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6 RESULTADOS E DISCUSSÃO

6.5 A chegada do desenvolvimento: transformações e impactos no

6.5.5 As Alterações ambientais e repercussões na sustentabilidade da

Figura 33 - Alterações ambientais no complexo de dunas entre a comunidade de Bolso e o porto do Pecém, na construção da correia transportadora de carvão mineral para a termelétrica Energia Pecém e campo de muricis no caminho dos tratores.

[...] onde estão fazendo a correia transportadora do carvão tinha muito pé de murici. Muita gente juntava para vender, para o próprio alimento, fazer suco. (participante do grupo focal).

Onde construíram a Tortuga aterraram uma lagoa. A máquina passa e arranca (os muricis) e aterra [...] a lagoa. A água que vinha para a (lagoa) como foi aterrado, (a água) vai alagar [...] as outras partes e morrem os pés de murici. Fica tudo seco! A mata sente. (participante do grupo focal).

Eu acho assim: na firma por enquanto, dois, três meses, você tá garantido e a agricultura, nesse tempo que nós estamos agora, não tem essa garantia, você trabalha um dia, passa três, quatro sem trabalhar. Porque tá todo mundo vendendo terra, ninguém quer plantar porque vai ser desapropriado. Fica com aquela dúvida e não querem mais plantar, não tem mais farinhada, é raro ter farinhada. (participante do grupo focal).

Em pouco tempo a comunidade andou muito rápida. Você pode observar que foi só por causa da termelétrica. Só ela conseguiu mudar muito a comunidade. Até pouco tempo, prá nós, a farinhada era de três em três meses. (participante do grupo focal).

As transformações no ambiente são relatadas pelo grupo que enfatizam as práticas comunais modificadas em decorrência dessa situação. A rapidez das transformações espanta as pessoas o que não impede uma reflexão. Constatam que uma só empresa em implantação já provocou uma intensa transformação, pensam no que pode acontecer com a implantação da siderúrgica e refinaria, que trarão impactos maiores.

A diminuição das atividades agrícolas pela instabilidade que acomete os agricultores é outro fator citado. A oferta de trabalho na produção agrícola está sendo reduzida e a população fica sem alternativas que não sejam as oferecidas pelas empresas. Essa situação compromete a sustentabilidade da comunidade, por alterar as formas tradicionais de subsistência e aporte nutricional que complementa o sistema alimentar das famílias, interfere no ambiente provocando transformações de grande magnitude nos ecossistemas e afeta sobremaneira a saúde da comunidade por ter que conviver com essa nova realidade.

A perda da soberania alimentar, a perda da biodiversidade e a aquisição de riscos ambientais a saúde decorrentes desses processos, desencadeia sentimentos como insegurança, medo e incertezas, afetando o bem estar com conseqüências diretas sobre a saúde.

Freitas e Porto (2006) consideram que é impossível pensar a noção de saúde sem incorporar a questão do bem estar, do acesso aos serviços dos ecossistemas e da manutenção da integridade ecológica dos sistemas de suporte da vida, que são vitais para fortalecer a expressão da vida humana.

Tal assertiva comprova a amplitude das ações pertinentes ao campo da saúde que necessita estar associada a diferentes políticas públicas no sentido de ser efetivada em sua plenitude. A proposta de promoção tem base na perspectiva ampliada de saúde, articula a formulação de políticas públicas saudáveis com a criação de ambientes favoráveis à saúde sendo um campo promissor para a consecução desse objetivo.

Conforme Fernandez et al. (2008) há uma evolução das concepções sobre a promoção da saúde à partir das Conferências Internacionais, que dirige o foco para os determinantes sociais, econômicos e políticos, para uma preocupação com as condições de emprego, renda, moradia, educação e segurança, entre outras coisas, que facilitam ou dificultam a obtenção de graus satisfatórios de saúde e bem-estar pelas pessoas e comunidades. Nessa perspectiva, a promoção da saúde assumiu contornos mais políticos atuando em proximidade com agendas de conquista e efetivação de direitos, de reforma dos modelos de gestão e de mobilização social.

Czeresnia (2003, p. 46) considera que "promover a vida em suas múltiplas dimensões envolve, por um lado, ações no âmbito global de um Estado e, por outro, a singularidade e a autonomia dos sujeitos, o que não pode ser atribuído à responsabilidade de uma área de conhecimento e práticas".

Em Bolso a autonomia dos sujeitos é um caminho trilhado com muitos percalços, mas desponta pouco a pouco. Nos embates acontecidos na luta pela terra a comunidade se fortalece, busca caminhos, constroem alianças. Quanto à ação do Estado questionamos de que forma a concretude das estratégias de promoção da saúde se darão no âmbito local, se não estão ancoradas em políticas mais abrangentes em outras esferas governamentais. O serviço de saúde pode desenvolver algumas estratégias para a população local, mas seriam paliativos diante da intensidade de impactos e mudanças provocadas pelos novos processos produtivos que aportam nesses territórios. A comunidade encontra-se vulnerabilizada e há a ausência de políticas públicas que fortaleçam o modo de vida e de trabalho.

A Política Nacional de Promoção da Saúde proposta pelo Ministério da Saúde tem como objetivo geral:

Promover a qualidade de vida e reduzir vulnerabilidades e riscos à saúde relacionados aos seus determinantes e condicionantes – modos de viver, condições de trabalho, habitação, ambiente, educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais (BRASIL, 2006, p. 130).

Reduzir vulnerabilidades e riscos a saúde, previstos na Política, torna-se de difícil consecução em contextos alterados de forma repentina, por interferências no modo de vida e a imputação de novos riscos provenientes de novos processos produtivos. São políticas que se contrapõem: a da Promoção da Saúde a de Desenvolvimento/Crescimento econômico a qualquer custo.