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ARTICULAÇÃO ‘ÁGUA-TERRITÓRIO’ NA PROTECÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

2.5 AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS E O NEXUS ‘ÁGUA-TERRITÓRIO’

A gestão integrada de recursos hídricos além de assumir a integração entre os vários aspectos relacionados com a governação da água, entre eles, a qualidade e disponibilidade da água, e a articulação com as diferentes políticas setoriais a envolver a água, deve reflectir orientações sobre a adaptação aos potenciais riscos associados às alterações climáticas (Benson e Lorenzoni, 2016).

Têm vindo a aumentar as evidências de que as alterações climáticas podem ameaçar a disponibilidade dos recursos hídricos, e que as pressões antrópicas associadas ao uso do solo agravam as variações climáticas (EEA, 2008). O grau de vulnerabilidade dos recursos hídricos face às alterações climáticas depende das opções assumidas no âmbito do planeamento e gestão da água. Os recursos hídricos são identificados como um dos factores determinantes para a adaptação às alterações climáticas, sendo mencionados em grande parte dos planos nacionais de adaptação climática (IPCC, 2014). Neste contexto, os recursos hídricos precisam ser mais resilientes ao clima, especialmente em áreas ou comunidades vulneráveis. Sob estes desafios, o planeamento e gestão dos recursos hídricos devem desenvolver atenção especial ao território e aos impactes do uso do solo, bem como à definição de medidas capazes de influenciar o comportamento dos vários actores e autoridades públicas associadas aos diferentes sectores de governação.

As alterações climáticas têm efeitos directos e indirectos sobre os recursos hídricos. Os efeitos directos, entre outros, estão associados à distribuição da disponibilidade dos recursos hídricos, à qualidade da água (superficial e subterrânea) e à frequência e intensidade dos fenómenos extremos como inundações e secas ou escassez, sendo estas um dos principais impactes das alterações climáticas na disponibilidade de água (Delpla et al., 2009). Os cenários sobre as alterações climáticas preveem uma diminuição do escoamento médio nos rios do sul da Europa, e em particular, algumas bacias hidrográficas na região do Mediterrâneo, que já enfrentam stress hídrico, podem sofrer reduções acentuadas da disponibilidade de água e a recarga subterrânea poderá ser afectada (Piras et al., 2014 em Shresthaa et al., 2017). Os efeitos indirectos resultam das respostas das actividades económicas e sociais perante uma nova realidade climática, que podem agravar as pressões decorrentes dos primeiros, através, entre outros, do acréscimo na procura de água, de uma degradação da qualidade de água, ou de alterações do uso do solo (IPCC, 2014).

Os efeitos das alterações climáticas sobre os recursos hídricos dependem, por um lado, das interacções entre o clima, topografia e geologia e por outro do controlo do tipo e intensidade dos usos do solo. Os usos do solo são identificados como um dos principais factores com forte influência sobre os efeitos das alterações climáticas nos ecossistemas, nomeadamente na biodiversidade e recursos hídricos (Smiraglia et al., 2016). De acordo com Foley et al. (2005), as práticas de gestão de uso do solo que têm vindo a ocorrer, podem ter aumentado a sensibilidade

do meio ambiente às alterações climáticas. Rounsevell et al. (2012) consideram que os futuros usos do solo serão fortemente determinados pelas medidas de mitigação e adaptação às alterações climáticas e que os serviços dos ecossistemas, nomeadamente os proporcionados pelos recursos hídricos têm o potencial de informar as decisões sobre os usos e o controlo dos usos do solo. Os efeitos das alterações climáticas decorrentes das opções do uso do solo podem determinar a ocorrência de episódios de poluição difusa, o aumento do escoamento superficial e diminuição das taxas de infiltração e potenciar a ocorrência de inundações.

Os impactes na degradação da água podem advir de práticas e usos do solo que conduzam à erosão do solo e ao arrastamento de sedimentos para as massas de água, e à contaminação da água, por vezes destinada ao consumo humano, por nutrientes e micro-poluentes. Em alguns casos, estes impactes tornam-se graves e onerosos do ponto de vista da protecção dos recursos, em particular quando a capacidade de tratamento não consegue acompanhar os elevados níveis de contaminação ou quando o abastecimento público está dependente de uma única origem.

O aumento do escoamento superficial devido ao aumento dos níveis de impermeabilização e agravado por episódios de precipitação intensa e concentrada em curtos períodos de tempo, leva a uma maior frequência de ocorrência de inundações. Nestes cenários, a presença territorial de elementos capazes de realizar a retenção ou controlo da água assumem especial importância, como seja o caso, das albufeiras ou lagos. Os reservatórios de água podem contribuir para o controlo e gestão de inundações, reduzindo o escoamento e os potenciais efeitos das inundações nas zonas urbanas a jusante destes e reduzindo os custos de conformidade com a Directiva Inundações (McMinn et al., 2010).

Outras práticas são também recomendadas, sublinhando o conceito ‘room for the river’, com o objectivo de restaurar a resposta natural da bacia à precipitação, como seja, a reflorestação sustentável, sistemas naturais de drenagem, e soluções baseadas na natureza (Keesstra et al., 2018). As vulnerabilidades às inundações e às secas estão fortemente associadas aos usos do solo, pelo que as opções territoriais, nomeadamente ao nível local, contribuem de forma decisiva para a sua mitigação ou redução. Neste sentido, a intervenção ao nível territorial deverá assentar na regulamentação eficaz do uso do solo, com especial incidência nas áreas mais vulneráveis e de maior sensibilidade ambiental. A minimização dos efeitos das alterações climáticas dependerá do grau de incorporação e coerência destas matérias no planeamento territorial (IPCC, 2014).

As alterações climáticas afirmam-se como uma agenda fundamental no quadro das políticas públicas de ambiente e ordenamento do território e devem ser consideradas de forma integrada em todas as políticas setoriais com reflexos nos recursos hídricos. As questões das alterações climáticas, em todas as suas vertentes, deverão ser consideradas nos processos de decisão nos vários domínios e o foco deve ser a internalização de medidas de mitigação e adaptação nos ciclos de planeamento e de gestão setoriais bem como nos momentos de definição de estratégicas (McMinn et al., 2010). A integração da adaptação às alterações climáticas nas políticas da União Europeia é sublinhada em diversos documentos europeus, como seja, a própria DQA (2000), a Directiva Inundações (2007), o White Paper (EU, 2009a), a Estratégia de Adaptação às Alterações Climáticas (EU, 2013a).

A mitigação e adaptação às alterações climáticas exigem articulação entre as várias políticas públicas, nomeadamente entre as políticas territoriais e a dos recursos hídricos na medida em que as alterações climáticas têm efeitos significativos sobre os usos do solo e estes interferem sobre a capacidade de adaptação dos recursos hídricos.

2.6 CONCLUSÕES

A gestão integrada dos recursos hídricos assume coerência entre os vários aspectos relacionados com a governação da água ao nível da bacia hidrográfica, por exemplo a qualidade da água, produção de energia, produção agrícola e florestal. Mas os críticos argumentam que a GIRH, na prática é frequentemente menos “integrada”, levantando preocupações sobre a integração sectorial, a coordenação entre as estratégias do uso da água e as do uso do solo e a mitigação e adaptação aos riscos associados às alterações climáticas, nomeadamente episódios de inundações e secas. A GIRH apresenta vantagens efectivas, mas também revela alguns desafios. Entre eles, a articulação entre o planeamento e gestão da água e o planeamento territorial. A DQA produz orientações e medidas que estimulam formas articuladas de planear os recursos hídricos com o território. Ao nível regional e local os planos de gestão de região hidrográfica e os seus programas de medidas apresentam importantes potencialidades de promover ou reforçar essa articulação. A formulação de medidas capazes de comunicar, de forma clara, a dimensão territorial das questões da água é essencial para o planeamento ao nível local. Os planos territoriais ao nível local em articulação com os planos dos recursos hídricos assumem um papel relevante para proteger a

água e ecossistemas associados e em conciliar usos e integrar as expectativas dos diversos stakeholders. A incorporação das questões da água no planeamento territorial ao nível local constitui condição necessária ao garante da salvaguarda dos recursos naturais, sobretudo em contextos de mudanças climáticas, e à utilização sustentável e resiliente do território. A mitigação e adaptação às alterações climáticas exigem a articulação entre as políticas públicas a envolver a água e o território que incentivem ou facilitem essa articulação e a práticas coordenadas e integradas. No entanto as interacções entre as alterações climáticas, o uso do solo e da água precisam de ser melhor compreendidas.

CAPÍTULO 3

TERRITÓRIO E PROTECÇÃO DE ALBUFEIRAS DE

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