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As assessorias de imprensa frente ao telejornalismo

Thompson denomina como bem simbólico toda e qualquer forma simbólica a qual foi atribuído um valor econômico. Ele observa que “algumas valorizações levam maior peso do que outras em função do indivíduo que as oferece e da posição da qual fala; e alguns indivíduos estão em uma melhor posição do que outros para oferecer valorizações e, se for o caso, impô-las” (1990, p. 204).

A história e o contexto tanto das assessorias de imprensa quanto do telejornalismo brasileiros se enquadram na teoria de Thompson, pois estão intrinsecamente ligados à história política e econômica do Brasil, ou seja, aos poderes dominantes de cada período.

Na época da introdução da televisão no País a economia se abria ao mercado dos Estados Unidos, adotando o modelo americano para realizar as produções televisivas nacionais. No período da ditadura militar, a censura limitou os meios de comunicação e fez do governo a principal fonte de informação dos telejornais, regrando e fiscalizando tudo que atentasse contra o interesse dos militares por meio de seu Departamento de Comunicação e Relações Públicas.

Após a redemocratização, no final da década de 80, uma censura velada foi exercida pelo poder econômico das empresas privadas em acordo com interesses políticos, que até hoje determinam o grau de legitimação dos bens simbólicos. Na órbita desta relação entre os poderes político e econômico com a mídia, a história do telejornalismo se entrelaça com a da assessoria de imprensa no momento em que a técnica televisiva é disseminada pelas novas tecnologias.

Este fator se deve em parte pela democratização dos meios tecnológicos e pelo advento da internet, mas também pelo fato de o mercado televisivo estar totalmente monopolizado, cada vez mais concorrido e saturado, o que implica em baixos salários para grande parte dos jornalistas e profissionais de televisão.

Sem perspectiva de crescimento ou de melhora financeira, a saída para muitos profissionais do jornalismo foi oferecer seus serviços às assessorias de imprensa e qualificar a produção de informações com o objetivo de atrair as redações televisivas. Assim, cinegrafistas, editores, produtores e repórteres encontraram nos departamentos de comunicação de governos e empresas privadas um novo fôlego ante a desvalorização imposta pela saturação do mercado.

Como visto anteriormente, existem critérios que compõem uma linguagem comum entre jornalistas e assessores de imprensa. No caso da televisão, esta linguagem entrelaça-se com a necessidade da construção de bens simbólicos constituídos de imagens em movimento.

O trabalho do assessor de imprensa, a grosso modo, consiste em inserir o assessorado no que Tuchman (TRAQUINA, 2005) chama de “rede noticiosa”, a cadeia formada por jornalistas e fontes noticiosas no seio da sociedade. Mauro Wolf (1987) destaca que esta rede de fontes estabelecida com os órgãos de informação reflete, por um lado, a estrutura social e de poder existente e, por outro, organiza-se a partir das exigências dos procedimentos produtivos.

Teoricamente, para os jornalistas, qualquer pessoa envolvida, conhecedora ou testemunha de determinado acontecimento ou assunto pode ser uma fonte de informação. Mas, segundo Traquina (2005), as fontes também são, geralmente, pessoas interessadas. Por isto, é necessário avaliar a fiabilidade da informação, e os jornalistas se utilizam para isto de diversos critérios de avaliação desta fonte, como autoridade, produtividade e credibilidade.

O jornalista pode utilizar a fonte mais pelo que é do que pelo que sabe. A maioria das pessoas acredita na autoridade da posição. Quanto mais prestigioso for o título ou a posição do indivíduo, maior será a confiança das pessoas na sua autoridade. Chama-se a isso a hierarquia da credibilidade. (TRAQUINA, 2005, p.191)

A autoridade da fonte é um critério fundamental para os jornalistas. O fator de respeitabilidade refere-se justamente à preferência em fazer referência às fontes oficiais ou que ocupam posições institucionais de autoridade. Diante deste panorama, cabe ao assessor colocar seu assessorado em disputa com as fontes oficiais de forma a torná-lo também uma fonte de respeito, autoridade e credibilidade.

Para tanto, o assessor faz uso dos seus conhecimentos sobre a rotina do trabalho jornalístico, bem como das predileções dos jornalistas por determinadas pautas e fontes. A idéia é aproximar o assessorado dos critérios valorizados dentro das redações por meio de construtos simbólicos remetidos aos meios de comunicação, como press-releases24, sugestões de pauta, e-mails e contatos telefônicos.

No caso da televisão, a valorização da fonte está atrelada ao potencial de imagem que ela proporciona. Como bem exemplificou José Mitchel, pauteiro do Jornal do Almoço,

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Texto produzido por assessores de imprensa em linguagem jornalística, de maneira a informar o jornalista da redação sobre determinada pauta na tentativa de atraí-lo para um cobertura.

“não adianta apenas sugerir uma fonte sem proporcionar imagens que ilustrem o que esta fonte está dizendo”25.

Segundo Wolf, a notícia televisiva é resultado de um processo organizado, que implica uma perspectiva prática sobre os eventos. Ela está estreitamente ligada aos processos que padronizam e tornam rotineiras as práticas de produção, mesmo que o produto – os acontecimentos do mundo – seja uma matéria-prima de natureza extremamente variável e imprevisível (2005, p.196-197).

Hierarquicamente, participam do processo de produção de um telejornal o diretor de jornalismo, o editor-chefe, o editor-executivo, as chefias de produção, a reportagem e a redação. O diretor de jornalismo é responsável editorialmente pelo programa e todos os profissionais estão subordinados a ele. O editor-executivo é quem finaliza o telejornal (MACIEL, 1995). O editor-chefe controla as editorias, revisa os textos, dá a palavra final sobre o que entra no programa (seguindo a linha editorial da emissora) e faz a avaliação final do produto em conjunto com os outros editores.

Já o chefe de produção comanda os editores de texto e de imagens – que finalizam e editam as reportagens que serão exibidas aos telespectadores. O chefe de reportagem coordena as equipes de reportagem, dando orientações e escolhendo quais delas devem cobrir os diferentes acontecimentos (YORKE, 1998). Geralmente, o chefe de reportagem tem auxiliares, como sub-chefes e uma equipe de produtores. Ele também chefia os repórteres, pauteiros e produtores – todos com a função de prover o veículo de informação (BITTENCOURT, 1993).

A chefia de reportagem é a parte mais importante do levantamento e da produção de matérias para o telejornalismo. É, pode-se dizer, o coração de todo o processo de produção de notícias com imagens e entrevistas, na retaguarda e no palco da ação. [...]É deste setor que parte a decisão final de cobrir ou não um determinado assunto. O responsável pela chefia, de acordo com as necessidades dos editores-chefes dos telejornais e em concordância com a Direção de Jornalismo, é quem organiza a cobertura diária dos assuntos pautados, orienta os jornalistas na maneira adequada de abordar os temas e indica qual o aspecto deles que interessa naquele momento. Ele tem também a incumbência de informar aos repórteres qual a duração aproximada das matérias e também a variação possível para as suas entradas ao vivo. (SQUIRRA, 1990, p. 83)

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As escolhas dos assuntos que serão veiculados no telejornal são resultado de reuniões entre produtores, editores, chefe de reportagem, chefe de redação e diretor de telejornalismo. Depois, é decidida a ordem, a duração, e a divisão em blocos das reportagens que vão ao ar (MACIEL, 1995).

Conhecedor destas rotinas, o assessor de imprensa, na teoria, sabe que o critério de seleção do que é notícia é muito particular em televisão. A idéia de que “uma imagem vale por mil palavras” é ainda uma das principais prerrogativas da TV. No entanto, também é sabido que outros fatores são decisivos para as escolhas feitas pelos editores de telejornais, como os aspectos políticos, econômicos, culturais, psicológicos e sociais.

O número de informações que chegam às redações através de press-releases, revistas, jornais, fac-símiles, serviços de escutas, folhetos, telefonemas de telespectadores, e rondas junto aos órgãos públicos é muito grande. Assim, o chefe de reportagem verifica criteriosamente os acontecimentos que possam ser transformados em matérias televisivas, se vale a pena enviar uma equipe até o local tendo em vista que os custos operacionais da TV são muito altos. (BITTENCOURT, 1993).

Com o conhecimento destes processos, as assessorias de imprensa elaboram estratégias de forma que seus materiais sejam encarados dentro das expectativas dos jornalistas. Embora as redações tenham variadas fontes de informação para elaboração de pautas, a assessoria de imprensa destaca-se por ser fruto do trabalho de um profissional consciente dos interesses e das rotinas que imperam nas redações.

Tendo ciência dos modos de produção de um telejornal e dos objetivos de uma assessoria de imprensa, faz-se necessário entender de que forma a relação entre assessores e jornalistas ocorre na prática. Para tanto, é imperativo recolocar esta pesquisa no recorte anteriormente proposto, junto aos telejornais selecionados.

Para entender a influência das assessorias de imprensa nos telejornais, é preciso compreender como os “jornalistas assessores” conseguem penetração para eleger suas pautas dentro das redações, bem como detectar que valores de noticiabilidade orientam as equipe de reportagem. O conhecimento das regras do jornalismo e, mais especificamente, da televisão, é um ponto crucial neste processo, que é o que veremos a seguir.