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As barreiras culturais no Rio de Janeiro, segundo a percepção dos

4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

4.1 Experiência de expatriação

4.1.2 As barreiras culturais no Rio de Janeiro, segundo a percepção dos

De acordo às respostas dos expatriados, a maioria entende que barreiras culturais estão associadas ao fato de não saber como comunicar-se no idioma com as pessoas locais. Alguns mencionaram que os valores e crenças se devem entender para não entrar em conflito. Outros responderam que os preconceitos e discriminação para uma determinada raça ou nacionalidade dificultam o desempenho pessoal e profissional. Isso pode refletir no que Trompenaars (1994) afirma que a variedade de problemas na comunicação é proveniente das diferenças entre culturas abertas neutras e afetivas.

Nesse sentido, conforme observamos nas entrevistas, a principal barreira cultural que os expatriados encontram no Brasil é não entender e saber falar o português, pois isso lhes dificulta comunicar-se, devido a que a interpretação e expressão das coisas podem ser diferentes e podem causar frustrações no seu desenvolvimento. Pelo qual, supomos que as cinco dimensões da comunicação humana apresentadas no item 2.2.1 por Mendenhall, Punnett & Ricks (1995), se encaixam neste aspecto também, pois as habilidades de comunicação dos expatriados, de acordo aos seguintes depoimentos são nossos exemplos reais de como eles entendem individualmente suas barreiras culturais na cultura brasileira/carioca.

O expatriado colombiano ressalta que mesmo o espanhol seja muito parecido ao português há uma desvantagem, devido a que a gramática é difícil e os sonidos são muito diferentes. Ele disse que deixou de apreender a gramática da língua portuguesa porque aqui

nem os brasileiros a conhecem. Nesse sentido, observamos que isso pode ser atribuído a que os brasileiros falam muito coloquial (gírias) tornando a comunicação bastante indireta e informal. “Aqui o que se deve apreender é a linguagem da rua porque até na esfera dos negócios não há formalismo com a língua. Antes me esforçava para que nas minhas reuniões meu português se escutasse correto, mas me disseram que estava falando um português antigo.”

Na opinião do expatriado eslovaco, as barreiras culturais que identifica aqui são os valores, segundo ele “as pessoas dizem coisas que sinceramente não querem dizer.” Nessa mesma linha, o expatriado norueguês 3 respondeu “a minha grande frustração é que aqui é ‘normal’ não dizer a verdade, não somente manter a promessa, mas também nunca tomar as responsabilidades. Ver que os brasileiros tentam pôr os erros cometidos por eles em outras pessoas é uma grande decepção para mim.” E, o expatriado holandês adere também que quando os brasileiros dizem que sim não significa que digam a verdade “eles não usam bem essa palavra.”

Por outro lado, a expatriada argentina considera que os preconceitos que existem entre brasileiros e argentinos a estereotipa. Segundo ela “os brasileiros não conhecem bem Argentina, eles generalizam a todos os argentinos com o exemplo de Maradona.” A resposta do expatriado americano 1 também se encaixa neste ponto, ele sente que o fato de ser estrangeiro o estereotipa “os brasileiros pensam que todos os ‘gringos’ não vêm ao Brasil para conhecer sua cultura e beleza natural, eles consideram que vêm pelas mulatas brasileiras só para fazer turismo sexual e acham que carregam muito dinheiro nos bolsos.”

Cabe ressaltar que segundo a entrevista com o expatriado americano 1, a comunicação dos brasileiros e em especial dos cariocas é bastante indireta. Eles naturalmente não dirão diretamente se estão de acordo ou desacordo, eles preferem dar voltas nas conversas antes de tomar uma posição, o qual pode ser irritante para um estrangeiro que não está acostumado com esse aspecto. “Os brasileiros são pouco diretos, te enrolam e enrolam antes de chegar ao ponto que querem chegar. Prometem coisas que não têm a mínima intenção de fazer. Não têm caráter para falar a verdade, pois querem ficar bem com todo mundo.”

A barreira cultural que o expatriado chileno considera está mais relacionada a uma das dimensões culturais que Hofstede (2001) aproxima para o Brasil: a individualidade “Brasil não conhece América Latina, para os brasileiros só existe Brasil e Estados Unidos, não conhecem outros países que não sejam esses. Desconhecem a localização geográfica dos demais. Academicamente os brasileiros são cultos, mas são prepotentes e têm ânsias de poder.” De acordo com esta resposta, concordamos que, é claro que o Brasil por sua

diversidade cultural e populacional, como menciona Hofstede (2001), ou porque o Brasil é uma sociedade que mais se parece com um extrato do mundo, como aponta Viana (2001), o expatriado colombiano ache que o fato de Brasil ser tão grande faça que os brasileiros pensem que só existe Brasil no continente. Entretanto, isso pode ser atribuído a que no Brasil, e assim como em outros países em desenvolvimento, exista uma carência de qualidade educacional, principalmente, pelo sistema de escolas públicas, pois certamente quem tem possibilidades de estudar em boas instituições nacionais ou estrangeiras não estará ao nível de conhecimento de alguém que estudou em uma escola pública.

Aqui existe um nacionalismo ou regionalismo, como se quiser dizer. Isso pode ser atribuído a que a qualidade de educação básica é deficiente. Por exemplo, as pessoas da minha idade não têm conhecimento de geografia nem de sua própria história, e ainda assim, há um obsoleto interesse por apreender. Muitos não sabem onde fica Colômbia e os que sabem me fazem brincadeiras pela imagem que a mídia divulga no exterior; país de violência e narcotráfico. Sinto um preconceito por ser colombiano, mas tento não dar-lhe importância, pois não estou isento de ser sinalado como tal (resposta do expatriado colombiano).

Consideramos que a primeira resposta sobre a linguagem confirma a importância da comunicação intercultural, pois de acordo com Mendenhall, Punnet e Ricks (1995), os problemas da língua são especialmente prevalentes quando são usados idiomas ou expressões coloquiais. Entretanto, como apontam os autores ela joga uma parte importante na socialização das pessoas. Por essa razão, a resposta do entrevistado aponta que é melhor apreender a linguagem coloquial para poder comunicar-se melhor.

Nas seguintes respostas observamos que vão ao encontro com as definições de cultura, propostas por Trompenaar (1994), Hofstede (1997, 2001) e Sundaram e Black (1995), já que os valores por ser o mais profundo e oculto da cultura mostra o entendimento mutuo que um grupo tem sobre o que está certo ou errado, ou como a parte sob a água do iceberg que não podemos ver, pois por ser implícita inclui regras sobre as relações, importância do trabalho, tolerância para a mudança, estilos de comunicação etc. Assim, notamos que algumas barreiras culturais se apresentam quando encontramos diferenças nas nossas crenças e valores culturais com que fomos criados.

Por outro lado, analisamos que as demais respostas estão relacionadas com os estudos de Freitas (1997), e Prates e Barros (1997), pois o fato de que o brasileiro seja indireto, segundo os autores, tem a ver em que a sociedade brasileira está baseada em relações, o qual desenvolve necessidades de tornar os relacionamentos mais próximos e afetuosos. No que se

referem a preconceitos, eles ressaltam que se trouxe de fora um sistema complexo sem saber como se ajustaria às condições da vida brasileira, e que a noção do individualismo é imposta de cima para baixo. Quiçá por isso, os respondentes observem que ainda há rastros de segregação nesta cultura.

4.1.3 Dificuldade para trabalhar em culturas diferentes da cultura de origem do

expatriado

A habilidade para trabalhar com pessoas de culturas diferentes se está convertendo em uma necessidade no ambiente de trabalho. Por isso é preciso aprender a conviver com outras culturas, já que cada vez as empresas estão-se internacionalizando (FLEURY & FLEURY, 2007), e também porque a cada ano se incrementa o número de imigrantes nas grandes cidades, sendo inevitável conviver com pessoas de outras regiões ou de outras nacionalidades. Observamos que o fato de ter tido experiências de expatriação em outros países, ter viajado ou morado mesmo não sendo expatriado em outras cidades, para vários respondentes isso lhes têm permitido conhecer e apreender as diferenças de novas culturas. Assim também, para quem Rio de Janeiro é sua primeira expatriação, eles manifestaram que é uma oportunidade para conhecer outra cultura e apreender dela. No entanto, mesmo gostando de alguns aspectos, eles mencionaram que há coisas que não lhes surpreendem e não significa que também as aceitem, segundo os respondentes, isso lhes serve para tentar integrar-se na sociedade e saber conviver com os brasileiros.

Dessa maneira é preciso considerar alguns dos aspectos mencionados na seção 2 sobre os traços da cultura brasileira, propostos por Holanda (1995), Freitas (1997), Ribeiro (2006) e Barbosa (2006), já que se ressaltam nas seguintes respostas, principalmente, no que se refere ao jeitinho que caracteriza aos brasileiros, a sociedade baseada em relações pessoais, informalismo e impontualidade (sendo para o carioca sinônimo de flexibilidade). Devido a que como advertem Rodrigues e Duarte (1999), é importante o entendimento da cultura nacional para onde o expatriado é deslocado.

Os depoimentos a seguir mostram as percepções dos expatriados entrevistados referente a este item:

• O expatriado italiano 1 considera não ter dificuldade alguma para trabalhar em uma cultura diferente “os italianos somos integrados, temos boa comunicação com todo mundo, por isso considero que me integro facilmente a uma nova cultura”;

• De uma forma mais positiva, o expatriado peruano afirmou: “a minha filosofia da vida é aproveitar as coisas diferentes, pois me ajuda adaptar-me física e intelectualmente”;

• Assim também é o caso da expatriada canadense, só que ela considera que aqui é absurdo ter que trabalhar 24 horas por dia e não receber remuneração, ela menciona que na sua cultura tudo é equilibrado e aqui é desorganizado, mas que funciona;

• O expatriado norueguês 3 sente que sua dificuldade é razoável, segundo ele, precisa lutar nos primeiros três ou quatro meses para apreender as regras locais, depois sabe controlá-las, mas lhe produz um desgarro;

• O expatriado equatoriano respondeu que na cultura carioca sente certa dificuldade, pois de acordo a sua resposta, a cultura do Brasil é muito diferente aos demais países de América Latina;

• Concordando com a resposta do expatriado equatoriano, o expatriado norueguês 1 explicou que para ele é um pouco complicado trabalhar nesta cultura, devido a que entre Brasil e Noruega há uma grande distância; na Noruega se trabalha muito e aqui são muito flexíveis “quando vamos executar um projeto os brasileiros não se importam pelas conseqüências, sempre encontram um jeitinho, mas quando vêm que os erros são grandes não sabem como sair deles, o jeitinho não ajuda, e tudo isso depois é caro.” Nesse mesmo aspecto a expatriada argentina também mostrou incômodo. Ela disse: “se vamos realizar um projeto precisamos discutir o processo, mas os brasileiros não se importam. Eles deixam levar tudo pelas relações e na Argentina nós nos focamos nos resultados”; finalmente

• O expatriado americano 2 disse que no início o sarcasmo do Rio de Janeiro lhe incomodava, devido a que esteve em outros estados do Brasil e aqui é diferente, mas que teve que relaxar-se para conseguir seus objetivos “apreendi a ser táctico de maneira a influenciar, pois sou direto e aqui têm um jeitinho. Aqui são calorosos, colocam mais tempero às conversas, mas são exagerados.”

Em referência às anteriores respostas observamos que a importância da interação das pessoas nesta sociedade tem a ver com os estudos de Chalant (1996), pois o autor analisa ao

indivíduo como um ser que não pode viver em círculo fechado. E de acordo aos seus estudos, concordamos em que o indivíduo precisa mesmo da relação com outros para que nessa interação possa construir o seu ego e sua identidade pessoal. Entretanto, isso predispõe saber lidar com as diferenças de outras pessoas para poder conviver tranquilamente, viver e deixar viver (BLACK e GREGERSEN, 1999).

Por outro lado, consideramos que as contribuições de Janssen (1995) e Rodrigues e Duarte (1999), também são aqui bem aceitas, pois para que o expatriado não tenha dificuldade de trabalhar no estrangeiro, ele precisa apreender os hábitos da cultura local, apreender a comunicar-se de diferentes maneiras (linguagem, comunicação verbal e não verbal), porque podem estar em desacordo com seus sistemas de valores e hábitos. Entretanto, observamos que de acordo com Bonach, Brewster e Suutari (2001), na internacionalização da empresa a estratégia de expatriação está relacionada com a aquisição de conhecimento, habilidades de comunicação e adaptação dos seus funcionários. Isso provê à empresa oportunidades para inovar e apreender de novas culturas idéias e experiências, que possam ser usadas para criar novos conhecimentos, que complementem o conhecimento já tido, e assim, poder desenvolver sua liderança global. Porém, Black e Gregersen (1999) ressaltam que os expatriados no exterior são selecionados pela empresa, precisamente, por ter a habilidade de ajustar-se a diferentes costumes, perspectivas e práticas de negócios.

Nesse sentido, além das sugestões propostas por Janssen (1995) e Rodrigues e Duarte (1999). Lau et al. (2001) ressaltam que as pessoas que tenha trabalhado em diversas organizações já estão acostumadas a trabalhar com pessoas de muitas culturas e diferentes visões do mundo. Por tal razão, os expatriados são enviados ao exterior por ser considerados com valiosas habilidades interculturais. Contudo, considerando que todas as culturas mesmo sendo diversificadas têm características similares (FERES JÚNIOR, 2010), os expatriados embora com grandes habilidades para comunicar-se e ajustar-se precisam conhecer as regras da nova cultura.