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As condições dos empréstimos: finança e condicionalidades

As condições financeiras dos empréstimos do Eximbank variaram em função do risco soberano, da estabilidade e da situação socioeconómica do país e foram estabelecidas aplicando uma margem (spread), sobre a LIBOR.245 As negociações para o primeiro financiamento resultaram no acordo para a aplicação de um spread de 1,5% sobre a LIBOR, o que, considerando a taxa média da Libor a três meses para o ano de 2004 (1,67%) colocaria a taxa de juro do empréstimo em torno dos 3,1%. Segundo entrevista a E8, funcionário do ministério das Finanças, o Eximbank pretendia adicionar uma sobretaxa de 1% ao spread de 1,5%, como prémio de risco para aceitar a garantia soberana oferecida pelo governo de Angola. As condições acordadas para o fornecimento diário de uma quantidade fixa de barris de petróleo, ao longo do período de pagamento do empréstimo negociadas pelo governo de Angola, permitiram a retirada da imposição desta sobretaxa.

O segundo acordo de financiamento, assinado em Setembro de 2007, obteve condições mais favoráveis para Angola, com a aplicação de um spread de 1,25% sobre a LIBOR. Segundo Alves (2010) e Aguilar (2006), o acordo de financiamento incluiu um período de pagamento de dezassete anos, após um período de carência de até cinco anos. Estas circunstâncias são particularmente relevantes no contexto de Angola, assolada pelo vencimento e acumulação de dívida de curto prazo, contratada a partir de 1985 pela Sonangol, num contexto de descida de mais de 50% do preço do petróleo nos mercados internacionais e de necessidade de liquidez para fazer face ao esforço de guerra (Oliveira, 2008)246. Está igualmente de acordo com Francisco (2008)

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A LIBOR é a taxa de juro utlizada como referência para as operações de financiamento no mercado interbancário de Londres (tradicionalmente baixa, por serem operações de baixo risco).

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O endividamento do governo angolano aos membros do Clube de Paris foi desenvolvido no capítulo 1. O esforço de guerra e a quebra do preço do petróleo nos mercados internacionais de 27,56 para 14,42 USD por barril entre 1985 e 1986 originaram a primeira utilização de

Special Purpose Vehicles, que permitiam o financiamento através de empréstimos garantidos

em petróleo, com preço garantido, com maturidades curtas e taxas elevadas. Devido ao risco os empréstimos eram sindicados.

184 que refere que no contexto dos países recetores de financiamento ao desenvolvimento, os prazos de pagamento são mais relevantes que as taxas praticadas.

Os empréstimos do Eximbank são acordos do tipo “oil-for-infrastructure”, o que significa que são garantidos em petróleo, ou seja implicam o fornecimento de uma quantidade diária de barris de petróleo à China, sendo o valor da venda depositado numa conta bloqueada, a partir da qual é feito o serviço da dívida em pagamentos trimestrais pelo governo angolano ao banco estatal chinês247. Para além do fornecimento de petróleo, os empréstimos do Eximbank implicam a adjudicação dos contratos financiados maioritariamente a empresas chinesas, assim como à importação exclusiva de equipamentos e materiais de proveniência chinesa, para a realização destes contratos (construção e equipamento).

Segundo entrevista a E8, o Eximbank sugeria duas ou três empresas para cada projeto, cabendo depois ao GAT do ministério das Finanças a escolha final relativa à empresa executora. Segundo esta interlocutora, no início teria havido alguma pressão por parte do Eximbank para designar unilateralmente as empresas chinesas que executariam os projetos; no entanto essa prerrogativa não foi concedida pelos interlocutores angolanos. A última palavra sobre a empresa selecionada para a execução de cada projeto individual caberia aos técnicos do GAT que, através de “concurso”, selecionariam uma, de entre a lista de três empresas apresentadas pelo Eximbank chinês.

Os objetivos do Eximbank tais como definidos no respetivo website implicam que a sua principal missão seja a “facilitação da exportação e da importação de maquinaria e de equipamentos eletrónicos, assim como de equipamento e tecnologia chinesa”248, “apoiar as empresas chinesas com vantagens comparativas nos seus

projetos no exterior (adjudicação de contratos e investimento)” e, em último lugar, “a promoção da cooperação económica internacional e do comércio”249. Ou seja, os

empréstimos chineses são um tipo de financiamento aos países em desenvolvimento utilizado prioritariamente para beneficiar a contratação e a atividade das empresas chinesas no exterior e para beneficiar as importações de equipamentos e maquinaria de origem chinesa.

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As condições dos empréstimos, no que refere ao fornecimento do petróleo, os chamados “oil-backed loans” são analisadas no ponto seguinte.

248 No original, são referidos “complete sets of equipment and high tech products”, o que

complementa o incentivo à exportação de maquinaria de origem chinesa, utilizado nos projetos de construção financiados.

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185 No caso de Angola foi negociada uma cláusula que obriga à contratação direta ou subcontratação de empresas angolanas, num valor proporcional a 30% do valor dos contratos financiados pelas linhas de crédito chinesas250. No que se refere à contratação de mão-de-obra local, segundo a Lei Laboral de 2000, apenas as empresas registadas em Angola podem contratar um contingente máximo de 30% de trabalhadores expatriados. Esta contratação é apenas admitida para profissionais com formação técnica, mediante justificação de inexistência de mão-de-obra qualificada nacional para as funções requisitadas. No entanto, na primeira fase de implementação dos contratos, conforme refere E8, os responsáveis locais das empresas eram hábeis em contornar a Lei Laboral de 2000, incorporando o máximo de mão-de-obra chinesa mesmo em funções não especializadas. Paralelamente os financiamentos concedidos no âmbito do acordo com a China, foram qualificados ao abrigo do Programa de Reconstrução Nacional e, como tal, as empresas eram enquadradas por um tratamento de exceção, sendo isentas do cumprimento das obrigações decorrentes da Lei das Sociedades Comerciais e da Lei de Investimento Privado.251

O cumprimento da quota mínima de 70% de mão-de-obra angolana em qualquer projeto seria sempre difícil de manter, de acordo com os vários interlocutores entrevistados, em particular na primeira fase do processo de reconstrução que decorreu nos primeiros anos após o final da guerra, até à realização das primeiras eleições legislativas em 2008. A escassez de mão-de-obra qualificada local, a par do número e da dimensão dos projetos a decorrer em simultâneo, foram variáveis que terão contribuído para justificar a grande incorporação de mão-de-obra chinesa na primeira fase de implementação do Programa de Reconstrução Nacional. Segundo entrevista a interlocutor do ministério das Finanças (E8), a falta de capacidade de execução das empresas angolanas também é referida como um obstáculo para a incorporação de maior conteúdo local nos contratos assinados com as linhas de crédito chinesas.252

O empréstimo concedido pelo China International Fund foi também garantido em petróleo (Corkin, 2013) e sendo um acordo oil-for-infrastructure, implicando o fornecimento de petróleo e a contratação de empresas chinesas para a realização dos contratos. As condições financeiras do empréstimo eram semelhantes às do empréstimo do Eximbank253, mas não foram tornadas públicas as condições relativas ao fornecimento diário de petróleo implícitas neste financiamento. Campos e Vines

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Mais pormenores em 4.3.

251 Ver Capítulo Seis – As Empresas Chinesas na economia angolana 252

Entrevista a funcionário do Ministério das Finanças.

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186 (2008) referem os atrasos sistemáticos de pagamento às empresas chinesas contratadas no âmbito deste acordo, assim como a pressão exercida pelo CIF no sentido de estas empresas aceitarem realizar os contratos com margens de lucro muito baixas, o que sugere a existência de uma margem entre o valor contratado e ao valor pago às empresas.