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As contradições de formar “para” a responsabilidade

No documento Revista Estudos nº 34 | ABMES (páginas 31-35)

social e formar “com “ responsa-

bilidade social

Partimos da premissa de que o embate público/privado é estéril quando se pensa a sério a questão de educa- ção. Independentemente do regime jurídico, lidar com educação não pode prescindir do compromisso com a qualidade. Qualidade, no entanto, como conceito plural, transacional, participativo exige que se celebrem acor- dos, que se explicitem as grandezas que estão sendo

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tomadas como referenciais balizadores do padrão de qualidade que se quer construir e a quem se destinam (BONDIOLI, 2004).

E isso não é questão consensual. Envolve conflito de interesses, valores, confronto de visões de mundo. Es- ses conflitos hoje não são privilégios das IES privadas. Ameaçam igualmente as IES públicas notadamente se estas se submeterem, sem crítica, à fúria mercado- lógica que vem ditando de fora para dentro os indica- dores de qualidade de ensino que interessam ao setor produtivo, valendo-se quase sempre das políticas de avaliação externa como indutoras e mantenedoras desse padrão. Avaliação de sistema processada em larga escala afeta as IES em sua totalidade. As públi- cas não estão a salvo só por serem públicas e devem demonstrar seu compromisso político usando sua autonomia na definição de seu PPP e mantendo sua coerência interna e externa na gestão deste projeto visivelmente setado. Há que prontamente se reconhe- cer para onde caminha uma instituição educacional, onde quer chegar e a quem pretende servir.

Dias Sobrinho fala-nos da privatização branca que está ganhando espaço nas universidades públicas, maculando sua responsabilidade social (2002). Isso nos obriga a interrogar de forma diuturna a realidade de nossos cursos de graduação ampliando nossa capa- cidade de perceber as contradições que existem no texto de nossos PPP e as ações/decisões que tomamos que podem se desvirtuar da rota estabelecida, premi- das pelas circunstâncias do momento histórico. O fenômeno se agudiza nas IES privadas, mas isso não pode nos levar a, inadvertidamente, supor que as

IES públicas possam prescindir de algum controle social.

Outro aspecto que queremos ressaltar refere-se ao problema do compromisso público que se espera das instituições privadas de ensino. Hoje a educação supe- rior no Brasil está concentrada nas mãos da iniciativa privada. Como alvo de interesse público, a educação não pode ser abandonada à própria sorte e ser conduzida de acordo com a vontade pura e simples dos gestores do momento, em especial quando concorda- mos que a educação superior não deve ser confundida com uma mercadoria e ser tratada apenas sob a ótica e a ética da empresa.

A educação deve gerar “produtos” socialmente rele- vantes e isso envolve um olhar minucioso sobre os PPP que são a expressão do acordo entre as partes envolvidas e definem o rumo das políticas de ensino/ pesquisa/extensão que são implementadas pelas IES. Quando se delega/compartilha com a iniciativa privada a possibilidade da formação dos cidadãos, impossível imaginar que, previamente, não se tenha cuidado da responsabilidade social que estas devam ter e manter, para poder intervir em área de alto risco e repercussão na qualidade de vida das pessoas e da sociedade. Em síntese, a educação como bem social, seja ofertada pela iniciativa pública ou privada, deve ser sempre de qualidade. Isso se inscreve no campo dos valores e é questão intransigível quando se trata de educação. Por cuidarem da cabeça das novas gerações e por interfe- rirem fortemente nos valores que lhes são agregados, as IES devem prestar contas publicamente do que fa-

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zem com o poder que lhes é outorgado pela sociedade, a quem devem responder e servir incondicionalmente. Isso nos coloca diante de nossa interrogação central: formar para ou formar com responsabilidade social? Será possível formar para sem que se tenha cuidado preliminarmente do formar com responsabilidade social? Há nítidas diferenças. No primeiro caso, posso eleger como meta que os estudantes devam aprender respon- sabilidade social para depois aplicarem. Isso pode con- duzir os professores a falarem sobre e os estudantes a ouvirem tal como se fosse um conteúdo outro qualquer, a ser repetido tantas vezes quantas necessárias nas avaliações em que participarem. Observamos o reducionismo de tratarmos como conteúdo um atributo que deve ser mobilizado de forma incontinente. Agir com responsabilidade social é diferente de discursar sobre responsabilidade social. Implica compromisso com o outro, o sujeito coletivo. Mas o que pode ser traduzido como responsabilidade social? Quais as evi- dências de que se ensina e se valoriza esse atributo na formação dos estudantes?

Alguns, de forma simplista, poderão assegurar que os alunos aprendem responsabilidade social quando se envolvem em atividades de extensão. Contestamos essa visão porque nos parece que a responsabilidade social permeia todo o processo educacional e esse é mais que a extensão. O ensino e a pesquisa quando trabalhados na dimensão edificante da ciência (SAN- TOS,1996) por si só já terão o compromisso com a re- alidade e com o trabalho extramuros, alargando as re- lações e os compromissos das IES com o seu entorno. Trazem, portanto, dentro de si; estão prenhes do ver-

dadeiro espírito extensionista, fazendo parecer uma re- dundância falar na já consagrada tríade ensino/pesqui- sa/extensão (COÊLHO, 2004).

Por conseguinte, se focarmos incisivamente a respon- sabilidade social nos projetos de extensão poderemos descuidar da forma com que os conteúdos são apre- sentados aos alunos nos espaços educativos. Podere- mos igualmente produzir investigações pobres na di- mensão ética, muito embora rigorosamente corretas. Cientificamente perfeitas. Mas para quem ou para que serve essa produção de conhecimentos?

Insistimos, pois, no resgate da reflexão sobre os valo- res que norteiam toda organização do trabalho pedagó- gico desenvolvido em nossas IES, contestando os terri- tórios que já estão demarcados como locus privilegia- dos para se ensinar responsabilidade social. Dada a complexidade de desenvolver em nossos alunos a consciência de seu papel social, defendemos que todo espaço e toda atividade que se intitula educativa deva conter em si o compromisso com a responsabilidade social e cuidar de que a mesma seja praticada, exercitada em situação real, no presente, fortalecendo a ação providenciadora de um futuro mais humano e humanizado.

Temos que aceitar, ainda que a contragosto, que nossa educação superior ainda é altamente elitizante. As ci- fras falam de um aumento significativo de alunos que podem estar cursando o ensino superior, mas se calam sobre o ainda enorme contingente de cidadãos brasilei- ros que permanece fora da universidade ou que pode, ao ser incluído, ser exposto a PPP conservadores, for-

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madores de homens domesticados, treinados para se submeter às regras do sistema vigente, mesmo quando as mesmas reproduzam iniqüidades sociais.

Formar com responsabilidade social é dispor-se a su- perar o mero compromisso com a instrução. Implica dar um sentido ético ao privilégio de se estar em uma instituição de ensino superior. Exige disposição para reagir às condições de funcionamento do projeto neoliberal e assumir como expressão da qualidade de ensino a capacidade de levar os estudantes a serem leitores do seu tempo, usando seus saberes para agir edificantemente. Defendemos que formar com res- ponsabilidade social é condição indispensável para pro- vocar o despertar da consciência dos estudantes para a responsabilidade social e para uma atitude radical di- ante dos fatores desencadeadores de ações que agudizam as desigualdades sociais.

Se admitirmos que há forte poder indutor nas políticas de avaliação que praticamos, independentemente do nível em que operam, parece fazer sentido examinar- mos com simpatia as mudanças trazidas pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) que recuperam a categoria da totalidade para apreen- são da realidade dos cursos de graduação. Confron- tam-se com a centralidade do antigo Provão no siste- ma e apresentam uma proposta de exame do desem- penho dos alunos que mescla dimensões gerais e específicas. As primeiras, intencionalmente versam sobre situações conectadas à vida social e pretendem provocar a reflexão sobre elas e identificar o quão fa- miliares os estudantes estão com os problemas sociais e como reagem a eles. Valorizamos essa decisão

política na reconfiguração do sistema de avaliação, notadamente por reconhecer a medida como uma for- ma de resistência aos modelos instituídos anteriormen- te que tratavam a avaliação como uma questão técnica apenas, subtraindo e/ou ocultando sua face política. Dias Sobrinho (2004) fala-nos do paradigma ético- epistemológico que subjaz a todos os processos avaliatórios. A clareza da função de uma IES na soci- edade interfere no conceito de responsabilidade social que orienta as políticas públicas. Define como o siste- ma entende e avalia o padrão de qualidade de suas es- colas e esta escolha se dá no campo dos valores não sendo procedente tratar a questão como meramente epistemológica.

A avaliação é assim, uma relação intersubjetiva, ins- creve-se num processo de comunicação pleno de conteúdos valorativos, associando ética e epistemologia como dimensões irredutíveis e inseparáveis. A ética é o terreno de emergência da subjetividade, é na ação pública e na comunicação que se constroem os sujeitos das práticas sociais. (DIAS SOBRINHO, 2004, p.7).

Dessa forma, entendemos o Sinaes como um importante passo na direção do formar com responsa- bilidade social e vemos no Exame Nacional de Desem- penho dos Estudantes (Enade), uma efetiva estratégia de resistência à lógica hegemônica no campo da avali- ação, com forte potencial formativo e reflexivo, indu- zindo as IES ao aprendizado de uma outra cultura de avaliação e currículo, detentores de mais responsabili- dade social.

É preciso admitir que responsabilidade social não tem hora e nem local próprio para ser praticada. Percorre

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de ponta a ponta o sistema educacional e ninguém, em instância alguma, pode se isentar de trabalhar de forma coerente com o conceito, assumindo os riscos e as pos- sibilidades que acompanham o compromisso com a responsabilidade social, do nível macro até o interior da sala de aula.

Só assim entendemos formar com responsabilidade social. Exercendo nosso poder decisório, qualquer que seja sua amplitude, de forma consoante ao entendi- mento que temos de responsabilidade social. E prefe- rencialmente construirmos algum afinamento conceitual nos diferentes níveis do sistema, ampliando as chances de produzir qualidade social. Agir em con- formidade com nosso pensar, recuperando o sentido de práxis parece ser essencial a um projeto educativo comprometido com a responsabilidade social.

Os desafios de praticar a

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