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Neste capítulo, apresenta-se uma visão geral do desenvolvimento histórico do Ensino de Física no Brasil, partindo do período colonial, explorando as contribuições dos jesuítas, até a sua institucionalização na primeira metade do século XX, quando a Física passou à posição de disciplina acadêmica nos ensinos secundário e superior; mostram-se aspectos da estrutura curricular do Curso de Física, da UFBA, nas modalidades licenciatura e bacharelado, passando pela implantação do Curso de Física, licenciatura, noturno, em 1999, que trouxe em sua matriz curricular o chamado Projeto das Físicas Básicas, objeto de interesse direto deste trabalho, discutindo também a natureza dessas disciplinas, que além de incorporarem a História e Filosofia da Ciência, por meio da abordagem contextual, propõem-se a fazer articulações com a experimentação e a linguagem matemática.

2.1 – Considerações históricas sobre o ensino de física no Brasil

No período colonial, podemos dizer que os primeiros educadores foram os padres jesuítas que aportaram em terras brasileiras com a vinda do governador- geral Tomé de Souza em 1549, liderados por Manoel da Nóbrega, no contexto da Contrarreforma, Inquisição e demais diretrizes eclesiásticas advindas do Concílio de Trento. Apesar da educação não constituir meta prioritária, uma vez que a economia colonial estava voltada para a agricultura e para atender às necessidades mercantilistas da metrópole, os missionários que aqui aportaram destinavam-se ao trabalho missionário e pedagógico, sendo responsáveis pela conversão dos gentios e impedir os desvios da fé católica por parte dos colonos (ARANHA, 2006). Os religiosos cumpriam também a função de garantir a unidade política da colônia, utilizando a educação para uniformizar a fé e a consciência, facilitando o papel do colonizador (ARANHA, 2006).

Podemos dizer que muito do ensino jesuítico ancorava-se na Escolástica, cujo apogeu se dá com as obras de São Tomás de Aquino; era a filosofia ensinada nas

escolas, na qual a sistematização da doutrina cristã ao concurso da razão, representava uma conciliação com os dogmas religiosos de então. Entre suas características estão o princípio de autoridade e a lógica dedutiva (silogismo ou lógica aristotélica, do bem-pensar), tendo nas universidades o foco da fermentação cultural da época (ARANHA, 2006). O método escolástico consistia em etapas, a saber, a leitura (lectio), o comentário (glossa), as questões (quaestio) e a discussão (disputatio), devendo-se evitar possíveis desvios heréticos. As universidades, por sua vez, surgem na Baixa Idade Média europeia, por influência da incipiente e crescente burguesia, a qual almejava a ascensão social, e com o objetivo de aumentar estudos de filosofia, teologia, medicina e leis (ARANHA, 2006), no contexto de uma nova sociedade, mais complexa, que começava a emergir.

O conteúdo de ensino, de uma forma geral, consistia no estudo clássico das chamadas sete artes liberais e era dividido entre o trivium (Dialética, Gramática e Retórica), o equivalente ao ensino médio atual, e o quadrivium (Geometria, Astronomia, Música e Aritmética), relativo ao ensino superior, cuja acesso era mais limitado (ARANHA, 2006), sendo o primeiro constituída de disciplinas humanísticas preparatórias para o segundo, na classificação de Boécio- Ancius Manlius Torquatus

Severinus Boethius(480-524 d.C.) - que caracterizou a universidade medieval. Essa

concepção de ensino passa a ser suplantada, gradativamente, e com algumas idas e vindas, a depender do local onde ocorreu, entre outros fatores, com a Renascença, o Humanismo, a Reforma Protestante e o advento da Ciência Moderna e da Revolução Científica, como vemos em Abdounur:

Cabe aqui ressaltar o cenário epistemológico vivido pela ciência neste período. A Revolução Científica nos séculos XVI e XVII propiciou a emergência de interpretações e argumentações inovadoras, contrapondo-se às doutrinas aristotélicas, à luz da qual os estudos da natureza possuíam caráter fundamentalmente qualitativo. Tendendo a justificar fenômenos naturais voltando-se para suas essências, a ciência satisfazia-se com explanações sustentadas por comparações e analogias nem sempre bem estruturadas e apoiadas em místicas numerológicas ou evidências pouco seguras (ABDOUNUR, 2003, p. 27).

Destaca-se aí, em meio à Revolução Científica, o importante papel das academias ou sociedades científicas, como a Accademia dei Lincei e Accademia del

Cimento, ambas na Itália, e a prestigiada Royal Society, em Londres. Tais

figuras ilustres da época, promovendo a ciência física experimental - chamada inicialmente de Filosofia Natural. O estabelecimento da Ciência Moderna e a mudança de mentalidade, como fruto do seu caráter “revolucionário”, pode ser visto em Rosa:

Um desenvolvimento de um espírito inquisitivo e crítico, ainda que em estágio inicial e minoritário no meio intelectual. Tal incipiente desenvolvimento permitiria um suficiente avanço tanto no campo teórico e conceitual quanto no metodológico e experimental, cujos efeitos imediatos seriam o de procurar afastar preconceitos, dogmatismos e sectarismos do trabalho científico, e fundamentar o conhecimento, ao menos em ramos das ciências exatas, em bases demonstráveis e comparáveis (ROSA, 2010, p. 22).

A valorização da observação e da experimentação no estudo das ciências da natureza, bem como da indução, a qual favorece a descoberta e a invenção, em contraposição ao rigoroso raciocínio dedutivo dos escolásticos, têm seu germe nesse período de transição. Vale destacar os trabalhos do frade Roger Bacon e dos franciscanos da escola de Oxford, que representavam uma reação ao tomismo (ARANHA, 2006).

Logo quando chegaram, os jesuítas fundaram escolas em Salvador, São Vicente e Piratininga. Vale lembrar que é a partir do Colégio de São Vicente que surge a cidade de São Paulo (ARANHA, 2006). Com a elaboração do Ratio

Studiorum, o Plano de Estudos da Companhia de Jesus, em 1599, redigido por

Santo Inácio de Loyola, fundador dessa ordem religiosa, os missionários passavam a ser orientados por esse documento, o que viria a fundamentar a pedagogia inaciana de então (CARVALHO, 1986). Os soldados de Cristo, como passariam a ser conhecidos, eram submetidos a uma rígida disciplina e tinham o objetivo sacerdotal de combater as heresias. Entretanto, apesar de caricaturados como guardiões da Escolástica, a qual passava a ser contestada com o advento da Revolução Científica, e de algum modo, pelo Protestantismo, vemos algumas exceções, como o padre jesuíta Inácio Monteiro, o qual deu importantes contribuições ao ensino de física em Portugal, valorizando o experimento e não o princípio de autoridade, sendo, portanto, anti-escolástico (MEDEIROS; MEDEIROS, 2002). Sua obra Compêndio dos Elementos de Matemática trata da física e do seu ensino (ROSENDO, 1996).

Notamos que apesar de religiosos mais “progressistas” na Ordem e do seu contato com “os modernos”, essas ideias não vingaram em Portugal, muito menos no Brasil Colônia. A educação e a evangelização iam desde os brancos mais abastados, aos nativos e aos mais pobres, seguindo o modus parisiense de ensinar (ALVES, 2005): os estudantes eram divididos em classes (grupos), relativos ao nível de conhecimento que apresentavam no período, sendo possível o avanço às séries seguintes após apresentarem domínio completo do conteúdo, o que fazia variar o tempo de permanência em cada série. A divisão do trabalho, o ensino seriado, a criação de salas de aula, a especialização dos professores nas disciplinas a serem ensinadas e a diferenciação dos conhecimentos são heranças do ensino jesuítico (ALVES, 2005), que ainda hoje podem ser observadas na educação contemporânea brasileira.

Pode-se dizer que a educação brasileira esteve sob responsabilidade dos jesuítas por quase duzentos anos (ROSA; ROSA, 2012). Para Carvalho e Martins (2004), quanto ao desenvolvimento científico, deve-se considerar também a forma como Portugal, o colonizador, via a Filosofia Natural; ao contrário de países como Inglaterra, França e Alemanha, onde havia um crescente interesse pela Filosofia Natural, abrindo-se para o desenvolvimento de técnicas e máquinas, Portugal continuava preso à dualidade terra-mar e às descobertas marítimas. O conhecimento dos fenômenos naturais e das matemáticas que se buscava nas escolas de navegação restringia-se ao utilitário (CARVALHO; MARTINS, 2004). Com as reformas pombalinas e a laicização do ensino, os membros da Companhia de Jesus foram expulsos das colônias, o que, dada a falta dos mestres, desestruturou completamente o ensino colonial, levando-o ao caos; não houve a substituição do ensino regular por outra organização escolar (ARANHA, 2006). Entretanto, por influência das reformas, criou-se, em 1772, a Sociedade Científica do Rio de Janeiro, cujo objetivo era a difusão do conhecimento científico, englobando os campos de Botânica, Física, Zoologia, Química e Mineralogia (CARVALHO; MARTINS, 2004), mas fechada em 1794. Em 1880, Azeredo Coutinho fundou, sem êxito ao cabo, o Seminário de Olinda, como tentativa de renovar o ensino colonial, incentivando o espírito científico e investigativo; a influência jesuítica no ensino colonial, além de resistente às mudanças, convinha ao interesse português de evitar o desenvolvimento de instituições em suas possessões que pudessem competir com a metrópole (CARVALHO; MARTINS, 2004).

A partir do início do século XIX, com a chegada da família real ao Brasil, nota- se uma reorganização do sistema de ensino, registrando-se a criação dos primeiros estabelecimentos de ensino técnico e superior no país (ROSA; ROSA, 2012), sem levar, contudo, a uma alteração significativa do quadro educacional brasileiro. Com maior abertura científica e educacional, foram criadas instituições como o Colégio Médico-cirúrgico da Bahia, a Escola Médico-cirúrgica do Rio de Janeiro, a Biblioteca Nacional, o Real Horto (que viria a ser chamado de Jardim Botânico, posteriormente), a Academia de Marinha, o Museu Real e a Imprensa Régia, com uma visão utilitarista, voltada a garantir segurança e estabilidade da Corte e atender demandas da elite intelectual local (CARVALHO; MARTINS, 2004). O projeto de criação de uma universidade brasileira, como pensado por José Bonifácio, previa a criação de uma faculdade de filosofia, tendo como núcleo as cadeiras de História Natural, Física, Química e Mineralogia, conforme visto em Carvalho e Martins (2004). Configura-se, como motivo para o fracasso desse projeto universitário, a falta de interesse do Reino em ciências cujas aplicações não trariam retorno econômico imediato, chocando-se com essa visão a concepção de ensino e pesquisa, o que fez prevalecer o modelo de escolas técnico-profissionais (CARVALHO; MARTINS, 2004). Quanto à institucionalização da disciplina física:

Dentre as iniciativas no campo do ensino destaca-se, na década de 1820, a introdução das aulas práticas de Física e Química, que foram ministradas no Museu Nacional pelo seu diretor, João da Silva Caldeira. Como disciplina autônoma, a Física começou a ser lecionada somente a partir de 1832. Ainda, porém, demoraria alguns anos para aparecerem as primeiras pesquisas nesta área (CARVALHO; MARTINS, 2004, p. 155).

No período posterior à Independência, já no contexto do Império do Brasil, o ato adicional de 1834 descentralizou as responsabilidades da educação popular, deixando a cargo das províncias a educação básica, proibindo também a intervenção do governo central no ensino elementar, ainda que financeiramente; esse ensino foi negligenciado pela falta de recursos financeiros das províncias em mantê-lo (ROSA; ROSA, 2012). Os mesmos autores ressaltam que os ensinos superior (constituído por aulas avulsas e exames parcelados) e médio restringiam-se às classes mais abastadas. Em meio às mudanças educacionais do século XIX, o ensino secundário restringia-se basicamente ao currículo humanista, com pouco espaço para o currículo científico, e os poucos cursos de ensino superior criados

visavam à formação de uma elite governante (NICIOLI JR.; MATTOS, 2007). A fim de criar novas perspectivas para o quadro de aulas isoladas, foi criado o Colégio Pedro II, em 1838, baseado no modelo francês de ensino, com escolarização seriada (ROSA; ROSA, 2012). Com isso, serviria de colégio padrão a outras escolas e daria organicidade ao ensino secundário; dadas as necessidades tecnológicas da época, tanto o currículo quanto a disciplina Física passam a ter finalidades específicas “não sendo mais exclusividade das disciplinas de caráter humanista- literária” (NICIOLI JR.; MATTOS, 2007, p. 3). Entretanto, houve pouca alteração do cenário da educação nacional, predominando o modelo de ensino avulso (ROSA; ROSA, 2012).

Para Carvalho e Martins (2004), o Colégio Pedro II e as escolas militares e politécnicas contribuíram para o crescimento do número de pessoas ligadas à física e a química, apesar da baixa qualidade do ensino, se comparada aos padrões europeus. Com as mudanças ocorridas no final do século XIX (abolição da escravatura, chegada de imigrantes, instituição da República, primeiro surto industrial, urbanização, crescimento de estratos médios e populares na sociedade), registrou-se um aumento na demanda social pela educação, exigindo-se a organização de um sistema nacional de ensino. A necessidade de pessoas com conhecimento científico para o mercado fez o currículo científico integrar-se à formação do estudante secundarista, principalmente com a ascensão das carreiras de engenharia e medicina, tornando obrigatória a disciplina física nos cursos preparatórios a partir da década de 1880 (NICIOLI JR.; MATTOS, 2007). Esse espaço dado às áreas mais científicas só é ocupado, segundo esses autores, no final do século XIX, pois até então a procura era maior pelo curso jurídico, considerado de maior prestígio: na “época de ouro do bacharel”, muitos jovens viam nesses cursos uma posição de destaque social, não se restringindo à atividade jurídica propriamente dita, mas conscientes das possibilidades de exercerem funções administrativas, políticas ou mesmo jornalísticas (ARANHA, 2006). A instituição responsável pelo ensino científico durante o século XIX, além do ensino médico (que já apresentava disciplinas de química e física), era, portanto, o Ensino Militar, o qual se dava nas Academias Militares.

O ensino militar foi criado, principalmente, para atender às necessidades específicas do meio militar. Sua formação exigia o

estudo das ciências, cujos resultados tecnológicos interessavam às táticas militares (NICIOLI JR.; MATTOS, 2007, p. 7).

É no meio militar que os conhecimentos de matemática, física e química tornar-se-ão indispensáveis para a concepção, implementação e manuseio de dispositivos bélicos, como nas aulas de artilharia e fortificações. Além de serem o embrião da engenharia no Brasil, as Academias Militares serão as responsáveis pela didatização do ensino de Física (incluindo conteúdos de mecânica, óptica, astronomia, geodésia e física experimental), servindo de preparação para as disciplinas de caráter militar que se seguiriam (o que se tornaria a base para a formação dos engenheiros e para o ensino nas escolas politécnicas), contrapondo- se à tendência educacional humanística de então e direcionadas a suprirem as deficiências do ensino secundário quanto aos conteúdos de ciências exatas (NICIOLI JR.; MATTOS, 2007).

A Proclamação da República, acompanhada de transformações econômicas e sociais, também trouxe outros impactos na questão educacional, como o aumento no número de estudantes matriculados no ensino primário (ROSA; ROSA, 2012). Dentre algumas características desse período, constam a laicização do Estado (separação entre Estado e Igreja Católica), e as influências dos positivistas, os quais, como apontam os mesmos autores, faziam-se ecoar através de Benjamin Constant, então ministro da instrução. Para Carvalho e Martins (2004), os positivistas defendiam currículos bem sequenciados, apesar de conservadores, e pesquisas apenas em áreas nas quais se pudessem apresentar provas experimentais; o fato do positivismo valorizar a ciência e combater o pensamento especulativo da realidade era bem visto, todavia essa concepção de conhecimento impunha certos limites à atividade científica, a exemplo da “recusa ao estudo da teoria de campo elétrico, na Física, e ao estudo da geometria não-euclidiana, na Matemática” (CARVALHO; MARTINS, 2004, p. 156). Segundo Rosa e Rosa (2012), em 1890, por influência dos positivistas, foram incluídos na educação básica conteúdos de Ciências Fundamentais (matemática, astronomia, física, química, biologia e sociologia), efetivando-se assim, ao longo da Primeira República, o sistema educacional brasileiro, mesmo com disputas políticas.

No início do século XX, tornava-se obrigatória a implementação de laboratórios que desenvolvessem conteúdos de física e química, espaços estes que eram utilizados para demonstrações práticas, sem, contudo, influenciarem o ensino

dessas disciplinas curriculares ou a formação de cientistas na área de ciências exatas (ROSA; ROSA, 2012). A partir de 1920, como decorrência de uma série de fatores (erros governamentais, situação das classes médias urbanas, influência da reorganização da Europa pós Primeira Guerra Mundial), eclodem, no Brasil, movimentos políticos, culturais e sociais que repercutiriam nos campos educacional, científico e tecnológico; criam-se, também, algumas instituições ligadas ao conhecimento, como a Sociedade Brasileira de Ciências (1922), posteriormente transformada em Academia de Ciências, e a Associação Brasileira de Educação (1924), suscitando discussões sobre a criação de uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (CARVALHO; MARTINS, 2004). No campo da física, particularmente da física experimental, foi criado pelo Governo Federal o Instituto Nacional de Tecnologia (1921), onde trabalhou o físico Bernhard Gross, emigrado da Alemanha (VIDEIRA, 2016).

Na década de 1930, após uma série de movimentos políticos e sociais que eclodiram no Brasil, cai a República Velha e inicia-se um processo de transição de um modelo econômico artesanal, baseado na agricultura, para um modelo industrial e urbano, o que fez reestabelecer também a centralização administrativa por parte do Governo Federal, bem como considerar a educação como alternativa para o desenvolvimento social e econômico, estendida a parcelas da sociedade, de menor poder aquisitivo, até então alijadas da escolarização (ROSA; ROSA, 2012). Em 1931, a Reforma Francisco Campos estabelece a obrigatoriedade do ensino secundário, com caráter nacional, e a divisão do secundário em fundamental e complementar, o qual prepararia o estudante para o ingresso no ensino superior, com disciplinas obrigatórias correspondentes à carreira universitária pretendida; essa reforma influencia também o ensino politécnico, cujo ingresso passa a ser pelo vestibular, o qual, por sua vez, passava a dar ênfase ao ensino de física (NICIOLI JR.; MATTOS, 2007). A física, portanto, passava a ser incorporada ao ensino secundário. Entretanto, Rosa e Rosa (2012) consideram a reforma baseada em aspectos conservadores, ao consolidar a base humanista tradicional e ao instituir o ensino profissionalizante, destinado às camadas mais pobres, sem condições econômicas de chegar ao ensino superior. Além disso, traz como inovação a Faculdade de Educação, Ciências e Letras, com o objetivo de formar professores para o secundário das elites, para que pudessem cursar a universidade. Mantinha-se um caráter seletivo e preparatório (ROSA; ROSA, 2012).

Decorre-se ainda, dessas discussões que se davam no campo educacional, o lançamento do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, assinado por vários intelectuais brasileiros que comungavam com os anseios da população. As práticas do chamado ensino tradicional passaram a sofrer fortes críticas, no início do século XX, de filósofos e pedagogos adeptos do movimento Escola Nova, o qual teve início em alguns países da Europa ainda no final do século XIX. Tal movimento ganhou força tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil; neste último, mobilizou intelectuais que participariam, em 1932, do referido manifesto, em uma espécie de reação às tendências passivas e verbalistas, centradas na figura do professor, características do ensino tradicional (GASPAR, 2014), tendências essas que, embora tenham perdido força frente a demais correntes e tendências pedagógicas desenvolvidas durante o último século, ainda estão presentes no ambiente escolar e universitário. Exigia-se uma nova política educacional, bem como um plano para executá-la, chegando a ter seus objetivos incorporados à carta constitucional de 1934, bem como nas demais constituições nacionais, com exceção da de 1937, dado o período ditatorial do Estado Novo (ROSA; ROSA, 2012). Em 1934 foi criada a Universidade de São Paulo (USP), contendo a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras - fundada, por sua vez, em 1924 -, o Instituto Biológico de São Paulo, as Faculdades de Engenharia, Educação, Direito e Medicina, a Escola Superior de Agronomia Luís de Queiroz e o Instituto Agronômico de Pesquisa (CARVALHO; MARTINS, 2004). Deve-se ressaltar que, até 1934, não havia pesquisa sistemática tanto na física teórica, quanto na física experimental, sendo seu ensino, em nível universitário, restrito às escolas de engenharia e faculdades de medicina, como explicitado anteriormente, e a fim de consolidar a área no país foram trazidos professores competentes do exterior, como Gleb Wataghin, o qual atraiu jovens brasileiros para a área, interessados em se dedicar à física - Marcello Damy de Souza, Mário Schenberg, Paulus Aulus (VIDEIRA, 2016).

Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial muitos desses físicos foram convocados para compor o esforço de guerra; Bernhard Gross, no desenvolvimento de sistemas de detonação, Marcelo Damy e Paulus Pompéia no desenvolvimento de transmissores e receptores de rádios, sistemas de detecção por ultra-som e medidores de velocidade de projéteis, numa clara visão utilitarista da atividade científica por parte do governo brasileiro (CARVALHO; MARTINS, 2004). Na segunda metade do século XX, dada a necessidade do governo brasileiro em

investir nas pesquisas nucleares, com fins militares, é criado em 1951 o Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), inicialmente voltado a financiar pesquisas em Física Nuclear, somando-se a isso outras instituições, como Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), no Rio de Janeiro, o Instituto de Pesquisas Radioativas (IPR), de Minas Gerais, e o Instituto de Energia Atômica, de São Paulo (CARVALHO; MARTINS, 2004). Vemos, portanto, a institucionalização de um quadro técnico -

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