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Neste capítulo, trataremos do delineamento metodológico da pesquisa, o que envolve o paradigma, as características da pesquisa, a estratégia e o método de análise de dados.

3.1 - Paradigma: a fenomenologia

Em vista do que foi apresentado na Introdução, enquadramos a presente pesquisa no paradigma interpretativista-fenomenológico, o qual considera o indivíduo e sua ação como unidades básicas, somando-se a isso as experiências vividas pelos sujeitos, os significados dessas experiências e os sentidos na consciência (CROTTY, 1998). Como vemos em Crotty (1998), ao optarmos por um paradigma de pesquisa comprometemo-nos com uma linha filosófica, a qual, por sua vez, enviesará a metodologia a ser empregada. Diferentes formas de ver o mundo envolvem, consequentemente, diferentes formas de conhecer e pesquisar o mundo. Estamos interessados em saber como as pessoas, no caso, os professores que ministraram as disciplinas Conceitos de Física, organizam os significados, como entendem a problemática das disciplinas, o que têm a relatar. O pesquisador, reconhecendo o mundo fenomênico, a inseparabilidade do objeto de pesquisa e a intencionalidade ao debruçar-se sobre este, tem também a intenção de produzir novos significados. A fenomenologia interessa-se pela vivência intencional, uma vez que intencionalidade procura articular vivência e significação na unidade do fenômeno, no sujeito que pensa e conhece, procurando retornar às coisas mesmas, sem se preocupar com a explicação, mas com a compreensão (CROTTY, 1998). Aqui também é importante mencionar o deslocamento epistemológico e metodológico do pesquisador ao longo do processo de investigação. De abordagens quantitativas ou que privilegiassem o estudo de fatores isolados, controle de variáveis, relações de causalidade linear, testes de hipóteses e explicações, para abordagens qualitativas que valorizassem uma visão mais global e holística do fenômeno em estudo, buscando a compreensão dos depoimentos dos sujeitos

pesquisados. A preocupação não é com o fato em si, mas com o relato sobre o fato, a maneira de articular sentidos, levando o pesquisador da previsão e verificação para a descrição e compreensão, adotando, portanto, um viés fenomenológico. A pesquisa que aqui se procurou desenvolver pareceu, pois, mais adequada ser pensada e realizada adotando-se o viés fenomenológico, uma vez que o objeto de estudo era o ensino de física universitária do ciclo básico, nas disciplinas Conceitos de Física da UFBA, o que direcionou a atenção para os professores dessas disciplinas, por meio de suas experiências de docência. O pensamento pré-reflexivo (BICUDO, 1994; FINI, 1994; BICUDO, 2000) é constituído a partir do contato com a literatura de Ensino de Física, História e Filosofia da Ciência na Educação Científica e da docência universitária, além das próprias vivências do pesquisador enquanto aluno de graduação, e nos leva a interrogar o fenômeno em questão.

3.2 – Características da pesquisa

Trata-se, pois, de uma pesquisa empírica qualitativa. Optamos, portanto, pelo método qualitativo, pois queremos investigar as experiências docentes, compreendendo-as por meio dos relatos dos professores, pela forma como significam as suas práticas pedagógicas, o que se enquadra nas características básicas descritas por Bogdan e Biklen (1994): ambiente natural como fonte de dados; predominância do caráter descritivo da situação estudada; foco no processo mais do que simplesmente nos resultados finais; análise indutiva dos dados (os dados conduzem a categorias não previamente estabelecidas) e ênfase no significado, a perspectiva dos participantes em relação ao tema abordado. A pesquisa foi realizada com professores dos componentes curriculares Conceitos de Física da UFBA, em número de quatro, em um universo de nove professores, que ensinaram uma ou mais de uma dessas disciplinas no período de 2016 a 2019. Esses foram escolhidos de modo que as quatro disciplinas estivessem representadas nas entrevistas, que os sujeitos pesquisados fossem professores em exercício há mais tempo na Instituição, que tivessem experiência, preferencialmente, em mais de uma dessas disciplinas e que fossem de acesso imediato, em razão do

pouco tempo disponível para a finalização do trabalho. Há aqui uma preocupação com a qualidade, com a riqueza dos depoimentos, sem pretensão de atingir aspectos quantitativos, como frequências de itens respondidos, ou universalização dos resultados. Deve-se observar também que um dos entrevistados é o orientador do presente trabalho dissertativo, pois, da reformulação curricular de 2016 até os dias de hoje, foi o único a lecionar uma das disciplinas.

Trabalhamos, portanto, com quatro docentes, cujas trajetórias acadêmicas serão descritas a seguir, conforme informações coletadas na Plataforma Lattes, do CNPq.

Professor 01:

Possui graduação em bacharelado em Física, mestrado e doutorado em Geofísica e curso técnico-profissionalizante em Técnico em Arquitetura. Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal da Bahia e atua em temas como isótopos estáveis, sedimentos, matéria orgânica.

Professor 02:

É bacharel e mestre em Física e doutor em Ensino, Filosofia e História das Ciências. Atualmente é professor associado I da UFBA, tendo experiência na área de Física, com ênfase em sistemas incomensuráveis, e na área de Ensino e História da Ciência (História da Física), atuando em temas como história da ciência, em especial, do eletromagnetismo, da óptica e da física moderna, associadas ao ensino de física do ciclo básico universitário.

Professor 03:

Possui graduação e mestrado em Física e doutorado em Ciências Ambientais. Atuou como pesquisador em regime de pós-doutoramento em duas ocasiões na

Universidad de La Coruña e uma vez na Universidade de Harvard. Atualmente é

professor na Universidade Federal da Bahia. Tem experiência na área de sistemas complexos, com ênfase em modelos computacionais, atuando principalmente nos seguintes temas: fractais, redes complexas, modelos computacionais, neurociência e biomecânica.

Possui graduação em Física, mestrado em Ensino, Filosofia e História das Ciências, mestrado em Science Education e doutorado em Science Education. Atualmente é professora da Universidade Federal da Bahia, onde coordena a área de PIBID em Física. Tem experiência em pesquisa em Ensino de Física e Formação de Professores de Física, partindo de referenciais feministas, pós-críticos e decoloniais. Tem interesse em pesquisa e prática em ensino de física, formação de educadores, física nas séries iniciais e discussões que envolvem as interseccionalidades de gênero, sexualidade, raça, etnia e status socioeconômico na construção e no ensino de ciências.

Apesar dos sujeitos pesquisados serem de ambos os gêneros, utilizaremos a terminologia (Professor 01, Professor 02, Professor 03, Professor 04), independentemente do gênero.

3.3 – Estratégia de coleta de dados

Como consideramos importante ouvir os docentes, para que estes, de forma espontânea, relatem suas experiências de docência nas disciplinas Conceitos de Física, utilizamos como estratégia prioritária de coleta de dados as entrevistas abertas, as quais foram registradas por meio de gravações de áudio (LICHTMAN, 2010). Pretendemos trabalhar com a espontaneidade dos relatos dos professores, com o que lhes vem à consciência quando interrogados sobre o fenômeno. Os professores foram solicitados a responder à seguinte questão: Como o (a) senhor(a)

relata suas experiências de docência nas disciplinas Conceitos de Física? A partir

daí, os professores poderiam mencionar diferentes aspectos de suas vivências nas disciplinas, podendo ser, inclusive, em mais de uma disciplina, além de poderem discorrer sobre temáticas como HFC no Ensino de Física nessas disciplinas, como viam as inovações curriculares, a abordagem didática/metodológica utilizada, como viam a extensão desses componentes curriculares ao curso diurno e sobre a extensão ao bacharelado, eventuais dificuldades etc.

Antes da entrevista propriamente dita, os professores foram contactados pessoalmente pelo pesquisador para colaborarem com a pesquisa. Foi explicado de

que se tratava, qual era o objetivo, em que eles poderiam contribuir voluntariamente, de modo que tivessem total clareza dos procedimentos metodológicos. Procurou-se enfatizar que eles teriam total liberdade para depor, sobre o que bem entendessem, suas percepções, impressões, e que seria, inclusive, desejado que ficassem totalmente à vontade, para que a conversa fluísse espontaneamente. Mostrou-se- lhes também que a intenção é que eles conduziriam a entrevista, devendo o pesquisador fazer apenas algumas intervenções a fim de elucidar determinados aspectos, esclarecer determinadas ideias.

Como estratégia secundária de coleta de dados, mencionamos a análise de documentos (MARCONI; LAKATOS, 2017). Foram analisados os projetos políticos pedagógicos do Curso de Física (o atual, de 2016, e o de 1998, quando foram criadas as Físicas Básicas, no então Curso de Física, Licenciatura, noturno, da UFBA), as ementas e os programas das disciplinas Conceitos de Física e Físicas Básicas. Além disso, a legislação educacional, que regulamenta a implantação e o funcionamento dos cursos de graduação em física, os cursos de formação de professores etc., também foi examinada.

3.4 – Método de análise de dados

Para a análise de dados, como se vê em Bicudo (2000), a leitura atenta das descrições levar-nos-á às unidades de significado, que nada mais são do que unidades de descrição que fazem sentido para o pesquisador a partir da interrogação formulada; não se trabalha, portanto, com categorias formuladas a priori, devendo o pesquisador, como parte da redução fenomenológica, chegar a categorias abertas, as quais irão subsidiar a análise (BICUDO, 2000). O procedimento de Redução Fenomenológica conduzir-nos-á à essência, estrutura do fenômeno em estudo, por meio dos invariantes e categorias abertas que irão emergir da análise, a partir da interrogação formulada. De posse das descrições dos discursos, resultantes das transcrições das entrevistas, procederemos às seguintes etapas, segundo Bicudo (2000):

Análise Ideográfica: relativa à representação de ideias de cada sujeito pesquisado; obtêm-se as unidades de significado, unidades/trechos do discurso que fazem sentido para o pesquisador diante da interrogação formulada; com isso o pesquisador redige o discurso articulado, na forma de um memorial, que procura, a partir das unidades de significado, tornar mais esclarecedor o discurso de cada sujeito, fazendo asserções.

Análise Nomotética: as asserções feitas sobre o discurso articulado de cada sujeito pesquisado, a partir das unidades de significado, são convertidas em temas, ou seja, através das convergências e dos invariantes obtidos dos diversos discursos, são obtidas as categorias abertas, as quais servirão de subsídios para a análise.

Compreensão: nessa etapa é onde é feita a compreensão propriamente dita, após intensa impregnação com o fenômeno de estudo; a partir daí se estabelece a essência do fenômeno investigado, obtendo-se possíveis respostas, ainda que provisórias, pois perspectivais, à questão de pesquisa.

Ressaltamos, mais uma vez, que como a percepção e a compreensão do fenômeno podem dar-se em diferentes perspectivas - a partir da interrogação formulada o pesquisador tem um papel ativo na atribuição de novos significados, valendo-se também de insights e intuições (BICUDO, 2000) - não há uma conclusão definitiva, mas provisória. O fenômeno está passivo de diferentes leituras, releituras e interpretações.

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