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3 CAMINHOS PARA OS FANDOMS

3.4 As Entrevistas

Realizar as entrevistas seguindo o método narrativo autobiográfico se mostrou um desafio inesperado para mim. A princípio, achei que instigar o entrevistado a falar sobre sua história de vida não seria algo tão difícil; acreditava que as dificuldades do método estariam restritas às análises. Entretanto, o campo e meus informantes me demostraram situações contrárias à minha expectativa. Além das dificuldades iniciais para conseguir marcar as entrevistas, realizá-las sobre o argumento de que eu queria ouvir a história de vida dessas pessoas causava estranhamento aos meus informantes. Era perceptível que as pessoas convidadas esperavam uma lista de perguntas diretas, com indagações mais elaboradas, e com linguagem possivelmente acadêmica. Um dos entrevistados relatou que estava preocupado com o que iria dizer, e que tinha tentando elaborar coisas “mais bonitas e acadêmicas” para me relatar. Em todos os casos, expliquei como funcionava a pesquisa, tentei deixar os entrevistados confortáveis, por vezes tentava tornar a conversa mais descontraída, a fim de criar mais segurança no diálogo. Alguns entrevistados também citavam o fato de eu ser fã da P!nk, realizando comparações e perguntas sobre a relação com minha diva. Por vezes, as entrevistas chegavam em uma informalidade que eu tentava buscar, afinal meu objetivo era que detalhes minuciosos das histórias de vida emergissem sempre que possível, e que situações íntimas fossem relatadas sem receios, para que assim eu tivesse o máximo de elementos para traçar perfis analíticos. Em alguns casos, os estímulos tiveram que ser frequentes, sendo assim, tentava sinalizar temas que fizessem parte das vidas pessoais dos fãs. Categorizei temas para esses estímulos no andamento da entrevista pela ordem: (1) Origem (2) Infância, (3) Família, (4)

22 O termo fã-clube não é mais utilizado, tendo em vista que a palavra denomina um grupo existente através de

Escola, (5) Vida sexual, (6) Vida religiosa, (7) Momento de conhecimento da diva. Seguindo posteriormente para a segunda fase.

Como já mencionado, na segunda parte das entrevistas, realizei estímulos para temas não abordados, e pedia para os entrevistados desenvolverem mais sobre algum relato especifico como “Me conta mais sobre esse dia que você conheceu a Britney...”. Como última pergunta da segunda fase, questionava sobre alguma possível relação entre a sexualidade e o fato de ser fã da respectiva cantora. Metade dos entrevistados sinalizaram espontaneamente suas identidades sexuais com a cantora que amavam; já outros, quando estimulados, tendiam a afirmar que já haviam pensado sobre isso ou já tinham uma ideia mais desenvolvida sobre a questão. Das sete entrevistas, cinco foram realizadas na praça de alimentação de shopping centers na cidade do Recife, uma no campus da UFPE e outra no hall da empresa em que um dos fãs trabalhava. Geralmente me coloquei a disposição para estar presente em qualquer local em que os contatos preferissem realizar os depoimentos, por mais que acreditasse que fazer as entrevistas em uma sala fechada, ou até na residência (minha ou do entrevistado) propiciariam um maior conforto para expor mais informações durante a coleta. Apesar disso, essa possibilidade não se tornou viável, devido à relação de possível flerte que era sempre trazida como uma dúvida ou possível possibilidade pelos meus primeiros informantes.

Assim como é sugerido por Rosenthal (2004), as transcrições não foram terceirizadas, desse modo seria possível relembrar situações e entonações de voz que contribuiriam para uma análise mais rica das entrevistas. Realizei categorizações temáticas durante a análise, similares aos temas estimulados durante as entrevistas: (1) Origem, (2) Infância, (3) Família, (4) Aceitação da sexualidade/Saída do Armário, (5) Sexualidade, (7), Religião, (8) Experiência Religiosa, (9) Culpa, (10) Descoberta da Diva, (11) Politica, (12) Consumo de Mídia, (13) Identidade/Subjetividade. As divisões temáticas, tanto nas análises quanto nas entrevistas, foram construídas como uma síntese dos conteúdos mais frequentemente abordados nos depoimentos, observações durante o campo e das minhas intenções objetivas para a pesquisa. Através da divisão temática, consegui traçar perfis a partir das histórias de vida narrada (com elementos simbólicos e de significados atribuídos ao passado vivido) e da história de vida vivenciada (cronológica, com fatos marcantes na história de vida). Após a construção de todos os perfis de análise dos entrevistados, consegui assimilar semelhanças, aproximações e distanciamentos de acordo com os perfis dos fãs, transversalizando temas como classe, raça,

iniciação sexual, relação religiosa e presença em shows das respectivas divas. A média de faixa etária dos entrevistados foi de 27 anos, quando dividido por fandoms, os membros das Beyhive tinham média de 23,5 anos e da B-Army de 27 anos. Dois entrevistados eram negros, e cinco eram brancos. A maioria dos fãs era de classe média, entretanto quando divido por grupos de fãs, a maior parte dos entrevistados da Beyhive era de classes populares e todos os fãs do

fandom da Britney Spears eram de classe média, um em especifico de classe média alta. Como

era esperado, garanti total anonimato para os entrevistados, dessa forma atribuí nomes fictícios para assegurar a privacidade dos depoimentos. Em alguns momentos das análises algumas informações sobre os entrevistados não foram explicitadas para não ferir o anonimato, tendo em vista que se tratando de grupo de fãs numa mesma cidade seria possível de identificar algumas fontes. Em alguns casos de conflitos, também evitei expor algumas situações que presenciei para não ocasionar em desdobramentos negativos para os fandoms e nos espaços de sociabilidade LGBT que realizei campo.