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2.ª PARTE FATORES CONTEXTUAIS

4.5. A Classificação Internacional de Funcionalidade e Saúde Crianças e Jovens (CIF-CJ)

4.5.1. As especificidades da CIF-CJ

A nível estrutural, a CIF-CJ apresenta uma organização homóloga à da CIF. No entanto, uma vez que se trata de uma classificação destinada a crianças e jovens, foram introduzidos conteúdos específicos nas componentes «Actividades e Participação» e «Fatores Ambientais». Estes refletem uma dimensão desenvolvimental e incidem, sobretudo, na participação da criança na sociedade, bem como na importância dos ambientes familiar, escolar e comunitário (Kostanjsek, 2011, OMS, 2007, Simeonsson, 2006). Assim, o componente «Actividades e Participação», formado por nove capítulos, está organizado numa lógica sequencial e correlacional, partindo dos aspetos mais particulares da pessoa (i. e. capacidade de apreensão e aplicação de conhecimentos) para os mais gerais (i. e. a questão das relações interpessoais), como se pode observar na Figura 14. Convém salientar que, tendo em atenção o vasto leque de aspetos abrangidos por este componente, o nono capítulo, referente à vida comunitária e cívica, estabelece a ligação entre o componente «Atividade e Participação» e os «Fatores Ambientais» (OMS, 2007). Contudo, apresenta algumas especificidades face ao seu homólogo na CIF, ao incluir aspetos que se referem ao desenvolvimento da criança nos primeiros anos de vida (i. e. aprender através da interação com objetos, do jogo simbólico e do jogo do «faz de conta»), bem como na adolescência (i. e. resolver problemas e tomar decisões) (OMS, 2007). Considerado um conceito importante na estruturação do documento, o termo «participação» pode ser entendido como um compromisso que crianças e jovens estabelecem com o ambiente que os rodeia, com o objetivo de, através da sua participação nos mais variados contextos, desenvolverem as suas capacidades em diferentes níveis de competência (McWilliam, 2005). Em consequência da introdução dos novos conteúdos, que abrangem um vasto leque de domínios e da importância atribuída à participação das crianças na sociedade, o termo «participação» é considerado um conceito nuclear da CIF-CJ e um direito basilar da criança (Simeonsson, 2009a).

117 No que respeita à estrutura do componente «Factores Ambientais», esta apresenta-se similar à que é utilizada na CIF, contendo apenas pequenas alterações relativas ao ambiente físico onde a criança pode desempenhar as suas atividades e participar na vida quotidiana (cf. Tabela 13). Assim, as referidas modificações surgem no primeiro capítulo - produtos e tecnologias - ao discriminar os produtos e tecnologias que podem apoiar a realização de jogos individuais ou em grupo (OMS, 2007).

Figura 14. Capítulos do componente «Actividades e Participação». Elaborado a partir da Classificação Internacional de Funcionalidade e Saúde - Crianças e Jovens (CIF-CJ) (OMS, 2007).

Figura 3- Capítulos da componente Atividades e Participação. Elaborado a partir de Classificação Internacional de Funcionalidade e Saúde-Crianças e Jovens (CIF- CJ), OMS (2007).

ATIVIDADES E PARTICIPAÇÃO

I CAPÍTULO

- Capacidades de apreensão e aplicação de conhecimentos, de pensar, resolver problemas e tomar decisões.

II CAPÍTULO

- Realização de uma ou mais tarefas, organização de rotinas e gestão do stress.

III CAPÍTULO

- Características gerais e específicas da comunicação realizada através da linguagem, sinais e símbolos.

IV CAPÍTULO

- Refere-se à mobilidade da pessoa, relativamente a deslocações, manuseamento e transporte de objetos de um local para outro. V CAPÍTULO

- Especifica aspetos de índole pessoal, como a capacidade de realizar a higiene pessoal e até cuidar da própria saúde de forma autónoma.

VI CAPÍTULO

- Refere-se às tarefas domésticas e quotidianas.

VII CAPÍTULO

- Aborda as questões das relações

interpessoais, relativamente à capacidade de estabelecer interações básicas e complexas socialmente corretas.

VIII CAPÍTULO

- Aborda áreas principais da vida, incidindo na capacidade de realização de tarefas relacionadas com educação, trabalho e transações económicas.

IX CAPÍTULO

- Explora a vida comunitária, social e cívica, seja no âmbito familiar ou fora dele.

118 Tabela 13

Organização informativa dos fatores ambientais. Elaborado a partir de Classificação Internacional de Funcionalidade e Saúde-Crianças e Jovens (CIF-CJ), OMS, 2007.

Fatores ambientais

CAPÍTULOS DOMÍNIOS

I -Aborda a questão dos materiais, instrumentos e equipamentos concebidos ou

modificados pelas pessoas, para melhorar a funcionalidade de uma pessoa com incapacidade.

II -Trata dos elementos que constituem o ambiente natural ou físico onde a pessoa se

insere.

-Numa dimensão interpessoal apresenta as características das populações que compõem esse mesmo ambiente.

III -Apresenta a questão dos relacionamentos e dos apoios.

-Especifica os diferentes tipos de apoios e as atitudes das pessoas que recebem os apoios face aos mesmos.

-

IV -Trata das atitudes enquanto consequências observáveis, provenientes dos costumes,

práticas, valores, normas ou crenças religiosas, que influenciam o comportamento de cada indivíduo tanto no âmbito individual como social.

-Estas atitudes referem-se às que são reveladas pelas pessoas face ao indivíduo com incapacidade.

- Os valores e crenças são considerados dentro do âmbito das atitudes, pois funcionam como catalisadores das mesmas.

V - Aborda os serviços que proporcionam benefícios, programas estruturados e

operações, em vários setores da sociedade, organizados para satisfazer as necessidades das pessoas.

- Especifica os sistemas que são mecanismos de controlo administrativo e de supervisão organizativa, estabelecidos pelas autoridades locais, regionais, nacionais ou internacionais.

- Apresenta as políticas que englobam regras, regulamentos, convenções e normas estabelecidas por autoridades que regem ou regulam os sistemas que controlam os serviços, programas e outras atividades em vários setores da sociedade.

Este componente assume, no conjunto da classificação, um papel preponderante na planificação dos programas destinados às crianças e jovens com deficiências ou incapacidades, uma vez que a tónica na identificação das necessidades reside na avaliação das «Actividades e Participação» e dos «Factores Ambientais» (Florian et al., 2006, Simeonsson, 2009a). Apesar de serem fulcrais na elaboração dos referidos programas, os fatores ambientais são os que apresentam o valor mais baixo de utilização na elaboração do perfil de funcionalidade da criança, como demonstram estudos realizados a nível nacional (Ferreira, & Simeonsson, 2010, Maia, & Lopes-dos-Santos, 2010). Além disso, este componente permite reconhecer as barreiras ambientais como as principais limitações funcionais e restritivas da participação (Simeonsson, 2009b).

Neste sentido, este sistema classificativo pode funcionar como um modelo defensor dos direitos das crianças, a par das convenções da ONU de 1989 e 2006, sobre os Direitos da Criança e das Pessoas com Deficiência respetivamente. Segundo estes documentos, as crianças devem ser as primeiras a receber todos os serviços que necessitam: i) serem protegidas por uma família; ii) ter bom ambiente familiar; iii) proteção contra a exploração; e iv) receber educação. Nesta perspetiva, a Convenção dos Direitos da Criança e a CIF-CJ

119 complementam-se, pois a primeira define os direitos das crianças, enquanto a segunda descreve o quadro que documenta as dimensões a ter em conta, no domínio da avaliação, para que esses direitos sejam respeitados. Estes dois documentos são complementados com o

Standard Rules for the Equalization of Opportunities (ONU, 1993) que considera esses direitos

comuns a crianças e adultos (OMS, 2007, Madden, Glozier, Mpofu, & Llewellyn, 2011, Simeonsson et al., 2003).