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As implicações na constituição psíquica dos sujeitos

1. A ESTRUTURA DO SUJEITO PSÍQUICO

1.2 As implicações na constituição psíquica dos sujeitos

Este tópico tem como objetivo trazer elementos pertinentes à constituição psíquica dos sujeitos, principalmente, no que se refere à sintomatologia das questões relativas à vida afetiva dos sujeitos com relação à inibição, ao sintoma e à angústia.

Baseia-se na obra freudiana, mais especificamente no texto intitulado Inibição, sintoma e angústia (1926/2006), para assim elaborar-se uma maneira de pensar sobre a formação dos sintomas e, deste modo, percebermos, a partir daí, o que isso representa em termos de estruturação do aparelho psíquico.

Para Freud (1926/2006), a inibição não está representando obrigatoriamente algo patológico, mas pode estar evidenciando certa limitação normal na função do eu. O sintoma vem atrelado a algo que diz respeito sobre o patológico. Desse modo, podemos perceber que a inibição pode ser considerada também, em alguns casos, como sintoma.

Desde o início, a ansiedade que ocorria em fobias ou em neuroses obsessivas levantava uma complicação, pois aqui a presença de fatos psicológicos não podia ser excluída. Mas, no tocante ao surgimento da ansiedade, a explicação continuava a mesma. Nesses casos – nas psiconeuroses – a razão do acúmulo de excitação não descarregada era psicológica: repressão. Mas o que surgiu foi o mesmo que nas neuroses ‘atuais’: a excitação acumulada (ou libido) foi transformada diretamente em ansiedade (Ibidem, p. 83).

Nessa linha de pensamento, a inibição é representativa de certa redução de alguma função, podendo ter muitas causas e expressar a limitação funcional do eu. Já o sintoma vem atrelado a uma alteração da função ou representando uma nova operação.

Os dois conceitos não se encontram no mesmo plano. A inibição tem uma relação especial com a função, não tendo necessariamente uma implicação patológica. Podemos muito bem denominar de inibição a uma restrição normal de uma função. Um sintoma, por outro lado, realmente detona a presença de algum processo patológico. Assim, uma inibição pode ser também um sintoma. O uso linguístico, portanto, emprega a palavra inibição quando há uma simples redução de função, e sintoma quando uma função passou por alguma modificação inusitada ou quando uma nova manifestação surgiu desta. Muito amiúde parece ser assunto bem arbitrário, quer ressaltemos o lado positivo de um processo patológico e chamemos o seu resultado de inibição [...] (Ibidem, p. 91).

Certas inibições ocorrem, simplesmente, pelo fato de que alguma atividade poderia representar um maior aproveitamento do eu, porém, o Supereu, de algum modo, não consente, fazendo assim com que o eu desista dessa atividade, evitando conflitos que seriam decorrentes do Supereu.

Assim, podemos pensar as inibições como limitações da função do eu, ou por empobrecimento de energia, já que existem intensas repressões de fantasias e afetos, ou simplesmente por precaução (evitando, assim, novo recalcamento). Nessa perspectiva, Freud (1926/2006, p. 92) destaca que:

Que existe uma relação entre a inibição e a ansiedade é algo evidente. Algumas inibições obviamente representam o abandono de uma função porque sua prática produziria ansiedade. Muitas mulheres manifestadamente temem a função sexual. Classificamos essa ansiedade sob a histeria, do mesmo modo como fazemos em relação ao sintoma defensivo da repulsa, que, surgindo originalmente como uma reação preterida à experiência de um ato sexual passivo, aparece depois, sempre que a ideia de tal ato é apresentada. Além disso, muitos atos obsessivos vêm a ser medidas de precaução e de segurança contra experiências sexuais, sendo assim de natureza fóbica.

Para Freud (1926/2006), o sintoma estaria totalmente atrelado a um processo sobre o Eu ou do Eu. O sintoma, assim, pode ser percebido como um indício ou mesmo como um substituto da satisfação pulsional não consolidada, ou seja, não completada, resultante de um processo denominado por ele de recalcamento. “Um dos resultados mais importantes da pesquisa psicanalítica é essa descoberta de que a ansiedade neurótica se origina da libido, que é produto de uma transformação desta e que, assim, se relaciona com ela da mesma forma que o vinagre com o vinho” (Ibidem, p. 83).

O recalcamento é uma maneira de manter sob afastamento todas as emoções pulsionais que são desagradáveis à consciência. Esse processo pode

ter seu início tanto pelo Supereu como pelo Eu. É pelo recalcamento que a excitação, que está tensionada pelo Isso, não ocorre, assim o Eu consegue fazer a sua inibição ou desviá-la de seu curso, o que nos traz luz de que o Eu exerce um poder, ou uma superioridade, sobre o Isso.

Pela íntima relação do Eu com a percepção, fica evidenciada a sua tarefa em criar condições que são necessárias para que se transmitam sensações de prazer ou desprazer, o Eu adquire influências sobre o Isso. Segundo Freud (1926/2006, p. 85):

O determinante fundamental da ansiedade automática é a ocorrência de uma situação traumática; e a essência disto é uma experiência de desamparo por parte do ego em face de acúmulo de excitação, quer de origem externa quer interna, com que não se pode lidar.

Para opor-se a um processo pulsional do Isso, o Eu necessita emitir certo sinal de angústia (desprazer), assim alcançando seu objetivo de desviá-lo ou mesmo inibi-lo. Freud (1926/2006, p. 110), ao tratar dessa questão, assim refere:

Algumas inibições tornam-se, por vezes, evidentes quando atingem determinadas atividades como escrever, tocar piano, e, revela em sua análise uma excessiva erogeinização do órgão encarregado de executá-la, sua significação sexual. Assim, o que a inibição encobre é justamente o que o significado simbólico que o ato em si representa. Com isso o eu renuncia a essas funções a fim de não produzir um novo recalcamento, a fim de evitar um conflito com o Isso.

O dominador do acesso à consciência é o Eu, bem como, sob a ação ao mundo exterior, e, através do recalcamento, tem sua afirmação de empoderamento em ambas as direções: tanto evitar agir como evitar o acesso. Porém, tem-se, de um lado, o Eu, que é organizador do Isso, e assim demonstra sua força de ação através do recalcamento, de outro lado, afirma-se sua impotência, pois o sintoma consegue se firmar, por vezes, fora dessa organização e consegue ser totalmente independente dela.

Embora o Eu lute contra algo desagradável que é a moção pulsional, e, consequentemente, contra um sintoma, por ser uma organização que se baseia no intercâmbio e na influência de mesmo modo em todos os seus componentes, aspira pela ligação e unificação, buscando a restauração.

A ansiedade ‘como sinal’ é a resposta do ego à ameaça da ocorrência de uma situação traumática. Tal ameaça constitui uma situação de perigo. Os perigos internos modificam-se com o período de vida, mas possuem uma característica comum, a saber, envolver a separação ou perda de um objeto amado, ou uma perda de seu amor – uma perda ou separação que poderá, de várias maneiras, conduzir a um acúmulo de desejos insatisfeitos e, dessa maneira, a uma situação de desamparo (Idem, p. 85).

Outra importante questão, que se evidência, é de que se, por um lado, o recalcamento demonstra a força do Eu, por outro lado, também marca a sua impotência, pois aquele processo, que se torna sintoma por obra do recalcamento, afirma a existência de algo fora da organização do Eu e independentemente dele.

Por um lado, o Eu luta contra a produção do sintoma e, por outro lado, por ser uma organização que se baseia livremente no intercâmbio e na recíproca influência de todos os seus componentes, a energia dessexualizada revela a origem e a aspiração à ligação e à unificação, tentando, assim, uma restauração para suprimir o isolamento do sintoma.

Segundo Freud (Ibidem, p. 94):

Quando o ego se vê envolvido em uma tarefa psíquica particularmente difícil, como ocorre no luto, ou quando se verifica uma tremenda supressão de afeto, ou quando um fluxo contínuo de fantasias sexuais tem de ser mantido sob controle, ele perde uma quantidade tão grande de energia à sua disposição que tem de reduzir o dispêndio da mesma em muitos pontos ao mesmo tempo. Inevitavelmente, é perceptível que o Eu obtém ganhos secundários com o sintoma: o rendimento, em sua debilitação, poderá acompanhar o sintoma apaziguando a demanda do Supereu ou recusando a exigência do mundo exterior.

No tocante às inibições, podemos então dizer, em conclusão, que são restrições das funções do ego que foram ou impostas como medida de precaução ou acarretadas como resultado de um empobrecimento de energia; e podemos ver sem dificuldade em que sentido uma inibição difere de um sintoma, porquanto um sintoma não pode mais ser descrito como um processo que ocorre dentro do ego ou que atua sobre ele (Idem).

Outro ponto muito importante, e que merece destaque, é que a angústia é a impulsão para o recalcamento. Desse modo, Freud (1926/2006) evidencia

certa cautela ao relacionar a angústia com a formação sintomática, pois existe a possibilidade de o sintoma não se apresentar conjuntamente com a angústia. Como uma maneira de evitar associações, e conexões aos pensamentos, o Eu obedece às ordens da neurose obsessiva que é um dos mandamentos mais antigos e fundamentais: evitar o toque.

O fato de que o EU pode subtrair-se da angústia através do sintoma de inibição harmoniza-se com a concepção de que a angústia seria, portanto, um sinal de afetividade. Segundo Freud (Ibidem, p. 96): “Estamos muito inclinados a pensar no ego como impotente contra o id; mas, quando se opõe a um processo instintual no id, ele tem apenas de dar um sinal de desprazer”.

Como ponto conclusivo, a angústia seria proveniente de alguma reação à situação de perigo; porém, se quiser, o Eu pode poupar certa situação. Deste modo, os sintomas são elaborados para evitar as situações de perigo iminente, que é notável através da angústia desenvolvida.

Sentimos a angústia. O seu desprazer é evidente, enquanto sensação, mas isso não limita suas características; nem todo desprazer pode ser identificado na angústia, pois existem outras sensações, como, por exemplo, o luto, as tensões e a dor, de caráter desprazeroso.

Mas essa explicação provoca novos problemas. De onde provém a energia empregada para transmitir o sinal de desprazer? Aqui podemos ser auxiliados pela ideia de que uma defesa contra um processo interno importuno será plasmada sobre a defesa adotada contra um estímulo externo, e de que o ego debela os perigos internos e externos, de igual modo, ao longo de linhas idênticas. No caso de perigo externo, o organismo recorre a tentativas de fuga. A primeira coisa que ele faz é retirar a catexia de percepção do objeto perigoso; posteriormente, descobre que constitui um plano melhor realizar movimentos musculares de tal natureza que tornem a percepção do objeto perigoso impossível, mesmo na ausência de qualquer recusa para percebê-lo – que é um plano melhor afastar-se da esfera de perigo. A repressão é um equivalente a essa tentativa de fuga. O caso retira sua catexia (pré-consciente) do representante instintual que deve ser reprimido e utiliza essa catexia para a finalidade de liberar o desprazer (ansiedade). O problema de como surge a ansiedade em relação com a repressão pode não ser simples, mas podemos legitimamente apegar-nos com firmeza à ideia de que o ego é a sede real da ansiedade, e abandonar nosso ponto de vista anterior de que a energia catexial do impulso reprimido é automaticamente transformada em ansiedade [...] (Ibidem, p. 96 e 97).

Todo o progresso de desenvolvimento, aumento de independência, e a divisão nítida em várias instâncias do aparelho psíquico na criança, além do advento de novas necessidades, não deixa de ter influências sobre todo o conteúdo e situação de perigo.

Ocorre a modificação da perda objetal (mãe) à castração, causando assim o empoderamento do Supereu. Através da despersonalização, da qual se teme a castração, pela via da instância parental, o perigo se torna cada vez mais indefinido.

A sede da angústia é o Eu, desse modo não temos motivos para atribuir manifestações de angústia ao Supereu. Nem mesmo o Isso pode ser considerado possuidor de angústia como o Eu, uma vez que ele não é organizador e assim não consegue presumir as situações de perigo.

Repetidas vezes acontecem processos no Isso, dando, assim, motivos ao Eu desenvolver a angústia. Os mais remotos recalcamentos têm sua motivação pela angústia do Eu frente aos métodos que são totalmente singularizados vindos do Isso. Segundo Freud, “Os estados afetivos têm-se incorporado na mente como precipitados de experiências traumáticas primevas, e quando ocorre uma situação semelhante são revividos como símbolos mnêmicos” (Idem, Ibidem, p.97).

Os progressos de desenvolvimento do Eu contribuem desvalorizando e deixando para trás o perigo anterior.

Nessa luta defensiva secundária o ego apresenta duas faces com expressões contraditórias. A única linha de comportamento que ele adota decorre do fato de que sua própria natureza o obriga a fazer o que deve ser considerado como tentativa de restauração ou de reconciliação. O ego é uma organização. Baseia-se na manutenção do livre intercâmbio e da possibilidade de influência recíproca entre todas as partes. Sua energia dessexualizada ainda revela traços de sua origem em seu impulso para agregar-se e unificar-se, e essa necessidade de síntese torna-se mais acentuada à proporção que a força do ego aumenta. Portanto, é natural que o ego deva tentar impedir que os sintomas permaneçam isolados e alheios utilizando todos os métodos possíveis para agregá-los a si de uma maneira ou de outra, e para incorporá-los em sua organização por meio desses vínculos (FREUD, 1926/2006, p. 101).

Quando o Eu é imaturo temos um período onde se marca o perigo do desamparo psíquico, bem como em relação à perda objetal, ponto este onde se localiza a apropriação à falta de autonomia da infância em seus primeiros anos. Todas as situações angustiantes e de perigo podem encaminhar o Eu à reação angustiante, podendo, assim, ao mesmo modo, ter a sua atuação eficaz.

Levando em consideração que percebemos a angústia em seu desenvolvimento como situação de perigo, podemos resumir o mesmo ponto dizendo que, para retirar o Eu de perigo, são formados os sintomas. Desse modo, se houver qualquer obstáculo na elaboração sintomática, surgirá, concomitantemente, o perigo, condição esta que é responsável, do mesmo modo, pelo condicionamento da angústia e da ansiedade.

Para Freud (1926/2006, p. 102),

Tudo isto resulta no que nos é familiar como o ‘ganho (secundário) proveniente da doença’ que se segue a uma neurose. Essa recuperação vem em ajuda do ego no seu esforço para incorporar o sintoma, e aumenta a fixação deste último.

Tomando por base a visão freudiana entre o sintoma e a angústia, percebe-se que há relações mais estreitas do que o oposto, mas entre as duas pontas encontra-se o cenário de perigo.

Ao desenvolver-se a angústia, desenvolve-se também o sintoma, uma vez que esta é uma questão necessária, pois, se não houver alteração de prazer e desprazer no Eu, através do aumento da angústia, não haveria, assim, condições de poder para barrar a maneira do Isso que manda sua advertência com o perigo.

A luta defensiva secundária contra o sintoma assume muitas formas. Trava-se em diferentes campos e faz uso de uma variedade de métodos. Não estaremos em condições de dizer muito sobre ela até que tenhamos feito uma indagação dos vários exemplos diferentes da formação de sintomas. Ao procedermos dessa forma teremos oportunidade de penetrar no problema da ansiedade – problema que de há muito avulta no segundo plano. O projeto mais sensato será começar pelos sintomas produzidos pela neurose histérica, visto não estarmos ainda em posição de considerar as condições nas quais os sintomas da neurose obsessiva, da paranoia e de outras neuroses são formados (FREUD, 1926, p. 103).

Toda formação sintomática tem como finalidade obter o resultado de extinguir a situação de perigo, e isto possui duas vias: uma que permanece ocultada para nós e inacessível, pois produz no Isso a modificação que é necessária para afastar o Eu de perigo, já a outra via volta-se para nós, pois nos mostra a formação substitutiva que é desenvolvida porque sofre influências dos processos pulsionais.

Segundo Freud (1926/2006, p. 101), “(...) é natural que o ego deva tentar impedir que os sintomas apareçam isolados e alheios, utilizando todos os métodos possíveis para agregá-los a si, de uma maneira ou de outra, e para incorporá-los em sua organização por meio desses vínculos”.

Na medida em que o Eu se defende de uma perigosa emoção pulsional, através do plano de recalcamento, inibe-se e lesiona-se uma parte do Isso, mas, por outro lado, também recebe, em parte, um reconhecimento pela sua soberania.

O recalcamento é uma tentativa de fuga, ou seja, algo que permanece do lado de fora da lei que rege o inconsciente e que foge à organização do Eu, este que permanece submetido a todas as leis e questões que perfazem o domínio do inconsciente.

Mesmo com toda dificuldade de entendimento sobre este capítulo, para quem não é da área psicanalítica, certamente percebe-se que, mesmo assim, ele é capaz de uma produção interessante de indagações sobre as questões pertinentes ao psíquico e ao educacional em seu lado oculto.

Os elementos freudianos são capazes de alterar toda uma lógica construída apenas para ver a aprendizagem como algo consciente. Os elementos apresentados mostram que há coisas ocultas em cada subjetividade circulante que constroem toda uma “nova visão” sobre a aprendizagem e sua relação com o inconsciente e o consciente.

Desse modo, devemos pensar nas consequências entre a inibição dos sintoma e a angústia causada pelo modo como se vê o processo de aprendizagem e a consequente não-aprendizagem nos sujeitos humanos,

principalmente aqueles que necessitam de um tempo diferenciado se comparados com os considerados normais pela sociedade.

2. A VINCULAÇÃO ENTRE O SUJEITO E O CAMPO EDUCACIONAL

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