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O campo educacional e a vinculação com o sujeito psíquico: a (não) aprendizagem

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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO

RIO GRANDE DO SUL – UNIJUÍ

PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO EM EDUCAÇÃO

NAS CIÊNCIAS

BRUNA ARCHESE KAFCZINSKI ARTUS

O CAMPO EDUCACIONAL E A VINCULAÇÃO COM O SUJEITO

PSÍQUICO: A (NÃO) APRENDIZAGEM

Ijuí - RS

2017

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BRUNA ARCHESE KAFCZINSKI ARTUS

O CAMPO EDUCACIONAL E A VINCULAÇÃO COM O SUJEITO

PSÍQUICO: A (NÃO) APRENDIZAGEM

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Mestrado em Educação nas Ciências da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação.

Linha de Pesquisa: Teorias pedagógicas e dimensões éticas e políticas da educação.

Orientador: Prof. Dr. Sidinei Pithan da Silva

Ijuí - RS

2017

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A792c

Artus, Bruna Archese Kafczinski.

O campo educacional e a vinculação com o sujeito psíquico: a (não) aprendizagem. / Bruna Archese Kafczinski Artus. – Ijuí, 2017.

72 f. : il. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Campus Ijuí e Santa Rosa). Educação nas Ciências.

“Orientador: Prof. Dr. Sidinei Pithan da Silva”.

1. Educação. 2. Aprendizagem. 3. Constituição humana. 4. Psicanálise. I. Silva, Sidinei Pithan da. II. Título.

CDU: 37.015

Catalogação na Publicação

Bibliotecária Responsável Ginamara de Oliveira Lima

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Ao Franciel Roberto Artus incentivador

desta pesquisa dissertativa.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço imensamente ao Universo pela minha existência,

aos meus pais pela vida e educação, à família pelo incentivo, e ao

Franciel, meu companheiro e sócio, pela paciência e compreensão.

Obrigada pelo apoio em minhas decisões e ações.

Ao professor Doutor Sidinei, por acreditar em minhas

habilidades e potencialidades na caminhada acadêmica. Pelas

preciosas horas de estudo e orientação, exigindo sempre o melhor.

Obrigada pela paciência, competência e exigência, o senhor

colaborou para o meu crescimento e amadurecimento.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação, pelos

grandes ensinamentos. Em especial, às professoras Maria Simone

Vione Schwengber, Marli Dallagnol Frison e Elisabete Andrade,

integrantes da banca de dissertação. Muito Obrigada!

Ao

programa

de

Pós-Graduação,

por

esta

grande

oportunidade e pelo brilhante trabalho realizado, todos os dias, com

os discentes que buscam o aperfeiçoamento e a qualificação

pessoal e profissional em suas vidas.

Aos colegas de Mestrado, pelos diálogos, trocas, sugestões,

convívio, caronas e amizade.

Enfim, agradeço a todas as pessoas que fazem parte da

minha vida, e que me incentivam na busca do aprimoramento em

todos os aspectos.

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Uma pessoa humilde é aquela que sabe que não sabe tudo, aquela que sabe que não é a única que sabe, aquela que sabe que a outra pessoa sabe o que ela não sabe, aquela que sabe que ela e a outra pessoa saberão muita coisa juntas, aquela que sabe que ela e a outra pessoa nunca saberão tudo que pode ser sabido”. Mario Sergio Cortella

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RESUMO

Este trabalho tematiza algumas questões que ficam ocultas na interpretação dos problemas envolvidos no processo de aprendizagens escolares dos sujeitos humanos. O enfoque da pesquisa é de natureza bibliográfica. Ampara-se, para tanto, em uma perspectiva metodológica de cunho qualitativo e interpretativo. Os principais autores estudados foram Sigmund Freud, Jaques Lacan, Alícia Fernández e Sara Paín. Por intermédio deles buscou-se pensar os vínculos entre educação escolar, subjetividade e aprendizagem, bem como muitas questões que, muitas vezes, permanecem ocultas, ou não são consideradas, nos processos de (não) aprendizagem. O estudo busca, sobretudo, compreender, através das leituras psicanalíticas que tratam sobre a constituição do sujeito, o que os laços vinculares, presentes no desenvolvimento da aprendizagem escolar, dizem, ou deixam de dizer, sobre as modificações do conhecimento nos sujeitos. Entende-se, como pano de fundo, na constituição humana, que todo o processo relacionado com a aprendizagem e, consequentemente, com a não aprendizagem, carrega consigo marcas da subjetividade humana, que condicionam as escolhas e buscas de vida de cada ser. Isto significa que perceber as diferentes subjetividades humanas implicadas nos campos educacionais é imprescindível para a construção e o reconhecimento das diferentes formas de aprender. Os problemas de aprendizagem, muitas vezes, são percebidos de maneira relativa ou completamente focados em um único aspecto. Neste estudo, toma-se o processo do aprender como algo complexo e, muitas vezes, indefinido. No primeiro capítulo, abordo a questão da constituição do sujeito e os problemas pertinentes e relativos ao desenvolvimento do conhecimento humano em relação ao mundo. No segundo capítulo, abordo os laços vinculares através da subjetivação humana em relação ao campo educacional. Entra em cena a questão do corpo e do desejo frente ao aprender. Já o terceiro capítulo trata das questões centrais e referenciais sobre os problemas de aprendizagem, buscando vincular a aprendizagem e a não aprendizagem como dependentes de um mesmo processo. Devemos, ainda, levar em consideração a educação, a cultura e a sociedade, o fato de que estas são dependentes de processos que promovam a argumentação e o ato de pensar. Deste modo, a constituição individual e coletiva está sendo pensada, no contexto escolar, através da subjetivação entre os sujeitos. Assim, não pensarmos que o ocultamento de questões pessoais e subjetivas, existentes nos processos de internalização da aprendizagem, pode causar rótulos significativos acerca do indivíduo que se apresenta no campo educacional.

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ABSTRACT

This work thematizes some questions hidden in the interpretation of the problems involved in the learning process of human subjects. The research focus is in a bibliographic nature. It is based on a qualitative and interpretative methodological perspective. The main studied authors were Sigmund Freud, Jaques Lacan, Alícia Fernández and Sara Paín. Through them, it is sought to think about the links between school education, subjectivity and learning, as well as many issues that are often hidden or not considered in the processes of (non) learning. The study seeks, above all, to understand, through the psychoanalytic readings that deal with the constitution of the subject, what the binding ties, present in the development of school learning, say, or fail to say, about the modifications of the knowledge by the subjects. It is understood, as a background, in the human constitution, that the whole process related to learning and, consequently, to non-learning carries with it marks of human subjectivity, which condition the choices and searches of life of each being. This means that realizing the different human subjectivities implied in the educational fields is essential for the construction and recognition of the different ways of learning. Learning problems are often perceived relatively or completely focused on a single aspect. In this study, the theme of learning is taken as something complex and often indefinite. In the first chapter, I board the question of the constitution of the subject and the pertinent problems concerning to the development of human knowledge in relation to the world. In the second chapter, I board the binding ties through human subjectivation in relation to the educational field. It comes in face the question of body and the desire of learning. Finally, the third chapter deals of the central and referential questions about learning problems, trying to link learning and non-learning as dependent on the same process. We must also take into account education and society, the fact that they are dependent on processes that promote reasoning and the act of thinking. In this way, the individual and collective constitution is being thought, in the school context, through the subjectivation between the subjects. Thus, we do not think that the concealment of personal and subjective questions that exist in the processes of internalization of learning can cause significant labels about the individual who is present in the educational field. KEY WORDS: Learning. Constitution. Subjectivity.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

1. A ESTRUTURA DO SUJEITO PSÍQUICO ... 17

1.1 O sujeito psíquico e os impasses da estruturação... ... 25

1.2 As implicações na constituição psíquica dos sujeitos. ... 30

2. A VINCULAÇÃO ENTRE O SUJEITO E O CAMPO EDUCACIONAL...39

2.1 Entre o psíquico e o educacional...44

2.2 O corpo e a sua função na aprendizagem...50

3. OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM: QUESTÕES CENTRAIS E REFERENCIAIS...55

3.1 Aprendizagem e educação...58

3.2 Principais fatores envolvidos na não aprendizagem...61

3.3 Psicopedagogia, tratamento e contrato...63

CONCLUSÃO...67

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INTRODUÇÃO

Esta dissertação de mestrado surge com o intuito de lançar questões ao campo educacional. Com relação à temática desta dissertação inclui-se a preocupação sobre os sujeitos inseridos no campo educacional e sobre a sua forma de internalização das aprendizagens. Busca-se pensar sobre os fragmentos ocultos que pertencem tanto ao campo da educação como ao da subjetividade e singularidade de cada ser que busca aprender algo. Sobretudo, pensamos acerca do não dito sobre as possíveis variáveis de aprendizagem, visto que aprendemos constantemente.

Como Psicóloga, vejo a importância da análise contextual de cada sujeito, visto que somos seres singularizados a partir de nossas vivências e experiências humanas desde o berço até a morte. Somos incluídos no campo educacional sob os mesmos preceitos, porém os problemas surgem desta perspectiva, pois temos o silenciamento individual que se apresenta no social, e do qual faz laço e marca a passagem subjetiva de cada um de nós.

A singularidade dos sujeitos se manifesta no modo de aprender dos mesmos, falando algo que precisa ser ouvido, mas que, seguidamente, é ignorado. Essa fala expressiva, corporal que, muitas vezes, é silenciada, deve ser ouvida, analisada e tocada para ser compreendida.

Tomo, como pressupostos teóricos para pensarmos o tema, os conhecimentos de Sigmund Freud, tematizando, inicialmente, o desenvolvimento da questão da constituição do sujeito, para então, entrar nas questões educacionais que os sujeitos do conhecimento enfrentam referente às dificuldades e aos problemas de aprender.

As questões ocultas nos problemas de aprendizagem serão aqui entendidas ao longo da compreensão do desenvolvimento do sujeito em sua relação com o complexo campo educacional e social. O sujeito do

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conhecimento necessita desenvolver suas potencialidades que ficam obscuras diante das diversas singularidades entre os sujeitos. Cada sujeito é único. Cada sujeito desenvolve seus aspectos internos, emocionais, sentimentais e identificatórios que contribuem ou não para as aprendizagens de conhecimentos.

Os problemas de aprendizagem, tais como, hiperatividade, déficit de atenção, entre outros, estão às voltas no discurso educacional e social na contemporaneidade. Os alunos que não desenvolvem suas habilidades escolares, como, por exemplo, a leitura, a escrita e o desenvolvimento intelectual, conforme os cronogramas e planejamentos institucionais, acabam sendo projetados, discursivamente, como alunos com problemas de aprendizagem.

Essa dificuldade do processo circula entre os sujeitos denominados problema, ou seja, pais, professor(es), instituição de ensino, direção escolar e comunidade social. Em quase todos esses campos, os problemas são percebidos e acometidos de pequenas intervenções que, consequentemente, produzem poucos efeitos no sentido da resolução para a questão central.

Na escola, a metodologia utilizada para o trabalho de ensino é exercida, na maioria das vezes, de modo muito amplo e geral para com os sujeitos que se encontram em um mesmo ambiente ou mesmo processo de ensino e aprendizagem. Esses sujeitos são convocados a corresponder, de modo igualitário, aos métodos e técnicas formuladas pelas instituições de ensino, através dos projetos e currículos pedagógicos, com uma vasta linha de ferramentas, mas que não atuam, de modo igualitário, entre os alunos.

Dessa maneira, encontra-se a forma teórica e prática com a qual o professor deve ensinar, cumprindo sua tarefa descrita nos planos de ensino educacionais. Porém, outras questões giram em torno do saber, da aprendizagem e, consequentemente, da não aprendizagem em um sujeito. Devemos pensar nisso e avaliar as inúmeras condições que são relevantes ao aprender.

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Pergunta-se, então, quais as questões que ficam ocultas no processo de interpretação dos problemas de aprendizagem? Como é possível pensar em uma perspectiva ampla sobre os diversos problemas de aprendizagens a partir dos vínculos entre educação, subjetividade e o aprender?

Os problemas de aprendizagem, muitas vezes, são percebidos de maneira relativa ou completamente focados em um único aspecto. Entende-se que, na interpretação desses problemas, a problemática existencial e singular, bem como a social, nem sempre é considerada. Esse reducionismo interpretativo acerca da constituição do sujeito produz uma leitura de enquadramento de cada ser, singular em uma universalidade hipotética. O enfoque psicanalítico nos mostra a dimensão corporal do ser, e, com isso, sinaliza para a dimensão social e a dimensão singular. Os que são considerados problemas de aprendizagem são sujeitos que não se enquadram na regra interpretativa universal. Eles estão fora da norma. O desprezo pela diferença e pela singularidade no processo de interpretação impede em pensar uma via radical para enfrentar o problema.

Quando se presencia uma reunião de pais de alunos com os professores, fica evidentemente explícita uma certa disputa simbólica para encontrar um culpado que leve a culpa pelos problemas de aprendizagem do sujeito, sem contar que, muitas vezes, o próprio sujeito que não aprende leva o rótulo de alguma questão, por exemplo, quando toma certos medicamentos para determinada finalidade do problema, deixando, assim, o rótulo da doença como causa para a sua não aprendizagem.

O processo de aprender é uma constante de fatores psíquicos/discursivos que se apresentam às voltas com a subjetividade do sujeito. Por isso, deveria ser isento de normas, padrões, gráficos ou tabelas que determinam o nível de aprendizagem, estipulado para os diferentes alunos no campo educacional. É fácil rotularmos e julgarmos a não aprendizagem, ou culpabilizarmos algo ou alguém por ela. Difícil é percebermos o que não está dito sobre o sujeito que não aprende, mas o que se faz presente

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discursivamente sobre ele e que fica nas bordas psíquicas e corporais da questão frente ao não aprender.

Temos, na maioria das vezes, no discurso educacional, uma lógica imposta para os sujeitos que ali estão: notas altas, bom desempenho e rendimento, atenção, concentração, bom relacionamento entre colegas e professores, disciplina. Isso se presentifica não só no campo educacional. A sociedade contemporânea e os pais também demandam essa mesma lógica, como se ela dissesse e estipulasse por si só quem de fato aprende.

No momento em que surge algum problema relacionado com a questão do aprender, a escola comunica os pais e, geralmente, encaminha, junto com eles, a criança para algum médico ou psicólogo, pessoa capacitada e especializada para avaliar o sujeito e, assim, diagnosticar a causa da não aprendizagem. Porém, geralmente, falha-se ao não enfatizar e trabalhar adequadamente a sintomatologia apresentada pelo sujeito.

O que encontramos no campo educacional são indivíduos com formas e tempos diferentes de apropriação de aprendizagens. A internalização1 da linguagem e, consequentemente, do saber, é, assim, disposta por tempos individuais diferentes. Não há sujeito que obtenha o saber de forma cronológica, mas sim através da sua lógica atemporal de apropriação do saber, disposto no mundo em que agora ele se insere. Aprender é um processo constante e lento.

Ademais, quando retratamos o contexto escolar da atualidade, não podemos nos esquecer dos processos de aprendizagem dependentes de uma sociedade contemporânea, que é tomada discursivamente pelos processos rápidos e digitais de aprendizagem. Devemos, ainda, levar em consideração, quando retratamos a educação e a sociedade, o fato de que estas são

1

Para a psicanálise, é a adoção ou incorporação inconsciente de certos padrões, ideias, atitudes, práticas, personalidade ou valores de outra(s) pessoa(s) ou da sociedade, que o indivíduo passa a considerar como seus.

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dependentes de processos que promovem a argumentação e o ato de pensar em todos os sujeitos humanos.

Então, podemos nos perguntar: quais problemas estão ocultos no processo de aprendizagem das pessoas? O que está representado de forma oculta sobre os alunos, professores, escolas, pais, medicamentos e, em todos os laços vinculativos? O que os discursos dos sujeitos nos dizem sobre a questão posta nos problemas de aprendizagem e, consequentemente, sobre a não aprendizagem? Ter vontade e desejo são condições suficientes para que o sujeito aprenda?

De um modo geral, a constituição individual e coletiva dos sujeitos deve ser pensada, no contexto escolar, de maneira a compreender a singularidade do sujeito aprendente, e isto implica reconhecer a complexidade do ser humano. A aprendizagem é proveniente da vontade individual, do desejo do sujeito, mas criada, sempre, através das trocas realizadas no social. A busca por querer aprender, querer saber, ganha forças sempre que há incentivos conscientes ou inconscientes para suprirmos a nossa falta de conhecimentos sobre as coisas do mundo que estão a nossa volta. Ações como incentivar, apoiar, dialogar, pesquisar, mostrar novas possibilidades, novos atrativos, entender a visão do aluno frente ao que está sendo sugerido, entre outros, fortalecem, no sujeito, cada vez mais, o processo de aprendizagem.

Este é um estudo bibliográfico de cunho qualitativo, no qual temos como hipótese central discutir o não dito no campo educacional, o ocultamento de questões pertencentes aos sujeitos que ali estão e que desenvolvem suas competências enquanto aprendentes. Para além da genética do indivíduo que aprende, temos a constituição vinculativa que faz com que se desenvolvam ou não as reações internas necessárias para a internalização dos diferentes saberes de mundo. A hipótese geral deste trabalho é destacar, justamente, a importância da vinculação, em suas diferentes perspectivas, entre os sujeitos, ou seja, entre pais, professores, alunos, sociedade escolar e cultural. Todos aprendem. Temos também tempos e modos de apropriação de conhecimentos diferentes. Assim, todos aprendem de alguma forma, porém essa forma não se

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dá de maneira igual entre os sujeitos. Por isso, quero aqui destacar a importância do entendimento individual de cada sujeito que pertence ao campo educacional. Ouvir, olhar, dialogar e compreender os alunos mostra-nos claramente que cada um tem uma forma oculta sob a qual aprende.

Tenho como justificativa para este trabalho que todo o processo relacionado com a aprendizagem, e consequentemente com a não aprendizagem, carrega consigo marcas da subjetividade humana, que condicionam as escolhas e buscas de vida de cada ser. Perceber as diferentes subjetividades humanas nos campos educacionais é imprescindível para a construção e o reconhecimento das diferentes formas de aprender. O Objetivo geral é investigar questões pertinentes nos processos de ensino e de aprendizagem bem como os diferentes modos de internalização do conhecimento entre os sujeitos no campo educacional. E, os objetivos específicos são: Compreender os modos de subjetivação dos sujeitos humanos; Reconhecer concepções sobre as diferentes formas de apropriação da aprendizagem nos sujeitos; Clarificar a construção de novos saberes através da aprendizagem e da não aprendizagem e perceber sua importância tanto no campo educacional como no campo subjetivo dos sujeitos.

A proposta metodológica desta investigação é de cunho bibliográfico, partindo dos pressupostos teóricos que fundamentam a temática, a partir de autores como: Sigmund Freud, Jaques Lacan, Alícia Fernández, Sara Paín, Alfredo Jerusalinsky e Julieta Jerusalinsky, entre outros autores secundários.

Sou uma pessoa estudiosa, muito preocupada em colaborar para que o mundo educacional possa evoluir e que se consiga superar o problemas relacionados com a aprendizagem dos indivíduos, permitindo que cada ser humano tenha reconhecida sua capacidade de ser alguém e o tempo de que necessita para adquirir sempre novos conhecimentos, por mais poucos que sejam, mas importantes para o ser humano em que se constitui.

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1. A ESTRUTURA DO SUJEITO PSÍQUICO: QUESTÕES PERTINENTES AO CAMPO DA EDUCAÇÃO

Neste capítulo, apresenta-se uma abordagem acerca da estrutura do sujeito psíquico, buscando a compreensão dos aspectos pertinentes ao seu desenvolvimento, desde o nascimento, para a compreensão de que as abordagens sobre o desenvolvimento dos sujeitos variam entre as diferentes áreas do conhecimento. Pensando nisto, busca-se, na área psicanalítica, e em seus autores principais, que são Sigmund Freud (1923) e Jaques Lacan (1996), algumas particularidades de retratar os sujeitos psíquicos em seus aspectos mais relevantes, como as emoções, os laços afetivos e toda a sua estrutura singular, formada através da vivência de mundo.

Vale ressaltar que os conceitos de sujeito e inconsciente são norteadores da teoria psicanalítica, portanto, sem eles ficaria difícil compreender a forma de estruturação dos sujeitos, para esses autores, bem como para essa área e pesquisa dissertativa. Sujeito é um conceito que foi utilizado por Jaques Lacan (1996), a partir de seus estudos em Sigmund Freud (1923), e o qual estrutura a sua teoria. Desse modo, podemos perceber a importância desses dois autores para a concepção do entendimento do sujeito psíquico em seu processo constitutivo.

Podemos constatar, na obra de Sigmund Freud (1923), que o seu entendimento em relação aos seres humanos, é de que, ao nascerem, estes estariam em uma espécie de caos, totalmente desprovidos de ser uma unidade, ou seja, um eu completo ou total. Dessa forma, percebe-se que, ao nascer, o bebê encontra-se em uma descontinuidade (do eu) fragmentada. Essa unidade, ou esse eu total, só é possível através da construção da noção de consciente e inconsciente.

Para compreendermos melhor esses dois conceitos de consciente e inconsciente, busca-se, na obra de Sigmund Freud (1923), intitulada A consciência e o que é inconsciente, o conceito utilizado pelo autor para tratar das questões pertinentes sobre a constituição do psíquico.

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A divisão do psíquico em o que é consciente e o que é inconsciente constitui a premissa fundamental da psicanálise, e somente ela torna possível a esta compreender os processos patológicos da vida mental, que são tão comuns quanto importantes, e encontrar lugar para eles na estrutura da ciência. Para dizê-lo mais uma vez, de modo diferente: a psicanálise não pode situar a essência do psíquico na consciência, mas é obrigada a encarar esta como uma qualidade do psíquico, que pode achar-se presente em acréscimo a outras qualidades, ou estar ausente (FREUD 1923/2006, p. 27).

Desse modo, Freud (1923/2006) esclarece que a vida singular e subjetiva dos sujeitos é fundamental para compreendermos os processos patológicos da vida mental de cada ser humano.

Através de seus estudos clínicos com pacientes histéricas, Freud conseguiu constatar a existência de realidades particulares. Essas realidades, denominadas por ele como fantasias, expressam-se no corpo em forma de sintomas. Segundo Pizutti (2012, p. 7) “assim, por meio da “associação livre” da fala das pacientes, foi descobrindo que as fantasias eram construídas por experiências vividas na infância, e que diziam da verdade do sujeito”. Conforme a autora, “a escuta dessas verdades que as pacientes relatavam sem saber levou Freud a postular a existência do inconsciente” (ibidem).

Para Jacques Lacan (1996), a noção de consciente não é construída de modo natural pelo sujeito, mas, sim, transmitido para o bebê através do Outro, muito antes de seu desenvolvimento motor, antes mesmo de seu nascimento. A consciência pode ser compreendida segundo o autor, como uma transmissão cultural que ocorre de pais para filhos através do desejo materno e/ou paterno.

Para obter uma melhor compreensão, a criança não vem ao mundo somente a partir de sua existência corporal. Muito antes da gestação ou do nascimento, ela já é concebida pelo Outro parental em seu desejo. O desejo 2 dos pais antecipa discursivamente um sujeito a se idealizar no filho/filha.

Ao nascer, o bebê humano depara-se com um mundo já constituído por normas e leis que são representantes de uma linguagem social e

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Desejo para Lacan é uma defasagem essencial em relação a tudo o que é, pura e simplesmente, da ordem da direção imaginária da necessidade – necessidade que a demanda introduz numa ordem outra, a ordem simbólica, com tudo o que ela pode introduzir aqui de perturbações.

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cultural. Sendo assim, o bebê, ao nascer, não tem uma estrutura completamente inscrita ou inata sobre o mundo que está agora, a sua volta, sendo assim encontra-se em estado de infans, ou seja, um estado de fetalização, não há fala, não passou completamente pelos processos inerentes aos traços identificatórios e é completamente incapaz de contar sua própria história. Assim, surge o questionamento de como, por qual via, a criança vai ter o acesso e ser introduzida nessa estruturação, ou seja, o que vai ter que acontecer para que a mesma saia do estado de infans e torne-se capaz de contar e escrever a sua própria história, isto é, para que seja um “ser humano no sentido pleno da palavra (...) capaz de se interrogar sobre basicamente duas questões: de onde vim e para onde vou?” (BERNARDIO apud BANDEIRA, 2013 p. 12).

A vinculação entre o berço simbólico, que já está em cena muito antes do nascimento, com a preparação que antecede a chegada de um bebê, através da escolha do enxoval, representante do feminino ou masculino, a escolha do nome, a preparação dos acessórios maternos, bem como do quartinho do bebê, vão criando aspectos imaginários sobre essa criança que ultrapassam a linha pura e simplesmente orgânica ou biológica. Desse modo, entram em jogo os aspectos da vinculação cultural que vão fazer parte, posteriormente, da constituição psíquica desse novo sujeito.

Nós, seres humanos, somos deficientes instintivos, diferentes dos animais. Quando viemos ao mundo, ficamos expostos as nossas necessidades, assim como fome e sede, pois não sabemos como satisfazê-las sem a intervenção do Outro, materno, e o seu desejo de suprir as necessidades para a sobrevivência do bebê. Segundo Pizutti (2012, p. 9), “A construção psíquica é um processo pelo qual o bebê humano precisa passar para que venha a se constituir enquanto sujeito”.

Para que se criem condições de desenvolvimento, é fundamental a intervenção do Outro materno, assim, segundo Bandeira (2013):

Percebe-se, ao analisar o nascimento do bebê humano, que para haver sobrevivência e, consequentemente, o desenvolvimento na sua inscrição estrutural, o bebê é dependente de outro ser humano, e isto não corresponde apenas ao seu desenvolvimento biológico, mas sim, e principalmente, no que se refere à sobrevivência emocional e psíquica. Deste modo, independentemente do bebê nascer com a aparelhagem orgânica correspondente à espécie homo sapiens não há garantias de que este bebê adquira os elementos propriamente humanos, como por exemplo, seus aspectos psíquicos. Esta

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aquisição apenas será possível através da convivência com outros seres humanos já inseridos na ordem simbólica, no que se refere à sobrevivência psíquica que dá forma e é representativa do que chamamos condição humana. [...] O corpinho do bebê – sua aparelhagem biológica, seu sistema nervoso central – vai se encontrar com esses aspectos culturais, com essa estrutura simbólica que pré-existe a ele. Seu psiquismo vai surgir deste encontro (BERNARDIO apud BANDEIRA, 2013 p. 13).

A forma de introdução do bebê nessa ordem simbólica resultará em um tipo de relacionamento de vinculação estabelecido entre todos os membros que são representantes de uma constituição familiar. Retomando Freud (1923/2006) e a questão pertinente da unidade do “eu”, podemos compreender, então, que é através da construção de uma imagem do corpo, que será transmitida através do Outro ao bebê, que se formará a linha que conduzirá a construção e a elaboração do conjunto de experiências subjetivas e cognitivas deste novo ser.

Segundo Pizutti (2012, p. 9), “A criança nasce como uma espécie de folha em branco e, para que nela se inscreva algo, é preciso que outro igual, da mesma espécie, o faça por meio de significantes. São esses significantes que marcam o nascente”. Podemos tomar como exemplo o significante seio materno, pois, ao fazer a retirada do seio, a mãe condiciona a criança para a questão da falta objetal. Ainda, segundo Pizutti,

“Ao retirar o seio, a mãe constrói a falta do objeto. O infans vai, assim, se subjetivando à medida do que experiencia ao ser atravessado pelos significantes da mãe. (...) Essa falta inaugura o nascente pela marca que a mãe imprime em seu corpo”. (PIZUTTI, idem)

São duas as funções puramente essenciais à humanização: o materno e o paterno. Estas não dizem respeito necessariamente à figura de pai e mãe biológicos, mas, sim, são representantes do lugar em que alguém cumpre e que faz função, sendo, esses lugares, imprescindíveis para o psíquico do bebê e sua constituição. A partir da transmissão dos termos da cultura, das leis e suas linguagens, através, principalmente, das pessoas que estão exercendo as funções do paterno e do materno, efetua-se a internalização enquanto processo da estruturação simbólica, que vai lentamente constituindo um novo psiquismo e possibilita que o bebê se desenvolva como um ser humano falante e desejante, ou seja, um sujeito capaz de contar a sua própria história.

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Segundo Pizutti (2012, p. 10):

A mãe amamenta o filho, suprindo sua fome e, ao mesmo tempo, instalando nele o prazer. Isso significa pôr em movimento seus orifícios pulsionais, ou seja, provocar a erotização do corpo numa antecipação de que aí se trata de um sujeito. Ela oportuniza ao bebê o início da constituição psíquica. Essa constituição só é possível quando o infans passa a investir em outro objeto que não só o seio materno, elegendo uma parte de seu corpo ou qualquer outra coisa que lhe proporcione prazer. Esta fase é denominada por Freud ([1905], 2006), como autoerótica.

A imagem que é fornecida, ao bebê, pelo grande Outro carrega consigo a marca da sexualização – esta que é, fundamentalmente, importante para que se dê a constituição de um eu e de um sujeito – porém reveladora de um drama, pois há uma imposição do desejo do Outro em relação ao desejo do próprio sujeito.

Segundo Pizutti (2012, p. 9 e 10):

No chupar o dedo, o ato de exercer a sucção confirma que a boca foi mapeada pela mãe como a primeira “zona erógena” (FREUD [1905], 2006, p. 172), a partir da qual passou a alimentar o filho e por meio da qual a criança desencadeia o processo da sexualidade. O chupar não só sacia sua fome, mas também lhe proporciona prazer. Ao sugar o seio ou qualquer outro objeto que o nascente elege como fonte de satisfação, o ato vai lhe provocar o desejo de repetição. Essa fase, que também se denomina “canibalesca”, é a primeira na organização sexual infantil, e consiste em renunciar ao “objeto alheio em troca de um objeto situado no próprio corpo” (FREUD [1905], 2006, p. 187). Esse ato provoca o prazer pela repetição, esvaziando a pulsão e, ao mesmo tempo, oportuniza ao bebê o início da constituição psíquica.

Toda a negatividade de um mundo narcísico é desejo. Nunca haverá um objeto que traga a plena satisfação, assim como as imagens ideais. O desejo não complementa as imagens e não satisfaz as pulsões, ele é sempre de outra ordem: pressupõe a falta, falta que, para Freud (1914/2006) e Lacan (1996), evidencia uma diferenciação.

A pulsão é sempre relacional porque a excitação corporal, que provoca mal-estar, só pode ser aliviada através do “outro”, que é capaz de nomear a fonte, direcionar a força pulsional em direção ao objeto. Neste sentido, a estruturação psíquica de um bebê só se dá a partir de um determinado momento, ao ser inscrito pelo desejo da mãe, pela linguagem. Assim a mãe oferece a essa criança a oportunidade de existir, ou seja, de ser sujeito (PIZUTTI, 2012, p. 10).

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Entende-se que todo o ser humano é permeado por uma curiosidade natural ao desconhecido, sendo impulsionado pelo desejo que é da ordem do inconsciente. Por isso, está propenso a aprender desde o nascimento, contudo, é necessário que o outro o acolha em seu desejo para que possa sobreviver e conhecer. A forma do desejo ocorre através da Lei, do simbólico, registro da psique que está atrelada com a função da linguagem.

A mãe nomeia o filho, antes mesmo de este nascer, a partir de seu desejo. Esse desejo que a move é quase mágico. A mãe, ao mesmo tempo em que se apresenta ao bebê como o objeto de seu desejo, vai investindo e estruturando-o através de seus cuidados, permitindo-lhe bem-estar e sobrevivência. Para a dimensão psíquica ser constituída, é necessário, portanto, que, na relação mãe e filho, se inscreva algo como falta. Entre a presença e a ausência a mãe abrirá um intervalo no qual a falta se coloca, tanto do lado da criança quanto da mãe (Idem, p. 11).

O bebê humano depara-se com todo um conjunto de estruturação que o antecede e, diante desta estrutura, se formará a constituição psíquica. Mas, para isto, a simples passagem cronológica do tempo mostra-se insuficiente, é necessária a passagem pelo tempo lógico para que a estrutura, que é antecedente, escreva nele seus efeitos. Do mesmo modo, afirma Jerusalinsky (2002, p. 261), “ainda que o bebê já esteja deparado à tal estrutura, é uma estrutura em relação à qual ainda precisará estruturar-se”.

Segundo Pizutti (2012, p. 11):

É, então, pela demanda de amor, ou seja, pela falta, que a mãe, aplacando o mal-estar sentido pelo nascente pela fome, registra neste uma marca. A partir dessa, ocorre o registro de imagens mnêmicas, associadas umas às outras, que vão formar os traços mnêmicos, os traços de memória (Erinnerzeichen).

Mais uma vez, evidencia-se que, para a constituição enquanto humanos, necessitamos do Outro. Segundo Pizutti (2012), através dos escritos em Jerusalinsky (2009), entende que:

Diante dos estímulos endógenos do bebê é preciso um Outro encarnado que atribua intenção de comunicação ao seu grito e, por meio de uma interpretação, produza uma ação específica capaz de satisfazê-lo. Se há interpretação é porque já há linguagem ali. Mas é evidente que a linguagem não se inscreve por si. Não basta colocar um bebê na frente do rádio ou da televisão. Para que o gozo do bebê se atrele ao Outro, como instância da linguagem, é preciso um endereçamento, é preciso um Outro que, ao tomar o bebê desde um desejo não anônimo e a partir do saber simbólico que a linguagem lhe

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permitiu constituir, opere corte e costura do funcionamento corporal do bebê, levando em conta o que o afeta e fazendo borda a seu gozo. Se isto atrela o bebê ao campo do Outro, para que ele possa chegar a situar-se na condição de falante, e não como um mero repetidor ecolálico do que lhe é dito, será preciso que esse desejo não anônimo opere no laço mãe-bebê enquanto um enigma diante do qual, para a mãe, o bebê se situa como sujeito que supostamente deteria um saber. (JERUSALINSKY apud PIZUTTI, 2012 p. 11) Assim, ao pensar sobre o discurso antecipado dos pais sobre o bebê, é importante mencionarmos o que a autora Julieta Jerusalinsky (1998), retrata em seus escritos De olho no instrumental na clínica psicanalítica:

Se o inconsciente é estruturado como uma linguagem – como situa Lacan -, é na fala de um sujeito que aquilo que é da ordem do inconsciente evidencia-se, apesar da vontade daquele que fala. Quem fala diz mais do que pensa estar dizendo e é nisto que se põe em jogo o que há de mais comprometedor para um sujeito: o desejo (JERUSALINSKY, 1998, p. 127).

Segundo Pizutti (2012, p. 13):

É a partir da linguagem, da forma como a mãe fala, que o nascente põe em cena não a palavra em si, mas o significado que ele dá a esta ao vivenciar prazer ou desprazer. A mãe marca o filho simbolicamente pelo tom da sua voz ao perguntar e responder, ao supor a necessidade do filho.

Todo o dito é representativo do desejo. Sendo assim, não podemos ver o corpo como algo que é apenas um objeto físico-químico que agiria naturalmente correspondendo instintivamente, como os animais, o mundo ao seu redor. O corpo está para, além disto, e deve ser entendido, aqui, como uma criação mental, representativa do desejo, que é possível através da apreensão da própria imagem, transmitida pelo mundo exterior, este que garante a individualização e apropriação de seus próprios elementos significativos.

Todo o movimento diz sobre algo, assim como a palavra. Para Jerusalinsky (1998, p. 134) “se na psicanálise a fala verbal tem um lugar primordial, é dentro do contexto maior da linguagem, onde o gesto, o movimento, o grito também têm seu lugar e seu sentido atrelado ao dizer de um sujeito”.

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Tão importante quanto a fala para o desenvolvimento está a representatividade dos movimentos corporais. O consciente e o inconsciente habitam nosso corpo e, por isto, como afirma Jerusalinsky (1998, p. 134)

Muitas vezes é preciso lançar mão do olhar para perceber o movimento deste corpo e deixar-se levar pela musicalidade que acompanha o que é dito, não por mero voyeurismo, mas por que nisto também o sujeito do inconsciente comparece.

Segundo Jerusalinsky:

Sabemos, a partir dos estudos feitos sobre a construção da linguagem, que, quanto menor a criança, menor é também sua possibilidade de manifestar-se por meio da palavra. E não só é menor sua possibilidade de manifestar-se, não se trata apenas de uma questão da chamada linguagem expressiva, trata-se, acima de tudo, da possibilidade que a criança tem de ordenar simbolicamente aquilo que a rodeia e situar nisto seu corpo (Ibidem, p. 128).

Dessa maneira, podemos entrar na questão pertinente à constituição psíquica denominada por Freud (2006) como Estádio do Espelho. É a partir desse Estádio de desenvolvimento que se pode pensar também na aceitação de uma imagem e em sua identificação mental e corporal, as quais produzirão transformações extremamente significativas no sujeito. É através dessa identificação que devemos perceber e pensar a relação significativa entre eu/outro. É através desse espelhamento que se apresentam os significantes e o discurso de todos aqueles que se ocupam da criança. O corpinho inteiro da criança, que recebe os cuidados, vai se transformando através do manuseio, do toque, do carinho, pela maneira como é dita e percebida, pela palavra que lhe é dirigida, ou seja, pelo desejo vinculativo. Nessa linha de pensamento, Jerusalinsky (1998, p. 128) referencia que:

Justamente estes membros e estes órgãos que ali estão não estão dados como um corpo. Para que cheguem a configurar um “corpo próprio” para esta criança, precisarão ser simbolizados: no início não é fome, é algo que dói e que nem sequer pode ser circunscrito pela palavra “barriga”. Quanto menos simbolizável é este corpo, mais se presentifica, como um do qual a criança não pode dar conta.

Para Pizutti (2012, p. 13):

Com seu saber, a mãe investe e inscreve no corpo carne deste ser bruto, fazendo mapeamento por meio de seus significantes. O significante descortina ao infans a satisfação de poder gozar. A estruturação psíquica de um bebê só se dá a partir do momento em que é inscrito pelo desejo da mãe na linguagem.

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Essa imagem representativa da mãe para com o seu filho ideal deve ser pregnante, pois tem um importante papel formador na subjetivação, tirando o corpo do bebê do caos inicial em sua fragmentação e, concomitantemente, tornando-o lugar para as representações psíquicas. “Mas, nessa altura, a criança não poderá simplesmente falar dos fatos, enunciá-los, ela precisará “fazê-los com o corpo”. É por isso que brincar requer armar uma cena e posicionar nela o seu corpo” (JERUSALINSKY, 1998, p. 129).

Segundo Jerusalinsky:

Para a criança, a âncora simbólica que permite navegar livremente na fala sem perder as referências não terminou ainda de ser amarrada, pois sua existência como sujeito encontra-se ainda fortemente sustentada – apesar da posição ativa que o brincar propicia na rede de significações tecida pelos adultos que encarnam a função materna e paterna. É por isso que a criança não pode se lançar do mesmo modo que o adulto em uma narrativa. Ela ali brinca: é brincando que ela fala.

De modo a dar continuidade e aprofundamento para as questões do desenvolvimento psíquico para este estudo, o tópico a seguir aborda o sujeito psíquico e os impasses de sua estruturação. Pensar na estruturação, através do conjunto formador da obra, ou seja, dos resquícios mentais à percepção de totalidade, é possível através da constituição.

1.1 O sujeito psíquico e os impasses da estruturação

Seguindo na lógica da estruturação do sujeito psíquico, é imprescindível mencionar, neste tópico, os impasses pertinentes aos tempos constitucionais, que são o real, o simbólico e o imaginário.

De modo a retomarmos um pouco do capítulo anterior, e darmos continuidade a este, menciono como início o trecho de Alba Flesler (2012), em sua obra intitulada A psicanálise de crianças e o lugar dos pais:

O ser humano é mais do que um simples vivente. Por isso, a origem de sua existência é anterior ao próprio nascimento de uma criança. Mais ainda, essa anterioridade lógica é condição necessária para que o nascimento aconteça. Como já dito, o traço mais destacado e relevante, característico desse momento inaugural, é a ilusão: um filho desperta uma aspiração sustentada de completude que anseia

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ver-se preenchida. Assim como acontece num negativo fotográfico, a partir da perspectiva da criança manifesta-se um movimento de impulso que leva, por sua vez, a se propor como aquele que imaginariamente cobre e responde às expectativas cifradas nele (Idem, p. 70).

Antes mesmo da existência física de um bebê, já há um desejo muito forte dos futuros pais em jogo. Porém, com a vinda, no real, de um novo pequeno ser, o desejo do imaginário dos pais, se confrontará com a imagem real do bebê. Como afirma Flesler (Ibidem, p. 71) “Trata-se de ser ou não o pequeno esperado, de alcançar ou não o elevado patamar que simboliza o falo”.

Gislene Jardim (2001), em sua obra intitulada Psicoses e autismo na infância: impasses na constituição do sujeito, evidencia, de maneira clara, as primeiras experiências:

No início há “pura carne” – expressão que até nos soa como inconcebível, já que se trata de um corpo humano, e não do corpo de um animal qualquer -, há um corpo mítico, perdido para sempre, como diz Freud. As primeiras relações, as primeiras experiências marcam um limite do corpo da criança na imaginária extensão do corpo da mãe. Desde o início, o bebê já recebe da mãe uma noção da posição do seu próprio corpo em relação ao corpo do outro. Ao mesmo tempo, a partir das primeiras experiências, há uma diferenciação das partes do corpo do bebê pela fala e pelo toque da mãe, que toca de modo diferente o órgão genital e as bochechas do bebê (Ibidem, p. 56).

Primeiramente, no imaginário materno, a criança nada mais é do que desejo. Esse desejo comporta um lugar de perda que motiva um campo de tensão e, desse modo, não é adaptativo, não é simplesmente homeostático e, por isso, não corresponde só ao princípio do prazer. A ruptura desse prazer é chamado pela psicanálise de pulsão, é nomeada por Freud (2006) de pulsão de morte, um dos objetos da pulsão, destacado por Lacan (1966, p. 173, apud ALMEIDA, 2004) é o olhar.

Há uma exigência de processamento dessa demanda, o que implica em pronunciar o desejo com as várias solicitações e condicionantes materiais. A psicanálise alerta para o fato de que, no vínculo que se estabelece, há algo mais em jogo, que não é simplesmente questão de necessidade.

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Sobre a função materna Jardim (2001, p. 57) afirma que:

É a partir da função materna que se arma um sujeito no bebê. Se pensarmos na metáfora do espelho, o Outro primordial está colocado como um espelho para o bebê, para o qual reenvia uma imagem do corpo, um nome e um desejo. À função materna cabe, primordialmente, transmitir um desejo de existência, de pertença a uma história, transmitir ao bebê um desejo que não seja anônimo. Desse modo, as marcas psíquicas constituem-se a partir da experiência com o meio circundante, ou seja, com o mundo familiar, cultural e escolar. Assim, o discurso do Outro, pouco a pouco, marca as fronteiras desse corpinho sem bordas, transbordando do olhar materno.

Sobre a função paterna, Jardim (2001, p.57) afirma que:

A função paterna – em exercício desde o início, mas operativamente importante quando se instala a função materna – tem a incumbência, entre outras, de barrar, de mediar a relação desejante estabelecida entre mãe e seu bebê. A função paterna barra não somente o desejo materno estendido sobre o bebê, como barra também, o bebê em apreender-se como único objeto de desejo de sua mãe, que, por sua vez, é também mulher. A função paterna porta consigo a lei, a lei da castração, se quisermos.

Este advento do pai, ou da função paterna, no núcleo narcísico entre mãe – filho – falo tem, como função, a interdição, a frustração e a privação. É através da inclusão da metáfora paterna que ocorre o “corte” na relação mãe – filho, assim, interditando o incesto e possibilitando a inserção do filho na cultura.

Para compreendermos melhor a questão de interdição do falo, voltamos a Flesler (2012) que retrata, em sua obra, o famoso caso Hans, descrito por Freud em 1909:

Não se podem ignorar as vicissitudes desse trânsito, pois imprimem suas marcas aos tempos vindouros, hipotecando, às vezes, com angústia, outras com inibição e outras com sintomas, os passos do porvir. Podemos localizá-los com bastante precisão no paradigmático caso clínico do pequeno Hans. Quando Hans percebe uma clara falta de coincidência entre a imagem que até então tinha de seu corpo e o conteúdo dessa imagem, descobre como está distante de ser o que se vê no olhar da mãe. (...) O pequeno Hans desperta (...) O universo materno se fecha. Não inclui um menino com falo, só um menino falo. Despertar do sonho, perder a ilusão de ser o falo da mãe, abala indubitavelmente a cena de seu mundo (FLESLER, 2012, p. 74).

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O declínio do Édipo é marcado, assim, pela simbolização da lei; o filho, ante a castração, imposta pelo pai, coloca o mesmo como portador do falo, portanto aquele que possui a preferência da mãe, ou seja, instala-se a metáfora paterna. Metáfora, pois diz respeito a uma troca de um significante por outro: o desejo da mãe pelo Nome-do-Pai. Esse processo, no entanto, diz respeito a uma constituição dita “normal”, neurótica.

Indo um pouco mais além, e já buscando um entendimento da relação desses modos de subjetivação com os problemas relacionados à aprendizagem, e o que estaria oculto ou não dito nesse processo, a autora Flesler (2012) nos afirma que:

No caminho, quando se avaliza a busca do saber, as crianças aprendem a ler e a escrever. É um tempo de alto predomínio simbólico. Os chamados “problemas de aprendizagem” não são exatamente isso. São a expressão de uma falha na resolução do tempo anterior, correspondente a esse instante do olhar, quando o sujeito percebe que seu corpo não coincide exatamente com o objeto do Outro. Se os elementos da estrutura não fazem jogo, a fixidez e a retenção do gozo impedirão não apenas o crescimento em geral, mas especificamente a aprendizagem da escrita. A escrita é uma operação que se alcança com a perda do referente. Os desenhos das crianças mostram, se soubermos ler, tempos de escrita e falhas em sua efetuação. Quando o referente imaginário mantém pregnância, colocam-se no plano da escrita sintomas próprios da simetria da imagem no espelho. As inversões de letras mostram uma cristalização de gozo não reordenada (FLESLER, 2012, p. 75 e 76). Assim, percebe-se a evidência de que esses três registros (real, simbólico e imaginário) podem ser compostos de maneira diferenciada e, assim, apresentar três subestruturas diferentes: a neurose, psicose ou perversão de acordo com o revestimento ao objeto a. Todas elas se apresentam como formas de defesa ao trauma e ao gozo inicial através dos mecanismos de defesa psíquicos.

Lacan (1996, p. 250) entende que a criança possui o simbólico e o real para o enriquecimento do imaginário infantil como se verifica:

Para a criança há inicialmente o simbólico e o real, contrariamente ao que se acredita. Tudo que vemos se compor, se enriquecer e se diversificar no registro do imaginário parte desses dois polos. Se vocês acreditam que a criança é mais cativa do imaginário que do resto, vocês têm razão num certo sentido. O imaginário está lá. Mas nos é absolutamente inacessível. Ele só nos é acessível a partir de suas realizações no adulto.

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Para a psicanálise, o complexo de Édipo desempenha papel fundamental na estruturação da personalidade e na orientação do desejo do ser humano. Considera-se, deste modo, que a psicanálise é mais um instrumento a ser utilizado na tentativa de compreender melhor esse objeto tão complexo que traz, em sua singularidade, o fato de ser agente e paciente de sua própria pesquisa.

Freud (2006, p. 120) já alertava que nos sonhos angustiantes ou pesadelos se encontra, de qualquer forma, e até mesmo de maneira mais acentuada, a ameaça da realização do desejo, razão de o sonhador acordar de seu pesadelo.

Se o último desejo do sonhador é o de continuar dormindo, até mesmo quando desperta do pesadelo para depois voltar a dormir, aterroriza, ao mesmo tempo em que dá prazer, permitindo continuar dormindo o sono tranquilo da realidade habitual, em que o desejo permanece recalcado.

A ética do desejo é o que o que dirige o fazer analítico e é o que legítima o analista no seu percurso. A confrontação com a estrutura do desejo, durante a análise, provoca angústia em vários graus.

A psicanálise traz a concepção de que o homem, direcionado pela razão e vontade, cede lugar ao sujeito movido pelo inconsciente e guiado por desejos incógnitos. De acordo com Lacan (1985, p. 112 apud ALMEIDA, 2004), é na relação com o outro que o pensamento se constitui sendo a linguagem estruturadora do inconsciente.

Freud (2006) identificou dois mecanismos básicos nessa rede de passagem de uma palavra a outra que é o deslocamento e a condensação que são responsáveis pela formação do inconsciente humano. Já para Lacan (1985), esse mesmo mecanismo é denominado, respectivamente, de metonímia e metáfora, utilizando, assim, termos da linguística.

Porém o que acontece é que esse fluxo de pulsão permanece em constante erro e sem representante, causando o próprio aparelho do psiquismo, no sentido de que este é um buraco real que vai chamar e buscar

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um significante que consiga fixar um objeto que lhe dê uma imagem consistente, mas tudo que vai encontrar é a ausência objetal (denominada por Lacan de objeto a), o silenciamento.

De modo a dar continuidade nesta linha de pensamento sobre a constituição do sujeito psíquico, menciono as questões sobre a inibição, o sintoma e a angústia.

1.2 As implicações na constituição psíquica dos sujeitos

Este tópico tem como objetivo trazer elementos pertinentes à constituição psíquica dos sujeitos, principalmente, no que se refere à sintomatologia das questões relativas à vida afetiva dos sujeitos com relação à inibição, ao sintoma e à angústia.

Baseia-se na obra freudiana, mais especificamente no texto intitulado Inibição, sintoma e angústia (1926/2006), para assim elaborar-se uma maneira de pensar sobre a formação dos sintomas e, deste modo, percebermos, a partir daí, o que isso representa em termos de estruturação do aparelho psíquico.

Para Freud (1926/2006), a inibição não está representando obrigatoriamente algo patológico, mas pode estar evidenciando certa limitação normal na função do eu. O sintoma vem atrelado a algo que diz respeito sobre o patológico. Desse modo, podemos perceber que a inibição pode ser considerada também, em alguns casos, como sintoma.

Desde o início, a ansiedade que ocorria em fobias ou em neuroses obsessivas levantava uma complicação, pois aqui a presença de fatos psicológicos não podia ser excluída. Mas, no tocante ao surgimento da ansiedade, a explicação continuava a mesma. Nesses casos – nas psiconeuroses – a razão do acúmulo de excitação não descarregada era psicológica: repressão. Mas o que surgiu foi o mesmo que nas neuroses ‘atuais’: a excitação acumulada (ou libido) foi transformada diretamente em ansiedade (Ibidem, p. 83).

Nessa linha de pensamento, a inibição é representativa de certa redução de alguma função, podendo ter muitas causas e expressar a limitação funcional do eu. Já o sintoma vem atrelado a uma alteração da função ou representando uma nova operação.

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Os dois conceitos não se encontram no mesmo plano. A inibição tem uma relação especial com a função, não tendo necessariamente uma implicação patológica. Podemos muito bem denominar de inibição a uma restrição normal de uma função. Um sintoma, por outro lado, realmente detona a presença de algum processo patológico. Assim, uma inibição pode ser também um sintoma. O uso linguístico, portanto, emprega a palavra inibição quando há uma simples redução de função, e sintoma quando uma função passou por alguma modificação inusitada ou quando uma nova manifestação surgiu desta. Muito amiúde parece ser assunto bem arbitrário, quer ressaltemos o lado positivo de um processo patológico e chamemos o seu resultado de inibição [...] (Ibidem, p. 91).

Certas inibições ocorrem, simplesmente, pelo fato de que alguma atividade poderia representar um maior aproveitamento do eu, porém, o Supereu, de algum modo, não consente, fazendo assim com que o eu desista dessa atividade, evitando conflitos que seriam decorrentes do Supereu.

Assim, podemos pensar as inibições como limitações da função do eu, ou por empobrecimento de energia, já que existem intensas repressões de fantasias e afetos, ou simplesmente por precaução (evitando, assim, novo recalcamento). Nessa perspectiva, Freud (1926/2006, p. 92) destaca que:

Que existe uma relação entre a inibição e a ansiedade é algo evidente. Algumas inibições obviamente representam o abandono de uma função porque sua prática produziria ansiedade. Muitas mulheres manifestadamente temem a função sexual. Classificamos essa ansiedade sob a histeria, do mesmo modo como fazemos em relação ao sintoma defensivo da repulsa, que, surgindo originalmente como uma reação preterida à experiência de um ato sexual passivo, aparece depois, sempre que a ideia de tal ato é apresentada. Além disso, muitos atos obsessivos vêm a ser medidas de precaução e de segurança contra experiências sexuais, sendo assim de natureza fóbica.

Para Freud (1926/2006), o sintoma estaria totalmente atrelado a um processo sobre o Eu ou do Eu. O sintoma, assim, pode ser percebido como um indício ou mesmo como um substituto da satisfação pulsional não consolidada, ou seja, não completada, resultante de um processo denominado por ele de recalcamento. “Um dos resultados mais importantes da pesquisa psicanalítica é essa descoberta de que a ansiedade neurótica se origina da libido, que é produto de uma transformação desta e que, assim, se relaciona com ela da mesma forma que o vinagre com o vinho” (Ibidem, p. 83).

O recalcamento é uma maneira de manter sob afastamento todas as emoções pulsionais que são desagradáveis à consciência. Esse processo pode

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ter seu início tanto pelo Supereu como pelo Eu. É pelo recalcamento que a excitação, que está tensionada pelo Isso, não ocorre, assim o Eu consegue fazer a sua inibição ou desviá-la de seu curso, o que nos traz luz de que o Eu exerce um poder, ou uma superioridade, sobre o Isso.

Pela íntima relação do Eu com a percepção, fica evidenciada a sua tarefa em criar condições que são necessárias para que se transmitam sensações de prazer ou desprazer, o Eu adquire influências sobre o Isso. Segundo Freud (1926/2006, p. 85):

O determinante fundamental da ansiedade automática é a ocorrência de uma situação traumática; e a essência disto é uma experiência de desamparo por parte do ego em face de acúmulo de excitação, quer de origem externa quer interna, com que não se pode lidar.

Para opor-se a um processo pulsional do Isso, o Eu necessita emitir certo sinal de angústia (desprazer), assim alcançando seu objetivo de desviá-lo ou mesmo inibi-lo. Freud (1926/2006, p. 110), ao tratar dessa questão, assim refere:

Algumas inibições tornam-se, por vezes, evidentes quando atingem determinadas atividades como escrever, tocar piano, e, revela em sua análise uma excessiva erogeinização do órgão encarregado de executá-la, sua significação sexual. Assim, o que a inibição encobre é justamente o que o significado simbólico que o ato em si representa. Com isso o eu renuncia a essas funções a fim de não produzir um novo recalcamento, a fim de evitar um conflito com o Isso.

O dominador do acesso à consciência é o Eu, bem como, sob a ação ao mundo exterior, e, através do recalcamento, tem sua afirmação de empoderamento em ambas as direções: tanto evitar agir como evitar o acesso. Porém, tem-se, de um lado, o Eu, que é organizador do Isso, e assim demonstra sua força de ação através do recalcamento, de outro lado, afirma-se sua impotência, pois o sintoma consegue se firmar, por vezes, fora dessa organização e consegue ser totalmente independente dela.

Embora o Eu lute contra algo desagradável que é a moção pulsional, e, consequentemente, contra um sintoma, por ser uma organização que se baseia no intercâmbio e na influência de mesmo modo em todos os seus componentes, aspira pela ligação e unificação, buscando a restauração.

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A ansiedade ‘como sinal’ é a resposta do ego à ameaça da ocorrência de uma situação traumática. Tal ameaça constitui uma situação de perigo. Os perigos internos modificam-se com o período de vida, mas possuem uma característica comum, a saber, envolver a separação ou perda de um objeto amado, ou uma perda de seu amor – uma perda ou separação que poderá, de várias maneiras, conduzir a um acúmulo de desejos insatisfeitos e, dessa maneira, a uma situação de desamparo (Idem, p. 85).

Outra importante questão, que se evidência, é de que se, por um lado, o recalcamento demonstra a força do Eu, por outro lado, também marca a sua impotência, pois aquele processo, que se torna sintoma por obra do recalcamento, afirma a existência de algo fora da organização do Eu e independentemente dele.

Por um lado, o Eu luta contra a produção do sintoma e, por outro lado, por ser uma organização que se baseia livremente no intercâmbio e na recíproca influência de todos os seus componentes, a energia dessexualizada revela a origem e a aspiração à ligação e à unificação, tentando, assim, uma restauração para suprimir o isolamento do sintoma.

Segundo Freud (Ibidem, p. 94):

Quando o ego se vê envolvido em uma tarefa psíquica particularmente difícil, como ocorre no luto, ou quando se verifica uma tremenda supressão de afeto, ou quando um fluxo contínuo de fantasias sexuais tem de ser mantido sob controle, ele perde uma quantidade tão grande de energia à sua disposição que tem de reduzir o dispêndio da mesma em muitos pontos ao mesmo tempo. Inevitavelmente, é perceptível que o Eu obtém ganhos secundários com o sintoma: o rendimento, em sua debilitação, poderá acompanhar o sintoma apaziguando a demanda do Supereu ou recusando a exigência do mundo exterior.

No tocante às inibições, podemos então dizer, em conclusão, que são restrições das funções do ego que foram ou impostas como medida de precaução ou acarretadas como resultado de um empobrecimento de energia; e podemos ver sem dificuldade em que sentido uma inibição difere de um sintoma, porquanto um sintoma não pode mais ser descrito como um processo que ocorre dentro do ego ou que atua sobre ele (Idem).

Outro ponto muito importante, e que merece destaque, é que a angústia é a impulsão para o recalcamento. Desse modo, Freud (1926/2006) evidencia

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certa cautela ao relacionar a angústia com a formação sintomática, pois existe a possibilidade de o sintoma não se apresentar conjuntamente com a angústia. Como uma maneira de evitar associações, e conexões aos pensamentos, o Eu obedece às ordens da neurose obsessiva que é um dos mandamentos mais antigos e fundamentais: evitar o toque.

O fato de que o EU pode subtrair-se da angústia através do sintoma de inibição harmoniza-se com a concepção de que a angústia seria, portanto, um sinal de afetividade. Segundo Freud (Ibidem, p. 96): “Estamos muito inclinados a pensar no ego como impotente contra o id; mas, quando se opõe a um processo instintual no id, ele tem apenas de dar um sinal de desprazer”.

Como ponto conclusivo, a angústia seria proveniente de alguma reação à situação de perigo; porém, se quiser, o Eu pode poupar certa situação. Deste modo, os sintomas são elaborados para evitar as situações de perigo iminente, que é notável através da angústia desenvolvida.

Sentimos a angústia. O seu desprazer é evidente, enquanto sensação, mas isso não limita suas características; nem todo desprazer pode ser identificado na angústia, pois existem outras sensações, como, por exemplo, o luto, as tensões e a dor, de caráter desprazeroso.

Mas essa explicação provoca novos problemas. De onde provém a energia empregada para transmitir o sinal de desprazer? Aqui podemos ser auxiliados pela ideia de que uma defesa contra um processo interno importuno será plasmada sobre a defesa adotada contra um estímulo externo, e de que o ego debela os perigos internos e externos, de igual modo, ao longo de linhas idênticas. No caso de perigo externo, o organismo recorre a tentativas de fuga. A primeira coisa que ele faz é retirar a catexia de percepção do objeto perigoso; posteriormente, descobre que constitui um plano melhor realizar movimentos musculares de tal natureza que tornem a percepção do objeto perigoso impossível, mesmo na ausência de qualquer recusa para percebê-lo – que é um plano melhor afastar-se da esfera de perigo. A repressão é um equivalente a essa tentativa de fuga. O caso retira sua catexia (pré-consciente) do representante instintual que deve ser reprimido e utiliza essa catexia para a finalidade de liberar o desprazer (ansiedade). O problema de como surge a ansiedade em relação com a repressão pode não ser simples, mas podemos legitimamente apegar-nos com firmeza à ideia de que o ego é a sede real da ansiedade, e abandonar nosso ponto de vista anterior de que a energia catexial do impulso reprimido é automaticamente transformada em ansiedade [...] (Ibidem, p. 96 e 97).

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Todo o progresso de desenvolvimento, aumento de independência, e a divisão nítida em várias instâncias do aparelho psíquico na criança, além do advento de novas necessidades, não deixa de ter influências sobre todo o conteúdo e situação de perigo.

Ocorre a modificação da perda objetal (mãe) à castração, causando assim o empoderamento do Supereu. Através da despersonalização, da qual se teme a castração, pela via da instância parental, o perigo se torna cada vez mais indefinido.

A sede da angústia é o Eu, desse modo não temos motivos para atribuir manifestações de angústia ao Supereu. Nem mesmo o Isso pode ser considerado possuidor de angústia como o Eu, uma vez que ele não é organizador e assim não consegue presumir as situações de perigo.

Repetidas vezes acontecem processos no Isso, dando, assim, motivos ao Eu desenvolver a angústia. Os mais remotos recalcamentos têm sua motivação pela angústia do Eu frente aos métodos que são totalmente singularizados vindos do Isso. Segundo Freud, “Os estados afetivos têm-se incorporado na mente como precipitados de experiências traumáticas primevas, e quando ocorre uma situação semelhante são revividos como símbolos mnêmicos” (Idem, Ibidem, p.97).

Os progressos de desenvolvimento do Eu contribuem desvalorizando e deixando para trás o perigo anterior.

Nessa luta defensiva secundária o ego apresenta duas faces com expressões contraditórias. A única linha de comportamento que ele adota decorre do fato de que sua própria natureza o obriga a fazer o que deve ser considerado como tentativa de restauração ou de reconciliação. O ego é uma organização. Baseia-se na manutenção do livre intercâmbio e da possibilidade de influência recíproca entre todas as partes. Sua energia dessexualizada ainda revela traços de sua origem em seu impulso para agregar-se e unificar-se, e essa necessidade de síntese torna-se mais acentuada à proporção que a força do ego aumenta. Portanto, é natural que o ego deva tentar impedir que os sintomas permaneçam isolados e alheios utilizando todos os métodos possíveis para agregá-los a si de uma maneira ou de outra, e para incorporá-los em sua organização por meio desses vínculos (FREUD, 1926/2006, p. 101).

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