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3. OS PROBLEMAS DE APRENDIZAGEM: QUESTÕES CENTRAIS E

3.3 Psicopedagogia, tratamento e contrato

Este tópico intitula-se psicopedagogia, tratamento e contrato com a intenção de ser um estudo, voltado, justamente, para tratar o indicador problema de aprendizagem através da relação desenvolvida, pelo sujeito, em sua aprendizagem.

É através do diagnóstico da não aprendizagem que ocorre um processo investigatório, em que são levados em conta todos os motivos ou causas que

se apresentam nos alunos que não aprendem ou nos que correspondem com o processo de aprendizagem.

Sara Paín, (1992) sobre esse processo discorre assim:

Diagnosticar o não aprender como sintoma consiste em encontrar sua funcionalidade, isto é, sua articulação na situação integrada pelo paciente e seus pais. A oligotimia é, antes de mais nada, um lugar que o sujeito pode vir a ocupar, tornando possível a existência de uma estrutura equilibrada na qual sua própria existência torna-se possível. A falta de aprendizagem revelará seu significado se prestarmos atenção à maneira como o sujeito é para o outro, evidentemente a partir de sua particularidade de ser como organismo e como história. Desta forma, o eixo do diagnóstico será a articulação do sintoma, o sentido da ignorância no triângulo edípico (PAÍN, 1992, p. 69)

Será através do diagnóstico que se forma uma rede de significações sobre o sujeito que não aprende. Serão levados em conta, no seu processo de aprendizagem, a sua forma de ver e pensar. E, é através dessa escuta e observação sobre o ver e o pensar da forma de mundo do sujeito, que podemos perceber questões ocultas e que são importantes para que a sua aprendizagem aconteça. Em outras palavras, diagnosticar nos traz luz sobre o sujeito e sobre as suas dificuldades.

Alícia Fernández, em sua obra, clarifica a conceituação da palavra diagnóstico e reforça a sua importância neste caso:

A palavra diagnóstico provém de dia (através de) e gnosis (conhecimento). Se nos atentarmos à origem etimológica e não ao uso comum (que pode significa rotular, definir, etiquetar), podemos falar de diagnóstico como “um olhar-conhecer através de”, que relacionaremos com um processo, com um transcorrer, com um ir olhando através de alguém envolvido mesmo como observador, através da técnica utilizada e, nesta circunstância, através da família (FERNÁNDEZ, 1991, p. 91).

Todo este processo deve ser feito de modo sutil, com muita competência e sensibilidade diante do sujeito que apresenta tais problemas ou dificuldades de aprendizagem.

Normalmente, nas instituições escolares, os alunos problemas são encaminhados para psicopedagogos ou psicólogos institucionais, ou ainda, para outra pessoa que esteja em tal função competente para esses casos.

Alícia Fernández (1991), em sua obra, cita uma passagem de Sara Paín, que descreve, de maneira brilhante, a principal e primordial tarefa para qualquer pessoa que desenvolva e realize o diagnóstico.

Uma tarefa primordial no diagnóstico é resgatar o amor. Em geral, os terapeutas tendem a carregar nas tintas sobre o desamor, sobre o que falta, e poucas vezes se evidencia o que se tem e onde o amor é resgatável. Sem dúvida, isto é o que nos importa no caminho da cura. Se no transcurso do diagnóstico ou do tratamento não conseguimos nos apaixonar por essa vida, nem pensá-la como um drama onde se está jogando este tipo de coisas que a mitologia põe em um relevo especial, mas que estão em todos os seres humanos, estaremos banalizando o sujeito. Não podemos curá-lo nem entendê-lo. Justamente a possibilidade de curá-lo, ou seja, de fazê-lo surgir como diferente, é facilitar seu trabalho de recriar-se como pessoa interessante. Que sinta que sua personalidade se diferencia das outras e tem um caminho próprio que é capaz de construir, que vislumbre uma possível escolha, certo grau de liberdade, ainda que seja no conhecimento (PAÍN apud FERNÁNDEZ,1991, p. 35)

Desse modo, podemos perceber o quão significativa é a avaliação diagnóstica. Tendo efeitos nocivos em médio e longo prazo, para os sujeitos, quando realizada sem sua devida atenção e cuidado diante dos casos. Assim, os atendimentos psicopedagógicos devem possibilitar um olhar mais humanizado e individualizado.

Tendo como intenção a captação específica em cada sujeito, o diagnóstico psicopedagógico trabalha em sentido investigatório sobre o não aprender. Desse modo, sobre a especificidade do diagnóstico Alícia Fernández (1991) nos afirma que:

(...) Um diagnóstico psicopedagógico de uma criança ou adolescente busca responder a interrogações particulares, tais como:

1) Com que recursos conta para aprender?

2) O que significa o conhecimento e o aprender no imaginário do sujeito e sua família?

3) Que papel foi-lhe designado por seus pais em relação ao aprender?

4) Qual é a sua modalidade de aprendizagem?

5) Qual é a posição do sujeito frente ao não dito, ao oculto, ao secreto?

6) Que função tem o não aprender para ele e para seu grupo familiar?

7) Qual é o significado da operação particular que constitui o sintoma?

9) O não aprender responde a um sintoma, ou é uma resposta reativa ao meio sócio educativo? (FERNÁNDEZ, 1991, p. 37 e 38).

Importante é percebermos, neste ponto, que o tratamento do sujeito problema de aprendizagem se inicia no processo das entrevistas diagnósticas, pois nestas há uma série de fatores que envolvem o sujeito em seu drama, ou seja, falar sobre a dificuldade já é um ponto com extrema carga de positividade em relação ao seu sofrimento ou angústia, frente ao não aprender.

Neste campo da aprendizagem surgem questões constantemente. Devemos olhar atentamente para cada sujeito, escutar suas questões e compreender que são as diferenças dos mundos subjetivos e ocultos que criam a estruturação necessária para vivermos e convivermos em uma sociedade, em uma instituição e em um meio familiar. As diferenças e os problemas entre sujeitos somam e criam novas perspectivas.

Os problemas de aprendizagem reforçam uma busca, reforçam novos conhecimentos, novas formas e medidas frente ao aprender. A não aprendizagem fala muito sobre a aprendizagem e sobre suas formas de internalização nos sujeitos em diferentes vias.

A escola tem de se empoderar desses conhecimentos, realizando reuniões entre os integrantes dos chefes de setores e os professores para entender a problemática e encontrar caminhos para superá-la. Isso também deve envolver os alunos e seus familiares e, se possível, deve-se trazer profissionais especializados, principalmente da área da psicanálise para esclarecer os pontos mais cruciais.

CONCLUSÃO

Atualmente, os problemas de aprendizagem são um motivo de preocupação tanto para a família quanto para a escola. Diagnosticar problema de aprendizagem não é fácil, e há casos em que são adicionados outros sintomas que podem evocar a presença de outros conflitos inconscientes, o que torna difícil identificar o problema de aprendizagem, entrando em questão as questões que ficam ocultas no processo.

Diante disso, torna-se necessário compreender os problemas de aprendizagem de forma mais abrangente. Por isso, é muito importante detectar os fatores que afetam a aprendizagem da criança para fazer um diagnóstico abarcativo que permite descobrir o conflito secreto nesse sintoma que impede o acesso ao conhecimento.

Como é sabido, problemas de aprendizagem mostram um campo muito complexo a colidir com as possibilidades de aprendizagem. Qual é o lugar da criança na dinâmica familiar? Qual é a ligação da família com a aprendizagem e o conhecimento?

Esses seriam alguns dos aspectos que devem ser levados em conta quando se analisa a questão das dificuldades de aprendizagem, sendo importante pensarmos no processo de estruturação psíquica, no funcionamento mental, no corpo, refletindo, em particular, a interação que ocorre entre os vários mecanismos de defesa que a criança coloca em jogo para lidar com ansiedade, incluindo desaprovação e a repressão e a sua implicação nos processos de apreensão do conhecimento.

Na perspectiva da psicanálise, aprender não depende apenas da inteligência, mas também a existência de um desejo corporal, que permite ou não o acesso e a apropriação do conhecimento, um desejo que Freud teoriza a partir da reedição de vestígios de satisfação que fazem parte do bebê durante o ato de ser cuidado por sua mãe, como retratamos no início desta dissertação.

Assim, a parte do corpo, na construção de conhecimento a partir de coordenação lógica das ações, inclui a dimensão afetiva, a ligação com o outro, permitindo o acesso ao mundo simbólico. É a partir das primeiras trocas sociais que o bebê constrói sua inteligência e sua atividade simbólica, que vai ser representado na sua psique, sendo que a insegurança, a falta de afetividade prejudicam demais o convívio.

Diante disto, é importante sempre compreender as dificuldades de aprendizagem a partir da dimensão afetiva do sujeito, buscando descobrir os significantes inconscientes que impedem o acesso da criança ao conhecimento, bem como para saber que mecanismos de defesa entram em jogo como uma maneira de evitar a ansiedade.

Desse modo, a pesquisa demonstrou que são vários os problemas que culminam em problemas de aprendizagem, sendo que a insegurança, a falta de afetividade, a angústia constituem uma tríade que leva o aluno ao desinteresse pela compreensão dos conteúdos.

Cabe aos professores, à comunidade escolar e aos pais utilizar a afetividade para motivar os alunos, buscando significados no ambiente escolar, semelhantes aos que eles encontram em seus lares, pautando-se na formação para a cidadania e no desenvolvimento pessoal.

Não se deve, durante o processo de aprendizagem, vislumbrar apenas o desenvolvimento pessoal do indivíduo, voltando-se para a individualidade, para a ascensão pessoal, preocupando-se excessivamente com os conteúdos. Dentre os problemas ocultos, é possível conjecturar a falta de cooperação da família e a ausência da integração escola, família e comunidade.

É fundamental a interação, já que provoca o envolvimento e o comprometimento dos pais com as causas escolares e com o progresso dos alunos. Ao buscar a participação dos pais e da comunidade escolar, obtém-se uma parceria importante que abarca a qualidade do ensino e o sucesso escolar tão almejados na sociedade atual.

Deste modo, a partir da interação entre os atores que fazem parte da vida do aluno, é possível a construção do eu, do sujeito criativo, autônomo e competente o suficiente para construir sua própria história.

Ao fim desta dissertação, percebe-se a importância desta temática ser colocada em prática e, principalmente, continuar avançando nesta perspectiva, tão fundamental para a vida de todos os sujeitos humanos.

A diferenciação, que nos torna humanos, também nos une diante das dificuldades relativas frente ao entendimento do que é aprendizagem e de por que não aprendemos, de forma igual, as mesmas coisas ou os mesmos conteúdos didáticos. Entra em cena a subjetividade e a estrutura psíquica adquirida desde o berço e que permanece oculta, mas que se representa, entre linhas, nas expressões do corpo.

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