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AS MANIFESTAÇÕES/TRADIÇÕES/ACTIVIDADES CULTURAIS

IV. ESTADO DA ARTE

2. A DIMENSÃO CULTURAL DA LUSOFONIA

2.2 AS VERTENTES ASSOCIADAS

2.2.2 AS MANIFESTAÇÕES/TRADIÇÕES/ACTIVIDADES CULTURAIS

A reflexão em torno da identidade afro-brasileira jamais pode ser pensada sem incluir a matéria religiosa. Apesar das religiões afro-brasileiras (Candomblé, Umbanda, Xangô, etc) contribuírem definitivamente para a memória colectiva dos afro-descendentes, a verdade é que as mesmas permanecem tabu nos sectores mais conservadores do universo académico, aparecendo apenas nas ciências sociais ligadas ao campus religioso. A diversidade cultural abrange “a literatura e as artes, assim como modos de vida, sistemas de valores, tradições

e crenças”225 e a sua progressiva valorização nos processos de mundialização, que se articula com a emergência de novas culturas, enquanto factor de criação, integração social, convivência inter-cultural e afirmação crescente das dinâmicas culturais no desenvolvimento226.

224 Entrevista de MÜLLER DE OLIVEIRA, Gilvan “Língua Portuguesa: expansão e diversidade”, jornal A Semana, Praia, 20 de Junho de 2011. (Texto policopiado)

225 Comunicação sobre uma agenda europeia para a cultura num mundo globalizado da Comissão Europeia ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, Bruxelas [COM (2007) 242 final, 10 de Maio de 2007], p. 2.

226 Relatório final – Estudo para o MC – GPEARI, O Sector Cultural e Criativo em Portugal, Augusto Mateus & Associados – Sociedade de Consultores, Janeiro 2010.

A título meramente exemplificativo é possível destacar alguns dos aspectos a nível cultural entre os países lusófonos, a saber:

 a cultura brasileira reflecte os vários povos que constituem a demografia desse país sul-americano (indígenas, europeus, especialmente portugueses, africanos, asiáticos, árabes, etc) e representa o resultado da intensa miscigenação e convivência de povos, surgindo uma realidade cultural peculiar, que inclui aspectos de várias culturas;  a religião católica é professada por mais 50% da população angolana, representando

os protestantes cerca de 20% e as religiões africanas acima de 10%;

 a diversidade cultural africana reflectiu-se na diversidade dos escravos, pertencentes a diversas etnias que falavam idiomas diferentes e que traziam tradições distintas;  o artesanato, produzido quer para utensílio, quer para decoração, tem grande

importância, por exemplo, na cultura cabo-verdiana, representando um verdadeiro instrumento de expressão da cultura popular;

 a herança cultural da Guiné-Bissau é bastante rica e diversificada que se subdivide em vários grupos etnolinguísticos, passando pela dança, expressão artística, tradição musical até às manifestações culturais;

 a música constitui, ao longo da história, uma expressão dos estados de alma da pessoa humana, independentemente da latitude e da realidade em que esta se insira, cuja importância, sobretudo para os povos africanos, ultrapassa o simples quadro do fenómeno cultural para se confundir com a própria vida; por exemplo, em S. Tomé e Príncipe a música desempenha um autêntico papel social, assumindo-se como a grande tradutora dos complexos estados da alma e, através da sátira, como espaço por excelência da crítica227.

227 BRAGANÇA, Albertino (2005), A Música Popular Santomense, S. Tomé e Príncipe: UNEAS (União Nacional dos Escritores e Artistas de S. Tomé e Príncipe).

De acordo com MOURA (2008: 79):

“A sociedade tradicional africana, embora seja dinâmica, poucas vezes fomenta debates à volta das grandes questões sociais. Por isso, o debate sócio-cultural perde-se, quase sempre, em detrimento da sabedoria milenar, assegurada pela experiência rotineira dos mais idosos.”

Não obstante essa realidade, no que toca às actividades culturais propriamente ditas, têm sido registados alguns avanços, que foram salientados na VI Reunião dos Ministros da Cultura, datada de Novembro de 2007, precedentemente mencionada: a criação do

Mecanismo Permanente de Articulação na área cultural para coordenar as reuniões e

acções destinadas a dinamizar a cooperação e acompanhar as decisões e recomendações adoptadas, bem como a apresentação do Portfólio de Perfis de Projectos Culturais, elaborado pelo MC do Brasil, destacando-se a relevância deste documento como veículo propulsor do reforço das capacidades dos agentes e actores culturais e promotor de empresas e indústrias culturais. Foi ainda referida a necessidade da implementação de acções de intercâmbio nas áreas relacionadas com património, museus, rede de bibliotecas e a criação de um «selo cultural» da CPLP. Comprometeram-se a desenvolver conjuntamente a cooperação em áreas consideradas prioritárias, como as do audiovisual e do Portal da CPLP. A aposta em documentários audiovisuais representa, efectivamente, um exemplo de informação cultural nacional de carácter não oficial mas que também contribui para a promoção da cultura portuguesa na área lusófona e internacional.

Em Portugal, no que se refere à informação sobre os PALOP, principalmente na programação da RTP, é usual a difusão de notícias nos boletins informativos (por exemplo, no Telejornal), bem como de alguns documentários exibidos em determinados programas. Contudo, inicialmente, a informação era, essencialmente, de índole política e económica, sendo, nessa altura, praticamente inexistente a apresentação de documentários de natureza cultural, contrariamente ao que tem vindo a suceder228.

228 Um exemplo nesta área foi a série documental televisiva (RTP 2), com o apoio do IC, intitulada “Eu sou África” constituída por 10 episódios, com uma duração aproximada de 30 minutos cada, em que cada um retratava a vida e a obra de um africano/a implicado/a na história e no desenvolvimento social, político e cultural do país onde nasceu, com recurso a fotografia e a som de qualidade (atributos imprescindíveis para captar e conservar a atenção dos espectadores e facilitar a difusão internacional – cf. Graça, 1992).

No que se refere à influência dos elementos informais das sociedades nas lógicas capitalistas e à produtividade das próprias empresas ditas organizações formais, João Mosca229 considera que se reflecte no seu funcionamento, reduzindo eficiências e competitividade na economia. Com efeito, numa mesma empresa podem coexistir várias

culturas, podendo esta situação manifestar-se de forma diferenciada, segundo alguns

factores:

 noções de tempo e espaço (horários, pontualidade, prazos, ritmos de trabalho, distâncias, etc);

 conceito de eficiência (conforme os sistemas de produção e as lógicas reprodutivas e de acumulação);

 especialização e divisão social do trabalho (Iolanda Évora230

considera que no mercado e na organização do trabalho, o género representa uma marca importante de divisão sexual do trabalho – as feiras e os mercados231 apresentam-se como espaços onde essa divisão é evidente, mas não significa que essa situação seja imutável até porque nem sempre a divisão do trabalho acompanha as tarefas desempenhadas; no geral, existe uma diferenciação no tocante ao grau de mecanização dos produtos para venda: os homens desempenham trabalhos que exigem mais força física durante curtos espaços de tempo e as mulheres232 são responsáveis por trabalhos de mais longa duração, mais exigentes e mais pacientes).

229 Intervenção de MOSCA, João (Investigador na Universidade Politécnica de Moçambique), «Desenvolvimento, Economia Informal e Papel do Estado nos Países Luso-Africanos», no Seminário “Trabalho, Sociabilidade e Geração de Rendimento no Espaço Lusófono”, CEsA/ISEG, 29 de Setembro de 2010.

230

Intervenção de ÉVORA, Iolanda (Investigadora no CEsA/ISEG), «Mercado e Organização do Trabalho: Questões de Género», no seminário “Trabalho, Sociabilidade e Geração de Rendimento no Espaço Lusófono”, CEsA/ISEG, 29 de Setembro de 2010.

231 Representam também espaços privilegiados para corrigir uma falha dos estudos que advogam a continuidade de certas tarefas destinadas aos homens / mulheres, o que na realidade já não é aplicável (os homens manuseiam máquinas de costura nos mercados e as mulheres agora já lidam com a venda de carne nos talhos – espaço masculino por excelência mas que cada vez mais inclui mulheres que introduzem uma nova forma de organização de trabalho).

A própria relação de poder também exerce influência, sendo traduzida nos seguintes elementos: na cadeia – famílias – clãs – etnias – impérios/Estado; na omnipresença do Estado (laços de hierarquia para com o chefe familiar e a noção de culto face ao Presidente, visto como o «pai» da nação) /tecido económico, sociedade civil, cidadania; na hierarquização, concentração e centralização/democracia e estado de direito; nos sistemas políticos (partidos, poder/oposição, separação de poderes-estado-povo).

Sónia Frias233 analisou a acção e o lugar de um grupo de mulheres nos circuitos de comércio informal em Maputo, durante e pós-guerra, perante um cenário durante e pós guerra, êxodo rural, ruptura na produção e na distribuição de alimentos, conduzindo à luta pela sobrevivência e à acção dessas mesmas mulheres de modo a protegerem os seus filhos da fome. O amor materno foi, neste contexto, alavanca de relevante mudança.

Já na cidade, a luta continuou através da necessidade de adaptação e adopção de comportamentos ajustados ao espaço urbano, provocando um ajustamento estrutural, desemprego, um agravamento da pobreza, oportunidades e oportunismos. Numa primeira fase, as mulheres cozinhavam os produtos que arranjavam na vizinhança234, procedendo à troca de produtos da cidade por produtos do campo, depois, numa segunda fase, passaram a comprar para vender, saindo de casa para alargar o seu negócio através da busca de produtos hortícolas, mais baratos, na província ou nos países limítrofes, o que implicava percorrer uma distância maior. De modo a angariar clientes e com base num sistema de confiança, vendiam fiado, recorrendo a diversas «medidas» ajustáveis ao poder económico das pessoas.

233

Intervenção de FRIAS, Sónia (Investigadora no ISCSP – UTL), «Pobreza, Engenho e Mudança: A Acção e o Lugar das Mulheres nos Circuitos de Comércio Informal em Maputo», no seminário “Trabalho, Sociabilidade e Geração de Rendimento no Espaço Lusófono”, CEsA/ISEG, Lisboa, 29 de Setembro de 2010.

234

É o chamado negócio “Xipanela” que consistia em cozinhar na panela para vender à porta de casa à hora do almoço. Como todas as mães sabiam, supostamente, cozinhar, quando não existiam os ingredientes necessários, inventava-se. Por exemplo, fazia-se a receita de arroz de tomate (quando havia tomate) ou a receita de arroz branco (quando não havia tomate).

Este empreendedorismo feminino acarretou alguns custos a saber: o peso da solidão; a desestruturação do clã familiar, resultante do desemprego dos homens235, fazendo aumentar a taxa de alcoolismo e a violência doméstica; consequências graves nas sociedades matriarcais ao nível da integração familiar e da própria linhagem, na medida em que as mulheres enfrentaram o desafio do «interdito». Os proveitos provenientes das acções destas mulheres prenderam-se com a sua filosofia de trabalhar e aprender (cálculos, logística, negociação), bem como com a nova consciência de si próprias e das suas capacidades.

Efectivamente, são outros tipos de eficiência que existem ao nível das sociedades não capitalistas cujo objectivo de maximização da segurança, estabilidade, do lazer e prestígio da família surge em detrimento da lógica capitalista. É o designado capitalismo imperfeito que é dificilmente quantificável. O risco/perigo é se a corrupção se torna num sistema endémico conquanto até exista uma certa aceitação de uma relativa passividade face à corrupção que contribui para uma maior agilidade da «máquina».

Miguel de Barros236 analisou, na Guiné-Bissau, as diferentes tácticas e dinâmicas inovadoras dos actores juvenis, na perspectiva de emprego com vista à fuga à pobreza, dada a elevada taxa de desemprego (46,87%) que atingia, em 2006, os jovens com idade entre 15 e 24 anos, para além de enfrentarem uma taxa de analfabetismo igualmente alta.

Por isso, a Organização Internacional de Trabalho (OIT) chama a atenção para uma geração perdida por causa das catástrofes económicas desta década, daí que Peter Spink237 considere que o desafio da actualidade tem um rosto e esse rosto é jovem, pelo que os “desafios que se colocam à juventude lusófona”238

prendem-se com: a cultura; o combate à

235 Os homens que não se encontravam no desemprego vendiam coisas respeitantes a si próprios: bebidas, peças de carro, produtos de estaleiro, parafusos, etc

236

Intervenção de BARROS, Miguel de (Investigador no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa - INEP), «Inventividade e Criatividade nas Feiras Livres: Imagens das Estratégias de Empregabilidade Juvenil em Contexto de Pobreza», no seminário “Trabalho, Sociabilidade e Geração de Rendimento no Espaço Lusófono”, CEsA/ISEG, Lisboa, 29 de Setembro de 2010.

237 Intervenção de SPINK, Peter (Pertencente à Fundação Getúlio Vargas – São Paulo), «Trabalho, Informalidade e Cidadania: Construções no Espaço Lusófono», no seminário “Trabalho, Sociabilidade e Geração de Rendimento no Espaço Lusófono”, CEsA/ISEG, Lisboa, 29 de Setembro de 2010.

238 Intervenção de SOARES, Tiago (ex-Secretário Geral da Juventude da CPLP), «A juventude. A Lusofonia. O papel do Círculo de Reflexão Lusófona», Reunião do CRL, Lisboa, 6 de Julho de 2010.

pobreza, à violência, ao desemprego e à fuga de cérebros; a igualdade de género; a criação de oportunidades económicas; o combate; a educação cujo papel é também fundamental ao nível da saúde sexual e dos comportamentos de risco; as migrações e a diáspora; o desenvolvimento sustentável assente numa consciência ecológica apurada; o processo de construção da paz e a estabilidade política; a globalização através do combate às desigualdades e da aposta no capital humano. Perante este cenário, a estratégia a adoptar consiste, em «se virar» / «ganhar o pão» / «ganhar a vida», num espaço multifacetado de oportunidades (para criar solidariedades e inventar negócios) e armadilhas (de empréstimos com obrigações/ofertas de emprego dúbias).

Entre as inúmeras actividades que passaram a integrar o quotidiano destes dois países lusófonos, o investigador Miguel de Barros destaca, para a Guiné-Bissau, alguns trabalhos, resultantes da observação da realidade e representação social, a saber: venda de café na rua; mercado de cestaria e esteiras; exposição e venda de móveis239 / produtos alimentares240 / artesanato; banca de recarga de bateria de telemóveis; serviço de telefonia ambulante; venda de sapatos de segunda mão; negócio de carrinhos de lata; sociedade familiar de venda de tecidos. Para o Brasil, Peter Spink menciona a venda de hot dogs à porta das faculdades, através de jovens, denominados «dogeiros», bem como a venda de produtos agrícolas às portas das casas. Essas estratégias de sobrevivência em contexto de contingência encontram-se ancoradas nas seguintes motivações: possibilidades de acesso ao trabalho e dinheiro; necessidade de autonomamente satisfazer as necessidades individuais; investir no apoio familiar (alimentação, vestuário, escola, saúde e diversão); auto-financiamento da iniciativa (alargamento da actividade e de pessoas).

O conceito em inglês Livelihood ilustra esta ideia de indivíduos e grupos que procuram sustentar uma vida, tentando resolver as suas diferentes necessidades económicas e de consumo, lidando com incerteza mas respondendo às novas oportunidades. Do lado positivo, representa um investimento para gerar rendimentos (por exemplo, o microcrédito é um dos resultados positivos deste conceito). No oposto, está crescentemente associado à redução da pobreza, visando atingir meios de vida sustentáveis.

239 Actividade realizada na principal avenida da Guiné-Bissau – Avenida dos Combatentes da Liberdade da Pátria.

Trata-se, com efeito, de emprego informal, o qual se reporta às actividades relacionadas com a produção ou comercialização de bens e serviços legais que não são registados no Estado. Para definir esta «informalidade», é proposta a noção de «neo-

informalidade» aplicável às actividades económicas urbanas que são caracterizadas por

uma divisão de trabalho simples (e não capitalista), onde os «donos» estão directamente ligados à criação de serviços.

Desta forma, são de realçar alguns aspectos: o uso e a apropriação do espaço e da cidade para afirmar a arte de engenharia social (acção e produção criativa), trabalho (talentos), sociabilidades, solidariedades e melhoria de condições de vida (económicas e sociais); a socialização pelo e para o trabalho que constitui um elemento decisivo de inserção económica, não só porque o trabalho fornece meios financeiros e materiais a partir dos quais se poderá assegurar a reprodução social; desengajamento/afastamento do Estado através da ausência de políticas e consequente transferência de custos sociais (educação, saúde, emprego, protecção) para as famílias – actores singulares/colectivos, aumentando, assim, as disparidades sociais.

Não obstante a contradição registada, durante muito tempo, na ligação entre a «economia» e a «cultura», como se os interesses económicos e a criação cultural e artística fossem opostos, emerge, entretanto, a noção de «economia cultural» que acompanhou a profunda transformação económica das sociedades modernas, ao abrigo de processos competitivos e concorrenciais em factores intangíveis, como sejam muitos dos bens culturais e simbólicos, os quais ganham um papel cada vez mais relevante, implicando o progressivo abandono de visões mais limitadas, nos planos político, económico e social241.

Os bens e serviços culturais comportam uma dimensão material ou tangível e outra imaterial ou intangível que não podem ser separadas e que, no seu conjunto, definem o seu conteúdo, utilidade e significado simbólico. A dimensão imaterial ou intangível de muitos dos bens e serviços culturais apresenta características próximas das dos «bens públicos», como a não-rivalidade e a não-exclusão no respectivo consumo. Contemplam ainda uma

241 Relatório final – Estudo para o MC – GPEARI, O Sector Cultural e Criativo em Portugal, Augusto Mateus & Associados – Sociedade de Consultores, Janeiro 2010.

dimensão própria de valor humano e social, associado a processos de capacitação («empowerment») individuais e colectivos, sobretudo no tocante à difusão de modelos comportamentais, institucionais e civilizacionais, que os aproxima da configuração dos «bens de mérito». O consumo de bens e serviços culturais está, desta forma, associado à produção de «externalidades» positivas significativas, seja em matéria de coesão económica, social e territorial, seja ao nível da construção e preservação de formas de identidade e singularidade comunitárias, que não são necessariamente incorporados nem no valor percepcionado pelo mercado, nem no respectivo preço.

Estes bens podem produzir, em certos casos, benefícios privados, que podem ser sujeitos a transacções no mercado, e benefícios sociais, não privados, que não são transaccionáveis, impedindo os mecanismos de mercado de estabelecer, por si só, os ajustamentos que garantam o acesso dos cidadãos-consumidores aos bens culturais que procuram, em quantidade e qualidade, e estão disponíveis para pagar. O forte envolvimento do Estado no núcleo-duro dos bens e serviços culturais (artes e património) encontra, assim, uma correspondência directa nas restrições ou falhas a que os mecanismos de mercado sujeitariam a respectiva produção e consumo.

Essas «falhas de mercado» colocam desafios nos processos de formação dos equilíbrios entre oferta(s) e procura(s), de afectação de recursos, de coordenação institucional e formulação de políticas públicas, isto é, de regulação de mercados, de forma a garantir a satisfação em quantidade e qualidade das necessidades culturais das populações.

A compreensão do papel multifacetado da «cultura» como factor de desenvolvimento humano, económico e social, explicitando-se através de um conjunto de dimensões que moldam o papel da cultura nas sociedades modernas enquanto: factor estratégico de competitividade; sector gerador de emprego e riqueza; meio de reforço da cidadania; alavanca de coesão social e territorial; e veículo de afirmação internacional das comunidades.