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3. O Estádio olímpico (a escola)

3.3. As minhas equipas

Equipa principal (turma residente)

A olimpíada iniciou quando o treinador principal (PC) referiu que nas duas primeiras semanas de treinos ainda não iríamos ter a equipa definida. Confesso que no início esta estratégia não me agradou muito, dado que queria acompanhar a minha equipa desde o primeiro dia. Mas foi assim que aconteceu.

A primeira semana iniciou-se com os treinos de apresentação, em que cada uma das treinadoras adjuntas (estagiárias) escolheu uma equipa de forma aleatória. Lembro-me perfeitamente do primeiro momento em que tive contacto com a equipa, do nervosismo do primeiro treino, da preparação, da escolha cuidadosa da roupa que iria usar e de chegar mais cedo para que nada falhasse. Nada sabia sobre a equipa, apenas que eram 18 atletas, do curso científico- humanístico de ciências e tecnologias. Recordo-me desse dia como se fosse hoje. Apesar de ter treinado em casa o que ia dizer, para que o nervosismo não tomasse conta de mim, tinha o coração a bater a mil à hora!

Comecei por me apresentar à equipa e de seguida pedi que cada um se apresentasse, mencionando qual o nome, idade e se já tinham praticado

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desporto. Cedo percebi que poucos eram os atletas que praticavam ou já tinham praticado alguma modalidade, contudo pensei para mim mesma: “Vamos a isso! Mais um desafio”. Após a apresentação de cada um, realizei uma pequena apresentação sobre a disciplina, focando vários aspetos, como a importância e benefícios da atividade física e o papel da educação física. A apresentação acabou com um pequeno vídeo sobre a importância educação física. Este vídeo tinha sido realizado por mim, no primeiro ano do mestrado em ensino da educação física básico e secundário, em prol da disciplina de Desenvolvimento Curricular em Educação Física, abordando a temática da legitimação da educação física e a importância do exercício físico. Na altura, decidi realizar o trabalho em vídeo, contrariamente aos meus colegas, com o objetivo de posteriormente o puder mostrar aos meus atletas no ano de estágio. O momento em que os “meus” atletas estavam a visualizar o “meu” vídeo foi único e aí pensei em todas as coisas novas que podia fazer, em todas as ideias que podia pôr em prática e em como podia tornar este último ano importante para eles, não só em termos de conhecimentos, mas também de vivências.

O treino de apresentação acabou com uma dinâmica de grupo que pretendia estimular o trabalho em equipa e a cooperação e também com o preenchimento de uma ficha de caracterização do atleta (Anexo 1), elaborado em conjunto com a minha equipa técnica, que pretendia retirar informações a nível clínico, das atividades realizadas nos tempos livres, da prática desportiva dos atletas, do gosto pela educação física e da preferência em relação às modalidades.

No que diz respeito às informações retiradas dos questionários, a nível clínico (Gráfico 1), identifiquei alguns atletas com problemas de saúde, sendo que mais de 78% têm problemas visuais e um atleta tem problemas relacionados com o sistema respiratório (asma), contudo isso não os impedia de realizarem os diferentes exercícios. De entre os problemas, identifiquei uma atleta com um problema de saúde grave (carcinoma na tiroide). Face a este quadro, houve a necessidade de tentar perceber quais as limitações da atleta, sendo que esta na primeira fase de competição (1º período) esteve de baixa, dado que tinha sido submetida a vários tratamentos.

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Gráfico 1. Problemas clínicos

Relativamente às atividades desportivas realizadas fora do contexto escolar (Gráfico 2), dos quatorze atletas, 43% praticavam uma modalidade, sendo que os restantes atletas não praticavam qualquer atividade desportiva. Dos seis atletas praticantes, dois praticavam jogos desportivos coletivos (futebol) e os restantes dividiam-se pelas seguintes modalidades: dança, natação, ténis e atividades de ginásio. No que se refere à predisposição para a prática, concluí que esta equipa era muito heterogénea, dado que havia alguns atletas com bastante interesse e motivação para a prática desportiva, mas a maioria não gostava de praticar desporto, nem se sentiam motivados.

Gráfico 2. Modalidades praticadas

Em relação às matérias de ensino, no décimo segundo ano o clube (escola) admite um regime de opções. Assim, para este ano letivo, foi fornecida uma folha aos atletas, onde tinham de ordenar as diferentes modalidades por

1 1 11 0 2 4 6 8 10 12

Doença grave Asma Visão

2 1 1 1 1 0 0,5 1 1,5 2 2,5

Futebol Dança Natação Ténis Atividades de ginásio

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ordem de preferência. Esta parte do questionário permitiu-me perceber quais as modalidades que os atletas gostavam de abordar e assim escolher as matérias de ensino, tendo em conta as modalidades mais selecionadas pela equipa.

De entre as catorze modalidades (Gráfico 3) apenas cinco iriam ser abordadas ao longo do ano, sendo que as modalidades mais escolhidas foram: futebol, basquetebol, andebol, acrobática e badminton. O futebol foi a modalidade mais escolhida como primeira opção pelos rapazes, sendo que nas raparigas a modalidade que obteve melhor pontuação foi a ginástica acrobática.

Gráfico 3. Modalidades preferidas

Após estas duas primeiras semanas, chegou o momento de escolhermos a equipa principal com quem iríamos trabalhar ao longo do ano. Admito que esta escolha foi fácil para mim, dado que a partir do dia do treino de apresentação os via como a “minha” equipa, os “meus” primeiros atletas.

Assim, a equipa selecionada foi uma equipa de décimo segundo ano, que inicialmente tinha 18 atletas, contudo com algumas mudanças acabou por ficar com 14 atletas. Confesso que fiquei um pouco reticente com estas alterações, uma vez que a equipa tinha ficado muito reduzida, porém o treinador principal explicou que seria um desafio diferente e que iria ter de trabalhar outros aspetos. Quanto aos métodos de trabalho, esta era uma equipa trabalhadora, dedicada e

1 7 1 1 1 2 1 1 2 3 1 1 2 1 1 1 1 4 3 1 1 2 1 1 1 0 1 2 3 4 5 6 7 8

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cumpridora. Apesar destas características, a equipa tinha alguns problemas de motivação, sendo que tive de encontrar algumas estratégias e exercícios que os desafiassem. No que concerne ao treino (disciplina de educação física), percebi que nesta equipa havia atletas com bastantes dificuldades, contudo mostraram- se sempre bastante empenhados em todas as tarefas propostas.

No geral, como a maior parte dos atletas nunca tinha integrado uma equipa, senti a necessidade de reforçar no processo de planeamento competências pessoais e sociais, como: a cooperação, espírito de equipa, responsabilidade, motivação, autonomia, liderança e superação.

Estava assim perante seis raparigas e oito rapazes, cheios de expectativas, ambições, empenhados e focados. De entre os rapazes, tínhamos dois jogadores da bola, líderes natos, sempre prontos a ajudar e com grande predisposição a nível motor, ambos muito competitivos e disciplinados, os meus braços direitos que queriam sempre ajudar a montar os campos e a arrumar o material. Já outros dois atletas eram os “jogadores”, muito unidos (onde estava um, estava o outro), companheiros, determinados e sempre muito divertidos, com grande desempenho motor em todas as modalidades, no entanto para eles todos os treinos deviam ser de futebol. Seguiam-se os dois mais tímidos, muito tranquilos e introvertidos, que apesar de terem mais dificuldades motoras se empenhavam sempre nas tarefas propostas e procuravam acompanhar os restantes colegas de equipa. Já um outro aluno era “o engraçadinho”, falador e divertido, que questionava tudo e que poderia até ser mais empenhado e ter melhores resultados, mas a sua preguiça era mais forte. Por último, “o rapaz do

fitness” era também muito prestável e com níveis de desempenho motor muito

elevados, contudo levava os estudos sem grande ambição, acabando por sair no fim da segunda fase de competição (2º período). Na mesma altura da saída deste atleta, chegou um novo desportista de nacionalidade Brasileira, que apresentava grande predisposição a nível motor, contudo tinha pouco conhecimento em algumas modalidades, sendo que nunca tinha praticado muitas delas.

Nas raparigas encontrámos “a líder”, muito observadora, perfecionista e empenhada, com grandes capacidades motoras para as diversas modalidades,

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que não gostava de perder, mas quando ganhava era sempre muito humilde e justa. Já “a nadadora” era esforçada, pontual e muito exigente com ela mesma, não gostava de errar, queria fazer todas as tarefas com a máxima perfeição e todos os desafios eram encarados com um sorriso nos lábios e a maior determinação. Depois tínhamos “a estudiosa”, que tinha muitas dificuldades motoras e na compreensão do jogo, no entanto encarava todas as tarefas com a maior dedicação e empenho, mostrando sempre uma postura muito correta e prestável. Outras duas atletas eram “as ginastas”, ambas muito observadoras, simpáticas e responsáveis, demonstrando um desempenho motor razoável em todas as modalidades, contudo apresentavam algumas dificuldades na compreensão dos jogos Desportivos Coletivos (JDC). Por último, “a teimosa”, que era sempre a última a chegar aos treinos, muito distraída, mas sempre bem disposta e pronta a ajudar.

Todos os atletas com personalidades muito diferentes, mas muito empenhados, maduros, com expectativas e ambições: estas eram as principais características da minha equipa.

Esta equipa do 12º ano será sempre a minha primeira equipa, os meus primeiros atletas, com quem aprendi e vivi esta olimpíada. Houve jogos em que me senti frustrada, pois sabia que eles podiam dar mais, enquanto que noutros fiquei satisfeita e contente, não só pelo resultado, mas principalmente pelo empenho e prestação dos atletas. Sem dúvida que a motivação de querer ensinar mais e melhor, de os fazer evoluir e gostar de desporto venciam todos os momentos menos positivos e faziam-me lutar por esta equipa.

“Se tivesse de voltar a escolher, teria escolhido novamente o 12º ano.” (Diário de bordo, 10 de dezembro de 2018)

Equipa secundária (turma partilhada)

Na segunda fase de competição (2º período), fui convidada para treinadora adjunta de uma equipa de jovens atletas noutro clube. A realidade desta equipa era muito diferente da minha equipa principal, não só em termos de estrutura e de atletas, mas também no funcionamento e material das instalações de treino.

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Ao contrário do que seria de esperar, este novo desafio despertou em mim diferentes sentimentos. Por um lado, estava muito entusiasmada por interagir e ensinar atletas de tão tenra idade, mas, por outro lado, sentia desconforto e medo por este novo desafio.

Antes de iniciar os treinos, a equipa técnica decidiu que era importante reunir com o treinador principal (PC), para obter algumas informações dos atletas. TP descreveu então a minha equipa e forneceu uma folha com as fotos dos atletas, onde realçou quais eram os que tinham mais dificuldades, os com melhor desempenho motor e os que tinham pior comportamento em treino. Após esta reunião, já me senti mais preparada, contudo as incertezas eram muitas e o medo de falhar também.

A equipa era do quinto ano de escolaridade, constituída por vinte e seis atletas (alunos), doze do sexo feminino e catorze do sexo masculino. Dos vinte e seis atletas, apenas uma era repetente, sendo que as idades estavam compreendidas entre os 9 e os 11 anos.

Esta equipa era muito heterogénea a nível de conhecimentos e disponibilidade motora, contudo apresentavam uma enorme predisposição para a prática e eram muito interessados. Em relação à conduta, esta equipa tinha alguns problemas de comportamento, com alguns casos que precisavam de uma maior atenção. Desde início usei algumas estratégias para colmatar esta energia dos atletas, como, por exemplo, falar só quando toda a equipa estivesse em silêncio e não avançar para o exercício seguinte sem que os atletas estivessem concentrados na tarefa, de forma a mostrar-lhes que os maus comportamentos prejudicavam o funcionamento dos treinos.

Como já referi, havia alguns comportamentos e situações que necessitavam de uma maior atenção, como casos de violência e intimidação entre atletas. Confesso que nunca tinha presenciado situações destas, contudo perante as mesmas sempre mostrei uma postura assertiva. Em treino, eram recorrentes os conflitos entre atletas, principalmente do sexo masculino, e muitas vezes foi necessário e importante intervir. Procurei sempre que possível falar sobre este tipo de situações e reprimir estas condutas, no sentido de

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consciencializar os atletas. No início não foi fácil lidar com estas situações, contudo, com a evolução dos treinos, tornaram-se cada vez menos recorrentes, o que pode indicar que a minha mensagem foi transmitida com sucesso. Quanto aos casos de intimidação, nunca me apercebi de nenhuma situação até aos dois últimos treinos. Neste caso, houve necessidade de comunicar os acontecimentos ao treinador principal, para que este atuasse em conjunto com o diretor da equipa (diretor de turma).

Apesar de todos estes contratempos, adorei treinar esta equipa. O meu foco esteve muito mais direcionado para o controlo da equipa, para a organização e criação de rotinas e regras, contudo proporcionar-lhes uma experiência de ensino favorável era o mais importante.

Quanto à planificação, a equipa na primeira fase de competição (1º período) tinha abordado a modalidade de voleibol, sendo que nesta segunda fase deveria lecionar basquetebol ou ginástica. Optei pelo basquetebol, dado ser uma modalidade coletiva e aquela pela qual os atletas mostravam mais interesse. Até ao momento da competição os atletas teriam sete treinos, alternadamente de quarenta e cinco minutos ou noventa minutos. Dado o número reduzido de treinos e por ser a primeira vez que os atletas iriam lecionar esta modalidade, optámos, juntamente com o TP desta instituição, por lecionar alguns conteúdos básicos da modalidade. Em conversa com o treinador principal, este sugeriu que a minha instrução fosse clara e focasse apenas o essencial, de forma a potenciar a aprendizagem dos atletas.

Admito que quando acabava um treino sentia-me esgotada, como se tivesse corrido uma maratona, mas no fim os abraços de despedida relembravam-me o meu gosto pelo ensino. Nunca me vou esquecer destes pequenos “craques”. Dos jogadores de basquetebol, que provocavam dores de cabeça e muitas vezes me levaram ao limite, mas ao mesmo tempo se mostravam líderes natos. Do jogador de futebol, que estava na “lista negra” do TP, contudo sempre se mostrou muito correto e educado comigo. Da durona, que não aceitava um elogio nem uma correção, mas mesmo assim eu não desistia de os transmitir. Da Brasileira, que tinha grandes dificuldades motoras e que era menosprezada pela equipa, mas que me considerou como uma amiga

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para poder desabafar. Das meninas, que mal eu chegava corriam para me abraçar e todos os dias me perguntavam se seria eu a dar o próximo treino. Estes eram os meus traquinas, que me fizeram dar valor a esta profissão e me mostraram a magia de ser treinadora (professora).

Sem dúvida que esta experiência foi muito enriquecedora e desafiante, permitindo-me vivenciar uma realidade completamente diferente da minha equipa principal. A alegria de cada treino, o entusiamo dos atletas, o querer aprender e o gosto pela competição são sentimentos que nunca vou esquecer.

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