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Capítulo 3. A intervenção social no âmbito do RS

3.1. As novas políticas sociais: desafios à intervenção social

As políticas sociais do final do século XX, designadas como políticas sociais ativas, introduzem a ideia da contratação como elemento indispensável à obtenção de apoios sociais específicos e pressupõem a ativação, ou seja, a participação dos próprios indivíduos nas medidas sociais a que acedem (Holen, 2003, citado em Santos, 2012). Assim,

o incentivo à participação dos grupos em situação de vulnerabilidade no processo de intervenção, a consciencialização dos seus direitos e deveres de cidadania relacionadas com processos de “empowerment” aparecem relacionados com os procedimentos e as práticas profissionais do AS e como metodologias específicas de intervenção social (Santos, 2012, p. 133).

Assim, a nova geração de políticas sociais institui novos hábitos e exigências à intervenção, trazendo novas configurações e agentes para o panorama da organização da proteção social, e “introduz uma filosofia de cidadania ativa, enfatizando a sua relação com o utente enquanto cidadão e não meramente como assistido” (Guadalupe, 2009, p. 112).

Para Sousa et al. (2007, pp. 95-101), estas metodologias de intervenção revestem-se de novas características, destacando-se:

i) Uma abordagem por projeto, que corresponde a um modelo de regulação partilhada entre o

Estado e a sociedade, sendo suportada por fundos de proveniência pública, privada e do terceiro sector, submetidos a uma estrutura mais autónoma de responsabilidades;

ii) Uma intervenção descentralizada e a partilha de responsabilidades e de ações com as

organizações da sociedade civil. Destaca-se a existência de parcerias e redes sociais de parceiros que trabalham de forma integrada, partilhando informação, produzindo ajudas e criando recursos capazes de dar resposta às necessidades sentidas pela população;

iii) Uma intervenção em parceria, ganhando especial relevo com a consideração da

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diversificada de atores, cada um com competências setoriais distintas, tanto públicas como privadas;

iv) Uma individualização das medidas, privilegiando-se medidas de caráter concreto ajustadas

ao perfil dos destinatários, sejam eles famílias ou indivíduos. Os novos programas de inserção social têm em conta o facto de cada sujeito ser único e individual, considerando as experiências e motivações de cada um, pelo que o programa de inserção passa a ser distinto de pessoa para pessoa, tentando-se adequar as medidas e as práticas às necessidades sentidas por cada indivíduo;

v) A ativação, que implica um envolvimento ativo dos destinatários. O direito a ser ajudado

(com um subsídio) implica o correspondente dever de contribuir com uma atividade socialmente útil, ou seja, o Estado deve exigir algo em troca da ajuda que presta.

Trata-se da transformação de um modelo assente na solidariedade, para um modelo baseado na responsabilidade, no qual os destinatários são instigados a “construir” o seu próprio lugar na sociedade, uma transição do Welfare para o Workfare (Santos, 2000). A reciprocidade entre direito e obrigação é uma das ideias centrais do Workfare, estabelecendo uma nova perspetiva dos direitos sociais. Neste contexto, no campo do bem-estar social inicia-se uma tendência que se reflete numa “passagem da responsabilidade do Estado central para o municipal, para o mercado e para a sociedade civil” (Nunes, 2010, p. 68).

Assim, estas políticas pressupõem a implicação de diversos atores, incluindo não só as estruturas centrais e descentralizadas da administração pública, em particular as autarquias, mas também um universo assinalável de entidades, de natureza diferenciada, com atuação em diversos domínios. São exemplos, as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), as associações locais e outras organizações com fins não lucrativos. Para Capucha (2005, p. 239), estamos presente uma nova forma de organização que poderá designar-se por “sociedade civil organizada”, implicando a conceção de um novo “welfare mix”.

Para além de pressupor um novo modelo de organização e de partilha de responsabilidades, objetivos e estratégias de atuação, esta “sociedade civil organizada”, atuando em parceria e em rede, subentende igualmente um conjunto de mudanças substantivas em termos de conteúdos. Para Capucha (2005, p. 240) estas mudanças referem-se a uma consciencialização mais ampla e partilhada do que se deve entender por desenvolvimento social, no sentido de tornar as políticas sociais “mais acessíveis e equitativas”, tendo como objetivo último o combate aos fenómenos de pobreza e exclusão social. Essa consciencialização pressupõe uma capacidade, não só de fomentar uma efetiva

reestruturação do tecido produtivo português, mas também por uma implicação de novas fórmulas e novos projetos de promoção do desenvolvimento (Capucha, 2005).

O RSI é um exemplo desta reestruturação, criando uma intervenção territorializada baseada na corresponsabilização, na contratualização e na individualização. Esta abordagem apresenta, segundo Hespanha (2008, p. 8), as seguintes vantagens: i) uma deteção das necessidades específicas e oportunidades de inserção; ii) a capacidade de gerir o conjunto de políticas nacionais, regionais e locais que afetam um dado território por forma a evitar duplicações e a maximizar as sinergias; iii) uma maior mobilização de agentes locais, empregadores e grupos de comunidade para apoiar os objetivos da política.

O RSI permite, desta forma, uma gestão local das respostas e uma (co)responsabilidade do território (e dos seus atores) pela resolução dos problemas sociais, onde o Estado é representado por instâncias locais da administração pública a quem são delegadas funções de execução de políticas e de mobilização de parceiros no terreno. Esta forma de atuação traduziu-se na criação de protocolos entre o Instituto da Segurança Social (ISS) e outras entidades sem fins lucrativos, visando a implementação e o acompanhamento do RSI no terreno, promovendo e concretizando o objetivo último das medidas do RSI, que é a autonomia e a inserção dos beneficiários (Despacho n.º 451/2007, de 10 de janeiro).

Conforme o exposto, a ideia de proximidade e territorialização implica transpor para o domínio local a responsabilidade de dar respostas a necessidades sociais específicas, mobilizando estratégias e recursos, objetivando o papel do Estado e das instituições a vários níveis e setores. Esta ação baseada na parceria ganha especial relevo se tivermos em conta a multidimensionalidade dos problemas sociais, os quais implicam um conjunto de estruturas e reclamam uma intervenção também ela diversificada de atores, que “põem em comum recursos com vista a atingir determinadas finalidades, como partilhar pertenças, fazer circular informação, produzir ajudas, mobilizar capital social, ligar os agentes económicos ou controlar as políticas públicas” (Hespanha, 2008, p. 9). Esta intervenção em parceria permitiu uma mutação de um modelo hierárquico de ação por uma estrutura horizontal – uma atuação em rede. O RSI é um exemplo desta nova lógica contratual, apelando para uma participação dos diferentes intervenientes que assumem o contrato – desde o beneficiário até aos diferentes parceiros que integram os NLI (constituído por representantes de instituições locais nas diversas áreas e coordenado pelo Estado, através da Segurança Social).

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