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As Novas Ruralidades: Mundo Rural Tradicional X Mundo Rural

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CAPÍTULO 1. DESENVOLVIMENTO LOCAL, TURISMO E NOVAS

1.3. As Novas Ruralidades: Mundo Rural Tradicional X Mundo Rural

As novas ruralidades têm sido explicadas a partir da constatação de que o mundo vem passando por transformações sociais, econômicas, políticas e ambientais e de reordenamentos espaciais, cuja origem está no acelerado processo de desenvolvimento do capitalismo, ou globalização. A superação das distâncias físicas e geográficas promovidas pela velocidade dos

meios de transportes, construções de rodovias, complexos industriais, agroindustriais e turísticos e a sofisticação dos meios de comunicação e novas tecnologias de equipamentos, implementos e insumos agrícolas aceleram os processos de mudanças das localidades, e suas interconexões alteram as culturas reorganizando o espaço. (HARVEY, 1989, p. 266).

Essa é uma das explicações da dissolução entre campo/cidade, rural/urbano, uma vez que nesses novos espaços criados, a entrada do capital transforma e cria novos espaços e outras relações sociais de produção. Ou seja, o espaço é destruído e homogeneizado no mesmo processo pela velocidade do tempo que trabalha a serviço do capitalismo. A respeito diz Harvey (1989, p. 266): “A produção ativa de lugares dotados de qualidade especiais se torna um importante trunfo na competição espacial entre localidade, cidades, regiões e nações”.

Frederic Jameson (1994, p. 40-43), quando estuda as sociedades avançadas no período de 1980/90, assinala que estava em curso um movimento por uma nova globalização e que, portanto, se faria necessário reorganizar a produção agrícola, “às vezes chamada de revolução verde, devido as suas inovações tecnológicas e mais especificamente químicas e biológicas”. E foi assim que consumou a transformação de “camponeses em operários agrícolas, e as grandes propriedades ou latifúndios (assim como as aldeias neles encravadas) em agronegócios”. Dessa maneira, o campo desaparece como uma “realidade essencialmente provinciana” porque “tornou- se estandardizada, escuta o mesmo inglês, vê os mesmos programas, consome os mesmos bens que a velha metrópole”.

José Graziano da Silva (1997, p. 46), já algum tempo, discute que essas novas alterações contemporâneas da organização industrial também chegaram ao campo brasileiro, promovendo mudanças nas relações sociais e de trabalho. Devido às novas tecnologias trazidas pela industrialização e modernização, as mudanças provocadas nas localidades trouxeram novos paradigmas que “pressionam novos modos de regulação por parte do Estado que incluam as políticas ambientais de planejamento do uso do solo e da água, de bem-estar social, de desenvolvimento rural etc.” (GRAZIANO DA SILVA, 1997, p. 46).

Partindo do entendimento que “a realidade humana é culturalmente construída”, Moreira (2003, p. 117-121) defende “uma compreensão de uma nova noção de ruralidade” nos estudos das sociedades na contemporaneidade. Para ele, está em curso um “processo de ressignificação do rural” da antiga visão dicotômica, que considera os “processos recentes de globalização e do exercício da hegemonia das políticas neoliberais... de descentralizações política

e de desformalização das relações de trabalho herdadas”. Ou seja, o rural deve ser entendido dialeticamente em relação ao urbano na modernidade.

O rural passa a ser compreendido como um campo de análise que procura ver a realidade em mudança constante, em movimento no agora que ressalta a visão pós-moderna, e não como algo dado, imposto, mas em processo de transformação. 12

Na visão de Moreira (2003, p. 114-115), o rural é entendido como uma fase de “exercício e da legitimação da hegemonia cultural e política”, resultante “das revoluções burguesas e das lutas pela independência colonial das sociedades ocidentais”. Em sua retrospectiva sobre o mundo rural da modernidade, conclui que aquele rural foi concebido de maneira dicotômica, pela visão “burguesa industrial e urbana”. Segundo ele, o rural “foi apreendido na cultura e na política pelas oposições cidade-campo, tradição-moderno, incivilizado-civilizado e não-tecnificado-tecnificado”.

Isto se deve ao entendimento de que o rural estaria, nessa visão hegemônica, ligado aos “domínios da natureza e da tradição”. E que, portanto, “um rural a ser transformado seja pelos processos civilizatórios burgueses, seja pelos processos de modernizações, dentre os quais os de tecnificação e os da lógica e racionalidade dos mercados”, tendo como parâmetro o modelo urbano-industrial da cultura e economia, desqualificando os saberes e técnicas diferentes “da racionalidade técnico-científica e do mercado”. Para o autor essa visão de mundo burguesa urbana-industrial representa a “ideologia de legitimação de forças hegemônicas”, e que por isto as políticas são concebidas e colocadas em ação “quer como intervenção sobre, quer como serviços ao, ou ainda como participação do mundo rural”. (MOREIRA, 2003, p. 115-116).

Esse autor (MOREIRA, 2003, p. 123), numa outra perspectiva, orienta que outra possibilidade de se estudar o mundo rural é a que considere “as relações entre o local e o global da pós-modernidade e da globalização”. Para ele, o “rural imaginário” dos processos de transformação da modernidade que via o mundo rural como sociedades pré-capitalistas do tipo modelo europeu, ou como no caso brasileiro do tipo rústico, atrasado, oligárquico, “estaria desaparecendo num paradoxal processo de desterritorialização e presentificação”. Esse desaparecimento se daria através de “um duplo processo de desenraizamento”, uma vez que esses

dois imaginários “seriam construídos e mesmo criados como tradições do e no tempo presente”, caso dos “simulacros, das realidades virtuais e teatralizações”.

Para o autor (2003, p. 123), as “relações de tempo-espaço fariam desaparecer o passado e antecipariam o futuro”. Assim, só o presente teria sentido e essas relações de tempo-espaço, “carregariam a possibilidade de construção de um global hegemônico sem lugar, sem território: desterritorializado”. O tempo desenraizado seria o ressurgimento desse tempo passado desaparecido, que volta como um tempo passado nostálgico, bucólico.

o passado que desaparece e reaparece como representação do passado desaparecido, tais como seriam as representações presentes do patrimônio e das tradições que sedimentam os turismos rurais contemporâneos e a produção e a mercantilização dos produtos e artesanatos culturais “da fazenda” e das tradições “camponesas”, seja no centro ou na periferia.

O espaço desenraizado seria o desaparecimento do local ou do território que ao ser globalizado como, por exemplo, o agronegócio ou estilo country americano, surge “como representações econômicas e culturais” em qualquer lugar do globo totalmente desterritorializado, “fazendo desaparecer o original americano”. (MOREIRA, 2003, p. 123).

Auxiliada pelas orientações teóricas que se encontram no nosso problema de pesquisa, buscamos olhar o processo de transformação social de Gravatá considerando também essas novas informações teóricas acima descritas.

No próximo capítulo, contextualizaremos o município de Gravatá com o objetivo de entendermos o seu processo de transformação social.

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