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No campo das organizações que adotam a QVT, Pagés (1987), pesquisador marxista, introduz o conceito de mediação:

A organização é um conjunto dinâmico de respostas e contradições. È realmente um sistema, mas um sistema de mediações que só pode ser compreendido pela referência à mudança das condições da população e das contradições entre os trabalhadores por um lado, a empresa e o sistema social, do outro [..] .A organização antecipa-se aos conflitos, absorve e transforma as contradições antes que estas resultem em conflitos coletivos. Quem diz mediação, diz antecipação dos conflitos” (Pagés 1987: p. 31- 34)).

Isso quer dizer que, para o autor, este é um traço característico da empresa e da sociedade capitalista, que se afirma na medida em que estas se desenvolvem, já que tanto a empresa moderna, quanto mais a empresa hipermoderna, não se limitam a tratar os conflitos, ela os prevê e se previne.

organização moderna e organização hipermoderna, é o fantástico desenvolvimento de seus processos de mediação e ainda, sua extensão a novas zonas (instâncias), bem como sua interconexão cada vez mais ramificada e sua constituição em sistemas cada vez mais coerente. Portanto, para ele, a organização hipermoderna deve assegurar as transformações do sistema capitalista e manter seu controle sob sua orientação e, simultaneamente, transformar os trabalhadores no sentido desejado e manter seu controle sobre os mesmos, em uma situação em que este controle poderia tender mais a escapar-lhe que anteriormente.

Pagés (apud Araujo 1996: p. 36) analisa as formas atuais de controle nas organizações capitalistas e verifica que os seus instrumentos de mediação são de ordem psicológica, política, ideológica e econômica, voltados para a percepção dos trabalhadores, constituindo formas de controle mais sutis, menos observáveis e mais poderosas. Pagés (Op. cit.) prossegue mostrando que esses termos mediadores respondem às atuais contradições da empresa capitalista que precisa desenvolver as forças produtivas e, simultaneamente, garantir a subordinação dos trabalhadores aos objetivos da empresa e do sistema capitalista. A participação é a garantia de que as coisas continuarão na mesma.

Quando trata dos diversos tipos de mediação, à luz das características da organização hipermoderna Pagés tem a seguinte visão:

1) A mediação econômica, caracterizada por salários altos e possibilidade aberta de carreira, é uma forma de contribuição para a destruição de vestígios da sociedade feudal que subsistem na sociedade capitalista clássica; 2) A mediação política é caracterizada pelo desenvolvimento de um sistema decisório de autonomia controlada assegurando a administração à distância de conjuntos vastos e complexos. Uma espécie de desaparecimento do papel autoritário dos chefes, que não são mais os que dão as ordens, como se fossem os pequenos soberanos locais da empresa capitalista clássica; 3) A mediação ideológica é

caracterizada pelo desenvolvimento da organização como lugar autônomo de uma produção ideológica, de uma religião de empresa, articulada a todas as práticas da empresa (políticas de pessoal, financeiras, comerciais...) e legitimadas por ela..Distintamente da empresa capitalista clássica, que, ao contrário, faz com que seus domínios permaneçam relativamente isolados e “puros” quanto às relações econômicas, a empresa hipermoderna, pelo contrário, investe nos aparelhos ideológicos da sociedade global, principalmente por intermédio do Estado e procura influenciar sua orientação, integrar as escolas, as universidades, ou universitários (com um sucesso no geral, notável, apesar das aparências) e torna-se ela própria um dos altos lugares da produção ideológica conformista; 4) A mediação psicológica é caracterizada pelo desenvolvimento da dominação psicológica da organização sobre seus trabalhadores. O indivíduo tende a assumir a organização, sua ideologia e suas regras, o trabalho que ela propicia e a reproduz, assim, da maneira mais segura e ao mesmo tempo mais suave e mais adaptada do que se fosse o objeto de uma restrição (coerção) direta. Ele vive a organização como uma droga da qual não pode se separar.

Esse controle, segundo Araujo (1996:37),

é necessário ao capital não apenas para assegurar o exercício de seu poder político sobre os trabalhadores. Ele também garante uma certa estabilidade necessária ao planejamento e à realização da produção e defende a empresa dos perigos da organização autônoma dos trabalhadores (greves, paralisações e reivindicações), que coloca em risco o seu processo de reprodução. O controle permite o domínio sobre os mistérios das profissões e, com isso, a determinação do tempo necessário à produção, assim como a introdução de elementos inovadores não fica mais na dependência do arbítrio do operário (Araujo 1996: p. 37).

Para o autor, o aumento da produtividade, portanto, e a manutenção dos critérios de competitividade, estão cada vez mais associados à capacidade das empresas em darem respostas rápidas e eficientes aos problemas surgidos e de modernizarem a base física e organizacional da produção. Por isso, potencializar a mão-de-obra, o capital variável, é fundamental para a consecução de tal intento.

Assim, deve-se refletir sobre a pesquisa dos programas de Qualidade Total e seus impactos sobre a QVT, realizada por Lima (1994), quando aborda os efeitos dessas novas políticas sobre a subjetividade dos trabalhadores e sobre as relações de trabalho, ao afirmar que :

Esse tipo de política desenvolve e mantém forte dependência dos empregados com relação à empresa, levando a considerável redução do seu espírito crítico e, conseqüentemente, de suas possibilidades de resistência. As reais vantagens oferecidas pela empresa, como contrapartida pela sua grande exigência de produtividade e qualidade, são percebidas como uma espécie de concessão à qual o empregado deve responder como dedicação incondicional e forte espírito de lealdade (Lima 1994: p. 69- 70).

Finalmente, merece destaque a colocação de Moretti (op. cit, p. 6), quando comenta que em termos comportamentais, a organização se move por meio de duas formas distintas: formal e informal. Para ela, a organização formal, delineada pela racionalidade, é apenas um plano de conduta traçado pelos organizadores, a fim de dar perfeita execução ao funcionamento da organização. Porém, como explica Wahrlich (1986, p.51) apud Moretti, “quase sempre o quadro real de comportamento e de relações apresentado pelos membros de uma organização se afasta, ligeira ou amplamente, do plano formal de organização”, e complementa a autora, daí vem a sensação de perda de qualidade de vida.

Para reforçar esse ponto de vista, Moretti apresenta a colocação de Tannembaum (1976):

As organizações, na verdade, não funcionam exatamente como deveriam, mas a idealização [...] é bastante útil como ponto de partida, pois equipara-se, em vários aspectos, aos modelos clássicos descritos na literatura sociológica e da administração [...] tais modelos apresentam a organização como um sistema altamente racional e impessoal, no qual se ignora quase que totalmente a psicologia dos elementos que a compõem” (Tannembau 1976: p. 15 apud Moreti op. cit.).

informal é a maneira pela qual os membros realmente se comportam, excetuando-se o comportamento traçado a eles pelo plano formal, ou seja, é a manifestação originária de sua vida privada em busca da qualidade de vida. Segundo ainda Wahrlich (1986: p.52, apud Moretti: Op. cit.), “o plano administrativo formal não pode nunca refletir, adequada completamente, a organização concreta à qual se refere, pela razão óbvia que nenhum plano abstrato pode [...] descrever exaustivamente uma totalidade empírica”.

Desta forma, Moretti (Op. cit.) arremata a questão, quando diz que:

Uma maior participação, como a demanda pela gestão da qualidade, implica maiores esforços e energia da parte dos trabalhadores, bem como uma maior parcela de responsabilidade a assumir. E, nem como todos os trabalhadores possuem a mesma estrutura motivacional, o processo de mobilização implica uma ampla relação de fatores que afetam sua qualidade de vida no trabalho (Moretti, op. cit. : p. 6).

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