• Nenhum resultado encontrado

AS PARCERIAS E A INSERÇÃO DO PROGRAMA OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA – ESCREVENDO

2 A CONSTITUIÇÃO DO PROGRAMA OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA – ESCREVENDO O FUTURO

2.1 AS PARCERIAS E A INSERÇÃO DO PROGRAMA OLIMPÍADA DE LÍNGUA PORTUGUESA – ESCREVENDO

O FUTURO NAS ESCOLAS

As práticas pedagógicas constituem-se como atividades humanas objetivas e, enquanto tais, conforme Bakhtin (2011), estão ligadas ao uso da linguagem. As interações realizadas nas diferentes esferas sociais produzem tipos relativamente estáveis de enunciados, os gêneros do discurso, que refletem e refratam as inúmeras possibilidades da atividade humana em cada esfera social. Da correlação estabelecida pelo autor entre as atividades humanas e o uso da linguagem, observa-se uma relação constituinte entre as esferas da comunicação, os enunciados e os gêneros do discurso, conforme aponta Rodrigues (2001):

Cada esfera social, com sua função socioideológica particular (estética, educacional, jurídica, religiosa etc.) e suas condições concretas específicas (organização socioeconômica, relações sociais entre os participantes da interação, desenvolvimento tecnológico etc.), historicamente formula na/para a interação verbal determinados gêneros discursivos, que lhes são específicos. Portanto, eles correspondem a situações de interação verbal típicas (mais ou menos estabilizadas e normativas) da comunicação social e, como tal, apresentam, na sua constituição, a finalidade e as condições da esfera a qual pertencem. (RODRIGUES, 2001, p. 58, grifo da autora).

Essa relação é apontada também por Grillo (2006, p. 146), ao afirmar que “a noção de esfera permeia a caracterização do enunciado e dos seus tipos estáveis, os gêneros”. Podemos dizer, com base nessa relação constituinte, que o movimento de produção e transformação dos gêneros discursivos está ligado à esfera de atividade humana, promovendo também as mudanças nessa esfera. As diferentes esferas em que se desenvolvem as atividades e as relações humanas não são estáticas ou apartadas umas das outras, elas convivem e se inter- relacionam constantemente.

A esfera escolar, por exemplo, onde se materializam práticas objetivas voltadas para os processos de ensino e aprendizagem, recebe influências de outras esferas da atividade humana que ressignificam as

ações que se dão nesse espaço. Segundo Geraldi (2010), a prática que ocorre na sala de aula, os acontecimentos que ali se desdobram,

são extremamente atravessados pelo que lhe é exterior, pois as concepções educacionais, as propostas de ensino, em moda ou não, as políticas e os programas de construção social que no interior da sala de aula se concretizam são definidas de seu exterior, no âmbito mais amplo da formação social. (GERALDI, 2010, p. 55). O programa OLP é fruto da articulação entre o setor privado, o Terceiro Setor26 e os entes federados, desenhando-se, assim, como reflexo do modelo educacional oriundo dos processos de redefinição do papel do Estado nas questões sociais. Vemos, portanto, que a materialização desse programa constitui-se em meio a essas esferas da sociedade e precisa, em uma perspectiva sócio-histórica, ser compreendida no diálogo que estabelece com as vozes provenientes dessas esferas.

A organização de parcerias entre os setores público e privado dirigidas à esfera escolar tem início no Brasil na década de 1990. Gatti (1994), ao problematizar as questões relativas à política educacional brasileira nesse período, ressalta a importância de coadunar, nas ações educativas, o diálogo entre a União, os estados e municípios com as ações provenientes de outros setores da sociedade.

As alianças e parcerias devem ser ampliadas ao setor privado, às comunidades locais, aos sindicatos, grupos religiosos, organizações não- governamentais de modo geral, associações diversas. É preciso conjugar todos os esforços e recursos possíveis para atender aos novos desafios, tendo presente que os recursos e as iniciativas do Estado são insuficientes. [...] mobilizar alianças em setores não-governamentais pode trazer uma grande contribuição com a mobilização de novos recursos, novas formas de atuação, flexibilidade de meios e idéias variadas. (GATTI, 1994, p. 18).

26

De acordo com Peroni et al. (2009), a denominação “terceiro setor” foi construída com o estabelecimento de três esferas sociais: o Estado, “primeiro setor”, o mercado, “segundo setor” e a sociedade civil, “terceiro setor”. O terceiro setor abrange as organizações não governamentais (ONG), fundações e demais atividades sociais formais ou informais.

Observamos, no discurso da autora, que a necessidade de firmar parcerias entre diferentes setores da sociedade com vistas ao desenvolvimento das ações educativas é ressaltada juntamente com o apontamento da ineficiência do Estado em controlar sozinho essas questões, julgamento que reflete a conjuntura política e econômica presente no contexto mundial nesse período.

A adoção de políticas neoliberais no cenário brasileiro na década de 1990 provoca um movimento que descentraliza o papel do Estado, diminuindo sua participação nas questões sociais e veiculando aos demais setores da sociedade a lógica do mercado. Esse movimento propicia a participação de iniciativas privadas e organizações do Terceiro Setor (ONGs) em áreas e atividades até então sob o controle do Estado, como pode ser exemplo o campo da educação (SILVA, 2011).

A inserção desses programas na esfera escolar tem como objetivo provocar mudanças nos processos que ali se realizam, por meio de intervenções em diferentes aspectos da prática pedagógica, principalmente aqueles voltados para o aumento dos índices de aproveitamento dos alunos. Sob essa lógica e para Freitas (2012), a educação é vista como promotora do crescimento econômico e instrumento de manutenção do modelo capitalista, atribuindo-se ênfase aos resultados obtidos e não ao processo.

Também para Peroni et al. (2009, p.30), os programas direcionados à busca da qualidade nos processos educativos e guiados pelo prisma mercadológico sustentam-se “na perspectiva da eficácia e sucesso escolar”, o que acentua, para Freitas (2012), as desigualdades educacionais presentes no campo da educação, agindo como força que produz efeitos danosos nesse ambiente.

Conforme Shiroma (2003), no período das reformas educacionais brasileiras iniciadas na década de 1990, a publicação de documentos promotores de discursos aparentemente agradáveis ao senso comum, mas que traziam em seu bojo noções como as de competência, qualidade e produtividade oriundas de uma lógica mercadológica, atribuiu ao professor a responsabilidade de dar um retorno às demandas da sociedade de acordo com essa perspectiva.

Ante esse entendimento, a formação de professores adquire caráter de funcionalidade e, assim, o intuito é preparar o professor para torná-lo capaz de desenvolver programas de resultados. Por essa ótica, “a reforma educacional brasileira dos anos 1990 visava estimular a criação de novos caminhos para que professores adquirissem um

conhecimento profissional que priorizasse as habilidades práticas a ele associadas.” (SHIROMA, 2003, p. 63).

Os programas educacionais construídos em parceria com outros setores da sociedade, como a OLP, que se inserem no cotidiano escolar visando provocar mudanças nas ações realizadas nesse ambiente, precisam estar atentos ao papel do professor em sua prática diária como mediador de propostas, pois para efetivarem-se nas ações didáticas, as ações desses programas demandam um processo de apropriação consciente por seus agentes.

Diante desse entendimento e considerando que o programa OLP deixa à mostra a inserção da lógica neoliberal na educação, faz-se relevante a discussão sobre os recursos formativos utilizados pela Olimpíada.

2.2 FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO DO