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As políticas neoliberais no contexto de crise do capitalismo monopolista

No documento LUCIENE MARIA DE SOUZA (páginas 125-130)

Nessa perspectiva consideramos importante destacar alguns argumentos em torno do caráter que assume o projeto neoliberal em relação à reforma do Estado e suas influências no campo educacional e no mundo do trabalho, demonstrando como as políticas neoliberais têm influenciado diretamente essas categorias nas últimas décadas.

Segundo Mello (1991) a corrente neoliberal que se desenvolve na Europa em meados do século XIX, é a lógica revisitada do liberalismo clássico. A doutrina liberal tem suas origens na Inglaterra do século XVIII, estendendo-se em seguida pela França e por grande parte da Europa Ocidental, tendo como um dos principais fundamentos que os homens, movidos por leis naturais, deveriam dispor de liberdade para dar vazão aos seus instintos egoístas e que, ao fazer isto, estariam promovendo benefícios a toda a sociedade, mesmo que não fosse esta a sua intenção. Na mesma perspectiva, Lucena afirma que:

Entre as ações do capital para a busca de uma saída para a crise da década de 1970, o neoliberalismo se apresentou como um braço político que não pode ser desconsiderado. Ele justificou mudanças impostas pelo capital como garantia de sua reprodução; atuou visando a estabelecer a individualidade em detrimento da coletividade; afirmou o fim da luta entre o capital e o trabalho, pois os conflitos poderiam ser resolvidos dentro dos interesses do primeiro. (LUCENA, 2004, p.117).

O neoliberalismo reinventa o liberalismo clássico, introduzindo novos conceitos, porém, mais conservador. Assim, podemos compreender o neoliberalismo como complexo processo de construção hegemônica, ou seja, um ambicioso projeto de reforma ideológica de nossas sociedades em que uma série de profundas políticas orienta para uma drástica reforma tanto no campo da educação quanto no mundo do trabalho.

Um dos fundadores da doutrina neoliberal mais conhecido é Friedrick Hayek. Segundo ele, as raízes da crise do sistema capitalista estavam localizadas no poder excessivo dos sindicatos e movimentos operários que reivindicavam salários maiores e gastos sociais pelo Estado. Assim, a doutrina neoliberal pregava um Estado forte em sua capacidade de romper com os sindicatos, mas fraco em todos os gastos sociais e nas intervenções econômicas. Para Paulani (2005), Hayek no livro “O caminho da servidão” é um defensor apaixonado contra qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado, para ele, uma ameaça fatal não só à liberdade econômica como também à política. A obra desse autor transforma-se numa espécie de “bíblia da doutrina

neoliberal” a ser seguida por todos os países que priorizam uma verdadeira liberdade econômica. Na visão de Hayek qualquer intromissão do Estado torna-se perniciosa e, nessa medida, irracional; ela afetaria a liberdade individual e dessa maneira estaríamos todos caminhando novamente para a tão temida servidão. Diante disso, Anderson define o neoliberalismo como sendo:

Um movimento ideológico, em escala verdadeiramente mundial, como o capitalismo jamais havia produzido no passado. Trata-se de um corpo de doutrina coerente, autoconsciente, militante, lucidamente decidido a transformar todo mundo à sua imagem, em sua ambição estrutural e sua extensão internacional. (ANDERSON, 1995, p.22).

Assim, o neoliberalismo constitui um projeto hegemônico, isto é, uma alternativa dominante à crise do capitalismo contemporâneo, que orienta um conjunto de reformas no plano econômico, político, cultural e ideológico. As bases teóricas do neoliberalismo podem ser traduzidas por algumas categorias centrais como: qualidade total, flexibilidade, descentralização, competitividade, eficácia, eficiência, descontratualização, desregulamentação, privatizações, dentre outras. Dessa forma, o neoliberalismo é uma nova forma de organização socioeconômica, com um novo papel para o Estado diante das políticas públicas. Destarte, com a hegemonia da doutrina neoliberal, temos uma proposta de reforma do próprio Estado que busca deixar de ser intervencionista na economia e nos setores sociais para se tornar um estado gestor que carrega em si a racionalidade das empresas capitalistas.

É nesse sentido, que Ianni afirma que o significado do Estado-Nação tem sido alterado drasticamente desde o término da Segunda Guerra Mundial, sendo que algumas das suas características clássicas foram radicalmente modificadas.

As condições e as possibilidades de soberania, projeto nacional, emancipação nacional, reforma institucional, liberalização das políticas econômicas ou revolução social, entre outras mudanças mais ou menos substantivas em âmbito nacional, passam a estar determinadas por exigências de instituições, organizações e corporações multilaterais,

transnacionais ou propriamente mundiais, que pairam acima das nações. A moeda nacional torna-se reflexa da moeda mundial, abstrata e ubíqua, universal e efetiva. Os fatores da produção, ou as forças produtivas, tais como o capital, a tecnologia, a força de trabalho e a divisão do trabalho social, entre outras, passam a ser organizadas e dinamizadas em escala bem mais acentuada que antes, pela sua reprodução em âmbito mundial. (IANNI, 1996, p.49).

É importante ressaltar, no entanto, que quando falamos de Estado-Nação submissos aos interesses do mercado estamos nos referindo ao Estado-Nação dos países periféricos e não dos países desenvolvidos, como exemplo, os Estados Unidos. Nos países desenvolvidos o Estado-Nação continua intervindo a favor dos interesses de suas empresas transnacionais. Segundo Boron (2002), vale ressaltar que se no “coração” dos países desenvolvidos há um reforço da organização estatal, no entanto, a história no mundo da periferia é completamente diferente. Sob a égide ideológica do neoliberalismo, os Estados Nacionais dos países periféricos foram radicalmente enfraquecidos e conseqüentemente submetidos às influencias das grandes empresas transnacionais e das políticas dos países desenvolvidos. Boron (2002) salienta ainda que essas empresas transnacionais por seu alcance e pela categoria de suas operações, sempre possuem uma base nacional e, para ter êxito em seus negócios elas buscam apoio nos seus governos para se manterem dentro do mercado internacional. Nesse

contexto é que Mészáros (2003, p.29), afirma que “apesar de todos os protestos em

contrário, combinados com fantasias neoliberais ao recuo das fronteiras do Estado, o sistema do capital não sobreviveria uma única semana sem o forte apoio que recebe do Estado”. Dessa forma, o Estado torna-se um instrumento imprescindível ao

desempenhar um papel fundamental no processo de acumulação capitalista. Para Boron (1999), as empresas transnacionais seriam “os novos Leviatãs”, cuja

escala planetária e gravitação social os tornam atores políticos de primeira ordem, quase impossível de controlar e causadores de desequilíbrio dificilmente reparável no âmbito das instituições e das práticas democráticas das sociedades capitalistas. Nessa conjuntura, Boron (1999, p.39), afirma que “os mercados tornaram-se crescentemente

oligopólios, sua competição é impiedosa e a gravitação de suas firmas dominantes é imensa. Os mercados projetam-se numa dimensão planetária”.

Segundo Anderson (1995), economicamente o neoliberalismo fracassou; no entanto, como doutrina ideológica nunca se conheceu no capitalismo algo tão forte e hegemônico que dominasse mentes e corações de todo o mundo. Nessa perspectiva, Paulani (2005, p.127), corrobora ao afirmar que “no plano político e no plano das idéias, porém o neoliberalismo alcançou hoje um êxito num grau insuspeitado, com o qual seus fundadores provavelmente jamais sonharam”. A autora ainda ressalta uma das características marcantes do neoliberalismo que é a idéia de que não há alternativas para seus princípios, nos apresentando como sendo a única e melhor alternativa racional. Quanto mais a sociedade entender esse projeto como algo sem saída, mais hegemônico

ele se torna, apontando que o resta é adaptar-se a ele. Como bem afirma Paulani(2005,

p.129), “nesse momento, as condições materiais em que se desenvolve o capitalismo possibilitam que esse ideário mostre-se, sem disfarce, como o discurso nu e cru do capital”.

Dessa forma, Antunes (2002b) salienta que a base material do projeto político e ideológico neoliberal é o processo de reestruturação produtiva do capital. O capital

como resposta à sua crise, iniciou um processo de reorganização de si mesmo ede seu

sistema ideológico e político de dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento do neoliberalismo que adotou políticas como privatização do Estado, a desregulamentação dos direitos do trabalho e a desmontagem do setor produtivo

estatal. As conseqüências dessas mudanças foium intenso processo de reestruturação da

produção e do trabalho, com o propósito de recuperação do capital. Como bem afirma Lucena (2004), as respostas do capitalismo monopolista à crise da década de 1970 estão trazendo profundas mudanças ao ser social que vive do trabalho. A exclusão social, a pobreza, a violência e o alto índice de desemprego estrutural afetam a classe trabalhadora levando à sua fragmentação e precarização num cenário de reestruturação produtiva do capital.

2.6 Reestruturação produtiva do capital e a nova configuração da classe

No documento LUCIENE MARIA DE SOUZA (páginas 125-130)