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CAPÍTULO 2 O BRASIL NA ORDEM ECONÔMICA GLOBALIZADA: A

2.1 Breves considerações sobre a economia brasileira a partir da segunda metade do século

2.1.2 As relações comerciais do Brasil: a evolução das exportações

A estratégia de se promover a industrialização de forma articulada ao capital estrangeiro, a partir dos anos 1950, visou, de fato, integrar a economia do país ao sistema capitalista internacional. Desta forma, o objetivo consistia em “industrializar”, não somente para suprir o mercado interno, mas para atender a um mercado internacional promissor.

Conforme Selingardi-Sampaio (1988, p. 9), no período de 1950 a meados dos anos 1980, o país teria evoluído da condição de “[...] predominantemente exportador de matérias-primas em bruto ou semi-elaboradas para a de país também exportador de produtos finais.”.

Com o esgotamento do modelo de substituição de importações71, as exportações tiveram que ser ampliadas e diversificadas. Para tanto, o governo brasileiro implementou medidas, tais

71De acordo com Bresser-Pereira (1977, p. 126-27), o esgotamento deste modelo ocorre quando “[...] os bens de consumo simples já foram todos substituídos e agora importa substituir a importação de bens que ou utilizam uma tecnologia excessivamente complexa ou possuem economias de escala muito elevadas [...] Alguns países, que possuem um mercado interno mais amplo, logram avançar mais no processo substitutivo. Instalam a indústria automobilística, desenvolvem a indústria de insumos básicos e de bens de capital. Mas também eles devem parar em determinado momento, quando não se trata mais de diversificar infinitamente a produção, mas de ampliar a produção de setores industriais já instalados quando [...] se depende da ampliação do mercado.”.

como a criação de corredores de exportação, a formação de trading companies, e a instituição de incentivos cambiais, fiscais e creditícios. Além dos já citados, especificamente em relação aos investimentos estrangeiros, dentre os incentivos concedidos, destacam-se a assinatura do “Acordo de Garantia de Investimentos”, entre os governos brasileiro e estadunidense, e os estímulos às exportações oferecidos a grandes empresas, extensivos às multinacionais ou suas filiais instaladas no Brasil. (SELINGARDI-SAMPAIO, 1988, p. 23-24)72.

Baer (2009, p. 97-99), ao analisar a economia nacional no período 1968-74 (o do chamado “Milagre Econômico”), relata o notável crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), atribuindo ao setor industrial a liderança em tal expansão. Neste contexto, as exportações de produtos industrializados teriam alcançado uma maior participação, passando de 7,2% em 1965 para 27,7% em 1974, ao passo que, no mesmo período, as de café declinaram, de 42% a 12,6% do valor total exportado.

Com o “choque do petróleo”, em fins de 1973 e seus efeitos negativos na economia nacional73, o governo, temoroso de que o país adentrasse em um período de estagnação econômica, acabou optando por uma política de altas taxas de crescimento, baseada em empréstimos financeiros no exterior, acarretando uma acentuada elevação da dívida externa, por várias décadas.

Embora nos anos 1970 tenha havido forte crescimento das exportações (e vários incentivos para tal), a balança comercial apresentou saldo negativo na maior parte da década, o que se explica, em parte, de acordo com Baer (2009, p. 278), pelos “[...] ambiciosos programas de investimentos do governo e empresas multinacionais (os quais) contribuíram para o aumento da importação de bens de capital e matérias-primas”.

Os anos de 1980 caracterizaram-se por uma conjuntura econômica de endividamento externo, recessão e de inflação, porém, conforme o autor (p. 278), teria havido uma considerável abertura da economia, com aumento das exportações.74 De acordo com Selingardi-Sampaio (1988, p. 23), grande parte destas exportações “[...] corresponderam aos produtos

72Segundo Baer (2009, p. 96), as políticas econômicas adotadas pelos regimes pós-1964 deram ênfase ao comércio exterior e, a fim de incentivar as atividades de exportação, o governo criou mecanismos tais como revogação de tarifas, incentivos fiscais e crédito subsidiado.

73A dependência do Brasil quanto às importações de petróleo teria gerado déficit tanto na balança comercial quanto no saldo em conta corrente.

74 Dificuldades enfrentadas, no início da década, para se obter empréstimos junto aos bancos estrangeiros, e os déficits em conta corrente gerados pelo pagamento de juros da dívida, levaram à necessidade de ajustes, a partir dos quais houve recuperação da economia. Tal recuperação “[...] estava ligada a um aumento exemplar das exportações [...]”. (BAER, 2009, p. 125-26).

industrializados, especialmente produtos siderúrgicos, suco de laranja, caldeiras e aparelhos mecânicos de transporte”.

Fonte: SECEX/MIDIC, 2016

A balança comercial recuperou-se a partir de 1981, contudo, na segunda metade da década de 1990, apresentou um saldo negativo. (FIGURA 2).

No contexto de globalização da economia capitalista, a adoção de uma política de cunho neoliberal possibilitou a abertura do país a novos investimentos, os quais aumentaram consideravelmente a partir de meados da referida década, bastante associados às privatizações. Com a implantação do Plano Real em 1994 e a valorização da moeda nacional, as importações aumentaram em detrimento das exportações, situação que veio a se reverter em fins da década, após os efeitos das crises asiática e russa ocorridas nesta época.

A fim de se diminuir o déficit comercial, algumas medidas foram tomadas, dentre as quais “[...] a desvalorização do real em 1999 que estimulou as exportações e diminuiu a demanda de importações [...]”, contribuindo para a geração de um superávit comercial a partir do ano 2001. (BAER, 2009, p. 278). Por outro lado, ainda conforme o autor (p. 278), “O dinâmico setor de exportações refletiu o elevado crescimento geral da economia mundial e a elevada demanda por muitos dos produtos que o Brasil estava exportando”.

A dependência em relação às exportações remete às considerações de Santos (2004, p 111), segundo o qual “Os países, cuja renda vem em grande parte das exportações, são

-40 -20 0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 220 240 260 19 5 0 19 5 3 19 5 6 195 9 19 6 2 19 6 5 19 6 8 19 7 1 19 7 4 19 7 7 19 8 0 19 8 3 19 8 6 19 8 9 199 2 19 9 5 19 9 8 20 0 1 20 0 4 20 0 7 20 1 0 20 1 3 U S $ b il h õ es F O B

Exportação Importação Saldo Comercial

Figura 2 Evolução da balança comercial brasileira – 1950 a 2013 (em bilhões de dólares)

prisioneiros das crises e flutuações da economia mundial, que não tem meios para dominar. Estes países estão destinados a se voltar mais para o exterior que para o interior.”.

Como pode ser observado na figura 2 a balança comercial apresentou, ao longo da década de 2000, elevados saldos comerciais, até então não atingidos, cujo apogeu deu-se em 2006, com superávit de US$ 46,5 bilhões. O considerável aumento das exportações, ocorrido a partir de 2001, deveu-se, sobremaneira, à crescente participação de produtos básicos na pauta exportadora brasileira.75 Tal crescimento, entretanto, contrasta com a tendência registrada em

décadas anteriores. (TABELA 1).

A tabela 1 indica a evolução das exportações brasileiras por fator agregado, de 1965 a 2014. Assim, observa-se que, em meados dos anos 1960, os básicos predominavam no total de produtos exportados, correspondendo a 81,6% de participação No primeiro decênio, tais gêneros aumentam quanto ao valor total (US$ 1,3 bilhões em 1965 para US$ 5 bilhões em 1975), e permanecem como maioria, chegando a 58% das exportações. Nas décadas seguintes, se em números absolutos o aumento foi contínuo, em termos percentuais os gêneros básicos declinaram para 33,3% em meados dos anos 1980, 27,8% em 1990, 23,6% em 1995, e 22,8% no ano 2000.

Contudo, a partir de 2001, os básicos aumentam sua participação percentual de forma progressiva, passando de 26,4% (US$ 15,3 bilhões) no citado ano, para 36,9% (US$ 73,02 bilhões) em 2008. No ano seguinte, ocorreu uma diminuição no valor das exportações (quando totalizou US$ 61,9 bilhões), assim como entre 2011 e 2014 (ao declinar de US$ 122,4 bilhões para US$ 109,5 bilhões), e desde então tais produtos ultrapassaram os 40% das exportações, alcançando, em 2014, 48,7% do total, nível semelhante ao registrado em fins dos anos 197076.

Por outro lado, a participação de produtos manufaturados aumentou quase que ininterruptamente, ao longo de todo o período analisado, tanto em números absolutos quanto em percentual (TABELA 1). Assim, observa-se um considerável “salto” já na primeira década, de 8,2% (US$ 0,13 milhões) em 1965 para 29,8% (US$ 2,58 bilhões) em 1975, sendo que em meados dos anos 1980 já correspondiam a maioria do total exportado, ou seja, 54,9%, (totalizando US$ 14,06 bilhões), situação que perdura até 2007, com 52,3% (US$ 83,94 milhões).

75Hespanhol (2013, p. 62) destaca o fato de que apesar do setor do agronegócio ter gerado saldos comerciais favoráveis na balança comercial brasileira, “[...] a produção de commodities agrícolas é altamente concentradora de terra e de renda, o que concorre para aprofundar ainda mais o já elevado nível de exclusão social da população brasileira”.

Tabela 1 - Evolução das exportações brasileiras por fator agregado – 1965 a 2014

ANO Básicos Semimanufaturados Manufaturados Valor* % Valor* % Valor* % 1965 1.301 81,6 154 9,7 130 8,2 1970 2.049 74,8 249 9,1 416 15,2 1975 5.027 58,0 849 9,8 2.585 29,8 1980 8.488 42,2 2.349 11,7 9.028 44,8 1985 8.538 33,3 2.758 10,8 14.063 54,9 1990 8.746 27,8 5.108 16,3 17.011 54,2 1995 10.969 23,6 9.146 19,7 25.565 55,0 2000 12.562 22,8 8.499 15,4 32.528 59,0 2001 15.342 26,4 8.244 14,2 32.901 56,5 2002 16.952 28,1 8.964 14,9 33.001 54,7 2003 21.179 29,0 10.943 15,0 39.654 54,3 2004 28.518 29,6 13.431 13,9 52.948 54,9 2005 34.721 29,3 15.961 13,5 65.144 55,1 2006 40.285 29,2 19.523 14,2 75.018 54,4 2007 51.596 32,1 21.800 13,6 83.943 52,3 2008 73.028 36,9 27.073 13,7 92.682 46,8 2009 61.957 40,5 20.499 13,4 67.349 44,0 2010 90.005 44,6 28.207 14,0 79.563 39,4 2011 122.457 47,8 36.026 14,1 92.929 36,3 2012 113.454 46,8 33.042 13,6 90.878 37,5 2013 113.023 46,7 30.526 12,6 93.800 38,7 2014 109.557 48,7 29.066 12,9 81.684 36,3 Fonte: SECEX/MIDIC, 2016. (adaptado).

Em 2008, apesar de ter alcançado US$ 92,68 bilhões, a participação dos manufaturados declina para menos de 50% do total, registrando 46,8% já no referido ano, tendência que prevalece nos anos subsequentes. Desta forma, em 2009 decresce para 44% (US$ 67,34 bilhões), declinando sucessivamente até 2011, com 36,3% (US$ 92,9 bilhões), sendo que, após ligeira recuperação nos dois anos seguintes, com 37,5% em 2012 e 38,7% em 2013 (quando alcançou US$ 93,8 bilhões), recuou para 36,3% (US$ 81,68 bilhões) em 2014.

A respeito dos semimanufaturados, com base ainda na tabela 1, observa-se que, ao longo das cinco décadas em questão, houve uma participação pouca expressiva destes produtos, com destaque somente no ano de 1995, quando atingiu 19,7% do total exportado, correspondendo a US$ 9,14 bilhões. A partir de meados da década de 2000, contudo, verifica-se, em valores absolutos, que os semimanufaturados apresentaram um crescimento mais pronunciado (em 2005 atingiram US$ 15,96 bilhões, chegando a US$ 36,02 bilhões em 2011, e em 2014 US$ 29,06 bilhões), embora em termos percentuais não tenha ultrapassado a média de 12 a 14% de participação.

Comparando-se os produtos básicos com os manufaturados, percebe-se que, a partir de 1980, a participação destes últimos suplanta a dos primeiros, tanto em números absolutos quanto relativos, situação que perdura praticamente nas três décadas seguintes. Em 2010, porém, tal quadro se inverte, já que os básicos superam os industrializados, respectivamente, com US$ 90 bilhões ou 44,6% e US$ 79,56 bilhões ou 39,4% do total. Nos anos seguintes, tal quadro prevalece, com os gêneros básicos ultrapassando os industrializados, tanto no valor das exportações quanto na participação percentual. (TABELA 1). A evolução das exportações brasileiras por fator agregado pode ser visualizada também com base na figura 3.

Com base no exposto, verifica-se, no decorrer da segunda metade do século XX, a participação do Brasil na nova divisão internacional do trabalho, não somente como “receptor” de filiais de empresas multinacionais, mas também como exportador de produtos industrializados. Ao mesmo tempo, o país permaneceu na condição de exportador de matérias- primas, tanto para países centrais como para aqueles também subdesenvolvidos. O crescimento nas exportações de produtos básicos e semimanufaturados, ao longo dos anos 2000, reflete a importância assumida pelas commodities agrícolas, minerais e agroindustriais no cenário econômico nacional, o que se deve, em grande medida, à valorização destes produtos no mercado internacional, e à demanda impulsionada pela entrada de um novo parceiro comercial, que consiste na China.

Portanto, é a esta forma da participação brasileira na divisão internacional do trabalho - como exportador de produtos primários, e também de semimanufaturados - que nos reportaremos no próximo tópico.

Figura 3 Evolução das exportações brasileiras por fator agregado – 1965 a 2014

Fonte: SECEX/MIDIC, 2016. (adaptado).

2.2 A inserção do Brasil na economia globalizada como exportador de commodities a partir da