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Capítulo 4: Fundamentos e trajetória metodológica da pesquisa

1- As Representações Sociais e a pesquisa qualitativa

É oportuno lembrar que, embora a pesquisa qualitativa confira uma acentuada presença nas investigações acadêmicas, a partir dos anos sessenta do século passado, Melucci (2005, p. 39) avisa-nos que “o termo pesquisa qualitativa aplica-se, de fato, a um percurso histórico muito amplo que funda as suas raízes nas origens da sociologia e não seria correto referi-lo, unicamente, àquilo que emergiu nas últimas décadas”. Porém, o autor esclarece que os modelos dessa pesquisa mudaram, fundamentalmente,

em função da definição da nova sociologia da ciência, do surgimento dos novos campos e das novas áreas de pesquisa. Como consequência dessas mudanças haveria a necessidade de promover uma descontinuidade entre o modelo tradicional da pesquisa qualitativa e aquele que está presente hoje. Para esse autor “a descontinuidade está no fato de que a relação observador-observado e a dimensão autorreflexiva se transformam no aspecto discriminante da nova pesquisa qualitativa”.

Com efeito, esta tese é produto de uma pesquisa de natureza qualitativa, por considerar a realidade social e o próprio homem como as fontes e o produto da humanidade historicamente construída, e essa natureza é adequada à investigação em Representações Sociais. Ao referir-se a essa adequação Spink (1995b, p.103) salienta que,

A pesquisa sobre as Representações Sociais, estando comprometida com situações sociais naturais e complexas – requisito imprescindível para que sejam acessadas as condições de sua produção –, é necessariamente uma pesquisa qualitativa.

A natureza qualitativa desta pesquisa pretendeu ser o que Triviños (1987, p.125) define como “desreificadora dos fenômenos, do conhecimento e do ser humano”. Portanto, o professor que no ensino superior é formador de professores foi colocado no centro da investigação por ser um sujeito social, cuja posição influencia a realidade profissional docente, não apenas no ensino superior, mas em todos os níveis de ensino. A pesquisa qualitativa possibilitou, ainda, a interação necessária entre a pesquisadora e os professores entrevistados e os selecionados para os trabalhos com os grupos focais, o que favoreceu a apresentação de longos pareceres, discussões e relatos de experiências, que tornaram mais acessíveis as representações sociais.

No entanto, importa esclarecer que o fato desta pesquisa possuir uma natureza qualitativa, não impede que a ela sejam somados dados quantitativos, e, ainda, ao declarar a opção pela pesquisa qualitativa, não significa que haja algum esforço no sentido de justapor pesquisa qualitativa e quantitativa como modelos competitivos de pesquisa social. Ao utilizar no processo desta investigação, instrumentos como o questionário, por exemplo, mostra-se que a polêmica entre a pesquisa qualitativa e a pesquisa quantitativa é estéril. É pertinente, ainda, destacar que pesquisas que focam dados quantitativos, também, são utilizadas nas representações sociais como testemunha a pesquisa desenvolvida por Moscovici (1961) sobre a psicanálise e a sociedade parisiense. Desse modo, os dados quantitativos revelados em alguns espaços deste trabalho necessitam de qualificação para a sua compreensão, assim como, os dados qualitativos são categorizados para melhor interpretação.

É possível perceber que as questões propostas aos sujeitos da pesquisa os conduziam à visitação das suas formas de compreender o processo de formação e exercício profissional docente e seus determinantes. E, nesse processo, expressam-se as representações sociais elaboradas e em elaboração sobre o poder profissional docente.

Na pesquisa qualitativa o trabalho de campo compõe uma etapa fundamental, pois ao invés de trazer os entrevistados para o espaço (ou laboratório) do pesquisador sob o domínio de uma relação estruturada, no caso das entrevistas, a pesquisadora foi ao espaço em que os sujeitos sociais pesquisados integram uma relação de intersubjetividade com os seus colegas de trabalho e onde podem interagir melhor com o pesquisador. Sendo assim, o campo, nesta pesquisa, constituiu-se dos diversos ambientes de trabalho dos professores, ou seja, as salas de aula, salas de estudo, bibliotecas, gabinetes e outros espaços oferecidos pelas universidades e faculdades.

Sem essa interação poderíamos estar compondo o “trabalho de survey” lembrado por Malinowski (1975, p.54), ou seja, nos deparar com um gigantesco acervo de informações, “com um excelente esqueleto” (...) ao qual falta, entretanto, carne e sangue”. Isso significa que pode-se apreender um grande arcabouço de informações acerca dos ambientes, das condições de trabalho e das práticas dos professores formadores da docência, mas não se perceber a influência desse acervo nas suas vidas cotidianas e, consequentemente, dificultar o acesso às representações sociais.

Para apreender as representações sociais dos professores sobre o poder da profissão docente, a pesquisa, ora apresentada, contou com entrevistas semi- estruturadas e trabalho com grupos focais. O recurso a essas técnicas requereu a escuta diligente do que era dito, condição para captar a forma e o conteúdo presentes nas falas dos professores participantes da pesquisa.

Além desses meios, foram utilizados questionários e documentos que potencializaram a compreensão das informações recolhidas, pois a contínua conversação entre os indivíduos, que repercute as representações sociais, pode ser acessada, também, por outras fontes. Concordando com a perspectiva de Spink (1995b, p.100) para apreender esse incessante diálogo, o pesquisador deve fazer uso de:

Material espontâneo seja ele induzido por questões, expresso livremente em entrevistas ou já cristalizado em produções sociais, tais como livros, documentos, memórias, material iconográfico ou matérias de jornais e revistas.

Foram aplicados, também, questionários a uma amostra de licenciandos com o objetivo de compreender elementos do universo de formação profissional dos futuros professores da educação básica, que possivelmente estariam associados às representações sociais dos seus professores sobre o poder profissional da docência.

Os procedimentos de coleta de informações requerem certa criatividade da pesquisadora, devido à necessidade de promover nos sujeitos da pesquisa, a interação que provocaria a imersão das suas representações. Contudo, a manifestação da criatividade não diminui o rigor da metodologia que a apreensão das informações requer, ao contrário, o ato criativo promove outras possibilidades de captação de informações enriquecendo a sua análise.

A definição dos instrumentos e técnicas presentes nesta investigação deve-se, em grande parte, ao estudo piloto realizado.