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As tarefas na matemática

No documento Joana Maria Bettencourt Pacheco de Castro (páginas 58-65)

CAPÍTULO 2 – CULTURA DE ESCOLA E DE AULA

2.2 C ULTURA DE AULA

2.2.3. As tarefas na matemática

As tarefas matemáticas, o modo como são apresentadas, como são interpretadas e exploradas como são resolvidas nas aulas são um ponto chave da aprendizagem. As Normas Profissionais para o Ensino da Matemática (NCTM, 1991/1994) defendem uma nova orientação curricular para o ensino da Matemática, nessa abordagem estabelecem a distinção entre tarefa e atividade. Os autores apresentam o conceito de tarefa:

As tarefas são os projetos, questões, problemas, construções, aplicações, e exercícios em que os alunos se envolvem. Elas fornecem os contextos intelectuais para o desenvolvimento matemático dos alunos. (NCTM, 1994, p. 20)

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Ponte (2012) esclarece que tarefas são ferramentas de mediação fundamentais no ensino e aprendizagem da matemática, elas podem ajudar a mobilizar e, a potenciar, conceitos e processos matemáticos. Dependendo do modo como a tarefa é proposta, do como se organizam os alunos e o ambiente de aprendizagem assim podem dar lugar a atividades diversas. A atividade corresponde a uma ou mais tarefas realizadas de uma certa situação. É pela atividade e pela reflexão sobre a mesma que o aluno aprende. Contudo a atividade teve em conta a tarefa proposta e a situação criada pelo professor.

O NCTM (1994) propõe que o professor de Matemática deve colocar tarefas aos alunos que sejam baseadas: (i) numa Matemática correta e significativa; (ii) no conhecimento das compreensões, interesses e experiências dos alunos, e (iii) no conhecimento das diversas maneiras como diferentes alunos aprendem Matemática.

No âmbito da teoria da atividade, Christiansen e Walther (1986) distinguem claramente a tarefa da atividade.

A atividade humana realiza-se através de um sistema de ações, que são processos dirigidos para objetivos causados pelo motivo da atividade. A atividade é realizada através destas ações, que podem ser vistas como as suas componentes. A atividade existe apenas nas ações, mas atividade e ações são entidades diferentes. Por isso, uma ação específica pode servir para realizas diferentes atividades, e a mesma atividade pode dar origem a diferentes objetivos e desse modo iniciar diferentes ações ... Uma tarefa é então ... o objetivo de uma ação. (Christiansen & Walther, 1986, p. 255-256)

Para eles a proposta de tarefas e a condução da sua resolução na sala de aula constituem a principal forma como se ensinar Matemática: A tarefa proposta torna-se o objeto da atividade dos alunos.

A atividade pode ser física ou mental, diz respeito ao aluno e ao que faz no contexto proposto. Por sua vez a tarefa representa o objeto de cada uma das ações em que a atividade de desdobre e é exterior ao aluno uma vez que geralmente é proposta pelo professor e interpretada pelo aluno.

Stein e Smith (1998) apresentam uma tipologia sobre as tarefas usadas na aula baseadas na aprendizagem dos alunos, distinguem as tarefas entre as de “baixo” e “alto” nível de exigência cognitiva. Consideram tarefas de “baixo” nível cognitivo as de memorização e os procedimentos sem conexões e, as tarefas de alto nível cognitivo consideram os procedimentos com conexões e o fazer matemática.

Kirshner (2000, citado por Ponte em 2012) apresenta-nos uma outra tipologia que tem por base a intenção do professor: exercícios, provas e puzzles. Os exercícios são tarefas ao serviço da habituação do aluno, o refinamento de capacidades e a aprendizagem da memória. As provas

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(probes) são tarefas ou questões que têm em vista avaliar a compreensão dos alunos, servem como veículos para a sua aprendizagem. Os puzzles ou problemas não rotineiros são tarefas para as quais não se dispõe de um método de resolução e precisa de empregar a sua curiosidade e persistência, a sua criatividade e a sua sensibilidade.

Por seu lado Ponte (2005) considera duas dimensões nas tarefas, o grau de desafio e o grau de estrutura. O grau de desafio matemático depende da perceção da dificuldade da questão entre reduzido e elevado. O grau de estrutura varia entre o aberto e fechado, grau fechado significa que é dito o que dado e o que é pedido, grau aberto existe alguma indeterminação pelo menos num dos aspetos (figura 2.5). Ponte obtém assim quatro tipos de tarefas:

- o exercício, no qual a tarefa é fechada e o desafio reduzido (2º quadrante); - o problema, no qual considera a tarefa fechada e o desafio elevado (3º quadrante); - a investigação que apresenta a tarefa aberta e o desafio elevado(4 quadrante);

- o 1º quadrante, das tarefas abertas e fáceis, ou seja as de exploração.(Ponte, 2005, pag 8)

Para o autor a linha de demarcação nem sempre está bem definida uma vez que no tipo de tarefa o ser fácil ou não depende da experiência dos alunos e do trabalho que realizam na aula.

Figura 2.5 . Tipologia das tarefas quanto ao grau de desafio e estrutura (Ponte, 2005, p. 8).

Ponte considera ainda importantes considerar mais duas dimensões nas tarefas, a duração e o contexto. Na verdade uma tarefa pode levar desde poucos minutos a horas ou dias ou meses. A Duração pode ser curta ou longa como indica a (Figura 2.6). Um exemplo de longa duração tem a ver com os projetos. Se por um lado a tarefa de longa duração pode ser rica, permitindo aprendizagens profundas e interessantes por outro lado pode- se correr o risco dos alunos se desmotivarem e perderem o interesse perdendo tempo com coisas irrelevantes e frustrantes.

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Figura 2.6. Diversos tipos de tarefas relativas à duração (Ponte, 2005, p.10)

Segundo Ponte o contexto é uma dimensão importante a ter em conta com dois pólos opostos, as tarefas são enquadradas num contexto da realidade ou as tarefas formuladas em termos puramente matemáticos. Skovsmose (2000) define ainda um terceiro, intermédio, que designa por semi- realidade, no qual se apresentam situações com a aparência de reais mas que são artificiais, são concebidas exclusivamente para fins de aprendizagem (figura 2.7).

Figura 2.7 Diversos tipos de tarefas, quanto ao contexto (Ponte, 2005, p. 11).

Skovsmose considera na sala de aula dois campos, o dos “exercícios” e o dos “cenários de investigação” no qual os alunos são obrigados a colocar questões e a procurarem explicações. Nesse contexto de dois campos e três tipos de tarefas encontra seis ambientes, três ligados à matemática escolar (relação entre o campo dos exercícios e o tipo de tarefas), e, três ligados à matemática investigativa (campo dos cenários de investigação com os três tipos de tarefas), defende, no entanto, que a educação matemática se deve mover nos seis ambientes constituídos e não só na matemática escolar.

Num estudo, Bispo, Ramalho e Henriques (2008), ao retratarem a tipologia de tarefas usuais na sala de aula, constataram que a maioria das tarefas propostas aos alunos tem como objetivo a reprodução de técnicas e de algoritmos básicos, aspetos que representam os exercícios.

Palm (2009) tem vindo a desenvolver a teoria das situações autênticas, centra a sua atenção nos problemas verbais caraterizando-os como descrições em linguagem textual de situações que assumem ser compreensivas e nas quais as questões matemáticas são contextualizadas. Palm (2009) considera que o fundamental é que as tarefas sejam representativas”, o que, por sua vez depende do modo como traduzem uma situação de forma completa (comprehensivness)e fidedigna (fidelity). Considera diversos fatores como decisivos para a representatividade: os acontecimentos; a questão a resolver; a informação e os dados indicados (na sua existência,

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realismo e especificidade); a apresentação (no seu modo e na sua linguagem); as estratégias de solução (disponibilidade e plausibilidade experimentadas); as circunstâncias (disponibilidade de ferramentas externas, orientação, consulta e colaboração, oportunidades de discussão, tempo e consequências); as exigências da solução (método de solução e resposta final); e o propósito no contexto apresentado.

Ao falar da planificação do professor, Ponte (2005) defende que este deve considerar tarefas de diferentes tipos, deve haver diversificação de experiências de aprendizagem e de instrumentos de avaliação. A diversidade é importante para alcançar os objetivos curriculares, uma vez que cada tarefa desempenha o seu papel na aprendizagem:

- As tarefas de natureza mais fechada (exercícios, problemas) são importantes para o desenvolvimento do raciocínio matemático nos alunos, uma vez que este raciocínio se baseia numa relação estreita e rigorosa entre dados e resultados.

- As tarefas de natureza mais acessível (explorações, exercícios), pelo seu lado, possibilitam a todos os alunos um elevado grau de sucesso, contribuindo para o desenvolvimento da sua autoconfiança.

- As tarefas de natureza mais desafiante (investigações, problemas), pela sua parte, são indispensáveis para que os alunos tenham uma efetiva experiência matemática. - As tarefas de cunho mais aberto são essenciais para o desenvolvimento de certas capacidades nos alunos, como a autonomia, a capacidade de lidar com situações complexas, etc. (Ponte, 2005, p. 17)

A diversidade das tarefas pode também envolver outras dimensões das tarefas que já foram indicadas como o contextos e a duração:

- Para que os alunos se apercebam do modo como a Matemática é usada em muitos contextos e para tirar partido do seu conhecimento desses contextos é fundamental que lhes seja proposta a realização de tarefas enquadradas em contextos da realidade (tarefas de aplicação e de modelação).

- Os alunos podem também sentir-se desafiados por tarefas formuladas em contextos matemáticos (investigações, problemas, explorações) e a sua realização permite-lhes perceber como se desenvolve a atividade matemática dos matemáticos profissionais” (p. 26).

- Tarefas de longa duração (os projetos ... no desenvolvimento de diversos objetivos curriculares. (Ponte, 2005, p. 18)

Mas não basta selecionar e diversificar as tarefas, é necessário criar um percurso de aprendizagem coerente que permita aos alunos a construção dos conceitos fundamentais e a compreensão dos procedimentos matemáticos, o domínio das notações e formas de representação bem como estabelecer conexões dentro e fora da matemática.

O modo como os alunos interpretam as representações indicadas nos enunciados das tarefas e o modo como criam e interpretam as suas representações é decisivo na

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resolução da mesma. Uma representação é uma “configuração que representa algo, de alguma forma” (Goldin, 2008, p.180).

Bruner (1999) distingue entre três tipos de representação, as ativas, as icónicas e as simbólicas. As representações ativas são as que se realizam através da ação, conhecemos muitas coisas para as quais não há imagem nem palavras e é muito difícil ensiná-la através de palavras, diagramas ou imagens. As representações icónicas dependem da organização visual ou de outra organização sensorial e de recurso a imagens de resumo. E, as representações simbólicas por palavras ou linguagem.

Algumas formas de representação, como diagramas, gráficos, expressões simbólicas, têm feito parte da matemática escolar. Infelizmente, estas representações e outras, têm sido frequentemente ensinadas e aprendidas como finalidades em si mesmas. As representações deverão ser tratadas como elementos essências no apoio à compreensão, por parte dos alunos, os conceitos e das relações matemáticas, na comunicação das abordagens, argumentos e conhecimentos matemáticos, para si mesmos e para os outros, na identificação de conexões entre conceitos matemáticos interrelacionados, e na aplicação da matemática a problemas realistas, através da modelação. (NCTM, 2007, p. 75)

Goldin (2008, citado por Ponte 2012) distingue entre representações externas e internas. As representações externas, também designadas de semióticas, têm existência física, sem papel, num ecrã de computador ou noutro suporte. As representações internas emergem no decurso da atividade do indivíduo, nas suas interações com os contextos material e social. As representações externas que um aluno na realização de uma tarefa são observáveis e pode-se tentar interpretá- las, quanto às representações internas não são observáveis, quando muito, pode-se recorrer à interpretação das representações externas e tentar perceber a representação interna e o raciocínio.

Bishop e Goffree (1986) apresentam-nos uma outra categorização, em quatro grupos, mais ligada às aulas de Matemática, os símbolos matemáticos, a linguagem verbal, as figuras e os objetos. Consideram que cada um destes tipos tem o seu próprio vocabulário ou código que precisa ser apreendido pelos alunos de forma a compreenderem as ideias matemáticas expressas. As figuras, imagens, ícones, etc. dão origem ao que podemos designar por representações pictóricas.

Para além de conhecerem diferentes representações os alunos têm ainda de saber transformar representações. Duval (2004, 2006) apresenta duas transformações de representações que considera distintas: os tratamentos e as conversões. Os tratamentos são transformações que ocorrem dentro de um mesmo registo, como resolver equações ou sistemas de equações, realizar um cálculo sem sair de um dado sistema de notação ou ainda completar uma figura utilizando critérios ou simetria. As conversões são transformações que consistem em transformar uma representação de um registo para outro registo, como a passagem de uma equação algébrica para

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a sua representação gráfica ou a passagem de um enunciado ou afirmação em linguagem natural para linguagem simbólica.

O NCTM nos Princípios e Normas para a matemática escolar (2000) refere que representações distintas focam, geralmente, aspetos diferentes de relações e conceitos complexos pelo que, para se tornarem conhecedores de conceitos matemáticos, os alunos necessitam de uma diversidade de representações que suportem a sua compreensão (p. 77).

Para Duval (2004), a aprendizagem da Matemática requer a diversificação dos registos de representação, a diferenciação entre representante e representado e a coordenação dos diferentes registros.

O modo como pensamos as tarefas, como as apresentamos aos alunos e como são trabalhadas na aula interfere com o tipo de aprendizagem conseguida. Stein e Smith (1998) propõem um quadro relativo à realização das tarefas matemáticas na sala de aula que distingue três fases (figura 2.8): (i) as tarefas como aparecem nos materiais curriculares; (ii) como são apresentadas pelo professor; (iii) como são realizadas pelos alunos.

Figura 2.8. Quadro para a análise das tarefas matemáticas (Stein & Smith, 1998).

Defendem que a tarefa apresentada aos alunos na sala de aula, escrita no quadro e complementada oralmente, nem sempre é a mesma da apresentada nos materiais curriculares (principalmente nos manuais escolares). Por sua vez, a tarefa resolvida pelos alunos, quer por questões de interpretação destes quer por informações adicionais ou experiências partilhadas complementares à apresentação já não é a mesma tarefa que a apresentada.

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