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No campo teórico-epistemológico e institucional contemporâneo brasileiro sobre o currículo, podemos encontrar, como afirmam Lopes e Macedo, produções de sujeitos investidos de legitimidade de falar sobre o currículo, conferida por sua presença em instâncias institucionalizadoras. Essas autoras consideram atuantes na produção deste campo no Brasil três grupos, fundamentados nas perspectivas teóricas: história do currículo e a constituição do conhecimento escolar, pós-estruturalista e currículo em rede (LOPES e MACEDO, 2002)22.

Os estudos sobre conhecimento escolar e currículo no Brasil se constituíram no final da década de 1980 com marcas das discussões da NSE inglesa, no Núcleo de Estudos sobre o Currículo (NEC), na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), coordenado por Antonio Flavio Barbosa Moreira, preocupados com o pensamento curricular brasileiro e com as disciplinas escolares23.

22 Todo objeto de investigação (no caso o currículo) sofre pressão do espaço de luta em torno de seus

significados - pelos estudiosos, sujeitos que lidam neste campo de força. Macedo não buscou aproximações teórica-metodológicas, mas os espaços institucionais onde o campo do Currículo está se materializando (de onde vêm a produção social do campo do Currículo): instituições de ensino e pesquisa, agências de fomento, textos publicados em GTs de Congressos. (Palestra proferida por Elizabeth Macedo, na Faculdade de Educação, da Unicamp, em 09/03/05, sobre o texto citado e uma pesquisa em andamento solicitada pelo INEP).

23 Segundo Lopes e Macedo (2002, p. 39), neste grupo encaminham-se duas linhas de estudos: uma do

pensamento curricular brasileiro (referenciando-se a Apple, Giroux e Young) e, outra, das disciplinas escolares (referenciando-se a Franklin, Goodson, Ball e Canclini). O grupo tem buscado analisar as temáticas de multiculturalismo, hibridismo e identidade nas produções de currículo. Nos estudos sobre a história das disciplinas valoriza-se certo alargamento conceitual e metodológico da história, em que ganham relevo a etno-

A perspectiva pós-estruturalista sobre currículo no Brasil, alcança destaque com as produções do grupo de Currículo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a partir da década de 1990, liderado por Tomaz Tadeu da Silva24.

Em 1994, no livro “Currículo, cultura e sociedade”, Moreira e Silva falam de Sociologia e Teoria Crítica do Currículo, apresentando o currículo como “um artefato social e cultural”, o que significava que:

ele é colocado na moldura mais ampla de suas determinações sociais, de sua história, de sua produção contextual. (...) O currículo está implicado em relações de poder, o currículo transmite visões sociais particulares e interessadas, o currículo produz identidades individuais e sociais particulares (MOREIRA e SILVA, 2002, p.7-8).

Para ambos através desta compreensão se pode aprender que “o conhecimento corporificado como currículo educacional não pode ser mais analisado fora de sua constituição social e histórica”. Situam ainda nesta obra, três temas em que se centram a Teoria Crítica e a Sociologia do currículo: ideologia, cultura, poder.

Em 1995, no livro “Territórios contestados: o currículo e os novos mapas políticos e culturais” organizado pelos mesmos autores, no entanto com textos separados, Moreira faz leitura da visão de currículo como forma de política cultural apresentada por Giroux. O currículo corresponde a uma forma de política cultural, acentuando-se a dimensão sócio- cultural do processo de escolarização. Assim, na sua leitura estão presentes elementos do pensamento democrático da perspectiva moderna:

Entender o campo do currículo como forma de política cultural demanda alçar categorias sociais, culturais, políticas e econômicas à condição de categorias primárias para a compreensão da escolarização contemporânea e de suas possibilidades emancipatórias (MOREIRA, 2001, p. 10).

Tomaz Silva (2001), nesta mesma obra, também discute o papel do poder e identidades sociais na implicação do currículo. O currículo como “o local onde se entrecruzam saber e poder, representação e domínio, discurso e regulação”. Mas, apresenta um início do aprofundamento das questões de gênero, etnia, raça, multiculturalismo, nas quais

história e o cotidiano das instituições, privilegiando a escola como uma instituição dotada de uma autonomia relativa, como uma totalidade em que o cultural e o social se apresentem mediatizados pelo pedagógico.

24 Segundo Lopes e Macedo (2002, p. 22), a base teórica deste grupo é Foucault, Hall, Derrida, Deleuze e

Guattari. A ruptura quanto à interpretação do conhecimento, é exemplificada com o fato da centralização de interesse e poder à questão econômica, sendo por eles ampliada ao relevarem nos estudos as questões de gênero, etnia e sexualidade. Salienta o alto relativismo desta perspectiva e a importância do movimento da “virada lingüística” em suas produções. Esta importância pode ser evidenciada numa classificação apresentada por Silva (2004, p. 17) no uso, entre outros, de conceitos como identidade, diferença linguagem, representação, discurso, gênero, multiculturalismo nas “teorias pós-críticas”; ao invés de ideologia, poder, classe social, emancipação e libertação, resistência, ensino-aprendizagem, avaliação, metodologia, eficiência nas “teorias criticas”.

começa a fundamentar a “perspectiva culturalista” adotada na análise da educação e do currículo.

Silva (2001, p. 201) apóia-se na compreensão de que “o currículo é uma das importantes narrativas nas quais certos grupos sociais exercem o privilegiado poder de representar o outro”, para centrar-se na questão das representações, dos grupos e interesses não representados no currículo, os que têm o poder de representá-los.

Moreira (1999) destaca novamente sua preocupação com o currículo e formação docente, adotando agora no conceito de “multiculturalismo” e de desenvolvimento de estratégias para a conscientização cultural do futuro docente.

Também em 1999, apoiado nas teorias foucaultianas, Silva (2004) passa a apresentar o currículo como “texto, discurso, documento”, como “documento de identidade”. Nega, insistentemente, elementos discursivos da perspectiva moderna de educação como a de sujeito autônomo, e novamente se apóia nos conceitos foucaultianos de governança por mecanismos sutis de poder e regime de verdade, para tratar as relações de educação e poder, radicalizando, com isso, o sujeito como governado e moldado, talvez negando também a característica de interpretativos e instruidores de sentido, própria de todos os seres humanos.