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Aspectos do Tempo de Trabalho sobre os Escores no Vestibular

4 ANÁLISE DESCRITIVA DO ACESSO AO ENSINO SUPERIOR: UM RETRATO A PARTIR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

4.2 ANÁLISE DOS CANDIDATOS INSCRITOS E APROVADOS QUANTO ÀS CARACTERÍSTICAS FAMILIARES

4.2.4 Aspectos do Tempo de Trabalho sobre os Escores no Vestibular

Um outro dado familiar e sócio-econômico muito importante é o que trata da participação do candidato na vida econômica familiar. Os dados observados sobre isto também denotam a elitização da Universidade, pois, do total de candidatos inscritos, dentre os anos disponíveis e válidos de 1993 a 2001, 65,1% declara não trabalhar. Os demais declaram trabalhar e: 1) receber ajuda, com 17%; 2) ajudar parcialmente a família, com 8%; 3) se sustentar, com 6,9%, e 4) ser responsável pelo sustento da família, 3,1%. Mais elitizada a Universidade resulta quando se observam esses mesmos dados entre os aprovados. Com efeito, os aprovados e que não trabalham alcançam a marca de 69,7%, na média dos referidos anos; os demais, que trabalham, têm os percentuais reduzidos em cada uma das situações retro citadas. A A AA A A A A A A A Escore inscrito Escore aprovado 0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00

Renda familiar (em salários mínimos)

Gráfico 5: Desvio - padrão do escore final do candidato inscrito e aprovado no vestibular em função da renda familiar.

demonstrada por meio das Tabelas 9 e 10. Segundo a Tabela 9, relativa aos anos de 1993 a 1995, de uma amostra de dados de tamanho de 87.170 inscritos, em que constam observações sobre a quantidade de horas semanais trabalhadas, 62,7% do total de inscritos não trabalha (indicado pela notação “0,00”), 18,1% trabalha menos de 20 horas (indicado por “20,00”), 7,4% trabalha de 20 a 30 horas (indicado por “25,00”, que é o ponto médio dessa classe) e 11,8% trabalha 40 horas (indicado por “40,00”). Por sua vez, os aprovados apresentam os seguintes percentuais: 69,2% não trabalha, 15,6% trabalha 20 horas, 6,7% trabalha de 20 a 30 horas, e 8,5% trabalha 40 horas. Comparando-se esses percentuais entre si, conclui-se que não trabalhar contribui para a aprovação do candidato (69,2% contra 62,7%).

Objetivando verificar se esse padrão se mantinha em outra amostra, calcularam-se os mesmos percentuais em amostra de bases de dados do vestibular da UFBA para os anos de 1997 a 2001. Essas estatísticas são apresentadas na Tabela 10, a partir de uma amostra de 114.792 observações, sendo que destas, 33.842 de observações válidas. Como se pode constatar, o mesmo padrão se mantém: os percentuais de aprovação são maiores quando não se trabalha, tornando-se menores entre os que trabalham.

Evidencia-se dessas duas tabelas, observando-se os percentuais menores dos aprovados em comparação aos percentuais dos candidatos inscritos, que trabalhar mais horas reduz as chances de aprovação, pois, quando se aloca o tempo para o trabalho, diminui-se, necessariamente, o tempo alocado para os estudos. Caso a seleção do vestibular fosse um processo de amostragem aleatório simples, constituindo-se em um “jogo” justo no sentido probabilístico, a probabilidade de ser aprovado seria, em qualquer classe de horas de trabalho, a mesma de não o ser, o que, entretanto, não ocorre; observa-se que a probabilidade é maior quando não se trabalha e se é aprovado do que quando se trabalha.

47415 14104 5716 9436 76671 61,8% 18,4% 7,5% 12,3% 100,0% 7263 1641 706 889 10499 69,2% 15,6% 6,7% 8,5% 100,0% 54678 15745 6422 10325 87170 62,7% 18,1% 7,4% 11,8% 100,0% Quantidade % dentro de situação do candidato Quantidade % dentro de situação do candidato Quantidade % dentro de situação do candidato Não-aprovado Aprovado Situação do candidato Total 0,00 20,00 25,00 40,00

Horas trabalhadas (em classes)

Total Tabela 9: Situação do candidato quanto à aprovação ou não versus horas

semanais trabalhadas. UFBA, 1993-1995

Fonte: Pesquisa do autor.

Nota: Cálculos do autor a partir de bases de dados do vestibular de 1993-1995.

23015 1658 2225 4277 31175 73,8% 5,3% 7,1% 13,7% 100,0% 2027 126 198 316 2667 76,0% 4,7% 7,4% 11,8% 100,0% 25042 1784 2423 4593 33842 74,0% 5,3% 7,2% 13,6% 100,0% Quantidade % dentro de situação do candidato Quantidade % dentro de situação do candidato Quantidade % dentro de situação do candidato Não-aprovado Aprovado Situaçã o do candid ato Total 25,00 40,00 Horas trabalhadas (em classes)

Total

Tabela 10: Situação do candidato quanto à aprovação ou não versus horas semanais trabalhadas. UFBA, 1997-2001

0,00 20,00

Fonte: Pesquisa do autor.

Nota: Cálculos do autor a partir de bases de dados do vestibular de 1997-2001.

Aspecto importante, pois trata de hipótese desta Tese, é a de que os candidatos menos favorecidos do ponto de vista financeiro e/ou da disponibilidade de tempo para alocar aos estudos se auto-excluem de certas carreiras quando se percebem em condições desfavoráveis na concorrência com os demais candidatos. Isto fica evidenciado a partir do Gráfico 6 em que se apresentam os escores mínimos médios necessários para o candidato inscrito ser aprovado em função da renda familiar.

A partir de amostra de 87.063 observações, relativa ao período de 1993 a 1995, constrói-se o Gráfico 6, que é composto de quatro painéis de curvas que retratam o escore mínimo médio necessário para ser aprovado no vestibular versus a renda familiar; esta última variável é indicada no eixo horizontal de cada painel, utilizando-se como variável de painel a quantidade de horas que o candidato inscrito declara trabalhar quando da ocasião da inscrição. O uso da variável de painel permite a elaboração de quatro painéis, todos com as mesmas variáveis, contudo, diferindo entre eles quanto à quantidade de horas trabalhadas. As quantidades de horas de trabalho são indicadas na parte superior, acima de cada painel. Por exemplo, “0,00” indica os candidatos que não trabalham, “20,00” indica aqueles que declaram trabalhar até 20 horas semanais, “25,00” indica os candidatos que declaram trabalhar entre 20 e 30 horas semanais etc. Esses quatro painéis revelam claramente que quanto mais os candidatos trabalham (do primeiro painel à esquerda e acima para o último painel à direita e abaixo), as suas preferências, em geral, recaem sobre os cursos que exigem um escore médio menor para ser aprovado. Isto pode ser observado claramente pelo nível das curvas em cada painel. Outra observação que se pode fazer sobre esses painéis em que, em cada painel, portanto, mantida constante a variável “horas de trabalho”, na medida em que a renda familiar se eleva, o candidato almeja um curso cujo escore mínimo para aprovação é maior. Veja-se o Gráfico 6.

Os dados revelam que o trabalho entre os candidatos inscritos não é uma característica freqüente desde os primeiros anos de estudo, quando o futuro candidato ao vestibular da UFBA ainda se encontra no ensino fundamental. Para ilustrar este ponto, os dados das bases de inscritos dos anos disponíveis revelam que em uma amostra de 37.656 observações válidas, apenas 1% desses candidatos trabalharam durante o ensino fundamental, 18,6% trabalharam durante o ensino médio e 4,8% trabalharam durante o ensino fundamental e médio. Contudo, 75,6% nunca trabalharam enquanto estudaram nos dois níveis de ensino, fundamental e médio. Quando se observa essa mesma característica na amostra de candidatos aprovados, constata-se que nenhum deles trabalhou no ensino fundamental, no médio ou em qualquer um dos dois níveis de ensino. Assim, mais uma vez, verifica- se a dramática elitização da Universidade por meio deste aspecto.

0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00

Renda familiar (em salários mínimos) 550 570 590 610 Esco re mín im o d o cu rso (x 100 0) 0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 50,00

Renda familiar (em salários mínimos)

0,00 20,00 25,00 40,00 . 550 570 590 610 Esco re mín im o d o cu rso (x100 0)

Gráfico 6: Escore mínimo médio do curso em função da renda familiar segundo o tempo alocado ao trabalho.

.

Fonte: Cálculos do autor a partir de bases do vestibular da UFBA, 1993-95. Classes de concorrência

Muito alta

A relação entre a renda familiar e a concorrência, para cada classe de horas trabalhadas pelo candidato inscrito, fica também evidenciada por meio do Gráfico 7. Esse Gráfico retrata o que já havia sido afirmado em parágrafo anterior sobre a relação inversa entre horas trabalhadas pelo aluno e a renda familiar: observe-se que, para qualquer classe de concorrência, quanto mais horas o candidato declara trabalhar, menores são, em média, as rendas familiares, o que pode ser constatado por meio de linhas (cheia ou tracejadas) mais baixas. Quanto à questão da concorrência, observe-se que também existe uma relação direta entre renda familiar e concorrência: quanto maior a renda familiar média, o candidato tende a se inscrever em cursos mais concorridos, crescendo mais rapidamente essa relação

Alta Média

Baixa Muito baixa

Renda familiar media (em salários mínim

os) 16,67 12,50 8,33 Horas trabalhadas .00 20.00 25.00 40.00

Gráfico7: Renda familiar média versus concorrência segundo as horas trabalhadas, UFBA, 1993-1995.

linha pontilhada mais alta, indicada por “.00” na legenda). Acrescente-se que essas classes de concorrência foram criadas a partir dos escores mínimos necessários para a aprovação no vestibular.

560 570 580 590 600 E

score mínimo do curso (

x 1000) 1,00 2,00 3,00 4,00 0,00 10,00 20,00 30,00 40,00 Horas trabalhadas 560 570 580 590 600

Escore mínimo do curso (x 1000)

0,00 10,00 20,00 30,00 40,00

Horas trabalhadas .

Fonte: Cálculos do autor a partir de bases do vestibular de 1993-95.

Nota: Estes painéis foram construídos agrupando-se a renda familiar em quatro classes (em salários mínimos): na primeira, de 0,5 a 1,5 salários; na segunda, de 2,5 a 8; na terceira, de 15 a 35, e na quarta, de 50 salários mínimos.

Gráfico 8: Escore mínimo médio do curso escolhido pelo candidato inscrito em função das horas trabalhadas, segundo a renda agrupada em classes. UFBA, 1993-1995

do curso no vestibular é a partir da observação dos quatro painéis do Gráfico 8: quatro grupos de classes de renda familiar (em salários mínimos): a primeira, de 0,5 a 1,5 salários; a segunda, de 2,5 a 8; a terceira, de 15 a 35, e a quarta, de 50 salários mínimos definem os quatro painéis apresentados. Observe-se que nestes quatro painéis, na medida em que as horas trabalhadas aumentam, ocorre, como esperado, um decréscimo do escore, pois sobra menos tempo para o estudo. No caso dos painéis indicados por 1,00 e 2,00, esse decréscimo ocorre até os pontos médios de classes de 30 e 20 horas trabalhadas, respectivamente, quando, então, ocorre uma mudança de concavidade. O painel indicado por 3,00 é muito semelhante ao indicado por 2,00, com a diferença de que a concavidade é mais acentuada; o mais dessemelhante, realmente, é o painel 4,00, em que, além do decréscimo ser muito acentuado, a concavidade é maior do que nos outros três painéis. Observe-se que o escore médio mínimo se eleva rapidamente no quarto painel, pois, a despeito da elevação da quantidade de horas trabalhadas, o aumento da renda mais do que compensa essa redução de tempo dedicado aos estudos, fazendo com que o escore mínimo volte a se elevar rapidamente. Isto demonstra, uma vez mais, a importância que a renda tem na escolha do curso pretendido pelo candidato.

Fazendo-se um resumo de todo esse arrazoado, uma regra geral que parece se aplicar a partir desses Gráficos 6, 7 e 8 é que quanto menor (maior) o nível de renda familiar do candidato, mantida constante a quantidade de horas de trabalho, a preferência do candidato recai sobre cursos de escore mínimo cada vez mais reduzido (elevado). Ademais, além de o escore mínimo médio se elevar à medida que a renda se eleva, de decrescente ele se torna crescente (em decorrência do aumento da quantidade de horas trabalhadas) e, tão mais acentuadamente quanto maior o nível de renda familiar, como se uma espécie de efeito renda mais elevada compensasse o aumento da quantidade de horas trabalhadas. Assim, estes resultados corroboram os achados apresentados por meio dos quatro painéis do Gráfico 6 e, os Gráficos 7 e 8 evidenciam a importância dos recursos econômicos, renda familiar e tempo disponível para os estudos, como determinantes, não apenas na escolha da carreira, mas, também, na posterior aprovação do candidato inscrito.

Um outro fator que parece influenciar na escolha da carreira é a qualidade da educação e da formação do candidato. Com efeito, elaborado um gráfico com o

esta em salários mínimos, sendo o tempo alocado ao trabalho uma variável de painel, observa-se que o desvio-padrão, no painel relativo aos candidatos que declaram não trabalhar, é monotonamente decrescente com a renda familiar, denotando que a formação e/ou qualidade escolar desses candidatos é cada vez mais uniforme. Isto é explicado porque, existindo uma relação inversa entre horas trabalhadas e renda familiar (Vide Gráfico 7), quanto maior esta, maior a possibilidade de os pais financiarem a formação de seus filhos em escolas que melhor lhes preparam para o vestibular, aumentando-lhes as chances de sucesso nesse exame. Além disso, ao se dispor de mais tempo para o estudo, o risco associado a participar de um vestibular mais concorrido se reduz pelo maior preparo que se pode adquirir por meio dos estudos. Entretanto, como seria de esperar e reforçando este argumento que se acabou de fazer, à medida que as horas trabalhadas aumentam, o desvio-padrão não se mantém tão uniforme nem monotonamente decrescente. Pelo contrário, permanece elevado, refletindo o maior risco que resulta de menos horas de estudo. Por exemplo, no caso dos candidatos que se declaram trabalhar na classe de 20 a 30 horas semanais, o desvio-padrão é bastante variado, constituindo-se em uma verdadeira cordilheira de vales e picos; esse padrão também se mantém nos outros dois painéis, de classes de ponto médio de 20,00 e 40,00 horas, porém, de maneira mais suave. Esse último padrão revela o oposto ao primeiro painel: quanto maior a quantidade de horas trabalhadas pelos candidatos, em geral e na média, a renda familiar é mais reduzida e, com ela, menor a possibilidade de a família em arcar com uma qualidade educacional mais uniforme.