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FEMINIZAÇÃO DO MAGISTÉRIO

4 O INSTITUTO DE EDUCAÇÃO EUCLIDES DANTAS E AS QUESTÕES DE GÊNERO NO CURSO NORMAL MÉDIO

4.1 O INSTITUTO DE EDUCAÇÃO EUCLIDES DANTAS (IEED)

4.1.1 Aspectos Históricos

O Instituto de Educação Euclides Dantas, conhecido, popularmente, por Escola Normal de Conquista, foi fundado nas primeiras décadas do século XX, em decorrência da política de ampliação do número de Escolas Normais em todo o Estado. Assim, houve a implementação dessas escolas em diversas cidades do interior, dentre elas, a cidade de Vitória da Conquista cuja implantação ocorreu no dia 20 de março de 1952, sob o Decreto nº 15.194, tendo como objetivo principal a formação de professores, na modalidade Normal Rural, modelo de escola que foi criado para atender às necessidades socioeconômicas e geográficas das cidades do

102 interior baiano. (MENDES, 2004). A sua inauguração representou um marco na história da sociedade conquistense que contava apenas com escolas primárias e o Ginásio de Conquista, inaugurado em 1940. Conforme Geísa Mendes:

Instituição educacional pública, única do gênero em Vitória da Conquista, o Instituto de Educação Euclides Dantas – ou simplesmente, Escola Normal, como é conhecida pela comunidade teve sua expressão de „monumentalidade‟ proclamada aos „quatro cantos‟ da cidade e região [...]. (2004, p. 20).

Para além dos inquestionáveis benefícios à educação e cultura local, a presença de uma Escola Normal em qualquer cidade era um importante símbolo de progresso, modernidade e civilização, razão pela qual a inauguração da Escola Normal de Vitória da Conquista, aconteceu em um clima de muita simbologia e respeito, tornando-se, mesmo, um acontecimento histórico e monumental para a cidade. Ainda no ano de 1952, teve seu nome modificado para Escola Normal Euclides Dantas, em homenagem a um ilustre cidadão conquistense, educador e poeta de muito prestígio, falecido em 1943. Atualmente a escola tem o nome de Instituto de Educação Euclides Dantas, honrando assim, uma homenagem feita há mais de cinco décadas. (MENDES, 2004).

A primeira turma da Escola Normal de Vitória da Conquista contou com a matrícula de 29 discentes, 22 mulheres e 7 homens, com idade entre 16 e 25 anos (MENDES, 2004). Essa diferença entre o número de mulheres e homens demonstra a predominância no imaginário social de que a docência da primeira infância seria atividade ideal para o ser feminino, concepção que não tem sofrido modificações ao longo dos anos, haja vista que, ainda hoje, há uma predominância de professoras na regência de classes das séries iniciais do ensino fundamental, pois o atual Curso Normal Médio conta com 172 discentes e, destes, apenas 5 são do sexo masculino.

O Curso de Magistério, implantado em Vitória da Conquista quando da inauguração da Escola Normal, era voltado para as características regionais, dentro da modalidade Normal Rural. Contudo, o curso parece não ter, efetivamente, funcionado com tal especificidade, pois, segundo Geísa Mendes (2002), em sua pesquisa sobre a Escola Normal de Vitória da Conquista, os sujeitos entrevistados não se recordavam dessa característica do curso nem de disciplina alguma que fizesse alusão à modalidade de Curso Normal Rural. Há ainda uma questão relacionada ao exercício da profissão que, ao término do curso, deveria ser exercida,

103 prioritariamente, na zona rural por dois anos, para depois migrar para a cidade. Porém, em vista da grande carência de professores(as), muitas(os) alunas(os), ao término do curso tiveram que ser aproveitadas(os) para o ensino na própria cidade.

Mesmo assim, o discurso de “civilizar os sertões” permanecia forte, estimulando as(os) professoras(es) a enfrentarem as intempéries dos rústicos espaços rurais, pelo “nobre” objetivo de contribuir com o progresso da nação. Além do mais, vinha sendo reforçado o discurso do “ser professor(a)”, como um(a) cidadão/cidadã comprometido(a) com sua pátria, sujeito abnegado, capaz de se sacrificar pelo progresso nacional (MENDES, 2002). Em função dessa ideologia nacionalista que impulsionava o processo de criação das Escolas Normais Rurais, a figura do(a) professor(a) tinha significativo valor como peça-chave para a concretização do novo projeto de civilização. Ainda, segundo Mendes:

Em vitória da Conquista, naquele período, a figura do professor era extremamente valorizada, e aqueles que exerciam a profissão detinham uma dimensão simbólica que fazia com que contassem com o respeito e a valorização de toda a comunidade. [...] O exercício da „nobre missão‟, atrelada a um modelo de virtude, dedicação e sabedoria é reconhecido com homenagens principalmente em nomes de prédios e ruas. (2004, p. 81).

Naquele período, o magistério representava para as mulheres da cidade a oportunidade de acesso ao mais alto nível de instrução que uma jovem poderia pretender, além da possibilidade de exercer uma profissão considerada nobre e valorizada naquele contexto social. Vale salientar, ainda, que o magistério contribuía também com a preparação das futuras mães e esposas, destino inevitável das futuras professoras. Na verdade, considerava-se que o magistério aprimoraria, na mulher, aqueles atributos que, naturalmente, ela já possuía, por sua condição biológica, pela maternidade, uma vez que os(as) alunos(as) deveriam ser tratados(as) como filhos e filhas espirituais de suas/seus professoras(es). Para tanto, pontua Mendes:

Uma série de ritos, símbolos, doutrinas e normas foi mobilizada para a produção dessas mulheres professoras. É assim que os currículos foram incorporando disciplinas especialmente voltadas para as destrezas manuais e estéticas como Economia Doméstica, Trabalhos Manuais, Canto Orfeônico, Higiene e Puericultura, as quais seriam válidas tanto para a educação escolar quanto para a educação do lar, em outras palavras, seriam importantes tanto para a professora

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quanto para a mãe. No currículo da Escola Normal de Vitória da Conquista, todas as disciplinas foram contempladas. Parte do programa desenvolvido na disciplina Canto Orfeônico era composta por canções de ninar; na disciplina Trabalhos Manuais [...] eram confeccionados: aventais, panos de prato, almofadas, quadros e bonecos para decorar quartos de criança. (MENDES, 2004, p. 99).

O modelo de Ensino Normal em Vitória da Conquista não fugia aos determinantes sociais mais amplos, pois, além de preparar a professora, esse curso também preparava a futura esposa e mãe. Por isso, o pequeno número de estudantes do sexo masculino nessa modalidade de ensino que, cada vez mais se consolidava como curso de mulheres. Entretanto, para os homens, o Curso Normal Rural oportunizava colocações diferentes das que eram, via de regra, direcionadas às mulheres, pois representava um passaporte para o exercício da docência em outras profissões com maior prestígio social, a exemplo dos cursos de Medicina e Direito. (MENDES, 2004).

Dessa forma, o Instituto de Educação Euclides Dantas representou, e ainda representa, uma instituição que tradicionalmente cumpriu o papel de formar profissionais qualificados para o exercício da docência. Atualmente, apesar de esta escola não ser, prioritariamente, de formação para o magistério, contando também com o Ensino Médio (geral) e o Ensino Fundamental, ela ainda mantém o Curso Normal Médio que habilita profissionais para o exercício da docência na educação infantil e fundamental, contribuindo assim, com a formação de muitos educadores e educadoras no cenário educacional conquistense, uma referência em ensino para a cidade e toda a região.