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Com base nos conceitos e modelos apresentados, é possível visualizar alguns dos principais aspectos evidenciados pela literatura para que se realize uma ANT. Um dos principais itens mencionados na literatura, presente em quase todos os modelos, é o nível de análise. Trabalhos como os de Mcgehee e Thayer (1961), Moore e Dutton (1978) e Gould et al. (2004) ressaltam a importância de se considerar as diferentes necessidades originadas nos diversos níveis de análise encontrados no ambiente organizacional. No entanto, a maior parte da literatura observa ainda o modelo O-T-P como uma avaliação que acontece nos níveis da organização, das tarefas e dos indivíduos, sendo que, no nível das tarefas, é importante apreender não apenas os processos e atividades de trabalho, mas também o agrupamento de processos comuns ou complementares que compõem os macroprocessos organizacionais.

Outro aspecto relevante na ANT é a avaliação dos fatores de contexto externo e interno à organização. Kaufman (1994) ressalta a importância da análise de variáveis do ambiente externo no processo de avaliação das necessidades. Segundo o autor, para que o processo se torne mais pró-ativo e não apenas reativo, é fundamental que se leve em conta, na sua realização, os elementos intra e extraorganizacionais que, de alguma forma, requeiram novas exigências de treinamento. Na mesma linha, Abbad, Freitas e Pilati (2006), ao trazerem uma reflexão sobre o que é desempenho competente no contexto atual, destacam que situações como a globalização e a internacionalização da economia, as mudanças climáticas decorrentes da poluição ambiental, as mudanças nas características demográficas da sociedade e outras pressões exercidas pelo acelerado processo de produção de novos conhecimentos e tecnologias têm exigido das organizações e das pessoas necessidades cada vez maiores de aquisição e de desenvolvimento de novas competências. Tal fato, por sua vez, tem gerado novas necessidades de treinamento, revelando-se outro importante elemento de análise em ANT.

A busca pela compreensão de variáveis contextuais oriundas do ambiente externo, na visão de Lima e Borges-Andrade (2006), está ligada à noção de competências, que tem

recebido cada vez mais atenção na pesquisa em ANT. Segundo os autores, essa abordagem tem como base a noção de que as competências dos indivíduos e das organizações, nos tempos atuais, são menos estáveis e dependem significativamente do ambiente, podendo ser identificadas por meio de uma avaliação da dinâmica externa, incluindo a análise de cenários futuros em que a organização atuará, conferindo à ANT o caráter estratégico tão destacado na literatura.

Tais fatores de contexto, segundo Abbad, Freitas e Pilati (2006), podem ser classificados sob três perspectivas. A primeira é a que considera as oportunidades e restrições geradas por fatores externos que potencializam o crescimento ou revelam ameaças à sobrevivência de uma organização, trazendo necessidades de treinamento de caráter mais macro, relacionadas ao nível organizacional. A segunda é a da influência distal e proximal, que engloba os fatores internos relacionados ao desempenho do indivíduo e às condições que influenciam diretamente o desempenho e a transferência da aprendizagem. E, por fim, tem-se a perspectiva dos antecedentes e consequentes, como causa ou efeito do desempenho individual, capazes de produzir necessidades nos três níveis.

Dessa forma, ao se verificar que o processo de ANT pode ser utilizado tanto para identificar necessidades de treinamento em si como para compreender questões não passíveis de resolução por meio de ações instrucionais (IQBAL; KHAN, 2011), torna-se importante a investigação das condições de suporte organizacional para a realização de uma avaliação de necessidades. Os esforços da organização devem ser direcionados para identificar e diferenciar as situações ou problemas provenientes de reais necessidades de treinamento daquelas que surgem da ausência de condições de suporte.

Outro fator a ser ressaltado, conforme Latham (1988), é o conjunto de características individuais dos participantes. Em uma revisão de literatura, o autor apresentou trabalhos empíricos que encontraram diferentes necessidades de treinamento, em função de características como idade, experiência no cargo e tipo de cargo. Segundo o autor, a compreensão de tais características pode possibilitar uma melhor avaliação das necessidades e um planejamento mais adequado das ações de TD&E. Essas características individuais, de acordo com Herold et al.(2002), incluem ainda fatores ligados à personalidade, como a consciência, a estabilidade emocional e a abertura a novas experiências.

Na literatura nacional, Meneses et al. (2006) identificam-nas como características da clientela de treinamento. Segundo os autores, essas são determinantes no processo de ANT, pois favorecem o planejamento instrucional, na medida em que, com base nelas, pode-se definir, com maior racionalidade, aspectos como modalidade de ensino e procedimentos e técnicas instrucionais que possibilitam melhores resultados às ações instrucionais.

Os autores apresentaram, de maneira sistematizada, cinco medidas de características de clientelas a serem levadas em conta no processo de ANT: repertório de entrada, sociodemográficas, psicossociais, motivacionais e cognitivo-comportamentais. As características de repertório de entrada englobam a identificação dos CHAs e experiências que as pessoas já possuem, seja por meio de ações induzidas ou pela aprendizagem natural. As sociodemográficas retratam questões ligadas ao indivíduo, como sexo, idade e escolaridade, ao seu trabalho, como tempo de serviço, cargo e função, e à sua condição socioeconômica. As psicossociais englobam variáveis que investigam características psicológicas que influenciam no processo de aprendizagem, relativas à percepção que o indivíduo tem sobre a sua capacidade de exercer controle sobre atitudes, comportamentos e outros eventos; à crença que este possui em sua própria capacidade de mobilizar recursos cognitivos, motivação e cursos de ação necessários para que obtenha sucesso no andamento da aprendizagem; ao comprometimento que o indivíduo possui com a organização; e ao prazer ou sofrimento que a participação em ações educacionais pode trazer ao indivíduo. As motivacionais, que tomam elementos como a motivação que o indivíduo tem para aprender, transferir a aprendizagem recebida e o valor instrumental que o treinamento tem para este. E, por fim, as características cognitivo-comportamentais, que agrupam as estratégias cognitivas, comportamentais e autorregulatórias que o indivíduo utiliza para aprender. Essas características são apresentadas de forma conjunta na Figura 8.

Figura 8- Medidas de características de clientela

Fonte: Meneses et al (2006, p.425)

Assim, de forma geral, segundo a literatura analisada, é importante, no processo de ANT, considerar: os diferentes níveis e métodos necessários para identificação das necessidades; os fatores contextuais que podem produzir novas lacunas ou demandar a aquisição ou o aprimoramento dos CHAs existentes; as características de clientela de TD&E que viabilizam uma visão mais clara do público-alvo a ser treinado. Depreende-se, então, que investigá-los, já na ANT, pode favorecer uma correta identificação e priorização das necessidades de treinamento, evitando, assim, investimentos desnecessários. A seguir, serão apresentadas visões acerca da evolução da pesquisa em ANT nos cenários internacional e nacional.