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Assentamentos rurais, famílias assentadas e área na mesorregião Centro-Sul do Paraná – 1981 a

O CENTRO-SUL PARANAENSE NO CONTEXTO DA QUESTÃO AGRÁRIA E DA LUTA PELA TERRA

Mapa 14: Assentamentos rurais, famílias assentadas e área na mesorregião Centro-Sul do Paraná – 1981 a

O expressivo número de assentamentos rurais existentes na mesorregião Centro- Sul merece esclarecimento. Os dados divulgados pelo INCRA referem-se à Relação de Beneficiários (RBs), na qual estão agrupados a regularização fundiária, recuperação de lotes e os novos assentamentos rurais criados. Assim, faxinalenses, comunidades quilombolas e posseiros que tiveram seus territórios regularizados pelo INCRA, bem como lotes de assentamentos já demarcados em que foram sanadas as irregularidades, são considerados como novos assentamentos rurais, mascarando assim, a quantidade exata de camponeses que são (re) territorializados a partir de áreas retomadas, por estes, do latifúndio/agronegócio. Mesmo diante disto é possível afirmar assertivamente que a territorialização do campesinato expressa nos dados de assentamentos rurais é fruto da luta camponesa. Pois, sem a pressão desta classe, nem mesmo a regularização de seus territórios ocorreria.

A significativa presença de assentamentos rurais na mesorregião reflete também a organização e luta camponesa nos movimentos sociais, sobretudo, no MST. Este é o principal movimento que realizou ocupações de terra no Centro-Sul do Paraná, foram 74 (total da mesorregião 126), mobilizando 20.169 famílias (total da mesorregião 26.211) no período de 1988 a 2014 (DATALUTA-PR, 2015). Assim, a territorialização do campesinato nos assentamentos rurais é também o processo de territorialização do MST decorrente da espacialização da luta pela terra em que os camponeses organizados em movimento conquistam frações do território (FERNANDES, 1996). A conquista de um assentamento rural, portanto, pode se desdobrar e, no caso da região em apreço se desdobrou, em novas lutas e, consequentemente, novas possibilidades de triunfo ao campesinato. Neste contexto é preciso salientar que as ocupações e acampamentos foram determinantes para a territorialização camponesa na mesorregião, pois, possibilitaram a conquista da terra, condição para tal.

A expressividade da luta camponesa no Centro-Sul do Paraná é realçada pela existência dos três maiores projetos de assentamento rural do estado: Ireno Alves dos Santos (887 famílias), Marcos Freire (578 famílias) em Rio Bonito do Iguaçu e Celso Furtado em Quedas do Iguaçu (1092 famílias). Esses casos específicos, juntamente com o assentamento 10 de Maio (66 famílias) de Rio Bonito do Iguaçu, serão aprofundados no decorrer deste capítulo.

Na mesorregião está também a maior concentração de áreas indígenas demarcadas no Paraná. Sete das 20 áreas demarcadas no estado se encontram no Centro-Sul, correspondendo a 71.691,4864 ha, o equivalente a 76% das terras, as quais abrigam 60,29% da população indígena residente em reservas (IBGE, 2010; FUNAI, 2013). É interessante a

observância de que estas áreas demarcadas, nas quais vivem povos Guarani, Kaingang e Xetá, refletem, sobretudo, a expulsão dessas populações de seu território original e seu aprisionamento em um espaço delimitado. Assim, a significativa presença indígena na região é na verdade um resquício do que outrora fora o território destas populações. Entretanto, deve-se atentar que esta parcela do território assegurado aos indígenas, através das reservas, só foi conquistada com muita luta e que perante o avanço das relações capitalistas é o que tem restado como possibilidade de sobrevivência destas populações. Ressalta-se ainda que, atualmente, a conquista de novas reservas está ameaçada perante o ataque dos setores ligados ao agronegócio como se constata na mesorregião Oeste do Paraná, na qual a população indígena Guarani vem sofrendo sucessivos abusos, principalmente, de vereadores, prefeitos, deputados e ruralistas.

Além de transformar o espaço rural, os tensionamentos do campesinato na mesorregião têm desenvolvido outras dimensões para além da conquista da terra, como por exemplo, a criação de um campus da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), dentro do assentamento Oito de Junho no município de Laranjeiras do Sul. A conquista da universidade está inserida no processo de espacialização da luta camponesa nos movimentos sociais e é resultante do entendimento de que somente a terra é insuficiente para alçar mudanças estruturais na sociedade.

É neste contexto de desigual distribuição da terra, renda e riqueza; da concentração do poder econômico e político, do coronelismo, da violência, de inúmeras pessoas vivendo em condições de extrema pobreza, das lutas e conquistas camponesas, que conformam a realidade espacial do Centro-Sul paranaense que se inserem os municípios de Quedas do Iguaçu e Rio Bonito do Iguaçu e os respectivos assentamentos: Celso Furtado, Ireno Alves dos Santos, Marcos Freire e 10 de Maio, elementos centrais da presente análise. Buscar-se-á agora levantar alguns elementos que colaboram na compreensão do espaço, principalmente o agrário, dos referidos municípios.

3.2 Quedas do Iguaçu e Rio Bonito do Iguaçu: territórios do latifúndio

Quedas do Iguaçu e Rio Bonito do Iguaçu são dois municípios pertencentes a microrregião geográfica de Guarapuava e a mesorregião Centro-Sul do Paraná (Mapa 2). Juntos os municípios possuem um contingente populacional de 44.266 pessoas, sendo que 46% destas vivem na zona rural (IBGE, 2010). Essa expressiva presença da população rural é

decorrente, sobretudo, dos cinco assentamentos rurais existentes nos municípios: Rio Perdido (60 famílias) e Celso Furtado (1092 famílias) em Quedas do Iguaçu e Ireno Alves dos Santos (887 famílias), Marcos Freire (578 famílias) e 10 de Maio (66 famílias) em Rio Bonito do Iguaçu. Em termos absolutos, a população dos referidos municípios é assim composta: em Quedas do Iguaçu das 30.605 pessoas, 20.987 vivem na área urbana e 9.618 na zona rural, enquanto que em Rio Bonito do Iguaçu, 10.339 pessoas compõem a população rural e 3.322 a urbana, totalizando um montante de 13.661 pessoas. Destaca-se a elevada presença da população rural em Rio Bonito do Iguaçu, compondo mais de 75% do total populacional, resultante do processo de “recampesinização” ocorrido com a luta pela terra.

Ambos os municípios, Quedas do Iguaçu e Rio Bonito do Iguaçu, ilustram as características de exploração, subordinação e desigualdades socioeconômicas assentadas na perpetuação das relações latifundiárias na mesorregião Centro-Sul do Paraná. A análise de alguns indicadores sociais permite a constatação do quão acentuada são as disparidades presentes nestes municípios, entretanto, ao menos duas ressalvas são necessárias ao conjunto de dados socioeconômicos apresentados na sequência, sob o risco de algumas privações metodológicas (propositais ou não), levarem a desconsideração, do importante papel dos assentamentos rurais conquistados nos referidos municípios e da consequente recampesinização. O primeiro é entender que tal situação de disparidade social precisa ser compreendida considerando os processos históricos que conduziram as desigualdades regionais em que os municípios estão inseridos. Nesse sentido, a superação de tal condição depende de amplas mudanças na base estrutural da sociedade (os assentamentos rurais são partes destas mudanças, mas não a totalidade), e também de um processo histórico gradual. O segundo ponto é compreender que as metodologias para tais levantamentos, com destaque para o IDH-M, como já destacado, estão assentadas num conjunto de dados com natureza urbana, muitos dos quais, insuficientes para captar a série de complexas e virtuosas dinâmicas do campesinato, como o autoconsumo, por exemplo. Outra fragilidade das referidas metodologias, conforme destacado por Paulino (2006), é a utilização do parâmetro da renda monetária como indicador da viabilidade econômica em estudos que envolvem populações camponesas, sobretudo, em municípios que possuem assentamentos rurais. Por fim, considerando a importância dos assentamentos rurais para além dos marcos da referência burguesa do que seriam empreendimentos econômicos de sucesso (PAULINO, 2006), destaca-se o estudo de Santos (2014), o qual é alvissareiro em destacar a evolução dos indicadores socioeconômicos para o município de Rio Bonito do Iguaçu em decorrência da instalação dos assentamentos rurais.

Considerando a relevância das restrições apontadas e a inexistência de outros dados que melhor ajudem a captar as dinâmicas do campesinato extremamente expressivas nos municípios de Quedas do Iguaçu e Rio Bonito do Iguaçu, recorre-se a alguns indicadores socioeconômicos, a fim de, contextualizar as disparidades produzidas historicamente nos municípios em evidência. Os dados do IDH-M revelam que os municípios supracitados estão abaixo da média nacional e estadual em relação a este índice, respectivamente 0,727 e 0,749. Quedas do Iguaçu apresenta um IDH-M de 0,681, enquanto que para Rio Bonito do Iguaçu este indicador é de 0,629, índices que deixam os municípios em posições desfavoráveis no ranking do IDH-M no estado do Paraná, respectivamente 295 e 383 (PNUD; IPEA; FJP, 2013).

Ao observar a renda familiar per capita, fator considerado pelo governo federal para a inclusão nos programas sociais, verifica-se que em Quedas do Iguaçu 1.773 famílias, 18,3% do total municipal se enquadram na linha de pobreza, pois recebem menos de R$ 140,00 per capita. Destas, 1.199 famílias vivem em condições de extrema pobreza, recebendo o inferior a R$ 70,00 mensais per capita. Essa elevada concentração de famílias pobres se acentua ao averiguar que, em julho de 2010, 1/3 das famílias possuíam renda familiar mensal

per capita menor que R$ 255,00, ou seja, menor que meio salário mínimo.

Em Rio Bonito do Iguaçu esses indicadores são ainda mais acentuados. 42,6% das famílias viviam, em 2010, com renda per capita mensal inferior a R$ 255,00, sendo que, 6,5% das famílias possuíam rendimento inferior a R$ 70,00 e 5,3% não obtiveram nenhum rendimento no mês da pesquisa. A Tabela 7 apresenta o conjunto de famílias distribuídas por faixa de rendimento para os municípios de Quedas do Iguaçu e Rio Bonito do Iguaçu e para o estado do Paraná. É possível, a partir da análise da Tabela 7, verificar que os indicadores municipais são mais aguçados que os estaduais, revelando a superioridade que os referidos municípios ocupam no contexto das desigualdades na distribuição da renda. Esta concentração de famílias vivendo em condições de pobreza é característica do processo de ocupação e incorporação dos municípios, no qual, a concentração fundiária foi a principal marca. Soma-se ao latifúndio a mecanização agrícola que intensificou os processos de expulsão dos camponeses das áreas rurais de Quedas do Iguaçu e Rio Bonito do Iguaçu acarretando numa maior concentração de riquezas, consequentemente, poder econômico e político.

Tabela 7: Número de famílias residentes em domicílios particulares segundo faixa de rendimento familiar per capita, Quedas do Iguaçu, Rio Bonito do Iguaçu e Paraná – 2010

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