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2 O Direito à Ampla Defesa

4.2 Assistência Judiciária

Etimologicamente, o verbo assistir recai sobre a interpretação de auxílio, acompanhamento, e sobre este diagnóstico pode-se a primeira correspondência sobre o instituto: assistência judiciária consiste no atendimento de causa em juízo por profissional habilitado.

A relação é composta por dois sujeitos: assistente e assistido. O primeiro é o responsável por prestar o auxílio processual, o segundo corresponde àquele que é auxiliado.Poderá, pois, essa relação ser amparada a título gratuito ou oneroso. Considera-se remunerada a assistência judiciária quando entre assistente e assistido há um pacto sobre valores devidos. Já a assistência gratuita pode ser realizada pelo advogado quando o mesmo atua sem o estabelecimento de qualquer fim lucrativo.

Frederico Rodrigues Viana de Lima aponta que “ A locução assistência

judiciária gratuita deve ser utilizada para designar o serviço público prestado pelo Estado.Ela exprime a atividade prestada por órgão estatal - Defensoria Pública.46”

A assistência judiciária é meio democrático de acesso à justiça, na medida em que proporciona que sujeitos denominados como hipossuficientes obtenham atendimento jurídico e possam buscar a consolidação de direitos em esfera judicial.Mais uma vez é necessário acrescentar que o beneficiário da justiça gratuita não se confunde com o assistido juridicamente.A doutrina aponta correntes casos, nos quais ocorre a concessão da gratuidade judicial e o atendimento por advogado particular que assume a ação em caráter de risco para recebimento de honorários apenas com o final vitorioso da demanda. Em sentido inverso, poderá não ser concedida a justiça gratuita, mas seja o beneficiário abrangido pela assistência judiciária quando a parte seja tida como pobre pelo agente prestador da assistência judiciária, mas não preencha os requisitos legais para receber o deferimento da gratuidade judicial.

Doutrinariamente, há quatro modelos de assistência judiciária: pro bono, judiciare, salaried staff model, misto ou híbrido.Assim Frederico Rodrigues Viana Lima define o modelo pro bono “O modelo pro bono implica na prestação de assistência judiciária gratuita por profissionais liberais (advogados), sem nenhuma espécie de contraprestação por parte do Estado.A atividade é desenvolvida de modo caritativo, imbuída do aspecto humanitário que encerra.”47

Já quanto ao modelo denominado judicare, adotado na Inglaterra, Holanda, França e Áustria, por exemplo, assim assinala Mauro Capelletti e Bryan Garth:

Trata-se de um sistema através do qual a assistência judiciária é estabelecida como um direito para todas as pessoas que se enquadrem nos termos da lei.Os advogados particulares, então, são pagos pelo Estado.A finalidade do sistema judicare é proporcionar aos litigantes de baixa renda a mesma representação que teriam se pudessem pagar um advogado.O ideal é fazer uma distinção apenas em relação ao endereçamento da nota de honorários: o Estado, mas não o cliente, é quem o recebe.48

O sistema híbrido, como o próprio nome insiste, é uma junção de técnicas existentes nos outros três modelos.

Afirma-se que o modelo adotado pelo Brasil é o salaried staff model, em poucas palavras configura-se como espécie onde a remuneração salarial dos agentes públicos é financiada pelo Estado para que esses funcionários prestem devidamente a assistência judiciária gratuita.

Nesse contexto, deve-se esclarecer que a Defensoria Pública é o mais claro exemplo da adoção desse sistema, pois é proclamada constitucionalmente como a instituição responsável pelo auxílio jurídico de carentes financeiramente. O art.4º, § 4º, da Lei Complementar 80/94 assegura que “a assistência jurídica integral e gratuita

custeada ou fornecida pelo Estado será exercida pela Defensoria Publica.”

Com a afirmação acima, percebe-se a ventilação de um novo termo até o momento ainda não tratado: a assistência jurídica. O artigo anteriormente citado declara que a Defensoria Pública prestará assistência jurídica e não apenas judiciária.

Explique-se: assistência jurídica é conceito mais amplo e abrange não apenas o patrocínio da causa por advogado, como também assessoria extrajudicial, acompanhamento em procedimentos administrativos, por exemplo. Marília Gonçalves Pimenta assim define:

47 LIMA, Frederico Rodrigues Viana de. Defensoria Pública. Salvador: JusPodivm, 2012, p. 55. 48

CAPPELETTI,Mauro e GARTH,Bryan. Acesso à Justiça.Tradução:Ellen Gracienorthfleet.Porto Alegre:Fabris, 2002, p.35.

De forma mais ampla se conceitua a assistência jurídica, que engloba a assistência judiciária, além de outros serviços jurídicos não relacionados ao processo, tais como orientar esclarecimentos de dúvidas e prestando orientação e auxílio à comunidade no que diz respeito à formalização de escrituras, obtenção de certidões, registros de imóveis.49

Por fim, a fim de aplicar as diferenças entre os três termos tratados nesse capítulo, cite-se mais uma vez Fredie Didier Jr. E Rafael Oliveira:

A despeito de serem constantemente utilizadas como sinônimos, os conceitos de justiça gratuita, de assistência judiciária e assistência jurídica são distintos:

a) justiça gratuita, ou benefício de gratuidade, ou ainda gratuidade judiciária, consiste na dispensa da parte do adiantamento de todas as despesas, judiciais ou não, diretamente vinculadas ao processo, bem assim na dispensa do pagamento dos honorários do advogado;

b) assistência judiciária é o patrocínio gratuito da causa por advogado público (ex.: defensor público) ou particular (entidades conveniadas ou não com o Poder Público, como, por exemplo, os núcleos de prática jurídica das faculdade de direito;

c) assistência jurídica compreende, além do que já foi dito, a prestação de serviços jurídicos extrajudiciais (como, por exemplo, a distribuição, por órgão do Estado, de cartilha contendo direitos básicos do consumidor)- trata-se, como se vê, de direito bem abrangente.50

Dessa maneira, infere-se que mesmo apresentando elementos semelhantes nas três expressões, os termos devem ser aplicados de maneira distinta, cada um em sua respectiva atribuição.

49 PIMENTA, Marília Gonçalves.Acesso à Justiça em preto e branco: retratos institucionais da

Defensoria Pública.Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 103, grifo do original.

50

DIDIER JR., Fredie e OLIVEIRA, Rafael. Benefício da Justiça Gratuita. Salvador: JusPodivm, 2008, p.11.

5. A DEFENSORIA PÚBLICA

No capítulo anterior traçamos as principais diferenças entre justiça gratuita e assistência judiciária. No presente capítulo buscaremos delinear aspectos importantes alusivos à Defensoria Pública, contudo, rotineiramente, faremos menção aos termos gratuidade jurídica e assistencialismo jurídico gratuito, tendo em vista que, embora sejam expressões com significados diversos, apresentam um enlace significativo.

A Defensoria Pública nasce de uma necessidade de aproximação entre uma sociedade assolada por mazelas econômicas, políticas e sociais, e o Poder Judiciário, tão gravemente apresentado como instância inalcançável. Doutrinariamente, várias são as funções condicionadas a essa instituição (Defensoria Pública), todas elas alinhadas com o desejo de acesso à justiça social.

John Rawls assim conceitua justiça “A justiça é primeira virtude das

instituições sociais, assim como a verdade o é dos sistemas de pensamento.”51

. Nesse sentido, verifica-se a relação direta entre a Defensoria Pública e a promoção da justiça social, na medida em que tal instituição proporciona a redução das diferenças entre membros de uma mesma comunidade.

Nelson Nery Jr. assim define a Defensoria Pública:

A Defensoria Pública é o serviço público institucionalmente destinado a prestar aos necessitados a assistência jurídica capaz de permitir acesso de todos à justiça e de resguardar e garantir o direito fundamental de todos à ampla defesa, com o objetivo que se viabilize o direito fundamental de todos quantos não tiverem recursos à assistência jurídica integral e gratuita.52 Cumpre ainda ressalvar o posicionamento de Aury Lopes Jr. sobre o papel estatal na construção de uma Defensoria Pública estruturada:

(...) Também impõem ao Estado a obrigação de criar e manter uma estrutura capaz de proporcionar o mesmo grau de representação processual às pessoas que não têm condições de suportar os elevados honorários de um bom profissional.Somente assim se poderá falar de processo acusatório com um nível de eficácia que possibilite a obtenção da justiça.

Frente ao inconveniente de ter que suportar uma atividade incompleta das partes (preço a ser pago pelo sistema acusatório), o que se deve fazer é fortalecer a estrutura dialética e não destruí-la, com a atribuição de poderes instrutórios ao juiz.O Estado já possui um serviço público de acusação (Ministério Público), devendo agora ocupar-se de criar e manter um serviço público de defesa, tão bem estruturado como o é o Ministério Público.É um dever correlato do Estado para assim assegurar um mínimo de paridade de armas e dialeticidade(...)53

51 RAWLS, John. Uma teoria da Justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

52 JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Códido de Processo Civil Comentado e

Legislação Extravagante. 13ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

Nesse contexto, afirma-se a importância institucional desempenhada pela Defensoria Pública, contudo é notável a infeliz negligência do Estado frente ao desenvolvimento estrutural do mencionado órgão.