• Nenhum resultado encontrado

ESFORÇOS PARA A ESTRUTURAÇÃO DO SETOR

4.2. Associações sectoriais

4.3. Intervenção do Estado no mercado da tradução 4.4. Sugestões para a regulação do mercado português 4.5. Conclusão

4.2. Associações sectoriais

4.2.1. Textos de referência

De acordo com a “Charte du Traducteur” (1994: Cap. IV) (anexo 3), as associações sectoriais têm como função exercer o papel de arbitragem e de peritagem quando ocorrem diferendos entre tradutores e os seus clientes. Para além desta função, as associações sectoriais possuem um papel informativo junto dos seus associados. Assim, cabe-lhes comunicar sobre as evoluções do mercado e prestar serviços de informação relativos a possíveis formações, colóquios e reuniões. Por sua vez, segundo a Recomendação de Nairobi de 1976 (anexo 4), os Estados signatários deveriam incentivar medidas que permitam assegurar uma representação eficiente dos tradutores e favorecer a criação assim como o desenvolvimento de organizações que os possam representar e sejam encarregadas de definir as regras e os deveres que devem ser seguidos para se poder exercer a profissão, defender os interesses morais e materiais dos tradutores e facilitar as trocas linguísticas, culturais, científicas e técnicas entre os tradutores, e

entre os tradutores e os autores das obras a traduzir. Para este efeito, e de acordo com o espírito deste documento, as organizações poderiam organizar, na medida em que a Lei nacional assim o permita, várias atividades com o objetivo de sensibilizar o tradutor para a realização de um trabalho de elevada qualidade, de aconselhar os tradutores nas suas relações com os clientes (remuneração, elaboração de contratos, etc.) e, de forma mais ampla, contribuir para o seu desenvolvimento profissional.

Apesar de estes textos aparecerem como essenciais no enquadramento da profissão, observamos o mesmo fenómeno que verificámos com a norma EN-15038. De facto, o conjunto destes documentos não possui um caráter obrigatório o que acaba por tornar quase nulos os seus domínios de atuação. Todavia, as associações sectoriais têm um papel fundamental no bom funcionamento do mercado.

4.2.2 Importância e limitações das associações sectoriais

A nível internacional, parece-nos razoável pensar que o facto de pertencer a uma ou outra associação sectorial é um argumento de venda, nomeadamente em termos de garantia de qualidade. Esta ideia é desenvolvida por Chan (2008) quando adianta que uma variável importante da eficiência e do estatuto de uma associação sectorial consiste na sua dimensão. De facto, por vezes, a reputação de uma associação sectorial pode trazer benefícios aos seus membros, tanto em termos de visibilidade como em termos financeiros. Contudo, seria superficial atender apenas à dimensão da associação para avaliar a sua utilidade. Na realidade, de acordo com o espírito de Chan (2008), as associações sectoriais na área da tradução apresentam uma falta de reconhecimento que o autor qualifica de invisibilidade. Assim, num inquérito desenvolvido por Leech (2005) e apresentado junto de 29 estudantes de línguas do Reino Unido, menos de um quinto tinha ouvido falar do ITI (Institute of Translation & Interpreting) ou do IoL (Institute of Linguists). Este número é eloquente, pois estamos a falar de alunos que, à partida, se destinam a trabalhar na área da tradução. A partir destes dados, Chan (2008:193) conclui que algumas associações de tradução atuam mais sob a forma de um clube cujo maior (e talvez o único) objetivo é o de proporcionar oportunidades de networking para os seus membros. Desta afirmação, parece-nos essencial voltar a pensar sobre o verdadeiro papel e objetivo das associações sectoriais que foi desenvolvido nos textos de referência e adaptá-las a um novo contexto.

Ainda a nível internacional, destacamos três das principais e mais influentes associações sectoriais:

 a EUATC (European Union of Associations of Translation Companies),  a FIT (Fédération Internationale des Traducteurs),

 a ATA (American Translators Association).

Embora as diferentes associações partilhem objetivos e problemas comuns, observamos que não comunicam entre si. Este aspeto, identificado por Boucau (2005), acaba por dar a imagem de um mercado desorganizado, o que é prejudicial para o setor da tradução. Observamos ainda que o que é verdadeiro a nível internacional é também a nível doméstico, pois é comum encontrarmos várias associações sectoriais da mesma profissão no mesmo país que, de alguma forma, acabam por não prestarem um serviço de qualidade junto dos seus associados. Assim, a falta de harmonização relativamente aos preços que os tradutores seriam aconselhados a cobrar constitui, por exemplo, segundo Wood (2004), um fator agravante no caso da sublicitação e descidas de preços.

4.2.3. Associações sectoriais portuguesas

A nível nacional, e de acordo com Brum (2008:85), as associações na área da tradução e interpretação abordam questões relevantes para o exercício da atividade. Consistem, essencialmente, na representação de tradutores e intérpretes, no apoio às empresas de tradução, no apoio e promoção dos tradutores através da formação, e na defesa da qualidade ou normalização. Em Portugal, associações profissionais como a Associação Portuguesa de Tradutores (APT) e a Associação Portuguesa de Empresas de Tradução (APET) apoiam os interesses profissionais dos seus sócios e não têm fins lucrativos.

Da mesma forma que observamos um espírito de concorrência a nível internacional, parece-nos que a mesma situação ocorre em Portugal. De facto, durante conversas com empresários do setor, estes explicam que não se têm visto ações por parte das associações sectoriais. E, de maneira geral, a maioria achou que as diferentes associações deveriam juntar-se para combater os problemas que afetam tanto os tradutores independentes como as agências de tradução. Para os empresários, o simples facto de não haver qualquer obrigatoriedade em as empresas de

tradução trabalharem com licenciados e credenciados nesta área mostra como não há controlo. Em consequência, o mercado interno sofre de uma falta de credibilidade comparado com o dos restantes países da Europa. Esta característica do mercado nacional em relação aos outros países acaba por ser um entrave ao desenvolvimento do mercado da tradução. De facto, se as empresas de tradução não apresentam garantias de realização de um bom trabalho, os clientes estão perfeitamente livres de recorrer a serviços noutros países.

Para responder às diferentes críticas, foi criado o Conselho Nacional da Tradução (CNT). Trata-se de uma associação criada no em abril de 2011 e que é constituída pela Associação Portuguesa de Empresas de Tradução (APET), a Associação Portuguesa de Tradutores (APT) e diversas instituições de ensino superior público (entre as quais a Universidade do Minho) e privado que apresentam cursos de formação de tradutores. Assim, segundo os estatutos desta associação, o CNT tem como objeto a defesa dos interesses e dignidade da atividade da tradução promovendo a formação adequada dos profissionais nela envolvidos. Neste sentido, pretende representar o setor da tradução em Portugal e servir de intermediário entre o setor e o Estado nas questões mais relevantes, bem como entre o Ensino Superior, os profissionais e as empresas de tradução em Portugal. Contudo, e por esta associação ser muito recente, não podemos medir o seu impacto no mercado e observar como os diferentes intervenientes atuam em função dos seus interesses.

A estratégia relacionada estabelecida entre as duas principais associações portuguesas (APET/APT) no sentido de interagirem e atuarem em simultâneo para a modernização e desenvolvimento deste tipo de mercado, já dá um sinal de preocupação face ao mercado da tradução. Esta coabitação poderá ser positiva se, efetivamente, forem fiéis a um conjunto de princípios.