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ENQUADRAMENTO ECONÓMICO

1.4. Natureza do mercado da tradução

1.4.1. Caracterização do mercado, informação perfeita, imperfeita e assimétrica

Antes de nos debruçarmos sobre os conceitos de informação perfeita, perfeita e assimétrica, que serão úteis para este trabalho, é conveniente observar o mercado da tradução de forma geral. Segundo Mankiw (2001:66), trata-se de um mercado competitivo, ou seja, um mercado em que há muitos compradores e muitos vendedores de modo que cada um deles exerce um impacto negligenciável sobre os preços do mercado. Por outros termos, cada ator do lado da oferta tem um impacto limitado sobre o preço a que os seus concorrentes vendem um bem similar. Por sua vez, o mesmo acontece com os atores que constituem o lado da procura. Nenhum deles pode influenciar os preços porque cada um compra uma parte insignificante da fração total. Neste contexto, o mercado da tradução aparece como perfeitamente competitivo, pois segundo Mankiw (2001:66), este tipo de mercado refere-se a um estado em que os bens oferecidos à venda são todos iguais, e os compradores e vendedores são tão numerosos que nenhum único comprador ou vendedor pode influir no preço de mercado. Em consequência, estes intervenientes devem aceitar o preço definido pelo encontro da oferta e da procura. E, num mercado perfeitamente competitivo, pressupõe-se ainda que todos os agentes sejam racionais e beneficiem de informação perfeita, o que possibilita a compra dos melhores bens ou serviços. Neste caso, o mercado beneficia os atores com os melhores produtos.

Por oposição, a informação imperfeita apresenta ausência de conhecimento e este tipo de contexto é essencialmente estudado no âmbito da Teoria dos Jogos. Dentro deste tipo de informação, encontramos o caso da assimetria da informação que envolve dois ou mais intervenientes e que ocorre quando estes estabelecem uma relação económica na qual uma das

partes envolvidas no processo de transação tem mais ou melhores informações que a outra parte para tomar uma decisão. Este tipo de informação impede o bom funcionamento do mercado, tal como visto anteriormente no caso da informação perfeita e, consequentemente, impede os agentes económicos de tomar decisões ótimas.

No caso do mercado da tradução, é difícil para as empresas ou para os clientes terem conhecimento das competências de um tradutor antes de iniciar uma negociação. Na maior parte das vezes, os clientes só podem comprovar a qualidade do serviço prestado aquando da receção da tradução. Consequentemente, tal como apontam Moav e Neeman (2004:1), a tradução é um serviço que se distingue pelo facto de a sua qualidade e valor para os consumidores não poder ser determinados de forma pormenorizada pelos consumidores na ato de compra.

Na prática, os clientes podem pedir a potenciais tradutores para traduzirem uma amostra. Contudo, no que diz respeito aos tradutores mais experientes, estes são relutantes em realizar testes de avaliação. E, em termos gerais, os tradutores não acreditam que realizar um teste seja sinónimo de qualidade, porque estimam que os resultados de um teste podem ser adulterados. Em consequência, para Chan (2008:29), os clientes não conseguem claramente distinguir entre os “bons” e os “maus” tradutores por causa do problema da assimetria da informação. Nesta visão, entende-se por “bons tradutores” aqueles que possuem habilitações literárias adequadas para exercer a profissão e por “maus tradutores” aqueles que se autodeclaram tradutores. Estes, geralmente, praticam preços abaixo da média e, à partida, não apresentam um produto de qualidade.

Para explicar esta tese, Chan (2008) recorre a um exemplo onde se assume que, para a tradução de um texto com um determinado número de palavras, um “bom tradutor” cobra 10€ enquanto um “mau tradutor” cobra 5€. Dado que os clientes não estão na posse de todas as informações em relação à qualidade do trabalho destes tradutores, eles estarão apenas dispostos a pagar o serviço em função de uma distribuição de probabilidades. Assumindo a probabilidade de existirem 50% de “bons tradutores” e 50% de “maus tradutores”, os clientes tencionarão apenas pagar: (10€ x (1/2)) + (5€ x (1/2)) = 7,5€. No caso da probabilidade de os clientes anteciparem trabalhar com um “mau tradutor” ser superior a 50%, o preço a pagar

poderá então ser ainda mais baixo, como por exemplo: (10€ x (1/4)) + (5€ x (3/4)) = 6,25€. Uma das consequências deste fenómeno é a saída de “bons tradutores” do mercado. Este fenómeno económico é conhecido por “seleção adversa” (Stiglitz e Walsh, 2000). No exemplo dado, os “bons tradutores” deveriam ser pagos a 10€ mas iriam receber apenas 7,5€ devido ao problema da informação assimétrica. Esta diferença determina que, para Chan (2008), os “bons tradutores” decidem abrir as suas próprias agências de tradução, dedicando-se mais à gestão de projetos do que à tradução em si.

1.4.2. Segmentação e heterogeneidade do mercado da tradução

Ainda a nível da observação geral do mercado da tradução, observamos tal como Pym (2000:10) o referiu, que a globalização originou um mercado dos serviços linguísticos mais segmentado. Para Chris Durban (2003:1), tradutora reconhecida pelo seu contributo no âmbito da profissionalização da profissão de tradutor, não existe apenas um mercado da tradução, mas sim uma variedade de segmentos. Esta observação pode ser entendida tanto da perspetiva da oferta como da procura. Para Chan (2008), com a globalização e com o papel cada vez mais importante desempenhado pelas tecnologias da comunicação e da informação, a procura de serviços de tradução cresceu rapidamente nos domínios político, económico, técnico e cultural. De acordo com esta perspetiva, observamos que as grandes empresas multinacionais perceberam a importância da comunicação multilingue e da tradução, em particular. A página Internet destas empresas é um excelente exemplo. De acordo com uma pesquisa desenvolvida pela empresa de tradução The Big Word (2008), 58% das maiores empresas americanas têm os seus sites traduzidos para várias línguas e o estudo apresenta uma correlação entre a dimensão das empresas e as suas necessidades de tradução. Esta necessidade de traduzir pode ser resumida numa palavra: localização. Trata-se de um ramo da tradução que consiste em traduzir os conteúdos de um texto, de um software, ou de um site Internet, adaptando a tradução para a cultura do país ao qual se destina, considerando costumes, religião, sistemas métricos, moedas, legislação e outras variáveis que possam afetar o produto. Em consequência, Chan (2008) prevê uma grande procura de serviços de tradução no futuro onde os compradores terão um grande problema, pois estes não irão possuir conhecimentos suficientes sobre o mercado da tradução. Assim sendo, Chan (2008:188) alerta para o facto de que ao existir uma grande diversidade de tradutores, o custo de procura de um tradutor qualificado vai ser cada vez mais proibitivo. Para

além disso, e atendendo ao facto de que os clientes podem recorrer a tradutores estrangeiros e que existem mercados virtuais, a segmentação do mercado tornou-se cada vez mais acentuada. Assim, para este autor, existe uma grande necessidade em os clientes poderem contratar tradutores qualificados e distinguir os “bons” dos “maus”.

Do ponto de vista da oferta, Chan (2008:186), citando Gile (1995), observa que o mercado da tradução é constituído por uma grande variedade de tradutores, desde estudantes até peritos na tradução de documentos técnicos. No seguimento deste trabalho, Pym (1999) reforçou esta ideia ao apresentar a segmentação do mercado de trabalho da tradução em Espanha. Para tal, recorre à imagem de uma pirâmide, conforme a figura 1.

Figura 1: Segmentação do mercado da tradução em Espanha, segundo Anthony Pym (1999) Fonte: Elaboração própria

Na base desta figura encontramos uma grande quantidade de trabalhos de tradução realizados por amadores ou tradutores sem experiência, como é o caso dos estudantes, ou ainda “amigos de amigos”, que não têm obrigatoriamente uma formação universitária na língua em causa. Em termos de remuneração, esta primeira classe ganha, segundo Pym (1999), o suficiente para pagar os estudos. A segunda categoria inclui pessoas que realizam traduções por conta própria ou ainda em part-time. Trata-se essencialmente de tradutores não especializados e cuja remuneração é variável, em função do volume de negócio. Por fim, o terceiro e último nível engloba os profissionais de topo e não necessariamente tradutores. Esta categoria inclui profissionais que possuem capacidades linguísticas em conjunto com outras, nomeadamente em termos de IT (Information Technology), economia, marketing, etc. Segundo o mesmo autor,

estes profissionais trabalham geralmente para empresas multinacionais que estão dispostas a oferecer uma alta remuneração em troca dos seus serviços.