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3 ATIVIDADE COMO FUNDAMENTO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO.

3.3 A periodização da atividade como meio de compreensão do movimento processual de desenvolvimento humano.

3.3.3 Atividade de jogo de papéis sociais.

Como atividade principal das crianças em idade pré-escolar, atividade de jogo de papéis possibilita às crianças apropriarem-se das relações generalizadas da sociedade humana: na reprodução dos papéis existentes na sociedade, a criança assimila os modos

de vivência dos adultos. Tal fato faz com que na idade pré-escolar aconteça um constante alargamento da realidade objetiva de que a criança se apropria, possibilitando também uma maior consciência dessa realidade. Realidade que agora não apenas se concretiza nos objetos próximos à criança, mas especialmente nos elementos e nos objetos que os adultos usam e que ainda é impossível de ela operar por suas incapacidades provenientes de suas limitações físicas, como demonstra Leontiev (1988) ao afirmar que

Em uma atividade infantil, isto é, em sua real forma interna, essa contradição surge entre o rápido desenvolvimento de sua necessidade de agir com os objetos, de um lado, e o desenvolvimento das operações que realizam essas ações (isto é, os modos de ação), de outro. A criança quer, ela mesma, guiar o carro; ela quer remar o barco sozinha, mas não pode agir assim, e não pode principalmente porque ainda não dominou e não pode dominar as operações exigidas pelas condições objetivas reais da ação dada (LEONTIEV, 1988, p.121).

Pelas colocações de Leontiev, uma questão aparece para nossa reflexão: quais os meios utilizados pelas crianças para superarem a dicotomia entre as condições materiais que não permitem a elas a assimilação das propriedades do mundo adulto, e a satisfação de suas necessidades para a apropriação cada vez maior das relações sociais humanas? A resposta para esta questão segundo a Teoria Histórico–Cultural se encontra nas relações lúdicas para com a realidade. Não sendo o jogo uma atividade produtiva no sentido mais concreto da palavra, o que motiva as crianças a jogar não são os objetivos encarnados nos fins da atividade lúdica em si, e sim os conteúdos dos papéis sociais que nas ações lúdicas devem ser apropriados.

No jogo, os objetos de ações são passíveis de substituição, como também o são as condições desses mesmos objetos; as operações podem transformar-se, o que só não ocorre é a mudança no conteúdo da ação, pois essa é sempre resguardada por ter como objetivo na atividade lúdica a apropriação das formas culturalmente elaboradas das ações humanas. Essas ações são representadas através dos papéis sociais, e as crianças, neste processo, internalizam as regras, os princípios, os modos dos conjuntos de atividades construídos pelo homem ao longo de sua história. De acordo com Elkonin (1960), é dessa necessidade de assimilação das atividades dos adultos que se efetiva a atividade lúdica como atividade principal das crianças pré–escolares.

Os jogos dos pré-escolares de mais ou menos idade, sendo iguais por seu argumento, se diferenciam pelo modo que as crianças destacam

como fundamental o conteúdo da atividade dos adultos. O conteúdo dos jogos se desenvolve a partir da reprodução das ações com os objetos para o reflexo das relações sociais entre as pessoas e, posteriormente, para manifestações do sentido social da atividade dos adultos (ELKONIN, 1960, p.513, tradução nossa).

Neste contexto podemos afirmar que a situação imaginária tem origem nas relações reais que a criança estabelece com o mundo, é fruto das vivências das crianças com os modos de vida dos adultos, portanto, a imaginação como fenômeno presente no jogo não é uma qualidade inata da criança, ela não é mais nada do que o resultado das práticas sociais apropriadas na atividade lúdica e deve ser entendida como resultado concreto e essencial do desenvolvimento da criança.

Outro aspecto do jogo, presente na atividade lúdica de papéis sociais e que tem grande importância no desenvolvimento infantil é a generalização: toda atividade lúdica tem como característica ser uma generalização, pois é a generalização que possibilita o jogo se efetivar em diferentes condições objetivas.

Leontiev (1988) esclarece essa particularidade da atividade do jogo, ao citar o exemplo da circunstância em que uma criança brinca de motorista. Na brincadeira, relata o autor, a criança pode até conceber algum motorista específico, mas como vai agir será sempre a partir da figura geral dos modos de ação de um motorista, portanto, o motivo da ação da criança não é reproduzir um determinado sujeito concreto, mas sim as vias, os princípios e os modos de ação da função social do motorista. Neste processo, forma-se a generalização das ações lúdicas próprias desta etapa do desenvolvimento infantil.

Estão presentes também no jogo de papéis sociais as regras, como uma característica da atividade principal da idade pré-escolar; na atividade lúdica, é imposta à criança, pela dinâmica do jogo como atividade social, um controle de seu querer em detrimento das suas vontades individuais. Os aspectos morais e a normas gerais de conduta humana devem ser apropriados pelos pequenos, o que influencia decisivamente na formação de capacidades voltadas para o controle da própria conduta infantil, ou nas palavras de Elkonin (1960, p.514), “No jogo é onde a criança aprende com mais facilidade a dirigir sua conduta”.

O jogo influi fundamentalmente na formação do aspecto moral da criança, já que é uma prática de conduta baseada em leis morais, em regras das relações entre os que tomam parte no jogo, as quais estão ligadas estritamente com seus papéis. Graças ao sentimento das regras

que se incluem nos papéis do jogo, este é uma escola para vontade da criança (ELKONIN, 1960, p. 514, tradução nossa, grifos no original). As capacidades psicológicas são desenvolvidas na atividade lúdica em outros vários aspectos, como por exemplo, na atenção e na memória voluntárias que são constituídas na brincadeira, pois quando a criança brinca, o recordar e o concentrar-se são ações essencialmente necessárias para que se tenha êxito na atividade. Como também é fundamental na atividade lúdica, que a criança opere com a substituição de objetos, desenvolvendo neste processo às capacidades necessárias para que o sujeito manipule os objetos no nível do plano mental. A substituição do objeto do real pelas significações sociais presentes na atividade do jogo são ferramentas fundamentais para “introduzir a criança no mundo das ideias” (MUKHINA, 1995, p. 165).

A linguagem tem grande importância na atividade lúdica, por isso mesmo essa capacidade que está presente na atividade do jogo também é impulsionada a se desenvolver, e as atividades comunicativas são aspectos essenciais para que se efetive a atividade lúdica. A criança que não tem boas formas de comunicar-se e consequentemente boa compreensão da linguagem, representa “uma carga para os companheiros”, segundo Mukhina (1995, p. 165), pois limita a vivência e a fluência do jogo.

A próxima atividade diretora que segundo Teoria Histórico – Cultural compõe o processo de periodização do desenvolvimento humano é a atividade de estudo, como nosso objeto de estudo aprofundaremos suas caraterísticas no item número quatro desta dissertação, por isso neste momento passaremos a contextualizar a atividade de comunicação social que se estabelece como atividade principal posterior a atividade de estudos.