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Capítulo II O jogo e a sensibilização à diversidade linguística e cultural

2.1 A atividade lúdica: o brincar e o jogo

Para Pessanha (2001) a atividade lúdica é fácil de identificar e difícil de definir, pois apesar de muitos outros autores terem procurado definir o conceito de atividade lúdica, não foi possível encontrar uma definição que fosse consensual.

Consequentemente, a atividade lúdica foi durante muitos anos desvalorizada, revelando-se pouco significativa no desenvolvimento da criança, no entanto, atualmente, é reconhecida a sua importância em contexto pedagógico, uma vez que é fundamental em vários aspetos, como por exemplo, no domínio cognitivo, social e afetivo do desenvolvimento harmonioso da criança.

Ainda na perspetiva de Pessanha (2001), a atividade lúdica é uma manifestação que surge de forma espontânea no comportamento do ser humano. Pressupõe-se que seja uma atitude natural e indispensável ao desenvolvimento das crianças. Seguindo esta linha de pensamento, a criança quando brinca manifesta diferentes formas de comportamento lúdico,

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pois esta diversidade depende de vários fatores, tais como, o desenvolvimento físico e emocional, o meio ambiente, o contexto familiar, a educação, entre outros.

A atividade lúdica é, indiscutivelmente, uma das formas mais comuns de comportamento durante a infância, mas apesar disso temos vindo a verificar a existência de algumas mudanças sociais que têm vindo a influenciar os contextos de vida da criança, deixando-lhe uma margem muito diminuta de escolhas no que concerne ao jogo espontâneo entre pares. Estas mudanças predem-se, em particular, com uma tendência crescente em ocupar os seus tempos livres com atividades dirigidas, muitas delas complementos curriculares dentro da própria escola, bem como o receio que se apoderou dos pais em deixá- las brincar livremente na rua, culpa da insegurança provocada pelos casos de criminalidade crescente veiculados pelos diferentes órgãos de comunicação social. Simultaneamente, verifica-se um aumento das atividades de jogo individual fomentadas pelas novas tecnologias que muitos pais põem à disposição dos seus educandos. Assim sendo, o jogo acaba por sofrer as alterações resultantes da evolução da própria sociedade e adquirir contornos naturalmente diferentes do que os que possuía há algumas gerações atrás.

Segundo Friedmann (1996), podemos constatar que o tempo para a criança brincar e jogar está a diminuir, sendo que o único tempo que estas usufruem para brincar é o recreio. Portanto, importa que a atividade lúdica seja incluída nas atividades dentro da sala e o educador deve aliar o jogo e as brincadeiras aos objetivos de aprendizagem que estão previstos as crianças atingirem. Vários autores dão muita importância à atividade lúdica em contexto pedagógico uma vez que este proporciona experiencias agradáveis e positivas favorecendo o desenvolvimento global das crianças, nos aspetos de integração afectiva,

social e cultural (Christie, 1985 e Pessanha, 1994 in Pessanha 2001, p. 51).

A atividade lúdica inclui o jogo e o brincar, no entanto existem diferenças entre ambos que importa clarificar. Relativamente ao conceito de brincar, este é a principal

atividade da criança na sua vida; através do brincar ela aprende as habilidades para

sobreviver e descobre algum padrão no mundo confuso em que nasceu (Moyles, 2002, p.

37). Quanto ao espaço destinado ao brincar, como já foi referido anteriormente, este foi alvo de mudanças, uma vez que antigamente acontecia, maioritariamente, na rua. Hoje em dia brincar na rua torna-se um risco, limitando as crianças a brincarem dentro de casa. Devido aos limites impostos às crianças quanto aos espaços para brincar, a criança “transforma” esses mesmo espaços tentando adaptá-los às suas brincadeiras (Friedmann, 1996, p. 15).

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O brincar da criança torna-se mais consistente à medida que a criança se vai desenvolvendo, sendo que as situações de jogo ficam mais percetíveis e, tal como refere Santos (1999, p. 14), existe uma evolução direta dos fenómenos transicionais para o brincar,

do brincar para o brincar compartilhado e destes para as experiências culturais.

O brincar é fundamental para a formação da personalidade da criança, pois potencia o conhecimento de si própria e do outro e, consequentemente, para a construção de conhecimento. Costa (2007, p. 17) afirma que a brincadeira é para a criança um espaço de

investigação e construção de conhecimentos sobre si mesmo e sobre o mundo.

Ao conceito de brincar pode associar-se o conceito de jogo, que está presente no quotidiano das crianças. Segundo Friedmann (1996, p. 12), o jogo é uma brincadeira que

envolve regras, contrariamente ao brincar, havendo sempre um vencedor e um vencido. O

brincar também pode implicar regras, por exemplo, quando a criança define quem é o pai e quem é a mãe numa brincadeira, implicitamente está a definir as regras ao indicar os diferentes papéis.

Torna-se difícil fazer a distinção entre o conceito de brincar e o jogar, pois as suas fronteiras são muito ténues. Pensamos que a grande diferença entre o brincar e o jogar pode situar-se na forma como existem e são definidas as regras, isto é, no jogo, as regras são muitas vezes previamente definidas, ao passo que, no brincar, quando existem regras, estas são geralmente definidas à medida que a brincadeira evoluí. Assim, as regras são fundamentais para a diferenciação entre o jogar e o brincar, sendo que o jogo pressupõe regras e estas são fulcrais para a formação das características pessoais e sociais da criança.

Para Ferran, Mariet e Porchet (1979) o jogo carateriza-se por ser uma atividade de socialização. Para estes autores o jogo oferece a possibilidade de entrar em relação com

outrem sob a forma simultânea da confrontação e colaboração, do antagonismo e da

cooperação. Jogar contra alguém é jogar com alguém. […] [Portanto] Uma criança que

joga é uma criança que socializa (ibidem, p. 23).

O ato de jogar não é um ato solto, pois existe sempre uma ligação com o meio e assume sempre uma relação com o outro. Como refere Neto (1997) o jogo ocorre sempre

numa determinada situação e deve-se […] não só conhecer o objeto do jogo mas também o

seu contexto (p. 32-33), portanto o jogo é sempre influenciado por diversos fatores, como

por exemplo, a relação da criança consigo mesma e com o outro e a relação com o contexto onde é desenvolvido.

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O jogo é uma das principais ocupações da criança, pois para ela, quase toda a

actividade é jogo, e é pelo jogo que ela descobre e antecipa as condutas superiores (Chateau,

1975, p. 16). O jogo deve ser visto como potenciador do desenvolvimento do corpo, da inteligência e da afetividade da criança, uma vez que através deste pode encontrar o seu mundo e realizar novas aprendizagens (Rocha, 1993; Fernandes, 2003). Durante o jogo a criança usa a sua imaginação, interage com outras pessoas, sendo essencial para a construção de novos conhecimentos (Coelho, 2007) e através do jogo a criança projeta a sua personalidade, satisfaz as suas necessidades e encontra soluções para resolver os problemas com que se depara (Fernandes, 2003).

No ponto seguinte, iremos esclarecer a importância do jogo em contexto pedagógico.