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4.3 Terceiro momento – Atividades críticas: percepções

4.3.1 Atividade 1

CONTEXTUALIZAÇÃO: Atividade desenvolvida à luz dos protestos ocorridos no Brasil nos meses de junho e julho de 2013. A atividade baseou-se na análise, pelos alunos, de charges sobre os protestos a partir do uso do Present Continuous, de forma a trabalhar aspectos linguísticos dentro de um tema que envolve diretamente os alunos. O gênero textual utilizado e o aspecto linguístico trabalhado representam uma revisão da última unidade trabalhada pelos alunos – Unit 3.

OBJETIVOS DA AULA TEMA: posicionar os alunos acerca dos protestos no Brasil.

GÊNERO: introduzir o gênero charge, fazendo uma ponte com os quadrinhos, tema do segundo bimestre

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LINGUÍSTICO: revisar o Present Continuous, tema do segundo bimestre

4.3.1.1 Aplicação da atividade

A atividade foi aplicada em cerca de trinta minutos devido ao tempo gasto com o deslocamento dos alunos para a sala de multimeios e a operacionalização do maquinário da sala. Todos os comandos da atividade foram feitos em português pela professora, assim como as discussões realizadas em grupo pelos alunos. A aula contou com uma discussão sobre o gênero charge, seguida de reflexões sobre charges concernentes aos protestos no Brasil, elaboradas a partir de discussões em grupos. Cada grupo ficou responsável pela análise de uma charge, e os demais grupos acrescentaram diferentes interpretações a cada análise.

4.3.1.2 Pontos positivos

O primeiro questionário sobre as atividades propostas, referente à atividade 1, foi respondido por 21 alunos, e contou com três questões abertas sobre a impressão dos alunos acerca da atividade, conforme quadro. As respostas revelaram que essa foi uma atividade apreciada por todos os alunos com unanimidade. Dentre os motivos, destacam-se:

 Possibilidade de exposição das opiniões;

 Tema interessante, atual e do interesse de todos;  Seriedade das discussões;

 Proposição de soluções para problemas que afetam os alunos diretamente;  Compreensão das manifestações;

 Análise crítica de material em inglês;  Contribuição para a vida social;

 Respeito a opiniões de outras pessoas e aprendizado com essas opiniões;  Maior entendimento de questões políticas;

 Aumento do vocabulário e da capacidade de interpretação de textos em inglês. Abaixo seguem alguns comentários dos alunos que ilustram os aspectos listados acima:

“Acho que não houve uma pessoa que não tenha aprendido nessa aula”.

“(...) além da língua inglesa, nos ensinou a interpretar situações, discutir e respeitar as diversas opiniões e pontos de vista”.

“Através da atividade, passei a ter uma outra visão a respeito dos protestos, adquirindo mais conhecimento”.

“Essa atividade nos proporcionou novas possibilidades de entendimento e pensamento, assim contribuindo para nossa formação pessoal e social”.

“Essa atividade nos ensinou a ler e interpretar um cartoon de modo crítico, ou seja,

entender o que o cartunista quis nos dizer através de seu cartoon.”

“Através da atividade passei a ser mais observadora e assim descobri coisas sobre o assunto tratado que não tinha ouvido falar antes”.

“A atividade não se limitou apenas ao inglês. Contribuiu de uma maneira muito forte,

pois o assunto envolve como nunca os jovens e muitas vezes não sabemos muitas coisas

sobre o tema e essa atividade ajudou muito para que possamos entender”.

“Aprofundei em um assunto que pode mudar o meu futuro (...), pois me conscientizou

para ser uma pessoa melhor, mais justa e que eu lute mais para o desenvolvimento do

meu país”.

“Além da língua inglesa, (a atividade) falou da realidade brasileira”. “(A atividade) me mostrou que nós podemos parar o mundo”.

“Além de aprendermos inglês, discutimos e ouvimos o que as pessoas pensam dessas manifestações no Brasil”.

Entende-se com os excertos acima que a atividade criou oportunidades para a conscientização dos alunos e o exercício da sua cidadania, uma vez que foram discutidas questões que afetam diretamente a realidade desses jovens. Crookes (2013) usa os dizeres de Freire para salientar que “a pedagogia crítica tem como objetivo facilitar a inserção dos alunos na criação de suas próprias histórias” (p. 71). As respostas dos alunos às atividades, conforme pôde ser observado, reforçam essa perspectiva e mostram que, de fato, eles estão dispostos a saberem mais e participarem na mudança de seu próprio tempo.

Outro ponto positivo a ser considerado foi o efeito do trabalho em grupo na perspectiva dos alunos. Depreende-se a partir de suas opiniões que esse tipo de interação foi de fato favorável para que eles pudessem não só se expressar, mas principalmente respeitar as opiniões dos colegas. O mais interessante, a meu ver, foi o fato de eles mesmos reconhecerem que aprenderam com as perspectivas dos colegas, o que mostra a importância da atividade também na formação pessoal e social dos alunos.

Além dos pontos positivos levantados pelos alunos, conforme o excerto acima, a professora participante relatou, em seu questionário, que sua impressão com relação à atividade foi muito

positiva, principalmente em se tratando do envolvimento dos alunos. Segue abaixo um trecho que comprova essa ideia:

Achei que os alunos superaram minhas expectativas ao compreenderem o conteúdo expresso nas charges e ao explicarem de forma clara e crítica o que estava acontecendo em cada figura.

Observa-se, dessa forma, que além de contribuir para a conscientização dos alunos acerca dos problemas no país, a atividade representou para eles uma oportunidade de expressarem suas vozes e construírem conhecimento a partir de múltiplas leituras de um mesmo texto. Através da exposição de vários pontos de vista, a turma refletiu sobre a possível intenção de cada charge analisada para, a partir dessa reflexão, ter uma noção mais abrangente sobre o que estava sendo reivindicado nos protestos.

As notas de campo também corroboraram os pontos positivos mencionados tanto pelos alunos quanto pela professora. É interessante observar que o envolvimento dos alunos com a atividade remete aos princípios do LC, presentes na revisão da literatura, especialmente no que concerne à conscientização desses alunos sobre um tema que os afeta diretamente. A atividade, nesse sentido, serviu como uma ferramenta de empoderamento desses alunos e do exercício de sua cidadania, aspectos que vão além da capacidade crítico-interpretativa trazida pela leitura crítica.

De acordo com McLaughlin e DeVoogd (2004), o letramento crítico propicia não só a compreensão do leitor acerca dos múltiplos pontos de vista em um texto, como também oportunidades para que esse leitor se torne um “usuário ativo” da informação disponível nos textos aos quais tem acesso, ao invés de reproduzir passivamente tais ideias (p. 7). Depreende- se a partir dos resultados obtidos nos instrumentos de coleta que, além da compreensão das charges, a atividade representou uma oportunidade concreta para o entendimento e o posicionamento desses alunos acerca de questões que, segundo eles mesmos, têm impacto direto em sua realidade, de forma a fazê-los pensar sobre seu papel na sociedade em que vivem.

4.3.1.3 Pontos negativos

Ainda que a atividade tenha apresentado pontos positivos relevantes na perspectiva dos alunos e da professora participante, dois alunos mencionaram os seguintes pontos negativos:

Aluno 1: Acho que a turma poderia ter participado mais.

Aluno 2: Acho que como as aulas são de inglês deveríamos usar mais o idioma.

Observa-se aqui o engajamento, ainda que de uma minoria, com a participação efetiva da classe durante as atividades desenvolvidas em sala e o reconhecimento da necessidade do uso do inglês durante as aulas, questão já problematizada na seção anterior.

Outro ponto negativo foi o fato de os objetivos linguísticos propostos na atividade não terem sido enfocados. Em outras palavras, apesar de a atividade ter possibilitado um ganho de vocabulário pelos alunos, uma vez que tanto a atividade quanto as charges exploradas estavam redigidas em inglês, as notas de campo revelaram que a revisão do presente contínuo, tema linguístico a ser trabalhado, não foi realizada. A professora participante apontou a falta de tempo como um dos fatores que impediram que os aspectos linguísticos fossem explorados mais profundamente (entende-se aqui que apenas os itens lexicais foram trabalhados na atividade). Em trecho da entrevista final, Ana menciona a questão do tempo como complicador para a aplicação das atividades e se justifica:

(...) com toda essa confusão que aconteceu a gente teve um tempo menor que o planejado, então muitas vezes a atividade era dada corrida, que não era o jeito que eu tinha pensado, e nem acho que o que você planejou, então foi muito corrido assim.

Além do tempo reduzido para a realização da atividade, decorrente de atrasos com o maquinário e a locomoção dos alunos até a sala de multimeios, acredito que outro obstáculo para o cumprimento dos objetivos linguísticos propostos na atividade tenha sido o uso do português em sala de aula. Embora o teacher’s guide apresentasse os objetivos da atividade e instruções claras sobre cada momento da aula, o presente contínuo não foi trabalhado devido ao uso exclusivo do português durante o processo. A professora alegou, ao final da atividade (off the record), que preferiu não trabalhar os objetivos linguísticos para engajar os alunos no tema e priorizar as discussões geradas pelas charges.

A professora mencionou também sua própria condição como obstáculo para a realização do trabalho, reconhecendo em um dado momento de sua entrevista que não se preparou para aplicar as atividades, devido à falta de tempo decorrente de sua situação atual:

Ah, o que eu desgostei, foi, foi... eu mesma, porque eu acho que eu poderia ter, assim, sentado mais, lido melhor, porque eu fui meio despreparada com as aulas por falta de leitura minha, por falta de um tempo que eu não tive, entendeu? (...) Então eu acho que o que eu desgostei foi de mim mesma. Eu acho que eu podia ter... me envolvido mais fora da sala para que dentro da sala o processo fosse mais tranquilo. Eu senti que eu estava, não estava preparada porque eu não me preparei.

Essa última fala da professora participante remonta às discussões sobre a condição docente, abordadas anteriormente nesta pesquisa. A colocação de Ana nos remete ao paradoxo entre o papel do professor no processo de condução de uma atividade, uma vez que é ele quem determina de que forma a atividade será trabalhada e com que perspectiva, e as condições em que ele atua – dentre as quais podemos citar a desvalorização da profissão, a ausência de tempo para estudo e formação continuada, e o baixo status da língua estrangeira na grade curricular (COX; ASSIS-PETERSON, 2008). Segundo Morrell (2005),

[p]rofessores precisam de oportunidades para aprenderem eles mesmos sobre estudos culturais, pedagogia crítica, cultura juvenil e letramentos multimodais. Eles também precisam de espaços para discutir sobre como incorporar letramentos novos e populares em escolas e salas de aula conservadoras (p. 10).

Dessa forma, ainda que ao professor sejam dadas oportunidades para aprender, por exemplo, em programas de educação continuada, o grande volume de trabalho somado à multiplicidade de atribuições fora da sala de aula leva à reprodução de um modelo de ensino que demande o menor esforço e, como consequência, priorize o cumprimento de uma obrigação em detrimento do compromisso com o aprendizado além do conteúdo programático estabelecido para o ano letivo.

4.3.1.4 Reflexões para ações futuras

Uma questão interessante abordada nas reflexões da professora participante diz respeito à forma como a atividade influenciou seu plano de ação em relação às próximas aulas, conforme pontuado a seguir:

No caso desta unidade, pretendo continuar discutindo com os alunos acerca de diferentes formas de protestos, enfatizando não só os aspectos críticos, mas também trabalhando com os aspectos linguísticos apresentadas na unidade.

Observa-se na fala de Ana sua preocupação com o aspecto linguístico, que não foi coberto nesta primeira atividade. Além disso, Ana demonstra uma impressão positiva em relação à resposta dos alunos ao tema e à discussão propostos, uma vez que ela pretende continuar criando oportunidades para reflexões críticas em suas próximas aulas a partir da ênfase em aspectos críticos (juntamente com os aspectos linguísticos) dentro do conteúdo a ser trabalhado.

Além de motivar ações de transformação das próximas aulas por parte da professora, alguns trechos extraídos do grupo focal também mostram que a atividade ofereceu reflexões sobre

possibilidades de transformação do ambiente segundo os alunos, conforme o exemplo a seguir:

K: (...) juntou grupos, todo mundo resolveu as perguntas... (...)

A: A gente podia expressar nossa própria opinião porque... Não que na sala a gente não consiga, mas lá na sala é o que, o professor fala e, entre aspas, a gente obrigatoriamente tem que entender o que a professora tá falando. Ali não, ali a gente podia dar nossa própria opinião, se a gente quisesse, assim, não, eu sou contra o que você tá falando a gente podia falar.

K: Ter liberdade de...

Mat2: De expressar... Porque ali era como se fosse um debate...

O excerto corrobora a visão positiva da turma sobre a interação e discussão em grupo possibilitada pela atividade 1, mencionada anteriormente. Depreende-se que esse tipo de interação possibilitou aos alunos “terem a liberdade de se expressarem, como se fosse um debate”. Além disso, a mudança do espaço físico constituiu uma grande mudança para os alunos, haja vista que eles associaram a possibilidade de “darem sua própria opinião” ao fato de estarem em um novo ambiente, com uma nova disposição de carteiras, executando um tipo de atividade que contou com sua participação efetiva e incluiu suas vozes.

4.3.1.5 Atividade 1: Conclusões

Analisando os dados trazidos pelos instrumentos de coleta acima mencionados, foi possível perceber que a primeira atividade implementada na turma D foi bem aceita tanto pelos alunos quanto pela professora, por tratar de um tema, segundo os próprios alunos, “de interesse de todos”, além de envolver discussões que possibilitaram o exercício da cidadania dos alunos e o desenvolvimento de sua capacidade crítica.

No entanto, ainda que tenha havido um ganho de vocabulário pelos alunos, uma vez que as charges e a atividade em si foram redigidas em inglês, os objetivos linguísticos não foram cumpridos. Alguns fatores que possivelmente contribuíram para esse fato foram o tempo reduzido da aula em função de dificuldades na nova sala, o uso do português em sala e a falta de preparação da atividade pela professora, ocasionada pela falta de tempo da mesma.

Apesar dos obstáculos, a atividade proporcionou reflexões tanto por parte da professora quanto dos alunos sobre pontos positivos a serem incorporados às próximas aulas. A professora valorizou as reflexões críticas e mostrou preocupação em incluir os aspectos linguísticos em suas próximas aulas. Já os alunos mostraram-se envolvidos com o tema, e consideraram o trabalho em grupo e a mudança de ambiente como os pontos mais relevantes para seu engajamento e sua participação efetiva durante a aula de inglês.

Passemos agora à análise da segunda atividade ministrada na turma D.