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Atribuição de competência ao presidente do tribunal para pro-

Outra característica do pedido de suspensão capaz de trazer questionamentos acerca de sua legalidade e constitucionalidade é o fato da norma que regulamenta o seu procedimento ter atribuído competência exclusiva ao Presidente do Tribunal res- pectivo para processar e julgá-lo. Essa regra é estabelecida em todas as formas de manifestação do pedido de suspensão, constante das leis 8.437/1992, 4348/1964 e 9.494/1997.

Linhas atrás, concluímos que o instituto em análise não constitui afronta ao princípio constitucional do juiz natural, vez que as normas que o instituíram caracteri- zam-se pela abstração e generalidade, e não se pode cogitar que as mesmas te- nham sido promulgadas ex post facto, nem que tenham como finalidade determinar a competência para apreciar um determinado caso concreto, seja ele preexistente ou não.

Mesmo feita esta consideração, permanece na mente uma pergunta cuja medi- tação parece ser necessária: porque o legislador fixou a competência do Presidente do Tribunal para apreciar o pedido de suspensão?

A questão se apresenta pertinente por ser verdade que o legislador bem pode- ria atribuir essa competência ao próprio juiz processante da causa, ou ao relator do recurso respectivo, ou mesmo a outro membro do tribunal a qual o recurso será diri- gido. Mas não, o legislador optou pela atribuição dessa responsabilidade ao presi- dente do tribunal.

O que faz o presidente do tribunal merecer essa distinção? Seria ele mais res- ponsável que os demais membros do tribunal? Seria uma espécie de fiscal dos seus pares, que a eles vigia?

Em uma primeira e superficial análise a conclusão a que se poderia chegar foi de que o legislador assim estabeleceu visando facilitar a consecução da medida sus- pensiva pela fazenda pública. Mas essa seria uma afirmação irresponsável. Primeiro porque assim pensar seria admitir como possível a torpeza do legislador no intuito de beneficiar a administração pública e o poder executivo, a cuja força incumbe mo- derar, em razão do sistema de freios e contrapesos (e aqui nem se cogite afirmar que a lei teria sido produzida pelo próprio Chefe do Poder Executivo, vez que as me- didas provisórias por ele editadas apenas regularam normas já criadas anterior- mente por lei ordinária). Em segundo lugar, porque os presidentes dos tribunais são juízes togados, tão magistrados quanto seus pares, conscientes de suas atribuições constitucionais e do papel que devem exercer na sociedade, e se exceções há, ser- vem apenas para confirmar a regra.

Os motivos do legislador foram outros, embasados em questões de interesse público. De fato, o Presidente parece ser órgão jurisdicional mais apropriado para decidir o incidente suspensivo. Primeiro, em razão do próprio cargo e de toda a litur- gia que o acompanha. Segundo, por se encontrar mais afastado do calor do litígio e com ele menos envolvido, o presidente do tribunal se põe numa situação distante dos debates jurídicos inerentes ao processo bem como da condição íntima vivencia- da pelas partes, e, portanto, teoricamente menos sensível aos anseios dos jurisdicio- nados. O Presidente parece ser menos comprometido com a defesa de determinado ponto jurídico envolvido na questão e mais atento às preocupações institucionais.

Outro fator levado em consideração para essa distinção feita pelo legislador é que o presidente do tribunal, durante aquele período em que está no exercício da- quele cargo, é, também, além de julgador, administrador público, já que responsável pela administração de um poder estruturado e complexo, que é o poder judiciário. Na circunstância do exercício do cargo de presidente é que os membros dos tribunais se deparam e aprendem a conviver com situações que de outro modo não lhe cruza-

riam o caminho ao longo de sua vida profissional. É ali que amplia a noção que tem das conseqüências práticas das decisões judiciais proferidas por ele e pelos demais julgadores, adquirindo preocupações institucionais que talvez antes não possuísse.

É de se notar também que o presidente já recebe reconhecido destaque sobre os demais integrantes dos tribunais, não só no âmbito administrativo, como também do ponto de vista jurisdicional. Inegável que a atribuição constitucional de exercício do juízo de admissibilidade dos recursos extraordinário e especiais conferem a eles poderes relevantíssimos, pois que lhes dão a possibilidade de decidir sobre o acór- dão que pode ser revisado, e o que merece trânsito definitivo. Essa ponderação mostra-se mais importante quando se analisa a quantidade ínfima de agravos de ins- trumento que são providos pelos tribunais superiores, o que denota a importância e razoável grau de acerto das decisões dos presidentes dos tribunais ordinários que negam admissibilidade aos recursos especial e extraordinário.

Essa escolha do legislador apresenta-se tanto mais apropriada quando perce- bemos – e isso foi apresentado de forma passageira no tópico anterior, mas será aprofundado quando discorrermos sobre o processamento do instituto aqui analisa- do – que ao presidente cabe exercer um mínimo juízo de delibação a respeito da matéria jurídica versada na causa principal, caracterizado em analisar a probabilida- de de reforma da decisão objeto do pedido de suspensão cotejando-a com a juris- prudência dominante e pacífica dos tribunais superiores. Ou seja, mais uma vez, o legislador elegeu o presidente do tribunal como responsável em analisar os casos concretos em comparação com as decisões das cortes especial e extraordinária.

Além disso, como se não bastassem, a jurisprudência consolidou entendimento de ser exclusiva dos presidentes dos tribunais ordinários, e de nenhum outro mem- bro do tribunal, a competência para apreciar medida cautelar que visa atribuir efeito suspensivo a recurso especial ou extraordinário ainda não admitido135. Nesses ca- 135 A Súmula 634 do STF diz: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conceder medida cautelar

para dar efeito suspensivo a recurso extraordinário que ainda não foi objeto de juízo de admissibilida- de na origem”.

A Súmula 635 do mesmo tribunal resolve: “Cabe ao presidente do tribunal de origem decidir o pedido de medida cautelar em recurso extraordinário ainda pendente do seu juízo de admissibilidade”. É sabido que o STJ admite temperamentos a essas súmulas, verificada a situação concreta e a ur- gência iminente.

sos, o presidente do tribunal pode conceder efeito suspensivo a medidas cautelares de modo a suspender julgados de suas turmas, câmaras, ou mesmo do órgão máxi- mo do tribunal. Contra essa decisão, não caberia sequer recurso, mas apenas o aguardo da subida do recurso especial ou extraordinário para, aí sim, realizar-se o pedido de revisão.

Assim, verifica-se que a constituição e a jurisprudência atribuem competência jurisdicional relevante e destacada para o presidente dos tribunais, de forma que não há nenhuma ilegalidade na lei ordinária que também o faça. Essa distinção, relacio- nada ao pedido de suspensão, é feita em razão do interesse público relevante, confi- gurado na proteção daqueles valores estatuídos na norma regente. O presidente do tribunal apresenta-se em posição que lhe confere mais serenidade, maior senso de responsabilidade institucional, destacada ciência das conseqüências práticas das de- cisões judiciais para o dia a dia da administração. Enfim, a escolha feita pelo legisla- dor obedece, pelo menos em tese, aos apelos do interesse público que devem orien- tar a nobre função legislativa.