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ATUAÇÃO METODOLÓGICA E PRINCIPAIS DADOS APURADOS

Recorreu-se ao estudo de caso por se considerar um método apropriado para descrever e compreender o ambiente escolar a partir da perspetiva dos sujeitos. Na mesma ótica, optou-se por um paradigma interpretativo, dando-se uma ênfase especial à opinião e às perceções dos sujeitos através de entrevistas semi-estruturadas, o que permitiu recolher dados na linguagem das próprias pessoas. A investigação permitiu identificar os problemas específicos da escola em questão, mas que podem ser comuns a outras escolas.

Numa fase inicial, obtiveram-se e sistematizaram-se dados sobre a escola e realizaram-se conversas informais com vários elementos do estabelecimento de ensino, nomeadamente, com a direção, professores do Gabinete de Apoio ao Aluno, diretores de turma, coordenadores de cursos profissionais, formadores, mediadores e técnicos dos cursos de educação de adultos. Finda esta fase, realizaram-se quinze entrevistas semi-estruturadas a professores, alunos, formandos e psicólogo educacional. As várias entrevistas de grupo tinham como tronco comum a caracterização da localidade, da escola, das relações entre alunos e entre professores, o projeto de vida (alunos/formandos) e o comportamento na escola. Foram ainda realizadas entrevistas a entidades parceiras da escola. As entrevistas permitiram perceber quais as principais preocupações dos entrevistados em relação à escola e ao seu funcionamento, e assinalar as perceções que têm uns dos outros e do seu próprio futuro.

Verificou-se que a escola não possuía nenhum organismo com técnicos sociais preparados para atuar em caso de necessidade social, ou até mesmo ao nível da prevenção e educação. Desta forma, os problemas que surgiam a nível social eram acompanhados pelos diretores de turma ou encaminhados para a direção, ficando por realizar um diagnóstico social personalizado dos casos dos alunos/famílias sinalizados.

Um dos professores entrevistados referiu que na sua turma de 23 alunos, apenas um aluno vivia com o pai e a mãe, sendo os restantes provenientes de famílias monoparentais ou, de certa forma, desestruturadas. Não sendo possível avaliar o impacto social deste facto, é, no entanto, um dado que poderia ser tido em consideração por uma equipa multidisciplinar. Na escola apenas funciona o tradicional apoio social que disponibiliza uma verba para aquisição de livros, material escolar, senhas de almoço e transporte. Caso existisse uma equipa multidisciplinar, seria possível intervir preventivamente e traçar o perfil dos alunos a nível pessoal e social. Desta forma, teríamos uma atuação mais centrada no aluno e os professores saberiam que alunos tinham na sala de aula e poderiam precaver-se com estratégias de atuação, podendo todos os casos, independentemente da sua escala de importância, ser acompanhados ou encaminhados devidamente. Atualmente, apenas em casos mais graves se contacta com o exterior e se acionam mecanismo legais de ajuda, através, por exemplo, da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), da Segurança Social ou do Grupo de Apoio à Saúde Mental Infantil (GASMI), no entanto, a existir uma equipa multifacetada, a situação poderia ser resolvida ao nível da escola de forma mais rápida e eficiente. Nesse sentido, um dos professores entrevistados, defendeu que as escolas deveriam ter “Gabinetes de Apoio Social que trabalhassem problemas atitudinais, problemas comportamentais e problemas sociais, porque repare, como é que se consegue ultrapassar alguns problemas que estas famílias têm se eles são provocados por famílias desestruturadas, se são provocados por desemprego ou emprego precário”. Estas problemáticas foram também realçadas pelos alunos da associação

83 de estudantes. Estes jovens defendiam a criação de equipas multidisciplinares, “para perceber o que é que se passa com o aluno em casa porque nem toda a gente tem um ambiente familiar perfeito o que se reflete na escola”. É referido no projeto destes alunos que estas equipas teriam competências para agilizar uma relação entre a escola e as entidades públicas e privadas de âmbito local e regional, no sentido de se intervir em situações problemáticas dos alunos e das respetivas famílias. A proposta destes alunos chegou a ser defendida durante uma edição do Parlamento dos Jovens promovido pela Assembleia da República.

Das conversas com os professores percebemos que a escola enfrentava problemas ao nível do comportamento na sala de aula. Os alunos foram descritos como muito “barulhentos” e “irrequietos”, tendo os próprios alunos admitido que não apresentam um comportamento ade- quado na sala de aula. Estes reconheceram que levavam os professores ao limite da paciência, havendo mesmo quem afirmasse que não existia respeito pela profissão docente. Verificou-se que este era um problema transversal a todos os anos de escolaridade, inclusive aos cursos noturnos, frequentados por jovens que não obtiveram aproveitamento escolar no ensino di- urno. As agressões verbais entre colegas e a professores foram assinaladas como preocupantes. Durante o tempo que durou a nossa investigação foram assinalados quatro casos de bullying e cinquenta participações disciplinares. Houve professores que sugeriram como forma de atenuar este tipo de problemas, a criação de um espaço de mediação e a implementação de programas de educação para convivência.

Verificou-se existir uma disparidade entre as ambições futuras dos alunos e o seu aprovei- tamento escolar e/ou comportamento, o que significa que os jovens não refletiam sobre a implicação futura dos seus atos no presente. Por outro lado, os professores assinalaram como preocupante a existência de alunos que afirmavam que “a escola não servia para nada”, e este sentimento de inutilidade da escola parecia ser transmitido de geração em geração, a avaliar pela baixa escolaridade do concelho e por declarações em que adultos e jovens afirmavam o conflito que tinham com as disciplinas mais abstratas. A facilidade que até então a população tinha na obtenção de emprego nos setores hoteleiro e da restauração contribuiu para acentuar a desvalorização da escola e consequente abandono escolar, conforme se comprovou nas de- clarações de um aluno que se encontrava a terminar um curso de formação à noite: “desisti da escola duas ou três vezes, estava na escola e depois chegava ao segundo período e aborrecia-me e como já estava habituado a trabalhar e a ter o meu próprio dinheiro, anulava a matrícula”. As faltas e os comportamentos desajustados são muitas vezes a resposta dos jovens que se sentem contrariados na escola. Um professor referiu que são alunos que “não sabem estar” e “são mal-educados”, acabando, alguns, por reprovar por faltas. As turmas mais problemáticas são as dos Cursos de Educação e Formação (CEF) e dos Cursos Profissionais porque, “são alunos que ficaram retidos muitas vezes, são alunos que têm interesses divergentes da escola, vivem em ambientes desestruturados e isso tudo provoca problemas aqui na escola”, referiu um professor. As medidas corretivas e sancionatórias, apesar de serem dissuasoras, não resolvem totalmente o problema tendo em conta que alguns alunos reincidem no comportamento.

Durante uma entrevista coletiva de professores, sugeria-se que as escolas deveriam ter técnicos que incentivassem os pais a envolverem-se mais nas questões escolares de forma a eles próprios motivarem os filhos a estudarem. No entanto, a realidade é que “os pais chegam à escola a pedirem ajuda, a dizerem que não sabem como agir”, referiu uma diretora de turma. Por outro

Investigação em Educação Social – prática e reflexão

lado, existem casos de negligência parental em que os filhos vêm para a escola com vestuário desadequado ou sem tomarem o pequeno-almoço “e depois vão ao supermercado comprar batatas fritas e colas para o pequeno-almoço”. São alunos que crescem com “faltas de atenção”, “pouco orientados” e “sem regras”, espelhando na escola todas essas carências socioeducativas.

De uma forma geral, os professores participantes nas várias entrevistas realizadas, definiram a população do concelho, em que escola se encontra inserida, como pessoas com pouca moti- vação para empreenderem projetos de vida. Uma problemática confirmada por um formando entrevistado que afirmou: “sei de quem tem projetos, eu não! Casei sem projetos absoluta- mente nenhum, tive filhos sem projeto absolutamente nenhum e as coisas que normalmente as pessoas projetam, no meu caso, não tenho projetado”. Uma outra formanda referiu que “se eu fizer planos para daqui a um mês, acho que as coisas não correm nada bem, então desabituei- me dos planos”. Referem os formadores que estas pessoas apenas pensam e agem tendo em consideração as necessidades imediatas, faltando-lhes uma capacidade para definirem objetivos e planificarem a sua vida. Daqui se percebe a necessidade de se trabalhar em conjunto com estes alunos e as suas famílias, novas perspetivas de vida, abrindo-lhes horizontes, facultando-lhes outros modelos, ajudando-os a refletirem sobre de que forma a escola pode ser importante para construírem um futuro mais consistente e feliz.

Enumeram-se os principais problemas detetados nesta investigação que, na nossa ótica convidam o educador social a intervir:

• Ausência de projetos de vida; • Desinteresse pela escola; • Abandono e absentismo escolar;

• Comportamentos desadequados em sala de aula; • Conflitos entre alunos e conflitos com os professores;

• Problemas familiares com interferência na escola (falta de acompanhamento escolar, problemas socioeconómicos; regras, limites, questões de saúde, entre outras).

Tendo em consideração o tipo de questões apuradas, parece ser um imperativo que a ação do educador social seja alicerçada numa forte parceria entre a escola, a família e a comunidade. Problemas sociais, emocionais, económicos ou de saúde, colocam em causa a aprendizagem exigindo uma intervenção concertada dos diversos atores sociais e em várias dimensões.