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CAPÍTULO 1 A PROPÓSITO DA TEORIA

1.5 O atual cenário das políticas de promoção da língua portuguesa no Brasil e no

Não basta notar e reconhecer o crescente número de estudantes estrangeiros no Brasil; é preciso preocupar-se com o tipo de política (e se há alguma) que tem sido promulgada no país para promover e acelerar com qualidade o Ensino do Português como Língua Estrangeira (EPLE). Pelo fato de nossa investigação ser em uma instituição de ensino superior brasileira, especificamente, em um curso de PLE, procuramos saber se já há políticas implementadas para o EPLE e encontramos algumas que têm fornecido suportes tanto didático e pedagógico quanto científico aos profissionais da área.

Consultamos, por e-mail, o Ministério da Educação (MEC) no Brasil, para saber da existência de documentos instituídos pelo governo brasileiro para a promoção do PLE, bem como para adquirir informações sobre as ações concretas atualmente empreendidas, no âmbito político, para o desenvolvimento do EPLE no Brasil e no exterior. Obtivemos, da Assessoria

43 Tradução nossa do seguinte trecho: right to identify with, to maintain and to fully develop one’s mother tongue(s) […] a self-evident, fundamental individual linguistic human right (SKUTNABB-KANGAS, 1998 p. 22).

da Secretaria de Educação Superior (SESu/MEC), a informação44 de que ainda não há documentos oficiais para o EPLE. No entanto, salientou-se que já existe uma Comissão PLE/PLA45 trabalhando na elaboração de um relatório46 sobre o tema para a Secretaria de Educação Superior (SESu) do Ministério da Educação (MEC). A resposta, por e-mail, acrescentou ainda que, em breve, seria possível acessar uma portaria que instituiria o Programa Idiomas sem Fronteiras47, o qual contemplaria inclusive sobre o ensino da língua portuguesa para estrangeiros.

Notamos que, até o momento de nossa consulta, não havia nenhum projeto concluído e oficialmente instituído pelo governo federal para a promoção do ensino de PLE. Percebemos, contudo, uma política claramente estabelecida para o ensino de línguas estrangeiras, para atender à demanda do programa Ciência sem Fronteiras (CsF), não havendo qualquer movimento do governo brasileiro em relação ao ensino de PLE para acolher os estudantes estrangeiros. Presenciamos apenas algumas ações não governamentais que têm sido desenvolvidas para o aprimoramento da área. Citamos aqui dois projetos, disponíveis em páginas eletrônicas da internet, que têm colaborado com o EPLE por se constituírem espaços tanto de produção quanto de troca de conhecimentos sobre o tema. O primeiro, de cunho científico, é a Revista SIPLE (Sociedade Internacional de Português Língua Estrangeira), lançada em outubro de 2010, que tem por objetivo, nas próprias palavras de seu atual editor chefe, o Prof. Dr. José Carlos Paes de Almeida Filho, “[...] manter aberto um canal mundial de difusão de trabalhos originais ao redor do ensino de Português e culturas de países de língua portuguesa a falantes de outras línguas” (ALMEIDA FILHO, 2013). A produção da revista, de edição bianual, ocorre no interior do Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada da Universidade de Brasília (UnB) e está ligada à Sociedade Internacional de Português Língua Estrangeira. Essa sociedade, fundada por ocasião do III Congresso Brasileiro de Linguística Aplicada realizado na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), no período de 31 de agosto a 3 de setembro de 1992, nasceu, segundo a Profa.

44

A resposta foi recebida por e-mail em 10 nov. 2014. 45

Português como Língua Estrangeira (PLE)/Português Língua Adicional (PLA). 46

Na ocasião da consulta, o relatório ainda não era de divulgação pública. 47

De acordo com o site informado abaixo: “O Programa Idiomas sem Fronteiras (IsF) foi elaborado com o objetivo de proporcionar oportunidades de acesso, através do programa Ciência sem Fronteiras (CsF) e de outros programas de mobilidade estudantil, às universidades de países onde a educação superior é conduzida em sua totalidade ou em parte por meio de línguas estrangeiras. Neste sentido, suas ações também atendem a comunidades universitárias brasileiras que passam a receber um número cada vez maior de professores e alunos estrangeiros em seus campi. Para atender tal demanda, suas ações incluem a oferta de cursos a distância e cursos presenciais, além da aplicação de testes de proficiência. Atualmente o Idiomas sem Fronteiras mantém ações para o ensino e aprendizagem das línguas inglesa e francesa”. Disponível em: <http://isf.mec.gov.br/>. Acesso em: 30 nov. 2014.

Dra. Itacira Ferreira, com o intuito de conferir à área de PLE “[...] um estatuto de profissionalização, seriedade e ampla divulgação”.48

O segundo projeto, de cunho didático e pedagógico, é o Portal do Professor de Português Língua Estrangeira/Língua Não Materna (PPPLE), que objetiva, de acordo com a própria plataforma, no tópico “O que é o Portal”, “[...] oferecer à comunidade de professores e interessados em geral, recursos e materiais para o ensino e a aprendizagem do português como língua estrangeira”.49 Ainda, segundo informações do site, o Portal, gerenciado pelo Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), com sede em Cabo Verde, tem um papel fundamental na promoção e na difusão da língua portuguesa e, por isso, é “[...] concebido, desenvolvido, alimentado e gerido de forma multilateral, funcionando como instrumento de cooperação linguístico-cultural entre os Estados Membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP)”.

O Relatório intitulado Languages for the Future [Línguas para o Futuro]50, elaborado pela British Council51 em 2013, mostrou que o português, além do espanhol, do árabe, do francês, do mandarim, do alemão, do italiano, do russo, do turco e do japonês, é uma das línguas estrangeiras de grande importância para o Reino Unido nos próximos vinte anos. Diante disto, salientamos a necessidade de se discutir, também, sobre a política externa para o EPLE. De acordo com o Relatório, a escolha das línguas que integra o português baseia-se em fatores econômicos, geopolíticos, culturais e educacionais no que tange aos interesses do Reino Unido e de seus negócios com o exterior. O Diretor de Estratégias da British Council, o Sr. John Worne52, acrescentou a importância de os ingleses aprenderem outras línguas. Em suas palavras, “[n]o Reino Unido, devemos aceitar que falar apenas o inglês não é suficiente

48

Disponível em: <http://www.siple.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=7:a-constru-da- sociedade internacional-de-portugulua-estrangeira&catid=14:a-sociedade&Itemid=55>. Acesso em: 29 out. 2014.

49

O Portal do Professor de Português Língua Estrangeira/Língua Não Materna (PPPLE) foi desenvolvido pelo Instituo Internacional da Língua Portuguesa (IILP). Disponível em: <http://www.ppple.org/>. Acesso em: 30 out. 2014.

50

O relatório completo está disponível em: <http://conferencialp.org/files/languages_for_future.pdf>. Acesso em: 28 out. 2014.

51

O papel do Conselho Britânico, desde 1934, conforme descrito no próprio site desta organização: “O Conselho Britânico cria oportunidades internacionais para o povo do Reino Unido e de outros países, e constrói a confiança entre eles em todo o mundo [...] Trabalhamos em mais de 100 países, conectando milhões de pessoas com o Reino Unido, através de programas e serviços no idioma Inglês, Artes, Educação e Sociedade [...] Nosso trabalho com o Inglês tem por objetivo produzir materiais linguísticos de alta qualidade para alunos e professores. [...]. Oferecemos mais de três milhões de exames do Reino Unido em todo o mundo, ajudando as pessoas a ter acesso a qualificações confiáveis para apoiar suas perspectivas de carreira e de estudo. Disponível em: <http://www.britishcouncil.org/organisation>. Acesso em: 29 out. 2014.

52

WORNE, J. Languages For the Future: which languages the UK needs most and why, British Council, 2013. p. 2. Disponível em: <http://conferencialp.org/files/languages_for_future.pdf>. Acesso em: 28 out. 2014.

em um mundo onde o multilinguismo está se tornando a norma”53. A conclusão do Relatório, além de mostrar que a aprendizagem da língua portuguesa interessa aos ingleses, salientou que o Reino Unido:

[...] precisa para construir um perfil de aprendizagem das línguas existentes incluir uma vasta gama de línguas e permitir que um grande número de pessoas aprendam línguas. Isso é fundamental, a fim de se evitar que o déficit em competências linguísticas aumente e permitir que o Reino Unido colha os benefícios econômicos e culturais disponíveis para aqueles que têm mais de uma língua à sua disposição (WORNE, 2013, p. 19).54

Além do reconhecimento pelo Reino Unido da importância da aprendizagem do PLE, conforme exposto no Relatório da British Council, notamos pela leitura do artigo Português como língua de herança: políticas linguísticas na Inglaterra, de Ana Souza e Olga Barradas (2013), da University of London, um aumento do ensino do Português como Língua de Herança (POLH). De acordo com Souza e Barradas (2013), por língua de herança compreende-se a língua materna dos pais ensinada, formal ou informalmente, aos filhos que crescem no exterior em razão da emigração dos pais. Ainda, segundo as autoras, a imigração de brasileiros na Inglaterra - recente se comparada à imigração dos portugueses neste país - teve um aumento a partir da década de 80, o que favoreceu, nos anos 90, a implantação de uma das primeiras escolas complementares55 para o ensino da cultura e do português do Brasil como língua de herança. O artigo mostrou a importância de se adotar políticas linguísticas nas escolas complementares brasileiras que lidem com conceitos mais flexíveis de língua para que não haja uma valorização do português em detrimento da língua inglesa, explorando assim a diversidade linguística dos alunos de POLH (SOUZA e BARRADAS, 2013).

Diante do exposto, no que tange à expansão do ensino da língua portuguesa diante do mundo, como língua estrangeira e/ou de herança, ressaltamos a necessidade de que ações do governo brasileiro sejam ampliadas e constantemente discutidas no sentido de promover e garantir o ensino do português a quem desejar aprendê-lo. Um exemplo de uma política

53

Tradução nossa do seguinte trecho: But in the UK we must accept that speaking English alone is not enough in a world where multilingualism is becoming the norm (WORNE, 2013, p. 2).

54

Tradução nossa do seguinte trecho: The overall conclusion therefore, is not that people in the UK are learning the wrong languages, but that the country needs to build on its existing language learning profile to include a wider range of languages and to enable far greater numbers of people to learn languages. This is crucial in order to prevent the current deficit in linguistic skills from increasing and to enable the UK to reap the economic and cultural benefits available to those who have more than one language at their disposal. . (WORNE, 2013, p. 19).

55

As escolas complementares, como o próprio nome diz, complementam a educação formal que os filhos de emigrantes recebem da sociedade que os acolhe, no caso do artigo, da sociedade inglesa (SOUZA, A; BARRADAS, 2013).

externa atual é o Programa de Leitorados, promovido pela Divisão de Promoção da Língua Portuguesa (DPLP) do Ministério das Relações Exteriores (MRE), que consiste, de acordo com o site do MRE56, no “[...] envio de professores academicamente capacitados a outros países para ensinarem a variedade brasileira da Língua Portuguesa, além da literatura e demais manifestações artísticas nacionais” (BRASIL, 2014). Ainda de acordo com o documento, existem atualmente “[...] 53 leitorados (eram 40 em 2006 e 45 em 2008) em 36 países (eram 30 em 2006), distribuídos em universidades de reconhecido prestígio [...] sendo a Europa, a América do Sul e a África [...] os maiores receptores de Leitores”.

Embora a política de leitorado tenha colaborado com a difusão da língua portuguesa e da cultura brasileira, destacamos que uma política mais ampla para o ensino do português deveria ser instituída para que as universidades tenham melhores condições de acolher os estudantes estrangeiros. Um exemplo, seria o oferecimento de cursos de PLE no exterior com o aumento do número de Leitores, a exigência do exame de proficiência em português pelas universidades brasileiras, a implantação de cursos online e, também, presenciais de português antes do início do semestre acadêmico nas universidades.