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Se nas áreas da psicologia e educação as pesquisas sobre a autoeficácia são consideradas ainda incipientes (AZZI; POLYDORO, 2009; IAOCHITE, 2016), a situação no campo da performance musical carece ainda mais de avanços sobre o tema. Nessa linha, Torres (2016) esclarece que "diante da relevância desse tema ainda há uma enorme lacuna na literatura brasileira sobre o assunto no que se refere à performance tal como seus possíveis desdobramentos práticos". (TORRES, 2016, p. 1237)

No campo da regência coral, após pesquisas em acervos virtuais em língua portuguesa de livros, artigos, monografias e dissertações, foi possível encontrar somente uma monografia sobre o tema da autoeficácia aplicada à regência coral. Nela, Fritzen (2004) aborda a questão da autoeficácia para se cantar afinado por parte dos cantores, apresentando resultados positivos da aplicação da TSC e da autoeficácia no rendimento da afinação vocal dos participantes. Tal achado confirma a hipótese de que os construtos da TSC e da autoeficácia podem ser aplicados ao contexto coral e regência coral com resultados positivos.

Para além desse estudo, não foram encontrados outros que tratem especificamente da autoeficácia na regência coral ou do canto coral em língua portuguesa. Outros estudos, por sua vez, tangenciam o assunto, abordando a regência coral e sua relação com temas correlatos, tais como a motivação (KOHLRAUSCH, 2015; LASS, 2015; TORRES, 2016; FUCCI AMATO; AMATO NETO, 2009).

Apesar do pouco conhecimento ou interesse nas pesquisas nesse assunto até momento, alguns autores defendem o potencial da TSC e da autoeficácia para o campo musical, tanto no cenário relativo à aprendizagem como também à performance e ao ensino, conforme as palavras de Azzi (2015) ao mencionar que

é importante destacar a promissora relação que a teoria social cognitiva vem revelando no campo musical, seu aporte teórico favorece a construção de um amplo cenário de investigação e discussão em direção à melhoria da aprendizagem, performance e ensino no campo musical. Alguns aspectos onde esta relação pode ser ampliada ou aprofundada são: ensino de música em diferentes níveis, aprendizagem observacional, práticas e processos autorregulatórios, crenças pessoais e coletivas e performance, só para mencionar algumas possibilidades. Há muito a ser explorado no campo musical em diálogo com teoria social cognitiva, e a boa articulação [entre] teoria e campo de investigação é fundamental para o avanço do conhecimento e seu potencial de intervenção em favor da qualidade e bem estar dos músicos no exercício de sua aprendizagem e profissão. (AZZI, 2015, p. 16)

Aqui a autora destaca dois pontos importantes sobre a pertinência da Teoria Social Cognitiva: o primeiro é o potencial de aplicação, ampliação e aprofundamento para o campo da performance, enquanto que o segundo trata do potencial para a promoção de crenças pessoais e coletivas. Ambos relacionam-se diretamente com a atividade coral.

Araújo (2015), por sua vez, destaca a perspectiva positiva acerca dos estudos da autorregulação no contexto da prática musical, sob a ótica da teoria da autorregulação (ARAUJO, 2015, p. 145). Com relação aos estudos da autoeficácia e performance musical, os pesquisadores Gary McPherson (2002, 2006) e Barry Zimmerman (2002) desempenham importante papel no estudo da autoeficácia e música na literatura estrangeira. Suas contribuições são consideradas de grande valia ao relacionar a teoria sociocognitiva de Bandura à área musical, conforme destacado por Azzi (2015):

Sem dúvida, os elementos apresentados nas descrições de McPherson e Zimmerman sobre o cenário musical nos dois textos de referência para a área (McPherson e Zimmerman, 2002, 2011) ajudam a perceber que de fato a autorregulação da aprendizagem derivada da visão sóciocognitiva de Bandura configura-se como uma contribuição de grande valia também para a área musical. (AZZI, 2015, p. 13) Concordando com a indicação de Azzi, Araújo (2015) também cita os estudos de McPherson e Zimmerman (2011), desta vez demonstrando resultados positivos associados à melhoria da performance musical, resolução de problemas técnicos e outros:

Na área da música, a teoria da autorregulação tem sido utilizada prioritariamente para compreender os processos motivacionais, afetivos e comportamentais envolvidos na aprendizagem de alunos de música à medida que se tornam independentes (McPHERSON; ZIMMERMAN, 2011, p. 131). A frequência da utilização de estratégias de autorregulação por parte de alunos de música esteve associada com a melhoria da performance musical, a resolução de problemas técnicos e interpretativos de determinadas peças musicais, o gerenciamento do tempo no estudo, o tempo de estudo formal, as crenças de autoeficácia e com a utilização de estratégias cognitivas. (ARAUJO, 2015, p. 145 e 146)

Qual seria então a relação entre autoeficácia e a autorregulação, oriundos da TSC de Bandura, com o conceito autoeficácia aplicada de McPherson e Zimmerman? Ou melhor dizendo: como se daria essa adaptação da autoeficácia para o campo da performance musical? Segundo Bzuneck (2001), a autoeficácia desempenharia o papel de mediação. Explica ainda que Bandura sugere que os julgamentos de autoeficácia atuariam como mediadores entre as reais capacidades e a própria performance, contribuindo para a predição de desempenho.

Bandura (1986) considera que os julgamentos de auto-eficácia [sic passim] atuam como mediadores entre as reais capacidades, que são as aptidões, conhecimentos e habilidades, e a própria performance. Isto é, esses outros fatores, que também contribuem para predição do desempenho, não produzirão as esperadas consequências, a menos que ocorra a mediação das crenças de auto-eficácia. (BZUNECK, 2001, p. 3)

Ao inserir a autoeficácia de forma prática para a performance de músicos, Araújo, Cavalcanti e Figueiredo (2014) sugerem que uma forma adequada de sua aplicação seria reforçar as crenças de autoeficácia nos músicos que já tenham crenças pessoais positivas. Em contrapartida, para os casos de músicos que sejam assolados por dúvidas e insegurança, deveriam ser fornecidas experiências exitosas e empoderadoras que desenvolvessem suas crenças de autoeficácia:

os músicos com fortes crenças de autoeficácia devem ter a oportunidade de continuar fortalecendo essas crenças pessoais. No entanto, aqueles que são assediados por dúvidas quanto às próprias capacidades precisam de experiências nas quais suas crenças sejam cultivadas e constantemente fortalecidas. (ARAÚJO; CAVALCANTI; FIGUEIREDO, 2014, p. 40)

Concordando com o exposto acima, Cavalcanti (2009), ao transferir a questão para a realidade de instrumentistas de tradição clássica, destaca também o fator determinante que a confiança nas próprias capacidades pode ter para um bom desempenho e até mesmo para a continuidade dos estudos musicais:

No caminho que conduz à expertise, instrumentistas de tradição clássica se deparam com obstáculos e desafios inerentes ao processo de aprendizagem. Nesse percurso, confiar nas próprias capacidades pode ser determinante para um bom desempenho ou até mesmo para a continuidade dos estudos musicais. (CAVALCANTI, 2009, p. 93)

Tanto no escopo geral da autoeficácia quanto no campo específico da performance musical e da regência coral, um componente que efetivamente poderá auxiliar para a adesão das crenças de autoeficácia do indivíduo é o da motivação, principalmente no campo da

regência coral. Esta atividade apresenta em sua natureza uma comunicação e relacionamento humano mais próximo e direto entre seus integrantes, inclusive com o maestro.