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2. Capítulo Teórico-Metodológico

2.4. Abordagens teóricas

2.4.2. Autonomia

O processo de busca por autonomia

Essa palavra demonstrou-se como elemento importante para pensar as configurações atuais em unidades de conservação e, também, no contexto estudado. Inicialmente, ter ou buscar autonomia estaria relacionado à ideia de conquistar uma maior “liberdade” 43; poder “andar com as próprias pernas” sem ter

que dar satisfação para ninguém ou nenhum órgão; adquirir a legitimidade da posse e permanência na terra; e poder gerar renda a partir do próprio “quintal”, ou seja, a partir do uso dos recursos de maneira direta ou indireta sem que houvesse a locomoção até o centro de Ubatuba ou Paraty para o suprimento de suas receitas.

Em unidades de conservação, a questão sobre a utilização dos recursos naturais é central nos esquemas de discussões e negociações e, por isso, em regiões onde estão em sobreposição territorial com caiçaras e quilombolas, a utilização dos mesmos está sempre mediada por proibições ou regras, que normalmente restringem o uso direto desses recursos, atuando como uma redução de sua liberdade. Assim, a utilização dos mesmos através da pesca ou por novas alternativas de uso, tanto da agricultura por meio dos acordos do Plano de Uso Tradicional, como de maneira indireta através do turismo, poderiam apontar para algumas estratégias utilizadas na busca de uma maior liberdade, de uma autonomia ou um esboço da mesma.

42 A categoria quilombola começa a se mostrar presente no Cambury em meados dos anos 2000, quando se inicia a demarcação de um território quilombola na comunidade. Esta questão será melhor trabalhada na descrição desse bairro, no capítulo 3.

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Categoria êmica bastante comum que pode ser utilizada como um dos elementos da abordagem analítica de autonomia. Essa palavra foi notada em algumas entrevistas abertas e foi percebida, também, com frequência nos trabalhos realizados na mesma região como Da Silva (2004) e Gallo (2014).

Esses elementos são de natureza material e, por isso, inicialmente, o foco da atenção do trabalho, para pensar sobre as estratégias de autonomia, se deu nas atividades de renda desses moradores ou, seus meios de vida. Ao longo dos trabalhos de campo, por meio da observação direta e das entrevistas foi possível apreender que nesse processo, para além da busca econômica, existe uma busca simbólica pela autonomia. Um exemplo para elucidar esta questão está na longa luta pela identidade quilombola que ocorre na comunidade do Cambury desde 2002. Esta apareceu como uma alternativa de receberem a propriedade coletiva da terra e, dessa forma, estarem livres ou libertos das ações, limitações e restrições relacionadas ao PESM/NP e do Parque Nacional da Serra da Bocaina (PNSB), unidade de conservação de jurisdição federal que também se sobrepõe aos territórios dessa comunidade. A resistência cotidiana desses moradores, pode ser configurada da mesma maneira como elemento dessa busca não material.

Além disso, outros elementos começaram a ser incorporados no processo da autonomia, o qual se evidencia não só com as problemáticas particulares referentes à justaposição dos bairros com a UC, como também na relação dos moradores com a prefeitura da cidade. Ou seja, questões relacionadas ao direito à cidadania e melhorias na infraestrutura do bairro são essenciais para pensar a complexidade da região. Por isso, outro ponto importante que passou a ser o foco deste trabalho foi a compreensão de uma realidade de sobreposições (urbana, rural e conservacionista)44, que se expande para além da questão parque-comunidade. É imprescindível a observação de localidades que representam a extensão periférica da cidade litorânea de Ubatuba e, também, de Paraty45.

Um aspecto essencial a ser destacado é que a busca por autonomia é vista como processo porque ela se desenvolve no tempo e no espaço. Seu desenho não é algo dado, fixo e que não se altera. Está em constante ressignificação e apresenta estratégias distintas ao longo dos anos. Assim, considero muitas questões envolvidas nesse caminho que não é algo colocado, diretamente, pelos moradores. A construção da ideia de busca tem sido delineada por mim em relação às

44 Agradeço às ricas contribuições da Prof.ª Dr.ª Mariana Chaguri no momento da qualificação desta pesquisa, em que, dentre outros elementos, chamou-me a atenção para uma realidade de inúmeras sobreposições, na qual, com o intuito de apontar a dinâmica urbana, não deveria ocultar as questões fundamentais que se relacionam aos traços rurais destas comunidades. 45

Ambas as comunidades estão localizadas próximas à divisa do estado de São Paulo com Rio de Janeiro e, consequentemente, aos limites entre Ubatuba e Paraty. Portanto, ambas são influenciadas pelas urbanidades das duas cidades, muito embora pertençam ao município de Ubatuba.

discussões em e sobre unidades de conservação – tanto em eventos científicos ou reuniões que envolvam essas questões, como também na literatura que aborda esse tema – e a algumas colocações de residentes das duas comunidades como, por exemplo, quando falam sobre as restrições às quais são submetidos, bem como ideias de protagonizarem atividades sem esperar a atuação de outras instâncias como da prefeitura ou do parque. Dessa forma, o delineamento do mesmo, assim como o conceito de autonomia, é uma representação analítica da realidade empírica estudada.

Ainda, ao pensar a ideia de um processo de busca por autonomia é possível trazer e mostrar os interlocutores desta pesquisa como agentes. Eles são protagonistas de suas histórias e, por isso, ao trabalhar suas perspectivas e apontar suas ações dentro dessa dinâmica, pretende-se apresentá-los com centralidade em um contexto de conflitos e lutas. Menezes e Malagodi (2009), pensando sobre o prisma de observação centrado nos atores, colocam:

A perspectiva centrada nos atores pressupõe, portanto, uma multiplicidade de resultados, e se propõe, assim, a investigar a heterogeneidade das

estratégias e lógicas dos diversos grupos sociais. Cabe, porém, estar

atento à diversidade de condições, enfim à heterogeneidade de práticas sociais e visões que viabilizam e efetivam a atuação dos indivíduos como sujeitos sociais no mundo (MENEZES E MALAGODI, 2009: 11, grifos da autora).

Nesse sentido, trazendo a questão da agência dos mesmos como centralidade, entende-se a heterogeneidade das práticas sociais como a substância que dá movimento e pulsão à busca por autonomia. A singularidade dos indivíduos como sujeitos sociais se mistura na multiplicidade de suas práticas em grupos e, consequentemente, neste processo.

Diante disso e buscando compreender a região a partir da ideia de uma busca por autonomia, dois aspectos substanciais foram desdobrados: 1) buscar e ter autonomia é sinônimo de agência, de ação e, 2) o processo de busca por autonomia demonstra que nessas regiões a complexidade de relações e conflitos se estende para além das questões com o parque, utilização dos recursos e o meio ambiente. O contexto de periferia urbana permeado por uma ruralidade dos tempos da lavoura e da pesca e pela unidade de conservação traz a localidade à luz de sobreposições que têm se tornado cada vez mais comuns em diversas regiões brasileiras no século

XXI, principalmente quando tomamos como base os rápidos avanços na compressão do espaço-tempo que rege a sociedade em expansão. Nas seguintes narrativas de diferentes moradores das duas comunidades é possível perceber um esboço de tal categoria analítica.

A questão da restrição, como já citada muitas vezes, vem no sentido de que não podem realizar atividades como em tempos antigos. Na colocação de uma moradora nativa da Vila de Picinguaba, estão evidenciados alguns tipos de restrições que lhes foram impostas e a recente problemática com a pesca que aparece, tanto em sentido estadual (da polícia florestal), como federal (da marinha): “já proibiram o caiçara de plantar, de caçar e de construir. Agora, querem proibir o caiçara de pescar? Querem proibir o caiçara de ser caiçara. Querem matar o caiçara” (DC, 05/2015).

A menção da perda de liberdade relacionada tanto ao parque como com a construção da estrada, como colocado por um morador quilombola do Cambury: “O pessoal aqui vivia da roça, tinha toda liberdade para trabalhar (…) E até a chegada da estrada. A gente não sabia que a estrada ia passar (…) E depois o parque” (EA,05/2015); e esse mesmo morador, em relação ao sentimento ainda presente, mesmo depois das diversas negociações que aconteceram com a UC, de uma falta da mesma: “Então, nós ainda temos alguma coisa assim do parque. Não tem toda liberdade” (EA, 05/2015)46

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Em referência à burocracia relacionada aos pedidos de autorização que devem solicitar ao parque para qualquer reparo em suas casas, uma moradora nativa da Vila de Picinguaba comenta:

Eu fico assim: eu tenho mesmo que ir lá no parque pedir para reformar meu telhado? Qual é a função de um parque estadual? De um parque dentro de uma comunidade? Isso que a gente fica se questionando. Porque se eu começo a fazer e não vou lá pedir, os caras vão vir bater aqui na minha porta (EA, 05/2015).

No tocante às ações, atividades e lutas das e nas comunidades, uma moradora nativa da Vila coloca: “Tudo que a gente tem aqui, foi fruto da própria

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Aqui referia-se, principalmente, à questão que tem atrapalhado o processo de titularização do quilombo: a sobreposição da comunidade com as duas unidades de conservação, o PESM/NP e o Parque Nacional da Serra da Bocaina (PNSB). Este último não aceita o reconhecimento do território quilombola.

comunidade” (DC, 05/2015); e uma moradora nativa do Cambury: “para a luz hoje, que está aqui instalada no Cambury a gente também teve que fazer um mutirão lá no parque. Ficamos lá três dias até sair a assinatura da luz. Então assim, tudo foi lutado pela comunidade” (EA, 09/2014).

Em relação aos pedidos de auxílios da prefeitura, um morador nativo da Picinguaba comenta:

Agora, nós vamos perder tempo vendo um sistema quebrado e pedindo ajuda? Parece que a secretaria da cidade está pior que a associação da Vila. Então, se vamos pedir material para fazer uma placa, vamos pedir para o pessoal nosso mesmo lá da Vila. Vamos nós mesmos buscar os materiais e quem faz. A gente vai perder tempo? (EA, 05/2015).

Ideias sobre a escrita de projetos pela própria comunidade tentando aprová-los nos editais abertos, via Associação de moradores e seleção de projetos que recebem das ONGs que aparecem nos bairros47 também foram questões fundamentais que influenciaram a ponderação e observação desse processo, bem como o foco deste trabalho para as estratégias que apontam para o delineamento do mesmo.

Diante disso, para traçar os caminhos de tal questão busca-se a base teórica desse conceito em autores que pensam as perspectivas e realidades campesinas permeadas pela “busca por autonomia” e resistência cotidiana e, também, pela mediação da autonomia honnethiana nos termos da teoria de reconhecimento recíproco.

A realidade estudada possui proximidades e dessemelhanças com a realidade camponesa do Brasil, como um todo. Em contextos de sobreposição territorial com unidades de conservação de proteção integral os moradores têm o seu acesso à terra restrito e, na maior parte, negado. Assim, a possibilidade de uso dos recursos de maneira direta é desestimulada nessas regiões, quando não proibida. No entanto, por estarem em realidade de parque, algumas questões parecem estar surgindo como possibilidades para o complemento de suas rendas.

47 Essa questão é explicitada na fala de um dos moradores do Cambury: “Tem capacitação? Se não tem a gente não quer” (DC, 05/2015). Ele referia-se à questão de que já existiram muitos projetos na região, porém, poucos deixaram resultados concretos, utilizando-se, apenas dos números de participantes para elaboração de seus relatórios.

Parte-se, então, do conceito de autonomia de Van der Ploeg48, ligado à condição camponesa, para guiar alguns passos em relação à realidade caiçara e quilombola em regiões de UC; o conceito de resistência cotidiana de James Scott, para uma apreensão simbólica da autonomia; e o conceito de Axel Honneth, pautado pela ideia de condições de infraestrutura de reconhecimento que criam possibilidades para a autonomia em uma luta por reconhecimento da cidadania dos sujeitos políticos estudados, mostra-se interessante para pensar a realidade dos mesmos quando consideramos os contextos de periferia urbana da cidade de Ubatuba e sobreposição com uma UC.

Autonomia pensada pelos estudos camponeses

Uma perspectiva centrada nos atores, pelo contrário, parte do pressuposto de que diferentes agricultores (ou categorias de agricultores) definem e operacionalizam seus objetivos e práticas de gerenciamento agrícola com base em diferentes critérios, interesses, experiências e perspectivas (LONG E PLOEG, 1994, apud MENEZES e MALAGOD, 2009: 11).

Jan Douwe Van der Ploeg é sociólogo holandês, com foco em trabalhos na área de Sociologia Rural sobre desenvolvimento rural, reforma agrária, campesinato, mercados agrícolas e alimentares, estilos de agricultura e, também, impactos das mudanças tecnológicas. Em seu livro Camponeses e Impérios

Alimentares, luta por autonomia e sustentabilidade na era da globalização realiza

estudos sobre o modo de produção camponês atual – o que também chama de recampesinização – e o seu papel e significado no mundo globalizado, tentando diferenciá-lo do modo de produção da empresa agrícola ou do agronegócio. Segundo ele, a agricultura camponesa tem origem e está inserida na categoria que define como a condição camponesa. Esta consiste “na luta por autonomia e por progresso, como uma forma de construção e reprodução de um meio de vida rural em um contexto adverso caracterizado por relações de dependência, marginalização e privação” (PLOEG, 2009: 18). Ainda, está mediada pela autogestão de recursos compartilhados e de iniciativas associativas.

48 Agradeço ao Prof. Dr. Fernando Lourenço pela profunda atenção conferida a esta pesquisa, bem como as contribuições, diálogos, conversas e discussões realizadas sobre os caminhos que começavam a ser delineados. As suas indicações bibliográficas foram fundamentais para a escolha do escopo teórico e analítico do conceito de autonomia. Ainda, as reflexões abordadas no Grupo de Pesquisas em Conflitos Sociais, coordenado pela Prof.ª Dr.ª Lucia da Costa Ferreira, que trazem autores importantes para as análises em unidades de conservação e conflitos socioambientais, também foram substanciais para tais definições.

Para demonstrar que essa condição camponesa difere daquela que domina os mercados capitalistas de produção global, ele mostra o acompanhamento, durante 30 anos, da história de casos de agricultores no Peru, na Itália e nos Países Baixos. O teórico defende que “confrontados com a dependência crescente de mercados globalizados, os camponeses adotam e reatualizam formas de resistência ou de distanciação da lógica produtivista e mercantil capitalista” (PLOEG, 2008: 1). Esse modo de produção global que conduz, invariavelmente, a crises econômicas, sociais, alimentares e ecológicas é praticado por aquilo que o autor chama de “novos impérios”: as firmas transnacionais que perpetuam um capitalismo selvagem, com a degradação dos recursos naturais. Em alternativa e resistência a essa forma de produção, verifica-se a ocorrência do que Ploeg explicita como reconstrução do campesinato ou recampesinização – a qual tem como principal característica, os fundamentos que permitem a constituição da “nova condição camponesa” (PLOEG, 2008).

A definição do que este pensador chama de “nova condição camponesa” possui a condição de agente do campesinato como característica central. Esta se baseia nos seguintes aspectos:

(...) as características fundamentais da condição camponesa são a luta por autonomia que se realiza em um contexto caracterizado por relações de dependência, marginalização e privações. Essa condição tem como objetivo e se concretiza na criação e desenvolvimento de uma base de recursos autocontrolada e autogerenciada, a qual por sua vez permite formas de coprodução entre o homem e a natureza viva que interagem com o mercado, permitem a sobrevivência e perspectivas de futuro e se realimentam na base de recursos e a fortalecem, melhorando o processo de coprodução e fomentando a autonomia e, dessa forma, reduzem a

dependência. Dependendo das particularidades da conjuntura

socioeconômica dominante, a sobrevivência e o desenvolvimento de uma base de recursos própria poderão ser fortalecidos através de outras atividades não agrícolas. Finalmente, existem padrões de cooperação que regulam e fortalecem essas inter-relações (idem: 40).

Dessa maneira, para Ploeg (2008), a busca de autonomia é um pilar básico para a condição camponesa. Nesse sentido, aponta, em uma nota de rodapé, que: “a terra sempre foi e ainda é um indicador essencial e uma metáfora para autonomia, mas o controle sobre os canais de comercialização, a disponibilidade de outros meios econômicos e/ou a capacidade de expressar sua própria identidade de forma inequívoca podem ser tão importantes quanto a terra” (idem: 318).

Para os moradores que estão em UCs de proteção integral, poderíamos pensar na autonomia como resposta às restrições que lhes foram impostas pela implementação do aparato estatal que previa a preservação integral do ambiente em questão. Desse modo, o PESM/NP poderia representar a metáfora que representa a dominação nesse sistema proposto por Ploeg. Ao impedir o uso direto dos recursos, quais outras alternativas pupilaram nessas regiões que podem representar o pilar básico daquilo que poderíamos definir como “a condição caiçara e quilombola49”? Ou

seja, quais alternativas de renda em detrimento da proibição aos antigos usos que propiciavam a subsistência dos moradores de comunidades que estão em sobreposição territorial com uma UC de proteção integral podem demonstrar os processos caiçaras e quilombolas de uma luta por autonomia? Ainda, existem outras fontes de renda que possam ser propiciadas pelo próprio “quintal”, que sejam uma alternativa ao antigo uso da terra?

Além disso, Ploeg (2009) comenta que a luta por autonomia resultante da condição camponesa tem como objetivo e materializa-se “na criação e no desenvolvimento de uma base de recursos autogerida, envolvendo tanto recursos sociais como naturais”, sendo a terra um “pilar central dessa base de recursos” (PLOEG, 2009: 19). Desse modo, será que opções como o uso indireto dos recursos, que poderiam propiciar a fonte de renda principal desses moradores oriunda de onde residem, representariam um apontamento de autonomia em substituição à não utilização da terra? Algumas formas de renda como a mercantilização da cultura a partir da definição da tradicionalidade50 poderiam suprir as condições necessárias de uma base de recursos adequada que permitiria autonomia?

Este autor será importante, portanto, para pensar sobre as novas alternativas de renda que são estimuladas em unidades de conservação e se as

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Uma parte dos moradores do Cambury, devido às condições demasiado degradantes em que se encontrava o bairro em função principalmente das imposições da UC, iniciam um processo de autoidentificação como quilombolas. Esta se mostra como resistência em relação ao parque e será melhor desenvolvida nos capítulos 3 e 4. No entanto, visto que o quilombo ainda não conseguiu a titularização, tanto os moradores que se autoidentificam como quilombolas ou como caiçaras necessitam realizar, atualmente, os mesmos processos burocráticos para a possibilidade de alguns usos que agora são permitidos pelos acordos conferidos pelo Plano de Uso Tradicional (PUT).

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Neste trabalho, a tradicionalidade é utilizada em referência ao enquadramento de alguns grupos sociais dentro da categoria de comunidades tradicionais. Esta foi uma política de reconhecimento jurídico proposta durante as discussões para a confecção do Plano de Manejo do PESM e conferiu alguns tipos de usos especiais àqueles que por ela foram representados. Os usos tradicionais, desta forma, podem ser associados às práticas comuns de tempos antigos dos moradores caiçaras, como a utilização da caça, da roça de coivara, construção de artesanatos, pesca, vida em comunidade, produção para subsistência e demais elementos culturais associados ao modo de vida antigo desses moradores. Quando forem abordadas algumas questões relacionadas aos acordos realizados durante a construção deste plano tal discussão será retomada.

mesmas poderiam enquadrar-se na base de recursos que, segundo ele, seria o pilar da luta por autonomia. Ou seja, atualmente, os moradores das duas comunidades conseguem gerar renda a partir do seu próprio “quintal”? Seria possível, através do uso indireto, substituir a importância fundamental da terra, nesse sistema? Existem outras atividades que entram nessa mesma lógica?

Autonomia pensada como resistência cotidiana

O que pode ser realizado no interior dessa camisa de força simbólica e, não obstante, até certo ponto, um testemunho da persistência e inventividade humana (SCOTT, 2011: 223).

O antropólogo norte-americano James Scott é autor dos estudos camponeses e grupos subordinados em condição de dominação e centra sua atenção para aquilo que ele denomina de resistência cotidiana. Em seu trabalho sobre a “Exploração Normal e Resistência Normal” traz um diálogo sobre as formas