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2 DA PRÁTICA DO EXAME AO ATO DE AVALIAR

2.2 A avaliação da aprendizagem no Brasil

$ SDUWLU GH 7\OHU TXH FXQKRX D GHQRPLQDomR ³DYDOLDomR GD DSUHQGL]DJHP´ D WHUPLQRORJLD ³DYDOLDomR GD DSUHQGL]DJHP HVFRODU´ SDVVRX D VHU XWLOizada com muita frequência nos meios educacionais e passou a nomear mesmo as situações de exames e seleção, gerando uma noção e uma prática equivocadas (LUCKESI, 2005).

O exame se refere a uma modalidade de verificação da aprendizagem que tem por objetivo aprovar ou reprovar os alunos. Os exames apresentam as seguintes características: i)

são pontuais, ou seja, o educando deve apresentar o conhecimento no momento em que está sendo examinado, não importando o antes ou o depois; ii) são classificatórios, aprovam ou reprovam o aluno, classificam-no como aluno bom, regular ou ruim; iii) são seletivos e antidemocráticos VHOHFLRQDP RV DOXQRV H[FOXLQGR RV TXH ³QmR VDEHP´ LY são estáticos, classificam o aluno em um nível como se este fosse definitivo. Os exames são fundamentados em uma prática pedagógica autoritária, em que o educador faz uso de provas como instrumentos para controlar e disciplinar os alunos (LUCKESI, 2005).

Luckesi (2001) assevera que esse modo de tratar a avaliação da aprendizagem ganhou tanta importância nos meios educacionais brasileiros, que nossa prática revela um direcionamento vigoroso, mesmo nos dias contemporâneos, para o que ele chama de Pedagogia do Exame. Nessa visão, uma significativa parte das atividades docentes e discentes está voltada para a resolução de exames e provas. Verifica-se que o interesse maior reside ainda, não na verdadeira aprendizagem do aluno, mas em sua promoção para a série posterior. Pais, escolas e alunos voltam a sua atenção para um bom resultado nas provas e estas, pelo poder que lhes foi conferido, são utilizadas, muitas vezes, como instrumento de negociação, tortura psicológica, ameaça e punição.

Nessa perspectiva, há um predomínio da nota, não importando os meios utilizados pelos alunos para conseguirem-na. As provas e notas são operadas como entidades dissociadas do processo de ensino-aprendizagem e são utilizadas como fator negativo de motivação, pois os estudantes devem se dedicar aos estudos não pelo prazer de aprender ou pela importância dos conteúdos, mas pelas ameaças que os professores muitas vezes impõem através desse instrumento (LUCKESI, 2001).

A Pedagogia do Exame gera consequências pedagógicas, psicológicas e sociológicas. Como consequência pedagógica, há uma superestimação dos exames em detrimento da melhoria da aprendizagem do aluno; psicologicamente, é útil para gerar personalidades submissas e; sociologicamente, serve para a função de seletividade social, contribuindo para a manutenção de uma sociedade de classes (LUCKESI, 2001).

As práticas avaliativas atuais ainda refletem a influência das Pedagogias Jesuítica e Comeniana, originadas, respectivamente, nos séculos XVI e XVII. Como vimos, a primeira destinava atenção especial às provas e exames, envoltos em um severo ritual de aplicação e a segunda utilizava provas como meio de estimular os estudantes ao trabalho intelectual.

Conforme referência anterior, Comênio afirmava que o medo constituía um fator importantíssimo para manter a atenção dos alunos (LUCKESI, 2001).

Já na sociedade burguesa, a Pedagogia Tradicional emergiu e se cristalizou, aprimorando mecanismos de controle por meio da seletividade escolar e dos processos de formação de conduta dos educandos. As provas e exames passaram a ser praticados de forma independente do processo de ensino-aprendizagem e da relação professor-aluno, conforme os interesses do professor ou da instituição de ensino, nem sempre considerando o conteúdo efetivamente ensinado.

Luckesi (2001, 2005) se opõe ao tipo de avaliação descrita acima, por ele denominada de avaliação classificatória, porém Demo (2004) assevera que toda avaliação tem como características a distinção, a comparação e a definição, que são elementos próprios da classificação. Quem avalia deve aplicar critérios gerais para o grupo, mas, ao mesmo tempo, reconhecer as diferenças pessoais e avaliar individualmente de acordo com as capacidades e dificuldades de cada um e isso requer algum tipo de classificação. Não há como avaliar sem classificar; avaliação que não classifica, não avalia. A classificação está embutida em qualquer análise que o sujeito faça. Assim, o autor sugere que a avaliação classificatória possui duas faces: aquela condenada pelos educadores e que deve, de fato, ser combatida por ser excludente e outra que é a classificação inerente e própria de toda e qualquer avaliação.

Para Demo (2004), toda avaliação é sempre injusta; sempre incômoda, pelo fato de que ninguém gosta de ser avaliado; sempre incompleta, pois é impossível realizar uma avaliação que considere todos os aspectos do avaliado; é sempre ideológica, porque nas relações de poder há influências; é facilmente autoritária, se o avaliador ocupa uma postura em que não pode ser questionado; é facilmente excludente; facilmente humilhante, se expuser o aluno e estigmatizá-lo; facilmente insidiosa, se utilizada pelo professor como arma contra o aluno. Se não há um pensar, um refletir sobre os riscos e os fatores negativos da avaliação, esta acaba por reincidir em práticas excludentes, autoritárias e reprovativas.

Atualmente, a Educação Brasileira é regida pela LDB nº. 9394, de 20 de dezembro de 1996, que prevê uma avaliação da aprendizagem na perspectiva formativa. Por conseguinte, deve-se realizar uma análise do desempenho global do estudante através de um acompanhamento contínuo, em que os aspectos qualitativos prevaleçam sobre os quantitativos. Apesar do respaldo legal, a prática avaliativa ainda continua a existir sob moldes antigos, muitas vezes por desconhecimento ou má interpretação da lei, pela

dificuldade de se abandonar antigas práticas pedagógicas, ou mesmo pelas vivências pessoais dos profissionais, que trazem para sua prática situações vivenciadas por eles como estudantes (BRASIL, 2001a; HOFFMANN, 2005; LUCKESI, 2001).

O que se propõe, ao invés de uma prática que enfatize o exame, é que haja de fato uma avaliação da aprendizagem, com o objetivo de diagnosticar a situação de aprendizagem do aluno, oferecendo dados que sirvam de base para a tomada de decisões com vistas à melhoria da qualidade da aprendizagem. A avaliação, nessa perspectiva, é uma prática: i) diagnóstica e processual, ou seja, a avaliação trabalha com resultados provisórios e sucessivos, compreendendo que o educando pode alcançar resultados mais satisfatórios e de melhor qualidade; ii) dinâmica, realiza um diagnóstico para a tomada de decisões pedagógicas adequadas à melhoria da aprendizagem do educando; iii) inclusiva, a prática pedagógica é voltada para o atendimento de todos os alunos, que apresentem ou não dificuldades; iv) democrática, pelo fato de incluir e estar a serviço de todos; v) dialógica, visa estabelecer uma aliança negociada entre educador e educando (LUCKESI, 2005).

Um ato avaliativo envolve três momentos claros e bem definidos: i) a coleta de dados; ii) a qualificação e a iii) tomada de decisão. O primeiro momento se refere ao uso de instrumentos que têm por função ampliar a capacidade de observação do avaliador, oferecendo a descrição da realidade a ser avaliada. Os instrumentos podem ser os mais variados: provas, seminários, redações, monografias, portfólios, questionários, dentre outros. O momento da qualificação é aquele em que o avaliador, a partir dos dados coletados, irá procurar compreender como se deu a aprendizagem do educando, quais as dificuldades que apresenta e o que conseguiu apreender. É o momento em que o avaliador analisa e compreende as estratégias de aprendizagem utilizadas pelo aprendiz. A tomada de decisão alude ao momento em que o avaliador/educador, com base no material colhido e na análise realizada, modificará ou fortalecerá sua prática pedagógica a fim de melhorar a aprendizagem do aluno. O avaliador/educador toma decisões pedagógicas que devem ser favoráveis à continuidade do processo de aprendizagem do educando (LUCKESI, 2005; HOFFMANN, 2009).

Embora, na contemporaneidade, haja uma visão diferenciada da encontrada nos primeiros momentos da história da avaliação, ainda se constata o intenso reflexo das primeiras ideias sobre o assunto na prática docente, caracterizando uma confusão entre avaliação e exame. Como resultado, temos hoje elevados níveis de reprovação e uma prática docente que

desvincula o ato de ensinar do ato de avaliar - o que cria uma dicotomia entre essas ações e torna a avaliação uma ação segmentada e descontínua, parcelando o conhecimento, além de não favorecer o desenvolvimento da aprendizagem.