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Avaliação do cortisol salivar após a administração de placebo, fludrocortisona, prednisolona, dexametasona e espironolactona

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO

4.2. Resultados da Avaliação Endócrina

5.2.5. Avaliação do cortisol salivar após a administração de placebo, fludrocortisona, prednisolona, dexametasona e espironolactona

5.2.5.1. Cortisol salivar em pacientes depressivos e controles após desafios

Nossos achados em relação ao cortisol salivar, diferente dos nossos achados no cortisol plasmático, indicam níveis basais (após o placebo) menores de cortisol salivar 30 minutos após acordar e na AUC0-30´-60´ nos pacientes depressivos comparado aos controles. Conforme, já discutido anteriormente, muito provavelmente essas diferenças encontradas entre o cortisol plasmático e o salivar nos nossos resultados se devam ao fato de que o cortisol plasmático foi avaliado através de uma única medida, enquanto que o cortisol salivar no nosso estudo foi avaliado em vários momentos, o que reflete melhor o padrão de secreção do

cortisol. É importante destacarmos também que o método de análise do cortisol salivar apresenta algumas vantagens, pois além de não ser um método invasivo, permite analisar o hormônio na sua forma livre e dispensa a necessidade de ambiente hospitalar e pessoal técnico treinado para a realização da coleta (Castro e Moreira, 2003; Hellhammer et al. 2009).

Estes resultados atuais confirmam nossos dados anteriores publicados em 2014, no qual encontramos níveis basais de cortisol salivar ao acordar menores em uma amostra de pacientes depressivos, semelhante a atual, com características depressivas atípicas, com estresse precoce e com tentativa de suicídio prévia (Baes et al., 2014). Estes achados são consistentes com alguns estudos da literatura que demonstram hipocortisolemia salivar em pacientes depressivos comparados a controles saudáveis (Strickland et al., 2002; Ahrens et al., 2008; Lindquist et al., 2008). Além disso, estudos têm demonstrado baixos níveis de cortisol em pacientes com outras doenças psiquiátricas relacionadas ao estresse, tais como transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), dor crônica, fibromialgia, síndrome da fadiga crônica e depressão atípica (Gold e Chrousos, 2002; Juruena et al., 2004; Juruena e Cleare, 2007; Yehuda et al. 2011; O´Keane et al., 2012). Baixos níveis de cortisol salivar também têm sido encontrados em pacientes depressivos com história de trauma na infância (Lopes et al., 2012) e em vítimas de abuso sexual (Trickett et al., 2010). A partir destes estudos que demonstram hiporegulação do eixo HPA em situações de estresse crônico, diversos autores têm apontado para a possível relação entre o trauma e o desenvolvimento de depressão atípica, o que tem levado alguns autores a chamarem a atenção para o papel do eixo HPA na etiologia dos diferentes subtipos de depressão. A depressão atípica tem sido associada em alguns estudos com altas taxas de negligência e abuso infantil, início mais precoce da doença, altas taxas de comorbidades psiquiátricas (distimia, abuso de substâncias, transtornos de conduta, transtorno do pânico e fobia social) e de transtorno de abuso de álcool e drogas familiar (Sullivan et al., 1998; Matza et al., 2003). Vários estudos têm demonstrado na depressão atípica hipoatividade do eixo HPA, menor atividade do CRH, hipocortisolismo e diminuição da atividade das vias noradrenérgicas aferentes (Tsigos e Chrousos, 2002; Posternak, 2003; Antonijevic, 2006; Juruena e Cleare, 2007, Stetler e Miller, 2011; O’Keane et al., 2012). Segundo Gold e Chrousos (1999) a atividade diminuída do CRH poderia estar especificamente relacionada aos sintomas de hipoativação (hipersonia, hiperfagia, letargia, fadiga e apatia relativa) presentes na depressão atípica (Gold e Chrousos, 1999). Por outro lado, a depressão melancólica tem sido associada a uma menor incidência de eventos estressores, menores taxas de transtornos de personalidade, menor incidência de tentativas de suicídio de baixa letalidade e menor prevalência de história familiar de alcoolismo (Coryell, 2007). Chrousos e Gold (1992)

sugerem que a depressão melancólica poderia ser caracterizada por uma ativação excessiva de ambos os sistemas de estresse fisiológico - o sistema lócus ceruleus-noradrenérgico e o eixo HPA, e que esta resposta anormal ao estresse refletiria em uma hiperatividade do HPA levando a um aumento da produção de cortisol nestes pacientes e a uma hiperatividade noradrenérgica (Chrousos e Gold, 1992). Com base nestas evidências, nossos achados parecem estar de acordo com a primeira linha de estudos, que demonstram um padrão hipofuncionante do eixo HPA com redução da secreção de CRH mediada pelo aumento do

feedback negativo nos pacientes depressivos avaliados no nosso estudo.

Além das diferenças individuais, alguns estudos demonstram que fatores como o gênero, a idade, o IMC, o tabagismo, o uso de estrógenos e de medicações psicotrópicas podem influenciar na resposta do eixo HPA (Kirschbaum et al., 1999; Uhart et al. 2006; Therrien et al., 2007; Stetler e Miller, 2011; Stalder et al., 2016). Assim como para os demais hormônios avaliados no nosso estudo, nossos grupos de pacientes depressivos e controles foram pareados quanto ao gênero, a idade e o IMC. Os grupos também não diferiram com relação ao uso de tabaco, de anticoncepcional e a presença de menopausa. Com relação ao uso de medicações psicotrópicas, por razões práticas no nosso estudo não foi possível testar os pacientes em um estado livre de medicações, o que pode estar influenciando nos nossos achados. No entanto, os dados da literatura são controversos quanto à influência de medicações psicotrópicas nas medidas do cortisol. Segundo uma metanálise publicada por Girshkin et al. em 2014, o uso de medicações psicotrópicas não influenciou no cortisol (Girskin et al., 2014). Os achados de Kunzel et al. (2003) e Kunugi et al. (2006) também sugerem não haver diferença da resposta do eixo HPA entre pacientes em uso ou não de medicações psicotrópicas (Kunzel et al., 2003; Kunugi et al., 2006).

Quando analisado os níveis de cortisol salivar após os desafios, diferente dos nossos achados em relação ao cortisol plasmático, encontramos nos pacientes depressivos após a espironolactona níveis significativamente menores de cortisol salivar às 22h do dia anterior, ao acordar, 30 minutos após acordar e na AUC0-30´-60´ do que nos controles. Encontramos também uma tendência após a fludrocortisona dos pacientes depressivos apresentarem níveis menores de cortisol salivar ao acordar do que os controles. Porém não foram não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos nos níveis de cortisol salivar após a prednisolona e a dexametasona. Dessa forma, estes achados demonstram que os pacientes depressivos apresentam menor estimulação do cortisol salivar em resposta ao antagonista MR (espironolactona) e tendem a apresentar uma maior supressão do cortisol salivar em resposta ao agonista MR (fludrocortisona), mas apresentam supressão semelhante do cortisol ao

agonista GR (dexametasona) e ao agonista misto GR/MR (prednisolona) em relação aos controles. Com relação a estes achados, cabe ressaltar ainda que quando analisado individualmente dentro dos grupos, nos controles encontramos níveis maiores de cortisol na AUC0-30´-60´ após espironolactona em relação ao placebo, enquanto que nos pacientes depressivos os níveis de cortisol entre a espironolactona e o placebo foram semelhantes, o que indica que os pacientes depressivos da nossa amostra diferente dos controles não respondem ao estímulo com o antagonista MR. Esses dados reforçam a nossa hipótese já apontada anteriormente em relação ao ACTH de que nos pacientes depressivos o uso de medicações psicotrópicas possam estar levando a uma diminuição dos níveis do metabólito ativo da espironolactona, o que explicaria o menor grau de ativação do eixo HPA encontrado nestes pacientes quando comparado aos controles. Portanto, com exceção dos nossos achados em relação à dexametasona, em que encontramos maior supressão do ACTH após a dexametasona nos pacientes depressivos, os demais achados em relação ao cortisol salivar parecem congruentes com os nossos achados em relação ao ACTH.

Além disso, nossos achados atuais suportam nosso estudo anterior publicado em 2014, no qual avaliamos a resposta do cortisol após a fludrocortisona e a dexametasona. Neste estudo encontramos níveis menores de cortisol salivar após a fludrocortisona nos pacientes depressivos, porém não foram encontradas diferenças nos níveis de cortisol entre os pacientes depressivos e os controles após a dexametasona. Sugerindo, assim, a possibilidade de um desequilíbrio entre os GR e MR, com aumento da atividade MR nos pacientes depressivos. No que diz respeito, aos estudos da literatura com agonistas e antagonistas GR e MR, assim como para o cortisol plasmático, para a avaliação da resposta do cortisol salivar a maioria dos estudos nesta área utilizam o teste da dexametasona. Sendo que, a maioria destes estudos mostra aumento dos níveis de cortisol salivar após a dexametasona nos pacientes depressivos comparados a controles saudáveis, indicando menor supressão do eixo HPA nestes pacientes associado a uma redução do mecanismo de feedback inibitório (Galard et al., 2002; Juruena 2006; Lamers et al., 2011; Jarcho et al., 2013). Em contraste, no nosso estudo, bem como nos estudos de Watson et al. (2002), Gervasoni et al. (2004) e Vreeburg et al. (2009), não encontramos supressão do cortisol salivar pela dexametasona no grupo de pacientes depressivos. Entretanto, a maioria dos estudos que encontraram maior supressão do cortisol salivar após a dexametasona entre os pacientes deprimidos foram realizados com pacientes com depressão do subtipo melancólico, resistentes ao tratamento medicamentoso e com sintomas psicóticos (Juruena et al., 2006; Lamers et al., 2011). Já a nossa amostra foi constituída predominantemente por pacientes com depressão atípica e com estresse precoce.

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