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1.2. Contextualização da Investigação

1.2.2. Avaliação das aprendizagens em Ciências

Nas salas de aula portuguesas, a avaliação das aprendizagens realiza-se segundo um equilíbrio difícil entre “políticas tendencialmente formativas e práticas predominantemente sumativas” (Pacheco, 2012, p. 1).

O Decreto-lei nº 74/2004, de 24 de março, que estabelece os princípios orientadores da organização e da gestão do currículo, bem como da avaliação das aprendizagens referentes ao nível secundário de educação, define a avaliação como o processo regulador das aprendizagens, que orienta o percurso escolar e certifica as aquisições que vão sendo realizadas pelos alunos. Define ainda que a avaliação tem por objetivos aferir os conhecimentos, competências e capacidades dos alunos e verificar o grau de cumprimento dos objetivos definidos para o nível secundário de educação. O mesmo decreto, no artigo 11º, estabelece que avaliação das aprendizagens compreende duas modalidades: a avaliação formativa, que é contínua e sistemática, permitindo ao professor, ao aluno e ao encarregado de educação obter informação sobre o desenvolvimento das aprendizagens para se proceder ao ajustamento de processos e estratégias de ensino e de aprendizagem, e a avaliação sumativa, que consiste na formulação de

sumativa interna, com um peso de 70% da classificação final da disciplina, que é da responsabilidade dos professores e dos órgãos de gestão pedagógica da escola, e a avaliação sumativa externa, com um peso de 30% da classificação final da disciplina, da responsabilidade dos serviços centrais do Ministério da Educação e da Ciência e que se concretiza através da realização de exames finais nacionais. Para Pacheco (2012), “é neste alinhamento de controlo externo que se enquadram as políticas de avaliação dos últimos anos em Portugal, enfatizando o

accountability face à melhoria” (p.4), ou seja, embora se enfatize a importância da avaliação

formativa, acaba por prevalecer a avaliação sumativa.

Para Wellington (2000), a avaliação formativa, onde o autor inclui a avaliação diagnóstica, tem uma maior capacidade de contribuir para a qualidade das aprendizagens em ciências, já que acompanha o processo, fornecendo informações sobre o que está a correr melhor e/ou pior, tendo então repercussões diretas no processo de ensino e de aprendizagem. A avaliação sumativa oferece pouca eficácia na promoção da aprendizagem das ciências, apresentando reduzidas potencialidades de contribuir para a promoção e regulação do processo de ensino- aprendizagem por surgir no final deste (Wellington, 2000).

Harrison (2005) realça também a importância da avaliação formativa nas aulas de ciências. Segundo a autora, esta é uma ferramenta indispensável para monitorizar a aprendizagem e para tomar decisões futuras relativamente ao processo de ensino e aprendizagem. Esta autora refere também a avaliação formativa como avaliação para a aprendizagem, assessment for learning, também referida por Cowie (2012), pois as evidências do processo de avaliação são usadas para conduzir a etapa seguinte do processo de ensino e de aprendizagem. Harrison defende que esta modalidade de avaliação leva à elevação de padrões e, por isso, vale a pena o esforço e tempo investido a desenvolvê-la. Ainda segundo a mesma autora, para que a avaliação seja para a aprendizagem, os alunos têm que nela participar ativamente e, portanto, requer aulas de ciências em que os alunos são encorajados a falar e a fazer e não apenas a receber informação. Deste modo, a avaliação para a aprendizagem leva o professor a maior conhecimento e compreensão dos seus alunos e, por isso, eleva a qualidade do feedback do professor relativamente ao trabalho desenvolvido por aqueles, conduzindo a ambientes na sala de aula de ciências que promovem a colaboração em vez da competição. Harrison (2005) realça ainda o facto de a avaliação formativa incentivar a autoavaliação e autorregulação para que os alunos atinjam a independência relativamente ao professor no seu processo de aprendizagem. Todavia, Black & Harrison (2010) chamam a atenção para alguns princípios que terão de ser cumpridos

quando se pretende que a avaliação formativa contribua para uma aprendizagem efetiva. Para começar, é essencial alcançar um verdadeiro feedback entre professores e alunos, o que incita mudanças significativas nas práticas letivas dos professores de ciências. É também necessário que os dados recolhidos pela avaliação formativa sejam utilizados para ajustar o processo de ensino e aprendizagem, o que implica uma maior flexibilidade dos programas para que estes possam responder às verdadeiras necessidades desse processo. Da mesma forma, é indispensável envolver ativamente os alunos no processo de avaliação. E, por fim, é importante estar atento às implicações que a avaliação pode ter na motivação e na autoestima dos alunos e aos aspetos positivos que advêm de envolver os alunos na autoavaliação e na avaliação diagnóstica.

No entanto, a avaliação para a aprendizagem ainda não é comum nas aulas de ciências (Cowie, 2012). Cowie (2012) considera que a avaliação formativa já não era uma tarefa fácil para os professores de ciências, devido às exigências de conhecimentos e habilidades para responder às necessidades das aprendizagens dos alunos. Mas esta tarefa tornou-se ainda mais difícil com a expansão dos objetivos da educação em ciências que passaram a incluir a compreensão da natureza da Ciência e o seu papel na sociedade em que se insere (Cowie, 2012). Por outro lado, Cowie (2012) realça a relação complexa entre avaliação e currículo como transformadora de práticas avaliativas. Os currículos de ciências têm vindo a sofrer várias transformações, passando de currículos com foco nos conteúdos científicos, para currículos focados em três domínios integrados, sintetizados por Duschl (2008): (i) estruturas conceptuais e processos cognitivos; (ii) estruturas epistemológicas usadas no desenvolvimento e avaliação do conhecimento científico; e (iii) processos e contextos sociais que condicionam a forma como o conhecimento científico é comunicado, discutido e debatido. Estas transformações provocaram a expansão dos objetivos dos currículos, o que tem implicações nas práticas pedagógicas e nas práticas avaliativas (Cowie, 2012).

Bennett (2003) considera que a avaliação sumativa em ciências tem limitações e traz problemas para a sala de aula: o conhecimento científico é reduzido à aprendizagem de conteúdos isolados; o nível cognitivo do trabalho em sala de aula é reduzido; o ritmo de trabalho na sala de aula é demasiado rápido para a aprendizagem efetiva; grande parte do tempo de aula é consumido na preparação de testes; o questionamento é inibido; as aprendizagens centram-se

considerados menos importantes; a autonomia dos professores é restringida e os seus métodos uniformizados; e, por fim, os professores são levados a desrespeitar os seus próprios padrões de ensino.

Se consideramos que uma educação em ciências equilibrada implica aprender ciências, aprender a fazer ciências e aprender acerca das ciências (Hodson, 1993), estas dimensões terão que ser incluídas na avaliação. Hodson & Reid (1997) não têm dúvidas em afirmar que devemos avaliar conhecimentos, procedimentos e atitudes, já que os três aspetos estão incluídos nos currículos de ciências. No entanto, os autores realçam que estas três dimensões exigem técnicas e instrumentos diferentes e variados. Segundo DeKetele & Roegiers (1996), existem três técnicas distintas para recolher informações: (i) observação; (ii) inquérito; (iii) análise de documentos. Na recolha de informações para a avaliação, recorrendo às técnicas citadas, podem ser usados instrumentos distintos; no caso da observação, podem usar-se Grelhas de observação ou Listas de verificação; no caso da técnica de inquérito, podem usar-se Testes escritos, Questionários ou Entrevistas; no caso da análise de documentos, podem utilizar-se instrumentos como Caderno de laboratório, Portfolios, Relatórios ou Fichas de autoavaliação (Leite, 2000).

Analisando o Programa da disciplina de Biologia e Geologia, 10º e 11º anos (DES, 2001), nas secções reservadas às considerações sobre a avaliação das duas componentes, concluímos que a avaliação surge como parte integrante do processo de ensino e de aprendizagem, já que “ensinar, aprender e avaliar são, na realidade, três processos interdependentes e inseparáveis” (p. 71). Por outro lado, é atribuída à avaliação uma função orientadora e reguladora, devendo ser caracterizada pela identificação de dificuldades e compreensão das causas destas para tomar decisões no sentido de as corrigir e remediar, tendo o aluno um papel ativo nessas tomadas de decisões. Assim, a avaliação formativa deve acompanhar todo o processo educativo para dar informações sobre a qualidade dos processos de ensino e de aprendizagem. Na medida em que o Programa de Biologia e Geologia integra as dimensões teórica e prática, não faz sentido a avaliação limitar-se ao domínio conceptual, esta deve igualmente integrar as dimensões procedimental e atitudinal das aprendizagens dos alunos. Além disso, é importante que os alunos consciencializem como construíram as suas aprendizagens, que destrezas e atitudes desenvolveram e que saberes mobilizaram. Deste modo, esta modalidade de avaliação requer a utilização de instrumentos de avaliação diversificados, tais como: relatórios de atividades, portfólios, mapas conceptuais, V de Gowin, grelhas de observação, listas de verificação, testes e

questionários, entre outros. De salientar que o Programa de Biologia e Geologia (DES, 2001) confere um papel preponderante à avaliação formativa mas considera indispensável criar momentos de avaliação sumativa. Desta análise podemos concluir que a avaliação das aprendizagens da disciplina de Biologia e Geologia assenta numa perspetiva construtivista da aprendizagem, inserindo-se no paradigma cognitivista e, portanto, é consistente com as orientações emergentes da investigação na área das Ciências da Educação.