• Nenhum resultado encontrado

2.2. Avaliação das aprendizagens: funções e modalidades

2.3.1. Um tema controverso

Os exames nacionais têm grande repercussão na vida de alunos, pais e encarregados de educação, pelo facto de classificarem e seriarem os alunos, dependendo o futuro deles dessa classificação e seriação. Mas os exames têm também repercussão na vida dos professores na medida em que, por um lado, os resultados que os alunos alcançam nos exames são um aspeto socialmente visível do seu trabalho e, por outro, quando os seus alunos alcançam bons resultados, estes são fonte de satisfação e orgulho profissionais (Cuthberson & Frost, 2005). Além disso, os resultados dos alunos nos exames têm também repercussão na vida das escolas porque estes resultados têm um papel importante no julgamento que a sociedade faz das delas (Cuthberson & Frost, 2005). Em Portugal, esta situação é visível nosrankings de escolas, uma seriação das escolas, públicas e privadas, baseada nos resultados obtidos pelos alunos nos exames nacionais, sem considerar o meio social e económico, o contexto educativo, os recursos, entre outros fatores que surgem como limitativos.

A avaliação é, sem dúvida, um tema cheio de contradições em educação, sobretudo quando falamos de avaliação externa. Garcia (2004) afirma que “o exame desde o seu aparecimento foi um espaço de conflito” (p.39). A maior contradição, segundo Méndez (2001), relaciona-se com o facto de, num sistema de educação que proclama a educação como um bem social fundamental para todos os cidadãos, aplicar-se um sistema de avaliação externa que seleciona e exclui alunos. Ou seja, numa escola igualitária e integradora, a avaliação externa aplicada revela uma conceção competitiva e elitista (Méndez, 2001). Barriga (2004) vai mais longe e afirma que o exame é um instrumento que, na sociedade de cariz neoliberal em que vivemos, legaliza a restrição à educação. Para Méndez (2001), uma outra contradição surge quando se insiste na responsabilidade e profissionalismo dos docentes, mas implanta-se um sistema externo de avaliação que, de forma subtil, restringe a autonomia dos professores e diminui a confiança no seu próprio trabalho, mas que também lhes retira responsabilidade. Desta forma, o exame perde a sua dimensão pedagógica e metodológica para aumentar a sua dimensão controladora (Garcia, 2004), passando a funcionar como um instrumento de controlo e limitação das ações de professores e alunos (Esteban, 2004). Neste ambiente, houve a perversão das relações pedagógicas, já que não se frequentam as aulas para aprender, mas para ter êxito no exame,

exames e os alunos apenas querem saber o que será abordado no exame (Barriga, 2004). Méndez (2001) considera que, em caso nenhum, poderão ser os exames a condicionar ou dirigir a aprendizagem. Pelo contrário, os exames é que têm que estar ao serviço da aprendizagem, do ensino, do currículo e do sujeito que aprende. De outra forma, serão os exames a determinar o currículo real, ou seja, o que realmente é praticado.

Para Barriga (2004), a introdução de exames teve um outro efeito perverso na educação. Este autor considera que, quando se inseriram exames nos sistemas educativos, o debate da educação ficou reduzido a um debate técnico, apenas centrado em aspetos técnicos como “a construção de provas, tipos de provas, validação estatística do exame e atribuição estatística de notas” (p. 70), o que condicionou a evolução da investigação em educação, reduzindo a pedagogia a aspetos técnicos, em vez de se consolidar a reflexão conceptual da educação sob perspetivas sociais, políticas, económicas, psicológicas e pedagógicas. Ora os problemas da educação, os problemas que surgem no processo de aprendizagem, objetivamente as questões metodológicas, não serão resolvidos com a aplicação de um sistema de exames mais exigente (Barriga, 2004). Barriga (2004) conclui afirmando que “a pedagogia, ao preocupar-se tecnicamente com os exames e notas, caiu numa armadilha que a impede de perceber e estudar os grandes problemas da educação” (p. 82).

Uma outra contradição surge quando se aplicam os exames num processo de ensino e aprendizagem que tem por base uma conceção construtivista. Para Méndez (2001), se se considera a aprendizagem uma construção com participação, compreensão, assimilação e apropriação e integração dos novos conhecimentos nas estruturas cognitivas existentes, alterando-as, a forma como se avalia tem que respeitar esta visão epistemológica do que é conhecimento. Ora, esta conceção construtivista da aprendizagem não se coaduna com formas tradicionais de avaliação em que o professor, ou outros agentes educativos, como no caso da avaliação externa, detém o papel preponderante, decisivo e unilateral na avaliação (Méndez, 2001). A mudança da conceção do processo de ensino e aprendizagem leva, necessariamente, a uma mudança do papel que devem desempenhar as técnicas de avaliação e a uma forma diferente de as implementar (Méndez, 2001). Nesta nova conceção de aprendizagem, a avaliação deve valorizar a qualidade do que foi aprendido, a qualidade da forma como foi aprendido, as dificuldades que surgiram nesse processo, a natureza dessas dificuldades, a

avaliação que traduz a aprendizagem como um “indicador válido da qualidade da educação” (p. 35). Se se aceita que a avaliação, para servir o processo de ensino e aprendizagem, é mais contínua e menos final, que é mais dinâmica porque se adapta aos alunos, que não negligencia a subjetividade dos intervenientes, que deve explicitar não só o que foi aprendido, mas também a forma como foi aprendido, que é mais qualitativa do que quantitativa (Almeida, 2012), não será razoável dar prevalecimento a uma avaliação que apenas classifica e certifica. Essa é uma avaliação que serve a sociedade, ao quantificar o que o aluno aprendeu. Este dilema está relacionado com a conceção que os agentes educativos têm de avaliação. Frequentemente, em educação pergunta-se como fazer a avaliação, em vez de perguntar porquê e para quê fazê-la, sendo as respostas a estas duas questões que definem as conceções de avaliação (Méndez, 2001). Será então fundamental clarificar quais os objetivos do sistema de avaliação em vigência no nosso país para o melhorar (Almeida, 2012).

Para Méndez (2001), vivemos numa sociedade que proclama a educação para todos os cidadãos e que apregoa a igualdade de oportunidades no acesso à educação, mas que não se preocupa com a igualdade de oportunidades antes e durante o percurso escolar dos alunos. É neste contexto que Méndez (2001) afirma que a natureza da avaliação educativa continua a ser conservadora, embora os discursos pretendam ser progressistas e reformistas.