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4.1 - Políticas de responsabilização das organizações escolares

A avaliação é um factor de regulação e governabilidade das sociedades contemporâneas e de gestão de relações de poder.

As principais abordagens à avaliação são: a avaliação externa e a avaliação interna ou auto-avaliação. À medida que as escolas se tornam mais autónomas a avaliação assume maior relevância.

A avaliação é uma obrigação da Lei de Bases do Sistema Educativo, evidenciada no art. 4.º, onde está inscrito o enquadramento geopolítico no contexto da União Europeia e determina a análise dos problemas relativos: à qualidade do ensino; à gestão das escolas; dos resultados dos exames e dos processos de intervenção educativa.

A Avaliação da Qualidade da Educação é, assim, um imperativo legal e um imperativo da construção europeia. Na Cimeira de Lisboa de 2000, o Conselho Europeu estabeleceu a meta de tornar os sistemas de educação e de formação na União Europeia ―uma referência mundial de qualidade, até 2010‖, conduzindo à elaboração de um conjunto de instrumentos de acção pública destinados ao cumprimento desse objectivo

político. Entre esses dispositivos emerge, como objecto central, as políticas de avaliação interna das escolas, a sua difusão, a adopção de referentes internacionais e a sua relação com o conhecimento especializado (César, 2007: 29).

A preocupação com a qualidade e a avaliação insere-se nos novos contextos sociais e políticos e no processo de reestruturação do Estado e responde, em simultâneo a estratégias das classes médias dominantes na definição das políticas públicas. A execução da avaliação é uma questão técnica, mas a produção de informação sobre a qualidade é uma questão política: os cidadãos têm o direito de conhecer os juízos de avaliação formulados e de ter garantias quanto à qualidade técnica e à idoneidade com que são formulados (Afonso, 2002).

As políticas de avaliação de escola legítimas e democráticas, devem confrontar o debate público e os novos modelos de governação baseados na concertação e regulação social. Avaliar a qualidade da política, das instituições, dos processos de gestão de meios, dos actores (professores e alunos) deve fazer parte do dia-a-dia. São os objectivos pilares de uma cultura de prospectiva e avaliação que sustentam as políticas educativas. Possuir "indicadores" ou referenciais que traduzam com a objectividade e o rigor possível o "alcance" da qualidade socialmente desejável é uma nova forma de conduzir as políticas e avaliar o caminho seguido.

A publicação da Lei n.º 31/2002, de 20 de Dezembro, Lei do Sistema de Avaliação da Educação e do Ensino Não Superior, impõe a estruturação de um processo interno de avaliação, que visa instituir uma cultura de avaliação promotora de desenvolvimento organizacional. Neste quadro teórico, a auto-avaliação das escolas enquanto instrumento de regulação pública é tida como a expressão de referenciais de conhecimento que induzem novas modalidades de governança. A análise dos instrumentos de acção pública expõe uma racionalidade política presente na relação entre governantes e governados, considerando cada instrumento como portador de um saber, de um poder social e de uma capacidade de o exercer (Lascoumes & Le Galès, 2004 citado por Barroso 2005).

Deste modo, a avaliação é a apreciação sistemática da valia ou mérito de um objecto. É o processo de identificar, obter e proporcionar informação útil e descritiva acerca do valor e do mérito das metas, da planificação, da realização e do impacto de um objecto determinado, com o fim de servir de guia para a tomada de decisões para solucionar os problemas de responsabilidade e promover a compreensão dos fenómenos implicados (Rosales, 1992, p.37).

4.2 - Modalidades de avaliação da escola

A avaliação dos estabelecimentos de ensino têm-se desenvolvido essencialmente segundo duas modalidades (Góis, 1997): modalidade de controlo e modalidade de regulação. Na primeira, a escola aparece como objecto de avaliação. Nesta perspectiva, procura-se obter informação sobre o estado do sistema educativo. A análise de dados serve para fundamentar a tomada de decisão dos órgãos centrais e/ou regionais. É normalmente designada como avaliação externa. A avaliação externa possibilita uma visão genérica do funcionamento e dos resultados das escolas, permitindo a introdução de factores de regulação, nomeadamente no que respeita à definição de políticas educativas, melhoria na gestão e utilização de recursos. Esta avaliação procura classificar as escolas através da comparação dos seus produtos. Para este efeito, utilizam-se indicadores objectivos, como os resultados obtidos pelos alunos em exames. Utilizam referentes pré-estabelecidos e aplicáveis a todas as escolas, permitindo a comparação (Afonso, 2002).

A avaliação externa tem evoluído para um papel menos interventor no sentido da orientação da acção educativa, desempenhando cada vez menos a função de elo de ligação entre a lei ou a norma e a sua aplicação no terreno. A avaliação externa têm evoluído no sentido de se constituírem como instâncias de avaliação que, pressionadas pelo Estado, pela sociedade, pelas famílias e pelas escolas, recolhem informação sobre o desempenho das escolas de uma forma regular, sistemática e credível, e a devolvem a todos os que têm parte na responsabilidade pela qualidade educativa (Clímaco, 2002).

Para esta mudança de paradigma muito têm contribuído as alterações na organização administrativa da educação, decorrentes da maior ou menor descentralização da administração e da maior autonomia das escolas, a quem se tem pedido que respondam de forma contextualizada às necessidades educativas das populações que servem e, simultaneamente, maiores níveis de exigência na qualidade das aprendizagens e nos níveis de desempenho. Esta avaliação tem sido frequentemente utilizada como instrumento de controlo social e educativo. A avaliação não é um problema meramente técnico. Enquanto prática social, a avaliação envolve relações de poder, sendo determinada por interesses, necessidades e exigências que legitimam determinadas políticas.

A avaliação do desempenho das organizações escolares é uma questão eminentemente política e, por isso, não pode ser reduzida à tecnologia dos procedimentos e instrumentos. O discurso crítico que põe em causa a avaliação externa, sublinhando as reais limitações dos dispositivos de avaliação, a subjectividade inerente ao processo avaliativo que a avaliação é uma démarche eminentemente subjectiva, construída a partir de valores de referência que devem ser expressamente assumidos (Afonso, 2002:100).

Na modalidade de regulação, a escola é sujeito de avaliação. Esta perspectiva tem como objectivo obter informação sobre os processos e produtos obtidos pela escola. Os dados obtidos são utilizados pela própria escola para a introdução de melhorias no seu funcionamento. Está associada à avaliação interna e auto-avaliacão. A comparação faz-se em relação a um referencial da escola, que analisa os resultados obtidos em função dos critérios por ela definidos. Cada escola identifica os critérios através dos quais selecciona o que quer avaliar, tendo como objectivo a melhoria dos processos desenvolvidos na escola (Figari, 1993, citado por Góis, 1997).

A tendência actual é, contudo, a de salientar a complementaridade dos dois quadros de referência, uma vez que a transferência de responsabilidades e poderes para as escolas terá, como efeito, o desenvolvimento de práticas de avaliação externa e de avaliação interna.

A auto-avaliação da escola consiste numa actividade realizada na escola, pela escola e para a escola, através da participação alargada dos diferentes grupos de actores. É a escola, enquanto organização, que é, simultaneamente, objecto e sujeito de avaliação. A auto-avaliação da escola é um processo que tem como finalidade a melhoria da escola através da utilização dos resultados desse processo. É eminentemente formativa, proporcionando aos diferentes actores um processo sistemático de auto-regulação.

Uma concepção mais globalizante de auto-avaliação da escola é a subscrita por Nevo (1996). Este autor entende a auto-avaliação da escola como uma actividade sistemática, envolvendo recolha, análise e interpretação de dados sobre o(s) objecto(s) de avaliação, neste caso, a escola como um todo ou uma ou mais das suas áreas. Tem que ser planeada de modo a servir os propósitos definidos, isto é, a responder às questões que se colocam e às necessidades que deve servir. Os resultados devem ser relevantes e pertinentes, devem originar recomendações que possam ser postas em prática. É feita na escola pelos membros da comunidade educativa, devendo constituir

um processo rigoroso, mas suficientemente acessível para ser desenvolvido pelos actores locais.

4.3 - Processo de avaliação da escola

O processo de auto-avaliação da escola será participado por todos os actores da comunidade educativa, devendo definir as áreas a avaliar e os critérios de operacionalização. Com a avaliação interna, pretende-se aprofundar e compreender os diversos aspectos da vida da escola. Deste ponto de vista, os resultados da avaliação interna têm mais possibilidades de serem valorizados e utilizados em prol do desenvolvimento da escola. Qualquer que seja a perspectiva em que o avaliador se coloque, a avaliação é uma operação fundamental de recolha de informação relevante sobre um dado objecto, permitindo a produção de um juízo de valor. O projecto de avaliação de uma escola resulta dos diferentes contextos sociais e económicas em que a escola se insere, das variadas características físicas dos estabelecimentos, do nível de recursos físicos e humanos, dos processos educativos adoptados e dos desiguais resultados atingidos pelos seus alunos.

Ressaltar os aspectos positivos da avaliação na edificação e manutenção de um sistema de ensino, na promoção de cultura colectiva e na clarificação contínua de objectivos. (Afonso, 2002:245) Nesse sentido, a avaliação que interessa só tem sentido se puder ser utilizada pelos produtores da avaliação para melhorar a actuação do sistema de acção no qual se inserem, afirmação que traz consigo consequências nas formas de fazer a avaliação (Guerra, 2002:248):

deve ser accionada de baixo para cima – do professor à área, da área à escola, da escola ao município, à região e desta ao país;

deve garantir que os objectivos locais de êxito educativo considerem as condicionantes e os recursos específicos de um determinado ambiente educativo, social, económico, etc., o que significa que é fundamentalmente uma avaliação localizada no tempo e no espaço e raramente generalizável;

é reflexiva, procurando produzir resultados mobilizadores para a mudança que suportem as decisões educativas na sua renovação que seja eficaz e portadora de resultados, adaptada à dimensão educativa e à cultura de cada estabelecimento.

melhor aproveitamento dos recursos.

uma organização moderna integra a avaliação como parte do processo de planificação e de tomada de decisão. A avaliação é destinada a descrever o estado do sistema, a apoiar as decisões e medir os níveis de concretização dos objectivos a que os actores colectivamente se propuseram.

A avaliação é uma construção colectiva contendo por isso uma dimensão social e política. É um acto democrático, porque pretende aumentar o conhecimento dos actores sobre o seu sistema de acção, reforçar a capacidade de reflexão sobre as decisões políticas e forjar consensos.

4.4 - Enquadramento legal da Auto-avaliação da Escola

Na análise desenvolvida, procurámos clarificar que a reorganização da administração, a pressão para um melhor serviço educativo e os contributos da investigação sobre a eficácia e melhoria da escola são as forças impulsionadoras que têm estimulado diferentes actores educativos face à problemática da auto-avaliação das escolas. Idêntica preocupação tem sido manifestada pelo Ministério da Educação e expressa nos textos dos vários diplomas legais.

A avaliação do Sistema Educativo é reconhecida desde 1986, na Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.° 46/86 de 14 de Outubro) estabelece que:

O sistema educativo deve ser objecto de avaliação continuada, que deve ter em conta os aspectos educativos, psicológicos e sociológicos, organizacionais, económicos e financeiros e ainda os de natureza política-administrativa e cultural (art.° 49.°).

A Lei do Sistema de Avaliação da Educação e do Ensino Não Superior, Lei n.° 31/2002 de 20 de Dezembro, vem estabelecer uma "cultura de avaliação global e continuada do sistema, abrangendo as escolas, os professores, os alunos, os funcionários. A partir da aplicação da Lei n.° 31/2002 de 20 de Dezembro, e considerando o seu Art.° 6.°, emerge a responsabilidade das escolas iniciarem, de forma coerente, organizada e sistemática, acções que conduzam à sua avaliação interna e que serão o suporte para a compreensão que a escola deverá ter da sua actividade, permitindo-lhe a tomada de decisões relativamente aos aspectos organizacionais e pedagógicos que deseja implementar.

Afonso (2000) enuncia "três motivações" para o desenvolvimento da auto- avaliação.

Em primeiro lugar, permite-lhes melhorar o seu desempenho, através da identificação de áreas mais problemáticas e da procura de soluções mais adequadas. Em segundo lugar, a auto-avaliação é um instrumento de marketing. A divulgação dos resultados junto da comunidade – pais, autoridades locais e outros membros da comunidade – contribui para o seu reconhecimento público e revela-se uma estratégia apropriada, não só para conseguir mais e melhores apoios, mas, também, para gerar maior procura da escola por parte dos potenciais interessados.

Por último, permite-lhes "gerir a pressão da avaliação externa institucional", quer antecipando a identificação dos seus pontos fracos e pontos fortes e delineando as estratégias adequadas de melhoria, quer preparando a justificação/fundamentação das fragilidades identificadas pelos serviços de avaliação externa.

Uma vez encarada a avaliação como instrumento de melhoria, parece necessário que se incentive o desenvolvimento de uma cultura de avaliação no sistema educativo, em particular na escola. Tal mudança cultural só poderá ser alcançada com recurso a mecanismos de acompanhamento, apoio, formação, negociação e contratualização, capazes de criar uma dinâmica de transformação. A par de uma cultura de avaliação é necessário promover uma efectiva cultura de responsabilidade – responsabilidade e prestação de contas do Estado para com os cidadãos, responsabilidade e prestação de contas dos cidadãos e dos profissionais com intervenção no sistema educativo.

Capítulo I