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Os Estados Unidos privatizados de American Flagg!

1.2 Bem-vindo ao ano

Em American Flagg!, Chaykin narra as aventuras de Reuben Flagg, um marciano/americano, ex-ator de uma série erótica, que foi substituído por um holograma, e por isso alista-se para servir como policial/segurança de shopping no planeta Terra. Flagg torna-se um Plexus Ranger, nome dado aos que protegem os Shopping Centers chamados de Plex Malls e também a população ao entorno desses estabelecimentos. A trama é ambientada em 2031, um futuro 48 anos distante do ano em que história em quadrinhos foi produzida em 1983. É nesse cenário que o autor procura expor suas ideias e temores de como o futuro poderia ser e suas perspectivas quanto ao potencial da ação individual para transformar o mundo em um lugar melhor.

Essa última ideia é indicada já na capa da primeira edição (figura 1), que apresenta o personagem principal, Reuben Flagg, segurando a bandeira dos Estados Unidos em suas mãos; ao fundo é possível perceber a mesma dividida em diversos pedaços, como se tivesse sido cortada por uma tesoura. O logotipo da revista traz um brasão estilizado com uma águia (animal símbolo dos EUA), as cores da bandeira e o nome da revista, que é um trocadilho com “bandeira americana”. A capa, além do logotipo da revista, traz algumas inscrições que sugerem ao leitor o que esperar da publicação: “Someone's gotta put it all back together... Reuben Flagg just might be the man. Back in the USA!!” [Alguém deve juntar tudo novamente… Reuben Flagg pode ser esse homem. De volta aos EUA]. Todos os elementos gráficos presentes na capa remetem à mencionada orientação patriótica da publicação e do autor. Além disso, ela indica que o personagem principal tem como missão reconstruir os Estados Unidos, representado pela bandeira em pedaços. Ou seja, é um indivíduo que tem uma grande missão pela frente.

Essa primeira edição é caracterizada por ser uma introdução ao mundo de American Flagg!, por isso faremos uma análise mais detalhada dela. No interior da publicação, a primeira página85 (figura 1), além de fornecer uma amostra do estilo artístico desenvolvido por Chaykin com o uso de quadros sobrepostos e carregados de informações, serve para localizar o leitor no tempo e no espaço da ficção. É 9h59 da noite, sábado, dia 4 de outubro e o ano é 2031; a cidade de Chicago, no estado de Illinois, é o local onde a trama da HQ se desenvolve. Mais precisamente, no Plex Mall de Chicago, que é um tipo de Shopping Center e aeroporto que recebe voos vindos de diversos

85 Em 1986, a editora lançou uma versão encadernada compilando as três primeiras edições de American Flagg! e para esse lançamento, Howard Chaykin escreveu e desenhou nove novas páginas de introdução, que mostravam um pouco do cotidiano da tripulação de voo entre Marte e Terra. Posteriormente, essas páginas extras passaram a fazer parte de todas as republicações da obra. Para nossa análise, optamos por utilizar o material como foi publicado inicialmente em 1983.

locais da Terra, da Lua e do planeta Marte; ao fundo, aparece o título dessa história: “Hard Times” [Tempos Difíceis]. Essa página apresenta uma frase do prefeito Charles Keenan Blitz: “Chicago is in the Plex, and Plex means business” [Chicago está na Plex, e a Plex significa negócios]. A frase sugere que a cidade, de certa forma, se resume ao espaço do Plex Mall, pois se trata de um local de maior importância, com funções que estão além do comércio de bens de consumo; mais adiante, na narrativa percebe-se que o local é, inclusive, onde a elite de Chicago reside.

Figura 1. Capa e página inicial de American Flagg! apresentando o personagem principal e um pouco do

contexto futurístico da narrativa (American Flagg!, n.1, p.1, 1983).

Além disso, a página fornece algumas informações sobre o conteúdo da programação disponível na TV – há monitores de televisão pagos à disposição do público na parede externa do Plex Mall –, indicando a existência de um campanha de arrecadação de fundos para uma instituição chamada, “Tricentennial Recovery Committee (T.R.C.)” [Comitê Tricentenário de Recuperação], e imagens de uma mulher seminua, indicando a existência de um conteúdo pornográfico disponível. Os aparelhos aceitam dinheiro ou o cartão de crédito American Plexpress que pode ser

usado para assistir aos seguintes programas: “Jerry Rigg Custom Firearms concurse 3”; “Love Channel Adult Center concurse 2” e “Plexus Ranger Station main concurse”.

Nessa primeira página, podemos perceber algumas das “novidades” que o autor idealizou ou projetou para o ano de 2031. Como voos espaciais entre Lua, Marte e Terra; grandes Shopping Centers que serviriam como abrigo para aqueles que tivessem como arcar com os custos; e um mundo caracterizado por uma acentuada presença de meios de comunicação na vida das pessoas – principalmente a televisão, que estava disponível para aqueles que podiam pagar.

A partir da segunda página, o leitor é introduzido ao interior do Plex Mall, um local amplo e limpo, no qual circulam muitas pessoas; é perceptível que algumas dessas pessoas estão portando armas pesadas, tipo metralhadoras, assim como no lado de fora, há aparelhos de TV espalhados por todo o local e que veiculam propagandas como o de uma arma a Magrum Automatic 666. A aparição de propagandas de produtos fictícios é algo recorrente em American Flagg! durante a fase de Chaykin nos desenhos. Armas e equipamentos utilizados pelos personagens aparecem como logomarcas ou acompanhados das iniciais “TM”, de trademark [marca registrada]. Esse recurso gráfico narrativo empregado pelo autor transmite a impressão que estamos vendo um programa de TV com constantes anúncios de patrocinadores.

Entre a segunda e terceira páginas, somos apresentados a três importantes personagens da trama: Hilton “Hammerhead” Krieger, chefe dos Plexus Rangers de Chicago; sua filha Amanda “Mandy” Krieger, controladora de tráfego aéreo, e Raul, o gato falante86. A trama da HQ deixa

claro que a relação entre Hammerhead e sua filha não é muita boa. E, após uma breve discussão com sua filha, Hammerhead Krieger se dirige ao setor de desembarque para receber o novo recruta chegado de Marte, Reuben Flagg. Além disso, Hammerhead havia mandado um colega contrabandear filmes pornográficos escondidos na bagagem e queria que esse produto passasse sem problemas pela alfândega.

Reuben está muito cansado devido a longa viagem e acaba provocando um incidente ao derrubar um representante do Brasil, Klein Hernandez. Krieger recebe Flagg e o reconhece como sendo o astro do seriado “Mark Thust: Sexus Ranger”, paródia erótica do trabalho realizado pelos Plexus Rangers. Posteriormente, Flagg e os leitores são apresentados a outra personagem importante na trama, a prostituta e cafetina, Gretchen Holstrum, responsável local pelo Love Canal; vale destacar que ela usa grandes brincos no formato do símbolo feminino (círculo e uma cruz). Logo na sequência, sem muito tempo para explicações, Flagg, Mandy Krieger e o resto dos Rangers do Plex Mall se unem para combater o ataque de uma Gogang, os Genetic Warlords

86 Ao longo das HQs Chaykin não deu nenhuma explicação para o fato de Raul conseguir falar. O gato é um importante aliado de Flagg nos quadrinhos e em algumas edições ele atua como narrador das aventuras do personagem principal.

[Senhores da Guerra Genéticos]. De acordo com um texto explicativo contido na revista, esse tipo de gangue é definido da seguinte maneira:

Gogangs. Clubes de motociclistas terroristas anarquistas, não afiliados a nenhum

dos 74 partidos políticos (na última contagem) legalmente registrados no Condado de Cook. Existem duas Gogangs locais, os Mutantes Éticos e os Senhores da Guerra Genéticos (havia cinco Gogangs: há rumores de que os Mutantes teriam comido os outros três) (CHAYKIN, 1983, p.8, tradução nossa)87.

A Gogang é facilmente derrotada com o uso de armas não letais, como balas de borracha e uma arma de contenção de manifestantes chamada, Snowball 99 [Bola de neve 99], armas carregadas com balas que contém um gás chamado Somnambutol, que deixa as vítimas em estado de dormência. De acordo com a narrativa, essa arma foi desenvolvida, a princípio, para conter fugitivos de um acidente nuclear ocorrido na Costa Leste dos Estados Unidos, em 1996. Os ataques de gangues ao Plex Mall são programados, ocorrem todos os sábados à noite, após ser exibido um desenho animado chamado Bob Violence, que faz muito sucesso entre os membros das gangues. Os Rangers não usam de força letal para deter esse tipo de ataque porque os membros das gangues “pagam impostos” (fala proferida por Hammerhead Krieger durante o ataque, p.8).

Flagg, que não teve muito tempo para se habituar ao local, acha muito estranha essa rotina de ataques, dão a impressão de ser um tipo de encenação, algo para movimentar um pouco as noites de sábado no shopping. Após o combate, o cansado Reuben Flagg, vai para seu quarto dormir, porém descobre que ganhou como presente de boas-vindas uma noite com Gretchen Holstrum. Os quadros sugerem que os dois fizeram sexo, porém não há nenhuma imagem explicitando o ato.

No dia seguinte, encontramos Mandy e o prefeito de Chicago, Charles Keenan Britz, conversando na praça de alimentação do Plex Mall. Os dois discutem sobre apostas ilegais no mercado negro de esportes e Mandy diz que o prefeito lhe deve 30 mil por causa de uma aposta; Flagg chega e atrapalha a conversa, é formalmente apresentado ao prefeito; que logo deixa o local. Flagg continua a conversa com Mandy, conhece o gato Raul e nisso, Hammerhead aparece e o convoca para sair do edifício e fazer um trabalho de rotina, verificando se as antenas de recepção de TV estão funcionando bem. No caminho, Hammerhead informa que foi ele que mandou Holstrum lhe dar as boas-vindas e aconselha Flagg a comprar um remédio chamado, Mañanacilina, o medicamento muito usado pela população e que é: “[...] um composto de anticoncepcional e antibiótico... mata todas as doenças venéreas que você teve contato, e com o

87 “Gogangs. Anarchist terrorist motorcycle clubs, unaffiliated with any of the 74 (at last count) political parties legally registered in cook county. There are two local Gogangs, the Ethical Mutants and the Genetic Warlords (there were five Gogangs: rumor has it the Mutants ate the other three)” (CHAYKIN, 1983, p.8).

currículo de Gret é melhor prevenir do que remediar” (CHAYKIN, 1983, p.13, tradução nossa)88.

Além disso, ele informa que sua noite com a prostituta foi filmada e se Flagg quiser uma cópia, é só pedir. Com base nas ações e falas, percebe-se que Hammerhead Krieger é apresentado como um agente da lei corrupto, envolvido em contrabandos, prostituição, pornografia e outros tipos de negócios escusos (que são revelados mais adiante na trama).

No decorrer da história, vemos Flagg e Hammerhead voando em veículo chamado de Hicycle, uma espécie de motoneve que voa e tem armas de fogo. Eles verificam se as antenas estão funcionando e conversam um pouco enquanto fazem isso. Ao longo desse trabalho, os dois têm um diálogo que expõe o quanto a transmissão de TV é importante para a corporação Plex. Já que uma das funções dos Rangers é garantir que as transmissões de TV não sejam prejudicadas ou interrompidas por algum grupo considerado subversivo. Na página seguinte, somos apresentados a um dos aspectos mais significativos da versão futurística de Chicago construída por Chaykin: a guerra urbana entre grupos políticos rivais. Vemos dois grupos, os Judeo-Christian-Moralist [Moralistas Judaico-Cristãos] e os Lesion Legion [Legião Lesão], envolvidos em um violento combate, ambos possuem armas pesadas, como bazucas, metralhadoras, lançadores de foguetes e tanques de guerra. Flagg fica extremamente surpreso ao ver a quantidade de armas que eles possuem e indaga a Hammerhead onde eles as conseguem? A resposta é a seguinte:

Hammerhead: A Plex, é claro. Existem cerca de 75 policlubes paramilitares

registrados em Chicago. A Plex fornece a eles armas convencionais, vidunidades89 e cartões American Plexpress. Eles conhecem as regras, sem

aeronaves, sem armas nucleares, sem combate em zonas comerciais e, claro, sem aventuras suburbanas.

Flagg: O que a Plex recebe em troca?

Hammerhead: Somente o vidshow de maior audiência em três planetas –

“Firefight All Night LIVE!” [Tiroteios à Noite Toda AO VIVO!] – a Plex faz uma fortuna com publicidade... e esses caras aparecem na TV. Troca justa.

Hammerhead: Os brasileiros já começaram a filmar seus tiroteios, grande

sucesso no Rio. C.K. me disse que a EuroPlex está vendendo para os Pan- Africanos.

Flagg: Pão e circo.

Hammerhead: O que é isso? Flagg: Nada… (Ibid., p.15-16)90.

88 “[...] combo contraceptive and antibiotic... kills all vd on contact and with Gret’s track record better safe than sorry” (CHAYKIN, 1983, p.13).

89 Vidunits no original, neologismo criado pelo autor juntando as palavras vídeo e unidade, seriam um tipo de filmadora usada para capturar as imagens dos combates urbanos.

90 “Hammerhead: The Plex, of course. There are about 75 registered paramilitary poli-clubs in Chicago. The Plex supplies ‘em with conventional weapons, vidunits and American Plexpress Cards. They knew the rules, no aircraft, no nukes, no combat in commercial zones and, of course no suburban adventurism./ Flagg: What does the Plex get in return?/ Hammerhead: Only the highest rated vidshow on three planets – “Firefight All Night LIVE!” – The Plex makes a fortune in revenues… and these guys get to be on TV. Fair exchange./Hammerhead: The Brazilians just start running firefights, big hit in Rio. C.K. tells me EuroPlex is shopping it to Pan-Afriques./ Flagg: Bread and circuses./

Nessa parte da narrativa, Flagg e os leitores são apresentados à dramática realidade da cidade de Chicago. Que ano de 2031 tornou-se um local devastado por guerras urbanas, envolvendo milícias fortemente armadas e gangues de motociclistas. O fato mais interessante dessa situação é que as milícias são “patrocinadas” pela corporação Plex, que na teoria deveria existir para garantir a segurança dos habitantes da cidade, mas na prática está envolvida em um lucrativo negócio de produção de um reality show que transmite ao vivo os combates que ocorrerem entre as milícias da cidade. E, como indica a fala de Hammerhead, o financiamento bélico da Plex implica no estabelecimento de certas regras para que os combates não sejam demasiadamente destrutivos. A narrativa apresenta um cenário teatral em que os Plexus Rangers, que trabalham para a corporação e são encarregados de combater o crime, aparentemente não têm de fato esse poder. Cumprem sua função de forma um tanto quanto encenada já que, tanto as ameaças das Gogangs, quanto das milícias, não podem ser realmente combatidas, pois geram grandes lucros à corporação. Tudo parece fazer parte de um grande show de TV91, um espetáculo lucrativo, entretanto com vítimas reais, a população mais pobre de Chicago, que não tem como arcar com os custos para viver na segurança do Plex Mall.

Hammerhead, aparentemente, não vê problemas nisso. A passagem mencionada indica que ele está um pouco entediado com a situação, mas está acomodado em sua realidade e posição social, não almeja realizar algum tipo de transformação nesse cenário. Porém, o novato, Reuben Flagg, tem uma visão diferente dessa situação. Quando se dá conta da realidade de seu trabalho e das condições de vida em Chicago, ele entra em um estado que a narrativa descreve como “desespero existencial”. Flagg se isola, momentaneamente, e faz a seguinte gravação em seu diário pessoal:

Eu cresci amando esse país e tudo o que ele representa. Minha mãe e meu pai entendiam isso... Mesmo sendo considerados “boêmios indesejáveis” pelos padrões da Marte Plex. Eu sabia que as coisas eram difíceis aqui... Quero dizer... Eu desisti da faculdade… Eu sei sobre… (CHAYKIN, 1983, p.16, tradução nossa)92.

Flagg não é um nativo da Terra, ele nasceu no planeta Marte, mas durante sua infância ouviu histórias sobre como os Estados Unidos eram, a narrativa indica que ele tinha esperança de encontrar algo que tivesse minimamente a ver com o que lhe contaram. No lugar disso, encontrou

91 O filme O show de Truman (The Truman Show), de 1998 dirigido por Peter Weir, escrito por Andrew Niccol, e estrelado por Jim Carrey, apresenta uma versão extremada de mundo dominado por transmissões televisivas e reality

shows no qual o cotidiano das pessoas se torna um espetáculo transmitido 24 horas por dia. A crítica feita por Chaykin

em American Flagg! vai um pouco mais longe que o filme, mas a obra vale como referência para pensar a questão da presença excessiva dos meios de comunicação em nossa sociedade.

92 “I grew up loving this country, and everything it stood for. Mom and dad saw to that… even if they were “undesirably bohemian” by Mars Plex standards. I knew the things were rough here… I mean… I’m a college dropout… I know about…” (CHAYKIN, 1983, p.16).

um país repleto de “[...] banalidade sem fim... e de uma vulgaridade entediante... pontuada por frequentes explosões de violência sem sentido” (Ibid.)93. A narrativa não diz como o personagem imagina que eram os EUA, a única coisa que fica clara é que não era nada do que ele esperava.

Na página seguinte, Flagg conta a história de como as coisas ficaram daquele jeito na Terra. Tudo começou em 1996, ano do efeito dominó, quando diversos incidentes ocorreram na seguinte ordem: acidente nuclear na Costa Leste; perda total das colheitas; URSS cai devido à insurreição islâmica; Europa Ocidental é abalada por revoltas por alimentos; Ásia assolada pela peste negra; colapso do sistema bancário internacional; guerra nuclear entre Irã e Israel; Alemanha reunificada lança míssil nuclear em Londres; Califórnia afunda e a peste se espalha. Todos esses acontecimentos levaram o mundo e, principalmente, os Estados Unidos e a União Soviética a um grande caos e desespero, a solução encontrada foi abandonar a Terra (temporariamente). Com apoio da indústria de telecomunicações, os EUA se transferiram para Marte e a URSS para a Lua. De acordo com o texto, somente as grandes corporações e alguns membros do governo e da elite da Terra é que tiveram condições para fazer essa mudança; o resto das pessoas ficaram para trás. É nesse contexto que surge a grande corporação Plex, com o objetivo de reabilitar o planeta para que sua elite retorne; a corporação é a responsável pelo “Tricentennial Recovery Committee (T.R.C.)”, mencionado anteriormente, e pelo que a narrativa indica, ela possui amplos interesses financeiros (comunicação, transportes, venda de armas, prostituição etc.). A corporação Plex é apresentada como o grande inimigo da trama de American Flagg!, ela é responsável direta e indiretamente por diversas mazelas que acometem o futuro elaborado por Chaykin. Ao longo das edições, gradualmente é revelada a extensão do controle e do poder dessa corporação sobre a vida das pessoas que ainda residem na Terra. Nesse ponto, American Flagg! apresenta uma trama pautada em ideias conspiratórias e que veem com desconfiança a atuação de grandes empresas.

Voltando à descrição da narrativa da primeira edição, enquanto Flagg registra em seu diário, ele é abordado por Cyril Farid-Khan, o líder dos Genetic Warlords, que veio oferecer um acordo, ou melhor, suborno. Cyril diz que o emprego de Flagg depende da ação de sua gangue e que o falecido antecessor de Flagg costumava pagar cem créditos semanais para que os membros da sua gangue errassem os tiros. Por estar em um estado de tristeza e desânimo, Reuben aceita pagar suborno a Gogang. Aparentemente, o personagem está cedendo aos esquemas de corrupção pré-estabelecidos no Plex Mall e, aceitando que seu papel como agente da lei é apenas um faz de conta, isso fica evidente quando ele diz: “Entendi, é um suborno. Deve ser o status quo aqui” (CHAYKIN, 1983, p.18, tradução nossa)94.

93 “[...] unending banality...and of mind numbing vulgarity... punctuated by frequent outburst of senseless violence” (Ibid.).

Tentando se distrair, Flagg vai assistir à TV e por sugestão de Mandy Krieger, sintoniza no programa Bob Violence. Ele percebe que cada quadro do programa está repleto de comandos hipnóticos subliminares que incentivam todo tipo de prática de violência. Chocado por essa descoberta, ele corre para pedir explicações a seu superior. Hammerhead fica extremamente irritado com Flagg e diz que não há nenhuma mensagem subliminar no programa. Afirma que Flagg deve estar louco, pois é o único que vê as mensagens. Logo depois, ele descobre que o gato falante, Raul, também vê as mensagens e afirma que o fato de Flagg ter nascido em Marte é o que permite que ele veja as mensagens. Em um estado de grande raiva, Flagg se junta aos outros Rangers para representar seu papel em mais um ataque semanal programado de Gogangs; em meio ao ataque Cyril pisca o olho, dando sinal de que ele fará o que foi combinado e diz: “Ei, Ranger,