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APÊNDICE 3- Tabelas de plantas introduzidas por Biezanko em Guarani das Missões

2.4. Uma breve história da Soja no Brasil

Com o nome científico de Glycine Max Merrill, a soja pertence à família

Leguminosae, planta próxima da ervilha, tendo hastes, folhas e vagens, mais ou menos

híspidas199 e flores geralmente verdes. Esta é uma planta pouco exigente quanto ao

clima, resistente à seca, podendo ser cultivada em quase todos os tipos de solo, mas com melhores resultados em terras férteis, com muito húmus ou argilosas (BIEZANKO, 1958, p. 7), além dos terrenos onde também se cultiva o milho. Segundo Biezanko (1958, p. 9) até 2000 variedades, eram conhecidas, entre as puras e fruto de cruzamentos, tal amplitude qualitativa incorre em diferentes aplicações como tempo de semeadura e colheita, formato da planta (caule, folhas, tamanho, etc.), espaçamento e profundidade da semeadura, tipificação da utilização: para forragem, semente, adubo, obtenção de óleo, etc.

A soja, segundo o próprio Biezanko em artigo retirado da revista Chácaras e

Quintais de 1963 (39-40):

é conhecida no Extremo Oriente desde os tempos mui remotos. As pesquisas históricas demonstraram que, já há mais de 5.000 anos a soja encontrou enorme aplicação e consumo, por motivo do extraordinário valor nutritivo de suas sementes. Sem exagero algum, devemos dizer, que desde fins do século XVII, a soja é alimento básico na China, Coréia, Manchúria e Japão. Na parte Oriental da Rússia Asiática, o chamado leite de soja substitui, em

muitíssimas localidades o leite de vaca. No comércio universal, a semente de soja cada vez mais ganha maior importância.

Na Polônia executaram-se trabalhos sobre seleção da soja, observações e estudos sobre esta planta, sob a direção dos professores J. Muszyński, amigo de Biezanko, e Z. Strazewicz, no Jardim das Plantas Medicinais da Universidade de Stefan Batory, em Vilnius, depois foi plantada em grandes e em pequenas propriedades horticultoras. Alguns destes aspectos discutiremos melhor depois, mas o importante é salientar também que Biezanko teria pesquisado sobre o produto antes de trazê-lo, tendo consciência do seu potencial, tanto que como coloca “A soja é uma planta que, sob diversos pontos de vista, merece ser cultivada em maior escala possível”, pois “possui utilidade fabulosa: este é um dos maiores fatores. O outro é ser uma planta de fácil cultivo. Acrescentaremos que é [...] resistente aos insetos e também às doenças”, ou seja, seria extremamente útil aos agricultores.

Já em 1934, Biezanko escreve uma série de artigos expondo as potencialidades da planta, estes textos foram publicados no periódico polono-brasileiro de Curitiba, o

Lud (Povo), todos em polonês, visando atingir um público leitor de poloneses, em 1958

os textos foram traduzidos e publicados, exatamente no bojo do processo de expansão da produção, comércio e industrialização da soja, quando destacavam-se grandes mercados importadores europeus como Inglaterra, Alemanha, Dinamarca e Holanda, os quais já desde os anos 1930 tinham interesse nas sementes. Naquele momento de escrita do artigo, segundo Biezanko, são Japão, China e Coreia os grandes produtores.

No Brasil, Dean (1989) escreve que um viajante encontrou soja em 1818 no Rio de Janeiro. Segundo Freire (1997), a referência mais antiga do produto é de 1882, num artigo intitulado, “Soja” no jornal da Agricultura do Rio de Janeiro, assinado por D’Utra, este escreve novamente, desta vez em São Paulo em 1899 delineando testes com a semente numa fazenda local. Ainda no século XIX, em 1892, também em São Paulo, são feitas referências ao produto com Daffert no Relatório Anual do Instituto Agronômico do Estado de São Paulo, quando houve experimentos daquela cultura.

Depois, no início do século XX, o cultivo da soja está relacionado à imigração dos japoneses, também em São Paulo, imigrantes estes que teriam contato com o produto no seu país natal e no Brasil, seriam os primeiros a plantar fora dos

estabelecimentos agronômicos. Depois em 1921, Löbde em São Simão-SP, teria trabalhado com variedades provenientes da Manchúria, na China e desde 1926 começaram a ser realizados estudos patrocinados pelo Instituto Agronômico do Estado de São Paulo, assim sendo, o sudeste parece ter sido o local, onde inicialmente o produto foi pesquisado, plantado e experimentado cientificamente, além de uma produção incipiente entre colonos japoneses imigrantes.

Para o caso do Estado do Rio Grande do Sul, as referências mais antigas citadas por Freire (1997) são em Dom Pedrito, no ano de 1901, onde teria ocorrido uma semeadura na fazenda Wellhausen, contudo, de acordo com Reis (1956 apud Freire, 1998), a introdução só teria ocorrido em 1914 com o americano E. C. Craig, professor de Agricultura da Escola Superior de Agronomia e Veterinária da Universidade Técnica do Rio Grande do Sul, não obstante redundou infrutífera devido à má relação das autoridades com os agricultores. Posteriormente, em 1924, em Santa Rosa a cultura teria se estabelecido e de lá, se difundido para outras regiões e municípios vizinhos do Alto Uruguai e Missões. Campal (1977) afirma que o Noroeste do Rio Grande do Sul nos anos 1930 viu a ação de dois “líderes da soja”: Pastor Lembauer e Biezanko.

Segundo Freire (1997, p. 2), “Nada se sabe quanto à origem da semente então usada. Supõe-se que foi introduzida por imigrantes poloneses que se fixaram naquela região e cujos hábitos alimentares incluíam o consumo de subprodutos obtidos a partir do grão de soja”. A partir daí, cita que “Em 1931, quatro colonos de nacionalidade polonesa adquiriram, no exterior, 30 kg de sementes e iniciaram a propagação da cultura”. E então “No ano seguinte, BIEZANKO [...], de nacionalidade polonesa, introduziu, na região de Santa Rosa, sementes de diversas variedades” (sic), citando artigo de Silva do Departamento de Estatística do Rio Grande do Sul, do ano de 1959. Os anos de 1930 marcariam o fim da adoção do produto pelos agricultores e na década seguinte já aparece com mais força e em algumas estatísticas (FREIRE, 1997), ainda que não naquelas que examinamos anteriormente.

Segundo Biezanko, referindo-se aos anos 1930 (1958, p. 6), “No Brasil, [...] as experiências sobre o soja são efetuadas na Estação Experimental da Escola de Agronomia, em Lavras (Minas Gerais)”, frisando que eram provenientes das plantações dos imigrantes japoneses que ele mesmo viu. Ainda na década de 1930 surge o nome de

Neme Abdo Neme, “uma das glórias da agronomia brasileira no setor de leguminosas” (FREIRE, 1997, p. 2), quem fez experimentos a partir de 1936, na Seção de Cereais e Leguminosas. Neme relatou os resultados dos experimentos realizados até o ano agrícola 1951/52 e as variedades indicadas para São Paulo. No Rio Grande do Sul, ainda foram realizados experimentos em Veranópolis e depois conduzidos pela Secretaria de Estado em Júlio de Castilhos, Encruzilhada do Sul e Osório, além da Estação Experimental do Arroz, em Gravataí, a qual trabalhou com variedades provenientes dos Estados Unidos. Outro personagem destacado para o Rio Grande do Sul é o já supramencionado pastor luterano norte-americano Lembauer, quem depois do cultivo rudimentar em Santa Rosa em 1914 teria proposto uma cultura mais sistemática quando esteve na cidade como missionário em 1923

Ele trouxe sementes de soja amarela comum e repassou aos colonos as informações sobre a qualidade proteica daqueles grãos. Os colonos começaram a plantar e a colher a soja e foram incluindo na ração dos porcos, que começaram a engordar mais rapidamente do que quando eram alimentados só com abóbora, mandioca e restos de cozinha. A soja era fervida e servida aos animais (CHRISTIENSEN, 2012, p. 17).

A partir de então, após o plantio inicial teria ocorrido a disseminação por repasse de um colono para outro de sementes e uma expansão da produção, não apenas na cidade, mas também na região, principalmente entre os colonos alemães. Tal fato levou a consideração da cidade de Santa Rosa como “Capital Nacional da Soja” e onde acontece a FENASOJA (Feira Nacional da Soja) anualmente, como resultado, ocorreu a oficialização pelo Projeto de Lei nº. 388/2007, da cidade como “Berço Nacional da Soja” (CHRISTENSEN, 2012, p. 30). Segundo Christensen (2012), os objetivos do pastor em muito se parecem com os descritos nas fontes sobre Biezanko, com ideias para melhorar as condições econômicas e alimentares dos colonos e permitir o aproveitamento dos gêneros derivados do soja.

Afora as questões de paternidade da soja, que como bem coloca Christensen (2012, p. 16) “Diz um velho provérbio que quem conta um conto aumenta um ponto. Isso é bem verdade em relação a soja”, onde muitas comunidades reivindicam o início do plantio. O importante destacar é que a partir da Segunda Guerra Mundial, a produção aumenta e já em 1942 são exportadas 480 toneladas do produto e em 1952, 77 mil

toneladas, num crescimento muito grande da produção, ainda que não constando nos censos pesquisados. Além disso, já no contexto dos anos 1930, iniciam-se as primeiras fábricas com o objetivo de beneficiamento do grão, destacando-se a WARPOL, na colônia Guarany, entre os colonos poloneses, a qual trataremos mais tarde. Com o tempo, o plantio da soja passa a ser associado com o do trigo proporcionando as bases para a modernização da agricultura no Rio Grande do Sul, processo que permitirá o grande desenvolvimento da leguminosa nas décadas seguintes e a decadência da agricultura tradicional da zona colonial.

La « dobradinha soja-trigo » ha transformado en pocos años el paisaje, en toda la franja occidental del Planalto Basáltico de la región meridional del Brasil y también en la zona de Misiones (RS). La exhuberante floresta latifoliada ha desaparecido, y de los legendarios yerbales indígenas, apenas restan ejemplares aislados. Sus siluetas austeras realzan la belleza de los campos de soja, todos cultivados en curvas de nivel. Así como en otros tiempos los respetara el hacha del mensú paraguayo o del caboclo brasileño, el tractorista rubio de la actualidad, también los respeta. Evita lastimarlos con los instrumentos aratorios que conduce. El sabe muy bien que nada mejor, para mitigar la sed y el hambre de las largas jornadas de labor, que el « cimarrón » o el « mate cocido». Las viviendas de los agricultores continúan escondidas en el fondo de los vallecitos basálticos. Siempre arrimadas al pequeño torrente que genera la fuerza mecánica o la energía eléctrica para el hogar. La dueña de casa y las « crianças », siguen cuidando de unas pocas vacas lecheras, de los cerdos y de las aves, estos últimos de razas muy mejoradas. Los depósitos domésticos de granos, ahora ya no son necesarios. Las cooperativas se han encargado de construir enormes almacenes graneleros, en lugares estratégicos que facilitan el flujo rápido de centenares de miles de toneladas de granos. Sus instalaciones monumentales, en las principales ciudades de la región, son tan imponentes como las iglesias que levantaron los guaraníes cristianos, en los pueblos inmediatos de las Misiones Orientales (CAMPAR, p. 193).

Merece, portanto, com base nos dados supramencionados, relevo a influência de agrônomos e outros profissionais estrangeiros na introdução da soja e sua participação na disseminação entre os colonos, em geral também estrangeiros ou descendentes, fundamentais para a adaptação do produto asiático em solo americano. Entretanto, é quando aumentam as exportações, bem como as indústrias da soja e existe então a possibilidade da venda, que os colonos vão passar a produzi-la em grande escala, interferindo efetivamente na condição camponesa deles e mudando suas relações.

A relação da soja com os poloneses é importante, pois no início dos anos 1930, este grupo imigrante já conhecia algumas variedades de soja nas colônias, fato

comprovado pelos estudos e artigos publicados em periódicos polono-brasileiros, bem como a atuação de vários intelectuais perante os colonos poloneses, desde o Rio Grande do Sul até o Paraná, caso analisado nos seguimentos abaixo.

2.5. A “Paternidade da Soja” e a relação Polônia, imigrantes poloneses, soja: