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APÊNDICE 3- Tabelas de plantas introduzidas por Biezanko em Guarani das Missões

1.2. A Imigração Polonesa no Brasil e no Rio Grande do Sul: entre colonos e

1.2.2. Fluxos migratórios

Para refletir sobre a chegada de Bieżanko, não devemos pensar a imigração polonesa apenas a luz do caso brasileiro, uma vez que o cientista viaja primeiro pela América Latina, antes de por último pisar em solo gaúcho. Necessitamos ampliar a

visão da imigração de poloneses para um caso mais territorialmente estendido e pensando a partir de etapas, as quais auxiliam na análise dos contextos imigratórios numa ampliação também temporal.

Segundo Dembicz e Smolana (1993, p. 22) “viéndolo desde el punto de las comunidades polacas establecidas ya en América Latina, dicha sistematización pudiera ser […] distinta expresándose en ocho etapas”: 1) De princípios do XVI até 1867: etapa de imigração individual de missionários, militares e alguns profissionais como engenheiros e médicos que trabalharam no Peru, Chile, Venezuela e Brasil. 2) 1867- 1914: etapa da emigração massiva, principalmente camponesa com fins de colonização rural. Esta etapa subdivide-se em duas fases: a) 1867-1889: na primeira os imigrantes provem principalmente da parte ocupada pela Prússia e é predominantemente voltada ao Brasil; b) 1889-1914: a segunda fase foi denominada comumente como “a febre brasileira” pela intensidade do fluxo imigratório ao Brasil, nela, juntos emigravam poloneses, lituanos, bielorrussos, ucranianos, alemães, judeus e russos, provindos das mesmas comarcas pluriétnicas e pluriculturais. Nesta mesma fase começou também a emigração para a Argentina, mas independentemente do destino seguia sendo uma emigração camponesa e familiar em busca de terra; 3) 1914-1918/20: etapa de suspenso

provocado pela I Guerra Mundial e seus conflitos derivados37, fase marcada

principalmente pela reaparição da Polônia no mapa-múndi político. 4) 1918/20-1939: a segunda etapa da emigração massiva, desenvolvendo-se um período de uma “emigração dirigida”, patrocinada e inclusive organizada pelo Estado. Neste momento, houve uma mudança dos fluxos emigratórios sendo o principal destino a Argentina e, em segundo lugar, o Brasil, mudou também a estrutura social dos emigrados, que eram “obreros en un buen porcentaje […]. Además estas oleadas ya sintieron las primeras señales de la política inmigratoria restrictiva de algunos de los países receptores”.

37 Guerra Polaco-Ucraniana (1918/19), a Guerra Polaco-Soviética (1918-20) e conflitos fronteiriços

As outras 4 etapas (1939-1949; 1949-1956; 1956-1988; 1988-em diante38) destacam o decréscimo da emigração polonesa devido aos problemas políticos da

Europa e do Brasil, existindo um fluxo de refugiados de guerra no pós-194539 e um

reforço tímido após 1988. Destarte, com base nestas informações podemos posteriormente traçar um arcabouço mais conclusivo quanto a Bieżanko, proveniente da quarta etapa citada, muito particular no seu contexto tanto na América como na Europa. O Brasil, como vimos, é um dos principais destinos de poloneses, já na década de 1840 recebeu o médico Czernovicz, que trabalhou na Corte assim como diferentes poloneses que esporadicamente aportavam no país. Posteriormente, a data de 1869 marca a chegada de poloneses a colônia Príncipe Dom Pedro em Santa Catarina a partir

da ação de Edmundo Saporski40 e o início oficial da Imigração Polonesa. No Paraná, a

partir de 1871 estes mesmos poloneses reimigraram instalando-se nas proximidades de Curitiba. Estas últimas datas, englobam as fases de imigração massiva, das quais vão formar-se as colônias polonesas, dentre elas, a que analisamos mais detidamente, que é Guarani das Missões.

Tabela 1- Demonstrativoda imigração polonesa para o Brasil – período 1871-1914

Local Até 1889 1890-1894 1895-1900 1900-1914 Total

Paraná 6.530 14.286 6.100 14.730 41.646 Rio Grande do Sul 300 27.000 - 7.000 34.300 Santa Catarina 750 5.000 - 1.000 6.750 São Paulo - 13.500 - - 13.500 Outros Estados 500 5.000 500 2.000 8.000 Total 8.080 64.786 6.600 24.730 104.196 Fonte: GLUCHOWSKI, 2005: 45

38 Seria interessante apontar uma periodização pós-1990, com o fim do regime comunista polonês e um

“renascimento” da polonidade no Brasil, capaz de intensificar fluxos e conexões, mas muito dificilmente uma Imigração.

39 Fim da Segunda Guerra Mundial, quando muitos judeus com qualificação profissional, imigram para o

Brasil.

40 Considerado o pai da imigração polonesa para o Brasil, imigrou em 1867 e seguindo o exemplo dos

alemães (Blumenau) em Santa Catarina organizou junto com o padre Zielinski uma colonização com poloneses naquela província.

Com relação aos números, como fica claro na tabela acima, poucos são os poloneses que não tem os estados sulinos como destino, ou seja, a maioria dos imigrantes estão em busca de lotes coloniais e não serão trabalhadores nas fazendas de

café paulistas41. Deve, portanto, ser manifesto que a imigração no Brasil será constituída

destes dois modelos (PETRONE, 1984. DACANAL, 1996), a ocupação de terras no Sul, muitas vezes oficial (seja nível estadual ou nacional) ou por empresas privadas, e o trabalho agrícola nas fazendas do sudeste, privado, que em grande medida, busca a substituição da mão de obra escrava.

Apesar dos dados citados, em relação à imigração polonesa é difícil precisar o número de imigrantes, uma vez que muitos deles vieram com passaportes alemães, austríacos e russos até a independência do país em 1918, justamente o período em que seu número foi o mais elevado. A partir de 1914, o número de imigrantes diretos da Europa começa a retroceder, todavia os dados são mais claros. Temos abaixo o demonstrativo para 1920 e 1937:

Tabela 2- Número de Poloneses frente à população total dos estados do sul do Brasil em 1920

Estado População total População polonesa

Paraná 685.711 100.282

Santa Catarina 668.743 18.810

Rio Grande do Sul 2.182.713 61.200

Total 3.537.167 180.292

Fonte: GLUCHOWSKI, 2005: 118

Tabela 3- Poloneses e descendentes no Brasil em 1937

ESTADO NÚMERO DE IMIGRANTES

Paraná 92.000

Santa Catarina 28.000

Rio Grande do Sul 83.000

Outros 14.000

Total 217.000

Fonte: Centralny Zwiazek Polaków w Brazylii, 1937 apud GRITTI, 2002.

No primeiro caso, Gluchowski faz uma comparação com a população total dos estados em que aparece a importância dos poloneses na região sul do Brasil, muito

41 Arquivo das Atas Novas de Varsóvia, seção MAE, pasta n° 9639, pp. 155-189. Perspectivas do

provavelmente este número registra também descendentes, pois aparecem discordâncias

com relação ao censo brasileiro de 192042 que registra aproximadamente 29 mil

poloneses, contabilizando “estrangeiros”, ou seja, nascidos na Polônia. No segundo quadro, com relação ao número de imigrantes, cofirmamos em alguma medida os dados apresentados anteriormente, com um crescimento da população polonesa total, mas podemos ver discrepâncias, como o caso paranaense, em que despontam números menores em 1937 que em 1920, resultado talvez de diferentes critérios de identificação, ou até mesmo, uma diminuição da população polonesa em razão de reimigração e/ou morte dos imigrantes. Entretanto, o que queremos demonstrar é que quando o cientista Ceslau Bieżanko chega ao Brasil, se depara com a região sul repleta de compatriotas e descendentes, deslocando-se ao encontro destes patrícios em diferentes situações ao longo do tempo.

Neste contexto, o Rio Grande do Sul foi um dos estados que mais recebeu imigrantes, os quais ocuparam os últimos lotes de colonização disponíveis na região. Apesar do marco da imigração ser 1875, com a chegada de alguns poloneses na Serra Gaúcha, são os anos de 1890 a 1894 os definitivos para a emigração polonesa, etapa conhecida como a “gorączka brazijliska” ou “febre brasileira”, quando milhares de poloneses, na sua grande maioria camponeses, espalharam-se pelo território gaúcho, alguns poucos nas cidades de Rio Grande, Pelotas e Porto Alegre e outra parte no interior do estado, ganhando lotes que variavam de 12,5 ha até 25 ha (GARDOLINSKI, 1958; STAWINSKI, 1975).

Para os que ficaram no interior, inicialmente ocuparam as rebarbas de terra da Serra Gaúcha, pressionados entre os italianos, outros ocuparam regiões próximas a Porto Alegre como as atuais Mariana Pimentel e Dom Feliciano. Posteriormente, os poloneses da serra reimigraram para as regiões do Alto Uruguai e Missões, potencializados por uma imigração direta da Europa com o objetivo de fundar colônias de povoamento naquela região.

42 Fonte: BRASIL. Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio - Diretoria Geral de Estatística.

Quanto aos dados estatísticos para o Rio Grande do Sul, conforme apontam vários autores, ainda que seja muito difícil precisar o número de poloneses que ingressaram no estado, principalmente em função da usurpação do território da Polônia por seus vizinhos mais poderosos, pode-se tomar como parâmetro dados dos censos demográficos das primeiras décadas do século XX, que contabilizam “estrangeiros”, e, segundo os quais, os procedentes da Polônia ocupavam a quarta posição, vindo atrás de alemães, italianos e uruguaios (WEBER, WENCZENOVICZ, 2012, p. 160). Para o período da chegada de Bieżanko, temos como dados mais próximos os de 1928 do Relatório da Secretaria de Obras Públicas, que contabiliza 80.000 poloneses, russos e

descendentes43 como verificamos no quadro abaixo:

Tabela 4- Quadro da população colonial do Rio Grande do Sul em 1928

NACIONALIDADE NÚMERO DE PESSOAS

Luso-Brasileira 140.000

Alemã e descendência 400.000

Italiana e descendência 300.000

Polonesa, russa e descendência 80.000

Diversas 60.000

Total 980.000

Fonte: Relatório da Secretaria de Obras Públicas do Rio Grande do Sul de 1928. [Adaptado por Rhuan Trindade].

Se considerarmos o fato de a Polônia não existir até 1918 e que boa parte dos imigrantes veio do Reino da Polônia, parte pertencente ao Império Russo e outros da Alemanha, os números destacados no quadro devem ser relativizados. Muitos dos “russos” seriam também poloneses ou se identificariam enquanto tais, além disso, em alguma medida, parte dos “alemães” também poderia ser apontada como poloneses, aumentando consideravelmente o número em destaque no quadro.

Para chegarem ao Brasil estes imigrantes traçaram um caminho mais ou menos semelhante, denotando fatores de expulsão (push) do continente Europeu e, em especial, da Polônia ocupada pelas nações estrangeiras, e fatores de atração (pull): terras e

43 Tais referências concordam com os dados do consulado registrados no Arquivo das Atas Novas, Seção das Atas do Ministerio dos Assuntos Estrangeiros, pasta 10 383, k. 23-27. No Recenseamento da

população polonesa, registrada para o Rio Grande do Sul como sendo de 80 mil pessoas, entre 1934 e 1938.

emprego na América. O governo brasileiro e as empresas colonizadoras investiram durante algum tempo no subsídio da passagem e no agenciamento de imigrantes através de indivíduos com a função de “divulgar” o país e suas “maravilhas”, levando muitas

vezes a fantasias de uma terra de leite e mel44, regada de ouro e joias.

Na Polônia, a expulsão em razão da superlotação do campo e exploração dos latifundiários encontrou na emigração o seu escape. Das aldeias ou cidades, os poloneses seguiam de trem, via Berlim, para o porto de Bremen, onde muitos eram roubados ou extorquidos pelos vendedores alemães. De lá, viajavam de navio por aproximadamente 18 dias até o Rio de Janeiro, onde então permaneciam nos barracões de imigrantes na Ilha das Flores, e quando definidos os destinos, alguns desciam para o Rio Grande do Sul. Do Rio, iam de vapor até Porto Alegre ou Rio Grande e depois de alguns dias de descanso definiam a região colonial, para onde deslocavam-se por via fluvial ou ferroviária até a cidade mais próxima e logo, de carreta, cavalo ou a pé para as colônias, onde poderiam aguardar meses até a demarcação e, enfim, a chegada ao lote.