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2 A CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS E SEU REFLEXO SOBRE O

3.1 Breve Histórico sobre a Evolução do Setor Elétrico Brasileiro

O setor elétrico brasileiro experimentou diversos estágios de desenvolvimento e de regulamentação, conforme já observado anteriormente. O crescimento econômico brasileiro e o processo de expansão urbana refletiram diretamente neste setor favorecendo a sua gradativa expansão por todo o país.

Em seus primórdios o sistema elétrico nacional ficou restrito a determinadas regiões do país. Este fato consistia em uma repercussão do desenvolvimento do mercado de consumo dessas regiões.

As primeiras experiências de uso da energia elétrica no país, no século XIX, foram favorecidas pelo crescente mercado de produtos primários que impulsionavam a economia nas principais cidades brasileiras. Estas iniciativas se restringiam a ações isoladas para o atendimento de iluminação e transporte públicos.

Veja-se que no ano de 1879 há a implantação da utilização da energia elétrica em espaços públicos da cidade do Rio de Janeiro, o marco inicial foi a inauguração da iluminação elétrica na estação central da ferrovia Dom Pedro II (Central do Brasil), cuja fonte de energia era um dínamo34.

Com o crescimento ascendente da economia do país foi observada a incorporação do uso da eletricidade por setores produtivos.

Entre os anos de 1883 e 1887, observou-se a implantação de vários projetos de geração e utilização da energia elétrica. Como marcos deste período tem-se a implantação da primeira central geradora, movida a lenha; a construção, em Minas Gerais, da primeira hidrelétrica brasileira; o início, em Porto Alegre, do serviço de fornecimento de luz elétrica a consumidores particulares e o aprimoramento do serviço de iluminação pública35.

Já no século XX, com o processo de expansão urbana, intensifica-se a evolução da geração de energia no Brasil.

A chegada das primeiras concessionárias estrangeiras deveu-se a investimentos canadenses e americanos ocorridos a partir do ano de 1904.

A “Rio de Janeiro Tramway, Light and Power Company” realizava a exploração de serviços urbanos, quais sejam, transportes, iluminação pública, produção e distribuição de eletricidade, distribuição de gás canalizado e telefonia.

Neste período, os concessionários firmavam contratos com os Estados e Municípios. A partir deste momento observou-se a necessidade de regular o principiante mercado da energia elétrica do Brasil.

São desta época a Lei nº 1.145, de 31 de dezembro de 1903, e o Decreto nº 5.704, de 10 de dezembro de 1904, de regulamentação da concessão dos serviços de eletricidade.

As mudanças políticas e econômicas ocorridas mundialmente e nacionalmente refletem diretamente neste setor e os anos de 1930 marcam um significativo avanço.

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34 Dínamo: Nome simplificado de máquina dinamoelétrica; gerador que transforma energia mecânica

em energia elétrica. (LUFT, Celso Pedro. Minidicionário Luft. São Paulo: Ática, 2000, p.246).

35 Iluminação Pública, conforme definido no artigo 2º da Resolução 456, da ANEEL, constitui serviço

que tem por objetivo prover de luz, ou claridade artificial, os logradouros públicos no período noturno ou nos escurecimentos diurnos ocasionais, inclusive aqueles que necessitam de iluminação permanente no período diurno.

O Estado assume um papel intervencionista na esfera econômica e desta intervenção resultou uma maior regulação dos serviços públicos, ou seja, o Governo Federal assume seu papel intervencionista na gestão do setor de águas e energia elétrica.

A Constituição de 1934 estabelece as bases para aprovação do Código de Águas, Decreto nº 26.643, que tramitava no Congresso desde 1907. Tal diploma trouxe disposições sobre o disciplinamento para a concessão dos serviços públicos de energia elétrica e sobre o controle destas prestadoras de serviços, porém, somente em 1957, com o Decreto 41.019 36, ocorreu a regulamentação do referido Código.

Em linhas gerais, após a edição deste código a União passa a deter a competência para legislar e conceder a prestação de serviços públicos de energia elétrica e desencoraja a realização de investimentos estrangeiros neste setor.

Após a Segunda Guerra Mundial e ao longo dos anos de 1940, o Estado viu-se obrigado a incrementar a oferta de energia elétrica no país e amplia seu papel atuando diretamente na produção. É deste período a criação da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (CHESF)37.

Em seguida, o governo cria e centraliza, sob sua gestão, diversas outras empresas que atuarão no setor elétrico. O governo assume neste setor o papel de financiador, planejador e produtor.

Após estes investimentos o setor elétrico passa a desenvolver-se exponencialmente nas décadas seguintes e o governo brasileiro verifica a necessidade de constituição de um órgão regulador. Em 1965 é criado o

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36 Do decreto nº 41.019, de 26 de fevereiro de 1957, que como dito regulamentava os serviços de

energia elétrica, extraímos o conceito de produção, transmissão, transformação e distribuição de energia elétrica, que será essencial em nosso estudo: “Art. 2º São serviços de energia elétrica os de produção, transmissão, transformação e distribuição de energia elétrica, quer sejam exercidos em conjunto, quer cada um deles separadamente. Art. 3º O serviço de produção de energia

elétrica consiste na transformação em energia elétrica de qualquer outra forma de energia, seja

qual for a sua origem. Art. 4º O serviço de transmissão de energia elétrica consiste no transporte desta energia do sistema produtor às subestações distribuidoras, ou na interligação de dois ou mais sistemas geradores. § 1º A transmissão de energia compreende também o transporte pelas linhas de subtransmissão ou de transmissão secundária que existirem entre as subestações de distribuição. § 2º O serviço de transmissão pode ainda compreender o fornecimento de energia a consumidores em alta tensão, mediante suprimentos diretos das linhas de transmissão e subtransmissão. Art. 5º O serviço de distribuição de energia elétrica consiste no fornecimento de energia a consumidores em média e baixa tensão”. Destaquei.

Departamento Nacional de Águas e Energia (DNAEE), que viria a realizar estudos hidrológicos, fiscalizar, dar concessões e controlar o aproveitamento das águas e dos serviços de eletricidade.

Na década de 1970, a disponibilidade de financiamentos internacionais e as crises do petróleo fizeram com que o Governo Federal abandonasse o financiamento setorial e buscasse o endividamento externo como forma de financiar a expansão do setor.

Ao longo dos anos de 1980, o setor foi perdendo o viço e se observa uma grave crise. O alto grau de endividamento externo das empresas e a contenção das tarifas para impedir o crescimento da inflação, pioram ainda mais a situação.

Os planos de expansão são frustrados, os investimentos no setor são drasticamente reduzidos e as empresas se encontram endividadas. Assoma-se a possibilidade de falta de energia e a recessão do mercado impede o atendimento à demanda crescente.

Diante destes fatos o governo vê-se obrigado a desenvolver políticas com o intuito de administrar estas crises. Delineia-se diante do ente estatal a possibilidade das privatizações.

A Constituição Federal de 1988, quando tratou da "Ordem Econômica e Financeira", já havia deixado as bases para esta nova política, onde ao Estado caberiam as funções de normatizador, de fiscalizador e de regulador da atividade econômica.

Assim, a década de 1990 inicia com profundas mudanças no setor, sendo o primeiro passo para a reforma do setor elétrico brasileiro, começando a preparar o mercado para o processo de desestatização. Observa-se o início da transição de um modelo estatal para um de participação mista (estatal/privado)38.

A Lei nº 8.031, de 12 de abril de 1990 ao instituir o Programa Nacional de Desestatização (PND) e ao criar o Fundo Nacional de Desestatização (FND) alavanca o início deste processo de implantação de um novo modelo econômico, como meio de ajuste fiscal e de saneamento do setor público.

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38 GOMES, Antônio Claret S.; ABARCA, Carlos David G.; FARIA, Elíada Antonieta S. T.;

FERNANDES, Heloísa Helena de O.. O Setor Elétrico. Disponível em:

A Lei nº 8.631, de 1993, que foi regulamentada pelo Decreto nº 774, do mesmo ano, foi promulgada no intuito de atacar as principais dificuldades do setor, remediando a situação para implantar-se, logo em seguida, um novo modelo no setor energético. Nesta extinguiu-se a equalização tarifária vigente e criaram-se os contratos de suprimento entre geradores e distribuidores.

Desenvolve-se um ambiente propício à concorrência, com a possibilidade de grandes consumidores de energia poderem escolher onde adquirir seus suprimentos de energia, figura dos consumidores livres, este fato possibilitaria a movimentação de investimentos no setor.

Vieram os processos de licitação para novos empreendimentos de geração que aperfeiçoaram os gastos da administração pública, a Lei nº 9.074 é deste período.

O modelo do setor elétrico permaneceu praticamente inalterado desde 1964 até 1995, data em que sua reestruturação teve início no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Observe-se que nos anos de 1995 e de 1996, o Programa Nacional de Desestatização alcança definitivamente o setor elétrico, o Ministério das Minas e Energia coordenou a implantação deste projeto de reestruturação do setor elétrico brasileiro.

O projeto possibilitou a implantação da desverticalização das empresas de energia elétrica, ou seja, a cadeia produtiva se divide e cada etapa do processo energético de geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica tornaram-se áreas de negócio independentes.

Com a finalidade de incentivar a competição nos setores de geração e comercialização, tais áreas foram gradativamente desreguladas, enquanto a transmissão e distribuição de energia continuaram sendo tratadas como serviços públicos regulados pelo Estado, por serem segmentos considerados como monopólios naturais.

As reformas do setor elétrico brasileiro ocasionaram, portanto, mudanças na gestão das empresas que atuavam no ramo da eletricidade.

Lembre-se que tais reformas foram inspiradas, principalmente, na idéia de se criar um ambiente que promovesse uma ampla competição entre os agentes setoriais com o intuito de atingir os objetivos de aumento da eficiência, melhoria na qualidade dos serviços, além de trazer para o setor investimentos estrangeiros, que

promovessem seu crescimento e amortizassem a crise econômica pela qual passava a economia brasileira com a crescente dívida externa.

Diante deste contexto, de ampliação da atuação privada neste setor, foi vislumbrada a necessidade de criação de um órgão regulador e o Governo Federal cria, ainda em 1996, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), cuja função é regular as atividades do setor.

Outras mudanças foram implantadas com o objetivo de organizar o mercado, com destaque para a criação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, em 1997, do Mercado Atacadista de Energia (MAE), ambiente para a realização das transações de compra e venda de energia elétrica, e de um operador para o sistema elétrico nacional, o Operador Nacional do Sistema (ONS), em 1998.

Entre os anos de 2000 e de 2002 o setor elétrico sofreu uma crise de abastecimento, conhecida como a “Crise do Apagão”, advinda de um período de escassez de chuvas que afetou consideravelmente o modelo de geração de energia brasileiro, que é essencialmente hidrelétrico. Este fato culminou em um plano de racionamento de energia elétrica.

O crescimento do setor foi atrasado e atentou-se para a necessidade de introdução de novas formas de geração de energia.

Em 2002 foi instituído o Comitê de Revitalização do Modelo do Setor Elétrico, com o intuito de tornar menos vulnerável o setor elétrico nacional.

Entre os anos de 2003 e de 2004 o Governo Federal lançou as bases de um novo modelo para o Setor Elétrico Brasileiro, sustentado pelas Leis nº 10.847, de 15 de março de 2004, e nº 10.848, de 15 de março de 2004 e pelo Decreto nº 5.163, de 30 de julho de 2004.

Foi criada uma instituição responsável pelo planejamento do setor elétrico em longo prazo, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estabeleceu-se o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), responsável por avaliar permanentemente a segurança do suprimento de energia elétrica do país, e por fim instituiu-se a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) para organizar as atividades de comercialização de energia, em substituição ao Mercado Atacadista de Energia (MAE).

Em 2007, o Governo Federal anunciou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que previu investimentos no setor elétrico para o triênio de 2007 a 2010 a fim de se evitar novas crises de fornecimento.

3.2 Considerações sobre o Setor Elétrico Brasileiro: Geração, Distribuição e