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Breves considerações sobre o conceito de integração

Capitulo 3. Portugal solidário? estratégias nacionais de acolhimento

3.3. Acolher para integrar? O caminho traçado por Portugal para ser um país que salva

3.3.1 Breves considerações sobre o conceito de integração

Uma das principais questões enfrentadas pelos refugiados e por aqueles responsáveis pela sua proteção é a procura e consolidação de soluções duradouras à situação de refúgio. Como explicado acima, existem três soluções consideradas chave e que são apresentadas aos indivíduos que estão nesta condição: a repatriação voluntária, o reassentamento num terceiro país e a integração local. A repatriação voluntária refere-se à volta do refugiado ao seu país de origem. É a solução considerada ideal e é aquela que a maioria dos refugiados prefere. Para que tal solução se concretize é imprescindível o total comprometimento por parte do país de origem para que a reintegração se dê com segurança e dignidade, além de haver também a necessidade do apoio da comunidade internacional para assegurar um ambiente estável onde os indivíduos em asilo possam retornar e reconstruir suas vidas (Silva, Lacerda & Jorgensen, 2011).

Contudo, muitos refugiados não têm a escolha de voltar para seu país de origem, pois os mesmos não oferecem estruturas materiais, políticas ou sociais que garantam a reintegração de seus antigos habitantes. Deste modo, o reassentamento e a integração local são as soluções indicadas. No primeiro caso, um terceiro país recebe os refugiados voluntariamente e os proporciona proteção jurídica e física, incluindo o acesso a direitos civis, políticos, económicos, sociais e culturais, sob as mesmas bases dos direitos oferecidos a seus cidadãos nacionais, como também deve permitir que os indivíduos em refúgio possam se naturalizar. Já a integração local realiza-se no país de asilo. Este processo é complexo e acontece de forma gradual, pois inter- relaciona dimensões jurídicas, económicas, sociais e culturais (Silva, Lacerda & Jorgensen, 2011).

O processo de integração é, para vários autores, considerado altamente complexo e desafiador, sobretudo por ser multidimensional. O debate conceitual em torno do que constitui integração e quais os fatores que devem ser considerados para a sua afirmação acaba por ser

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central, existindo diversas definições e abordagens teóricas e metodológicas entre pesquisadores dedicados ao estudo sobre o tema dos refugiados. Diversas esferas merecem ser consideradas, entre as quais: a social, a cultural, a étnica, a religiosa, a económica, a política, a psicológica, a espacial. No âmbito do programa de recolocação europeu, o processo de integração dos quase 10.000 refugiados que Portugal se comprometeu em acolher parece centrar-se em cinco objetivos principais: garantia alojamento e alimentação, acesso à saúde, acesso à educação, acesso ao mercado de trabalho e aprendizagem da língua portuguesa. Nesse sentido, para este trabalho, mencionaremos as conceções mais oportunas sobre o tema e que considere os objetivos centrais do programa português.

A integração local merece ser pensada como processo intersubjetivo, que diz respeito às vivências particulares dos sujeitos na sua interação com a sociedade recetora. Entende-se, dessa forma, que assume um caráter dialético, de via dupla: não apenas o refugiado recém- chegado deve se adaptar à comunidade local, como também esta deve se ajustar, abrindo espaço para recebê-lo. É um processo que implica tolerância e aceitação em relação ao outro, que pode portar em sua bagagem um repertório cultural, linguístico, religioso e carregar em si traços físicos distintos dos da comunidade local. Esta visão traz uma alternativa, em termos teóricos e práticos, frente à perspetiva assimilacionista, direcionada para aculturação e adaptação unilateral do refugiado à sociedade receptora. Dessa forma, seria possível manter laços identitários ligados à terra natal e, ao mesmo tempo, desenvolver relações com a comunidade no local de destino (Moreira, 2015).

Integrar-se diz respeito a conviver com os membros da comunidade recetora, construindo relações com eles e comunicando-se em seu idioma; inserir-se no mercado de trabalho, nos sistemas de saúde, educação e assistência social; ter acesso à moradia; ser portador de e poder exercer direitos; não ser discriminado por sua origem, características étnico-raciais, religião. Percebem-se, assim, várias dimensões a serem contempladas, cada qual se desenvolvendo em seu próprio espaço e tempo, de maneira não linear (Moreira, 2015). A integração, entendida como de via dupla ou recíproca, pressupõe que ambos os atores envolvidos – os refugiados e a sociedade que os acolhe – façam esforços para o seu alcance e sucesso. Os refugiados devem estar preparados para a adaptação aos modos de vida da sociedade de acolhimento sem que isso lhes exija a perda da sua própria identidade cultural. Ao mesmo tempo, a sociedade de acolhimento deve mostrar-se disponível para a aceitação dos refugiados como parte da comunidade nacional, adaptando as instituições públicas para estas mudanças e facilitando o acesso aos recursos de que estes necessitam para o recomeço de suas vidas. Nesse sentido, o processo de integração implica uma mudança de valores e comportamentos tanto da parte dos recém-chegados como da sociedade existente, assegurando desta forma uma igualdade de condições, mas mantendo a existência de diferenças culturais, transformando a sociedade numa verdadeira sociedade democrática e multicultural, onde vigoram os princípios da diversidade e liberdade de escolha. Já o contrário - a ausência de condições de igualdade produz exclusão social, pobreza e miséria. Portanto, é possível afirmar

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que os refugiados detêm uma parte importante da responsabilidade para que uma integração bem-sucedida aconteça. Se estes refugiados forem integrados por sociedades de acolhimento abertas e se tiverem, paralelamente à sua disposição os apoios, as ferramentas necessárias que os capacitem ou reconheçam suas capacidades, as suas responsabilidades e a sua integração serão mais facilmente cumpridas. Dessa maneira, é possível contribuir para o fortalecimento de uma sociedade coesa, pois a integração dessas pessoas dependerá inevitavelmente de políticas de coesão social bem concebidas e implementadas (Souza, 2017).

Ao tomar a integração como processo de via dupla, há que se abrir espaço para os refugiados se manifestarem a respeito de como o percebem em suas múltiplas dimensões e sobre os objetivos que os programas e as políticas nas diversas áreas devem alcançar. Os critérios a serem utilizados para definir o ‘sucesso’ desse processo multidimensional também devem incorporar os olhares dos próprios refugiados. De facto, eles merecem ser integrados às discussões sobre integração, tanto no desenho dos programas e das políticas, como na sua implementação e futura avaliação (Moreira, 2014).

Convém ressaltar por fim que sentir-se integrado numa área não acarreta necessariamente integração plena e efetiva, em todas dimensões, em meio ao país recetor. Ou seja, o indivíduo pode se sentir integrado economicamente (por ter conquistado um emprego), mas não integrado politicamente (por não se sentir capaz de participar nas decisões políticas que o afetam ou não ter direito ao voto) (Moreira, 2015). É preciso pensar em políticas que promovam uma integração plena, com acesso a serviços básicos e garantia do pleno gozo dos direitos civis e políticos.

Como um processo que promove uma solução duradoura para os refugiados no país de refúgio, a integração local apresenta três dimensões inter-relacionadas e específicas, que passam por várias etapas: 1) a dimensão legal: é o processo no qual são assegurados os direitos civis básicos dos refugiados como expressos na Convenção de 1951, que incluem o direito ao emprego, à aquisição e desfrute de propriedades, à liberdade de movimento e o acesso a serviços públicos como a educação, a saúde, entre outros 2) dimensão econômica: permite que os refugiados se tornem autossuficientes, não mais necessitando, portanto, da ajuda do Estado e da assistência humanitária; 3) dimensão social: possibilita aos refugiados estabelecerem uma nova rede social junto à população local sem discriminação, intimidação ou exploração pelas autoridades ou pessoas do país de refúgio (Silva, Lacerda & Jorgensen, 2011).

Considerando estas três dimensões, indissociáveis entre si para o sucesso do processo de acolhimento e integração, o plano nacional leva em consideração as características individuais de cada pessoa/agregado familiar, e as especificidades das localidades com disponibilidade de acolhimento com o objetivo de potenciar a integração e autonomização dos requerentes de proteção internacional. A estratégia nacional procura privilegiar o acolhimento por instituições, em detrimento do acolhimento por particulares, valorizar o potencial do acolhimento também em territórios de média e baixa densidade, mobilizar consórcios locais de

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instituições que, em conjunto, assegurariam os vários requisitos necessários para a plena integração dos refugiados e apresentar soluções que permitiriam a gradual autonomia das pessoas refugiadas, designadamente as soluções de alojamento que assentassem em soluções de pequena escala (ACM, 2017).

Em Portugal, o processo de integração local inicia-se com a chegada do então solicitante de refúgio no país. A partir do pedido de refúgio, o solicitante tem direito ao recurso a um intérprete sempre que necessário, aconselhamento e acompanhamento jurídico pelo CPR, ser informado sempre que precise, direito a beneficiar de apoio judiciário nos termos gerais, a beneficiar de apoio social para alojamento e alimentação no caso de carência económica e social e acesso ao Serviço Nacional de Saúde (ACM, 2017).

Para auferir o sucesso do plano de integração português fez-se necessário a análise dos cinco itens considerados pelo plano de ação nacional como indicativos da plena integração dos refugiados, aos quais sejam: Alojamento e alimentação - Acesso à Saúde, - Acesso à educação - Acesso ao Mercado de trabalho - Aprendizagem da língua portuguesa.

3.3.2. Alojamento e alimentação dos refugiados: A primeira fase do processo