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1. CÂNCER, PROTEÍNAS TIROSINA FOSFATASES E PLANEJAMENTO DE

1.2. Câncer e as proteínas fosfatases

As células que constituem o corpo dos organismos multicelulares formam uma comunidade de tecidos altamente organizados. Os órgãos crescem até atingirem certo tamanho porque suas células obedecem aos sinais recebidos para entrar na fase G- zero do ciclo celular e interromper a proliferação. As células cancerosas apresentam alterações no DNA e, por isso, escapam dos mecanismos de controle do ciclo celular [4].

O câncer é um termo genérico para um grande grupo de doenças que podem afetar qualquer parte do corpo. Outros termos utilizados são tumores malignos e neoplasias. O tumor surge de uma única célula que sofreu mutação, multiplicou-se por mitose e suas descendentes foram acumulando outras mutações que se foram somando até darem origem às células cancerosas. Tais células proliferam-se muito, perdem a capacidade de aderência, secretam enzimas capazes de atacar a matriz extracelular, espalhando-se no organismo e proliferando em locais distantes de sua origem, onde produzem tumores secundários. Esses tumores secundários são denominados metástases, sendo esta a principal causa de morte por câncer [4].

Existem muitos tipos diferentes de células normais e quase todos esses tipos podem gerar tumores. Isso implica em dizer que existem também muitos tipos de células cancerosas, produzindo tumores que diferem entre si pelo grau de malignidade e resposta ao tratamento. Tumores malignos recebem nomes diferentes relacionados aos tecidos onde são originados: carcinomas (originados de células epiteliais de

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revestimento), adenocarcinoma (células epiteliais secretoras), osteossarcoma (osteoblasto) e condrossarcoma (células de cartilagem) [4].

A transformação de uma célula normal numa célula de tumor é o resultado da interação entre fatores genéticos de uma pessoa e três categorias de agentes externos, incluindo:

a) carcinogênicos físicos, como a radiação ultravioleta e ionizante;

b) carcinogênicos químicos, como amianto, componentes da fumaça do tabaco, aflatoxina (um contaminante de alimentos) e arsênio (um contaminante de água potável);

c) carcinogênicos biológicos, como infecções por determinados vírus, bactérias ou parasitas.

O envelhecimento é outro fator fundamental para o desenvolvimento de câncer. A incidência da doença aumenta drasticamente com a idade, provavelmente devido a uma acumulação de riscos para tipos específicos de câncer. O risco global de acumulação é combinado com a tendência de mecanismos de reparação celular serem menos eficazes quando a pessoa envelhece.

O tratamento do câncer pode ser feito através de cirurgia, imunoterapia, radioterapia, quimioterapia ou transplante de medula óssea. Em muitos casos, é necessário combinar mais de uma modalidade. O objetivo é curar a doença ou prolongar a vida consideravelmente, melhorando a qualidade de vida do paciente. O diagnóstico e o tratamento são complementados por suporte psicológico. Alguns dos tipos de câncer mais comuns, como câncer de mama, de colo uterino, bucal e colorretal têm maiores taxas de cura quando detectados precocemente e tratados de acordo com as práticas recomendadas [5].

A cirurgia é o tratamento mais antigo para o câncer, sendo durante muito tempo o único que podia curar o paciente. O tratamento cirúrgico do câncer mudou drasticamente ao longo das últimas décadas. Os avanços nas técnicas cirúrgicas e uma melhor compreensão dos padrões de propagação das células tumorais têm permitido que os cirurgiões realizem com sucesso ressecções para número crescente de doentes. O desenvolvimento de estratégias alternativas de tratamento levou os cirurgiões a reavaliar a magnitude da necessidade de cirurgia. O cirurgião que trata o câncer deve

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estar familiarizado com os princípios e potencialidades não somente da cirurgia, como também da radioterapia, quimioterapia, imunoterapia e outras novas modalidades de tratamento [5].

A história da radioterapia para o tratamento do câncer remete ao final do século XIX, após a descrição de Wilhelm Roentgen de raios X em 1895 e a descoberta do rádio por Marie e Pierre Curie, em 1898. Nas primeiras décadas do século XX, radiação ionizante tinha sido utilizada para tratar uma variedade de tumores humanos. Avanços tecnológicos na segunda metade do século XX, levou ao desenvolvimento de unidades de telecobaltoterapia. Estas eram capazes de produzir raios X de energia mais alta, que poderiam penetrar mais profundamente no tecido e reduzir a dose para a pele e, portanto, representando um enorme avanço na capacidade para tratar tumores internos. Além disso, ao longo dos últimos anos, novas ferramentas foram desenvolvidas, aumentando a habilidade de colocar a dose de radiação em locais difíceis, permitindo um tratamento mais eficaz dos tumores, protegendo melhor os tecidos normais adjacentes. Em décadas recentes, a radioterapia tornou-se uma opção de tratamento padrão para uma vasta gama de doenças malignas [5].

O desenvolvimento da quimioterapia nas décadas de 1950 e 1960 resultou na disponibilidade de estratégias terapêuticas para os pacientes com doenças hematológicas malignas e vários tipos de tumores sólidos avançados. Esses avanços confirmaram o princípio de que a quimioterapia poderia realmente curar o câncer e forneceu justificativa para a integração de quimioterapia em programas de terapias combinadas com cirurgia e radioterapia nos estágios iniciais da doença, de modo a fornecer benefício clínico. Os principais obstáculos para a eficácia clínica de quimioterapia têm sido a toxicidade para os tecidos normais do corpo e o desenvolvimento de resistência celular ao fármaco. A melhor compreensão das vias moleculares pelo qual a quimioterapia exerce sua atividade citotóxica tem proporcionado uma base racional para o desenvolvimento de estratégias terapêuticas inovadoras [5].

A quimioterapia envolve o uso de pequenas moléculas capazes de destruir o tumor ou cessar seu crescimento. Um dos primeiros agentes usados clinicamente foi a mostarda de nitrogênio (mecloretamina – agente alquilante), que foi descoberta

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acidentalmente durante da 1ª Guerra Mundial [6]. A partir de então, várias classes de quimioterápicos foram desenvolvidas ou descobertas, sendo três delas destacadas no Quadro 1.1.

Quadro 1.1 - Exemplos de alguns quimioterápicos usados atualmente[6]

Classe Exemplos

Antimetabólitos Análogo do ácido fólico: metotrexato Análogo de purina: 6-mercaptopurina Análogo de pirimidina: citarabina

Terapia Hormonal

Modulador seletivo do receptor de estrógeno: Tamoxifeno

Análogos do hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH): goserelina

Anticorpos Monoclonais Indução da lise de células de linfócitos B: rituximabe

Inibidor de angiogênese: bevacizumabe

O quadro atual é caracterizado pela existência de tratamentos de elevado custo e índice terapêutico relativamente reduzido. Apesar das diversas classes farmacológicas disponíveis de agentes quimioterápicos para tratamento do câncer, nenhuma delas têm se mostrado capaz de erradicar as células cancerosas sem afetar tecidos normais. Assim, a descoberta de novas abordagens terapêuticas torna-se um dos principais desafios de nossa época, com investimentos significativos em pesquisa feitos tanto pela indústria farmacêutica global quanto pelos governos de diferentes países [7].

Novas drogas anticâncer inovadoras (por exemplo, o rituximabe e bevacizumabe) são importantes dentro dos regimes de tratamento recomendados para certas neoplasias malignas, no entanto, seus custos de aquisição são relativamente altos, enquanto que seus benefícios podem parecer modestos [7].

O balanço entre fosforilação e desfosforilação de proteínas controla diversos eventos biológicos disparados por efetores extracelulares, como hormônios,

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carcinógenos, mitógenos. Em consequência da ação destes efetores, ocorre regulação da divisão, diferenciação, desenvolvimento e morte celular, regulação do metabolismo e expressão gênica. A adição ou remoção do grupamento fosfato de uma proteína pode gerar um “motivo” de reconhecimento para a interação proteína-proteína, controlar a estabilidade proteica e, mais importante, modular a atividade de enzimas [8].

Aproximadamente 30% das proteínas celulares são fosfoproteínas [9]. As fosfatases são hidrolases que utilizam como substratos fosfomonoésteres. Em células eucarióticas, a maioria da fosforilação de proteínas ocorre em resíduos de tirosina, serina e treonina, catalisada por proteínas quinases, ao passo que as proteínas fosfatases exercem efeitos regulando negativamente e/ou positivamente as vias de sinalização e no controle fisiológico de uma variedade de tecidos [8, 10]. Numa transformação oncogênica, o nível de proteínas fosforiladas em resíduos de tirosina aumenta de 1% a 2% na célula. Mudanças anormais na atividade dessas enzimas acarretam na fosforilação inapropriada de resíduos de tirosina, o que contribui para o desenvolvimento de várias patologias que incluem diabetes, doenças resultantes de defeitos imunológicos e o câncer – foco dos estudos aqui apresentados [8, 11].

Com base na função, estrutura, sequência, especificidade, ativadores e inibidores, as proteínas fosfatases podem ser agrupadas em dois grandes grupos: proteínas serina/treonina fosfatases e proteínas tirosina fosfatases [8]. Neste trabalho, as proteínas tirosina fosfatases (LMW-PTP e CDC25B), descritas a seguir, foram selecionadas como alvo para a descoberta e o desenvolvimento de inibidores enzimáticos.

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